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segunda-feira, 16 de setembro de 2024

“Chibo”, de Gabriela Poester e Henrique Lahude (2023)

 

Dois curtas-metragens produzidos no Rio Grande do Sul em especial saltaram aos olhos na última edição do Festival de Gramado. O primeiro deles foi, obviamente, a grande revelação “Pastrana”. Vencedor do prêmio de Melhor Curta-Metragem na competição nacional, feito que não ocorria há anos no cinema gaúcho, o filme dos jovens diretores Melissa Brogni e Gabriel Motta ganhou, com total merecimento, ainda os Kikitos de Melhor Fotografia e Montagem, além de arrebatar a crítica na Mostra Gaúcha – Prêmio Assembleia Legislativa, levando o Prêmio ACCIRS, e mais o de Melhor Produção Executiva.

Porém, outro filme dessa recente leva gaúcha um pouco menos laureado, mas nem por isso, menor em relevância e qualidade, é, “Chibo”. Eleito melhor curta-metragem gaúcho no Prêmio Assembleia Legislativa, o filme dos também jovens realizadores Gabriela Poester e Henrique Lahude tem a potência inquietante do filmes de arte. Se “Pastrana” conquista o público em poucos minutos por sua montagem ágil, imagens impactantes e narrativa tocante ao prestar, num documentário muito pessoal, uma homenagem ao skatista de downhill Allysson Pastrana, falecido trágica e precocemente em 2018 durante uma competição, “Chibo”, por sua vez, vale-se de outras ferramentas para se erguer enquanto obra. O que faz com bastante originalidade.

O filme traz a história de uma família, que vive na fronteira entre Brasil e Argentina, às margens do rio Uruguai, e que trabalha com chibo - travessia clandestina de mercadorias para subsistência, comércio e pessoas. Dani, a filha mais velha, está prestes a concluir o ensino médio e enfrenta as decisões dessa fase da vida. Num realismo cru, fotografia que oscila entre o sujo e o poético e uma proposta de “dificultação” do olhar, “Chibo” capta tanto a questão identitária e socioeconômica do gaúcho quanto a feminina e a da juventude em busca de perspectivas. 

Em perspectiva de uma onda de produções gaúchas que vêm questionando valores arraigados (e, no mais das vezes, desgastados) do povo Rio Grande do Sul, como os longas “Casa Vazia” (Giovani Borba, 2021), “Rifle” (Davi Pretto, 2017) e os recentes “Além de Nós” e “Sobreviventes do Pampa”, ambos de Rogério Rodrigues, “Chibo” traz à tona uma outra perspectiva para essa saudável discussão. Num estado que recentemente viveu a maior catástrofe natural de sua história e tenta, a murros em ponta de faca, reconstruir-se, por que não, então, diante do presente sentimento de crise, voltar-se para dentro e repensar a si próprio? Afinal, o que é esse ser gaúcho? Filmes como “Chibo” trazem à tona um dos pontos essenciais dessa discussão, que é a questão do trabalho e sua precarização. Enquanto o agro monocultural e tecnológico (leia-se soja e pecuária) avança, para onde vão pessoas como Dani e seus familiares, à margem deste processo? Não à toa, simbólica e praticamente eles margeiam um rio que divide dois países vizinhos permanentemente em dificuldade econômica.

Cena de "Chibo": é preciso repensar o gaúcho

Além disso, “Chibo” também guarda um olhar muito apurado para a questão feminina. Que perspectiva de vida uma adolescente tem naquele fim de mundo pobre e sujeito a piorar? Causa uma desacomodarão ao espectador ver os momentos da protagonista em casa ou na lida com os bichos na pequena propriedade, ao passo que também é encantador vê-la nas interações com a irmãzinha imersas na paisagem bonita daquele local longe do mundo. 

Seja a emoção genuína que “Pastrana” causa no espectador, seja o desconforto propiciado por “Chibo”, o Rio Grande do Sul ganhou dois excelentes representantes do novo cinema este ano. E como curtas-metragens são a porta para realizações mais audaciosas futuras, que venham os desafios. Gabriela e Lahude, por sinal, já estão em desenvolvimento do longa-metragem "Caça". A se ver pelas mostras iniciais, o caminho foi muito bem aberto.


"Chibo"
Direção: Gabriela Poester e Henrique Lahude 
Gênero: Drama
Duração: 12 min.
Ano: 2023
País: Brasil

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Daniel Rodrigues