Sabe aquele tipo de sonho, por exemplo, que vc percorre um lugar que não conhece, cheio de corredores, uma casa velha e sombria, aí chega pra falar com vc uma pessoa desfigurada, um ser extraterrestre ou um zumbi. Aí, lá pelas tantas vc sai correndo, suas pernas não atendem, como se vc estivesse sendo segurado ou estivessse atolado numa lama, e quando consegue chega a um abismo ou buraco e cai, cai, cai e aquela queda não tem fim e vc acorda assustado. Sabe?
Pois é. O último disco do Portishead, Third, me dá esta sensação. Adquiri faz pouco tempo e agora resolvi comentar sobre ele, ainda que muito já se tenha falado, bem ou mal a seu respeito.
O disco parece um pesadelo no melhor sentido possível que uma definição desta possa conter. É uma sucessão de sensações intencionais ou não. Intencional como no caso da violenta Machine Gun, com sua bateria eletrônica repetida e insistente que remete ao barulho de uma metralhadora, ou mais ocasionais como em Hunter, uma balada triste com interferências de um efeito doido que se fosse traduzido em imagem, seria algo como uma espiral enlouquecida.
O disco já abre magnificamente bem com a tensa Silence que começa com uma gravação de uma voz em português e depois vai crescendo, crescendo e termina abruptamente como se fosse um defeito de gravação. O pesadelo segue e encontra na faixa 5, The Rip, uma bateria alta com rolos "desconexos" e muitos efeitos compondo uma atmosfera sombria, passando pela alucinante e angustiante Plastic até fechar com a "interminável" Threads.
O álbum é bem Portishead sendo, no entanto, bem diferente dos álbuns anteriores da própria banda. Me parece que em muitos aspectos houve um amaurecimento de idéias que já estavam presentes nos outros mas que em Third foram colocadas em prática já se sabendo aonde chegariam.
Na primeira vez que ouvi Portishead mesmo gostando, comentei com meus amigos que parecia "música de plástico". É curioso que neste álbum ao mesmo tempo que parece mais humano por ter guitarras mais vivas e percussões (ainda que eletrônicas mesmo), continua com esta alma sintética, como aliás me dão razão faixas com nomes como Plastic e Nylon Smile.
Música de plástico? Sintética? Isso não é defeito. É uma marca. É a assinatura do som do Portishead.
Cly Reis
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