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sábado, 21 de outubro de 2023

Ride - "Nowhere" (1990)

 




"...encontramos uma foto 
[a onda da capa do álbum]. 
Na minha cabeça, 
sabíamos o clima que estávamos buscando
 – que era essa coisa de escapismo, 
meio do nada
 – e tínhamos essa imagem 
para basear essa ideia."
Andy Bell, guitarrista


A expressão cult, às vezes meio vulgarizada, atribuída a qualquer obra ou artista de valor duvidoso, ou a elementos excessivamente populares para se destacarem como algo diferenciado, tem em uma de suas origens a definição de algo que tem, sim, determinado valor reconhecível, embora, evidentemente, não seja o melhor de sua categoria. Costumo classificar para mim alguns itens como cult, de forma muito pessoal e independente da avaliação geral ou da unanimidade dos entendidos. É o meu cult! Por ser subestimado, por ser underground, por ser maldito, pela raridade, enfim, pelo meu critério de reverência.
É o caso do álbum "Nowhere", do Ride. Embora para muitos ele seja o clássico absoluto da banda inglesa, um dos ícones da cena britânica do início dos anos 90, para mim "Nowhere" é o álbum cult. Tenho por sua obra maior, mais completa, seu sucessor, o excelente "Going Blank Again", de 1992, um trabalho, na minha opinião, mais maduro, mais bem lapidado, mais aperfeiçoado tecnicamente, no entanto, além de entender toda a idolatria dos fãs pelo disco de estreia, tenho por ele um enorme respeito e carinho. Em parte é isso: "Nowhere" ainda é meio tosco, meio cru, muito raiz, mas está  ali uma banda vigorosa, pura, cheia de coração. "Seagull" que abre o disco é  exatamente isso: é energia pura, numa linha de baixo alucinante com uma tempestade de guitarras e uma linha vocal celestial.

" 'Seagull' pode ser visto como a música tema do álbum, na medida em que tem a imagem do oceano, e é uma espécie de declaração de intenções com uma letra forte – parece a primeira faixa de um álbum. Além disso, faz referência a "Revolver", dos Beatles, que abre com "Taxman"Gaivota tem a mesma linha de baixo, então parecia que havia algumas coisas apontando para ela como a abertura."
Andy Bell

Mas o ímpeto não se resume à abertura e pode ser encontrada também em "Kaleidoscope" e "Decay",
Há também aquelas que são doces, adoráveis, e no entanto, não menos cruas, como "In a Different Place" e sua encantadora melodia, "Polar Bear", com sua guitarra suja e sua batida estrondosa, e "Drums Burn Boom", que equilibra leveza e beleza com peso e barulho. A versão original do álbum,  em LP, se encerrava com a delicada "Vapour Trail", embora a versão em CD ainda trouxesse mais três faixas, "Taste", com toda sua energia psicodélica, a boa "Here and Now", e a música que batiza o álbum, "Nowhere", soturna e misteriosa, como um mergulho num pântano.

"Esta tornou-se uma das nossas favoritas, mas naquele momento era apenas mais uma melodia. "Vapour Trail" parecia apenas uma música simples de quatro acordes. Não foi preciso muito esforço para gravar – foi uma sorte incrível que tenha ficado tão boa quanto ficou. Agora eu ouço as músicas e concordo que "Vapour Trail" saiu um dos melhores."
Andy Bell


Mas o ponto alto, que une precisamente essa pureza sonora, com leveza e intensidade, é a espetacular "Paralyzed". Sua sonoridade oca, suas guitarras hipnóticas, o vocal arrastado, seguem lentamente, numa batida seca, marcada, fazendo com que o ouvinte seja absorvido num inevitável transe mágico. A parada, a pausa no meio da música, retornando com a batida marcada e sons de vozes de uma multidão ao fundo é, simplesmente de arrepiar!

"Durante os tumultos eleitorais, estávamos gravando em Oxford Street, em Londres. Abrimos a janela do estúdio quando estávamos fazendo a linha de piano, e havia uma multidão se rebelando do lado de fora. Parecia tão bom, e nos lembrou de uma música dos Smiths, então decidimos usar aquilo em "Paralyzed". Você tem que estar aberto a esses acidentes afortunados, a esse processo orgânico, porque ele agrega. Tornou-se outra coisa no estúdio porque a segunda metade da música virou esse trecho atmosférico de bateria, baixo e piano que não teria feito parte de nenhuma demo caseira - e nós sequer teríamos ensaiado."
Andy Bell

Imagino que para a maioria dos fãs  e críticos seja exatamente o contrário: "Nowhere" seja o melhor disco do Ride e "Going Blank Again" mereça, se tanto, algum respeito. Mas até essa possível divergência reforça a condição de "Nowhere" dentro da minha concepção: é o preferido de muitos mas para mim, embora não seja o número um, é, indubitavelmente, um grande disco. Enfim, para bem ou para o mal, é um disco cult.

*********************

FAIXAS:
1 Seagull (6:10)
2 Kaleidoscope (3:02)
3 In A Different Place (5:29)
4 Polar Bear (4:46)
5 Dreams Burn Down (6:06)
6 Decay (3:36)
7 Paralysed (5:34)
8 Vapour Trail (4:18)
9 Taste (3:17)
10 Here And Now (4:27)
11 Nowhere (5:23)

***************
Ouça:
Ride - "Nowhere"




por Cly Reis

domingo, 31 de outubro de 2021

"Salomão Ventura, O Caçador de Lendas nº1 - A Maldição do Saci", de Giorgio Galli - Gico Mix (2011)


"A premissa da HQ é mostrar as lendas do nosso folclore
do jeito que a tradição oral as apresenta,
capturadas pelo mestre Luís da Câmara Cascudo em sua bibliografia.
Em resumo: são histórias de terror feitas para assustar."

"E minha escolha para essa primeira edição 
não poderia ser outra:
quem foi mais descaracterizado e infantilizado
do que o diabrete Saci Pererê?
Que em sua origem, conforme relatado pelo mestre Cascudo,
foi vítima de assassinato, tornou-se alma penada
e tem como objetivo causar morte e dor?
Não é para crianças..."

Giorgio Galli,
prefácio de "A Maldição do Saci"



Na data mais conhecida pela comemoração norte-americana do Halloween, mas que por aqui, simbolizando toda a riqueza de nosso folclore, é simbolizada no Saci, nosso destaque vai para um dos projetos mais legais da cena independente de quadrinhos nacional. É o projeto do artista Giorgio Galli, que, com sua série Salomão Ventura, explora as tradições folclóricas brasileiras, lançando sobre elas um olhar mais sombrio e aterrorizante, transformando lendas e personagens de tradição popular em temíveis criaturas sinistras. Assim, o Curupira e o Saci, por exemplo, têm recuperadas características estudadas por historiadores e folcloristas, e passam a ser, na visão artística de Galli, criaturas sobrenaturais e ameaçadoras que, por mais que tenham justificativas para existirem e demandas legítimas, devem voltar para seus lugares, no mundo do além, longe dos humanos. Para isso, o caçador de assombrações, Salomão Ventura, um misto de Constantine e Van Helsing, sai em busca das aberrações sobrenaturais e, com seus métodos, nada gentis (e nem podia ser diferente) mas muito "convincentes", as captura e manda de volta para o lugar de onde nunca deviam ter saído.
O primeiro número da série do Caçador de Lendas, criado por Galli, é exatamente "A Maldição do Saci", personagem de origem sinistra cujas características foram humanizadas e suavizadas para ficar mais palatável e poder fazer parte dos sítios-dos-pica-paus-amarelos da vida, mas que a bem da verdade, não é nada menos que uma alma-penada vingativa e odiosa, fruto de um brutal assassinato. O moleque tem seus motivos para voltar das trevas para alimentar sua sede de vingança, punir pais e fazer justiça em lares onde crianças são maltratadas como ele foi, só que Salomão Ventura, por mais que compreenda isso, não pode deixá-lo à solta por aí e vai atrás do pretinho endiabrado se valendo da única maneira possível de pegá-lo... (você sabe qual é, não sabe?).
Um projeto que, ao contrário do que muitos pensam, que demoniza personagens da cultura popular, na verdade a resgata e valoriza, levando ao encontro de muitos mergulhados na cultura norte- americana, um pouquinho mais das raízes brasileiras.
Trabalho de muito talento desenvolvido, como o autor mesmo revela no prefácio, ao som de The Cure, The Smiths, Jesus & Mary Chain, Titãs, Cartola, PixiesStone Roses, Kraftwerk e outras coisas mais. Com inspirações dessas, só poderia sai coisa boa, mesmo.

Página da HQ. O início da sina vingativa do Saci.


por Cly Reis



O projeto Salomão Ventura infelizmente, num primeiro momento, não foi muito adiante e ficou só em quatro números, Saci, Curupira, Lobisomem e De Volta Pra Casa, mas ao que parece, o artista resolveu pôr a mão na massa e parece estar produzindo novos episódios do caçador das trevas. Não é tão fácil de se encontrar exemplares mas volta e meia se acha em feiras de quadrinhos e eventos do tipo, além do próprio site do artista (salomaoventura.com.br).

quinta-feira, 2 de setembro de 2021

Meu Babaca Favorito


Em tempos de idolatrias tão efêmeras, edificadas sobre méritos mínimos, e cancelamentos quase automáticos motivados pelo primeiro deslize, posicionamento ou frase mal colocada de um ídolo que, não muito tempo atrás, era elevado à condição de semideus, pessoas com um pouco mais de critério, de apego a suas influências e referências, têm uma certa resistência em, simplesmente, adotar o tão usual procedimento vigente de CANCELAR uma personalidade que, de alguma forma sempre admirou e que fora seu referencial, por mais que este faça por merecer um belo "block" por conta de procedimentos, atitudes, declarações, que revelam uma pessoa diferente daquela que se imaginava ou que demonstrava ser.
Os caras se esforçam pra fazer merda, cagar pela boca, demonstrar o quanto são desprezíveis, pessoas que a gente não aceitaria no nosso meio social, mas aí a gente pensa no que já fizeram de fantástico na sua arte, o quanto foram (e são) importantes pr'a gente, o quanto os admiramos, e não conseguimos, meramente, virar as costas e dizer que não os admiramos mais. E aí que com muito esforço, colocamos seu trabalho, sua figura, suas músicas, suas letras, acima de tudo e, separamos o ser-humano de sua obra. Só assim mesmo pra aguentar uns, ó, que, vou te contar...
Muitos desses, os mais recentes, já tinham seu espaço para dizer o que pensavam, tiveram microfone, seus próprios álbuns, palco, livros, espaço na imprensa, mas com a ascensão das mídias sociais, uma verdadeira terra-de-ninguém, onde todo mundo tem opinião formada sobre tudo mesmo, muitas vezes, sem qualquer embasamento ou informação, pareceram encorajados a assumir posições, que não são decepcionantes por serem divergentes da minha ou de determinado segmento, mas sim por serem lamentáveis do ponto de vista humano.
Listamos, aqui, alguns dessas criaturas que a gente só não "cancela" porque não dá pra deixar de lado o que já fizeram e, cá entre nós, porque a gente adora esses caras mesmo. Mas que estão pedindo, estão...
Uns são de hoje, outros tem histórias que vem de muito tempo, uns se revelaram por conta da pandemia, outros revelaram preferências políticas bem preocupantes, enfim, tem um monte nessa barca, mas aqui vamos pegar apenas alguns desses "caraterzinhos" duvidosos, que a gente sabe que são uns idiotas, uns babacas, mas que odiamos amar.


Tá certo é esse cachorro!
Eric Clapton - "Clapton é Deus". A inscrição frequentemente vista em muros de Londres nos anos 60, quando o guitarrista inglês hipnotizava os fãs com sua técnica e habilidade, está longe de ser verdade. Ao contrário, hoje, muitos fãs preferem ver o diabo do que o gênio da guitarra.
Recentes declarações de Eric Clapton, acerca da situação da Covid-19 e do isolamento, comparando os protocolos de segurança à escravidão, reforçadas pela gravação de uma canção anti-lockdown, "Stand and Deliver", de Van Morrison, por sinal, outro que tem se revelado um grandíssimo feladaputa, provocaram indignação entre seus admiradores e de quebra ainda tiraram alguns velhos esqueletos do armário. Os atuais posicionamentos de Clapton fizeram com que pessoas lembrassem de um episódio em 1976 em que ele, durante um show em Birmingham, "convocou" os estrangeiros e imigrantes a se retirarem do país. Na ocasião, Clapton disse, se dirigindo ao público, “Vamos impedir o Reino Unido de virar uma colônia negra. Expulsem os estrangeiros, mantenham a Inglaterra branca. Os negros, árabes e jamaicanos não pertencem a este país e nós não os queremos aqui (...) “Precisamos deixar claro que eles não são bem-vindos. A Inglaterra é um país para brancos, o que está acontecendo conosco?” . Pois é... Clapton pode até ser um deus na guitarra, mas passa longe de ser um santo.
Ao que parece, até seus amigos músicos perderam a paciência e não aguentam mais tanta baboseira, uma vez que o lendário guitarrista tem reclamado de se sentir abandonado pelos colegas do meio musical.
Toma!
Mas não adianta: tem como odiar o cara que fez "Layla", "Cocaine", "Crossroads" e outras tantas maravilhas? Não, né?


Roberto sendo homenageado
pelos militares, nos anos 70
.
Roberto Carlos - Sabe aquele cara que sempre que se fala dele tem aquele asterisco ao lado do nome? Sim, esse cara é ele. As coisas que depõe contra o Rei não são de hoje e não são relacionadas com pandemia, isolamento, redes sociais nem nada tão atual, mas acompanham sua figura pública já de bastante tempo e, de certa forma, embora seja inegável sua contribuição para a música brasileira e seu talento para composições, nunca conseguimos perdoá-lo totalmente.
O problema de Roberto Carlos, na verdade, foi mais seu silêncio do que o que teria dito. Enquanto seus colegas do meio cultural, musical, das artes bradavam contra a ditadura militar no Brasil, sofrendo suas consequências de censura, prisões e exílios, Roberto, confortável e convenientemente não só não se manifestava em relação ao regime e as reprimendas sofridas pelos colegas e continuava, simplesmente, gravando suas canções alienadas com temas românticos ou de "curtição", como ainda não se esforçava em esconder uma proximidade com os generais e até mesmo era agraciado com comendas e homenagens pelos tiranos governantes brasileiros daquele nefasto período da nossa história.
Como se não bastasse, Roberto é conhecido no meio artístico por seu comportamento egoísta, mesquinho e antiético, sabotando outros artistas, reivindicando vantagens e benefícios junto a produtoras, gravadores, emissoras, etc., e, como se diz popularmente, "puxando o tapete" de colegas de profissão. Tim Maia foi um exemplo de um que, depois de ter sido parceiro de banda, ter convivido junto, foi ignorado e menosprezado por Roberto, assim que o Rei começou a estourar nas paradas de sucesso e tornar-se o fenômeno que veio a ser. O anglo-brasileiro Ritchie, sucesso nos anos 80, é outro que teria sofrido pelas mãos de Roberto que, segundo se sabe, e é confirmado por outros artistas, teria "mandado" a gravadora boicotar o sucesso de Ritchie, dificultando a distribuição do material do músico, sua participação em eventos e programas e negligenciando a divulgação em rádios do material do próprio contratado.
Mas não dá pra ignorar o tamanho desse cara na música brasileira, a qualidade de suas composições e a quantidade de grandes e inesquecíveis canções com que ele nos brindou. Se sua atividade no microfone, no estúdio, nos palcos é incontestável e proporcionou a todos nós momentos mágicos em músicas como "Debaixo dos Caracóis dos Seus Cabelos", "Emoções", os DETALHES das suas atuações nos bastidores, de alguma forma sempre mancharão um pouco seu nome, pois, como diz aquela canção, são coisas muito grandes pra esquecer.


Não se orgulhar mais de ter usado
camiseta do MST, tudo bem, mas Bolsonaro?
Lobão - O cara foi, simplesmente, uma espécie de símbolo da democracia da geração rock dos anos 80. Tinha a Plebe Rude que era contundente, tinha a Legião que se posicionava com ênfase e inteligência, o Capital Inicial correndo por fora mas ainda assim engajado, mas o Lobão era o cara que gritava. Ele participava de comício, ele fazia música que avacalhava o Sarney, chamava a galera pra votar consciente, tocava o hino nacional na guitarra, ao melhor estilo Hendrix, em pleno Globo de Ouro, na maior emissora de TV do país... e tudo isso pra quê? Pra acabar apoiando o Bolsonaro. Putaquiuparil
Ele alega ter se decepcionado com a esquerda, se arrependido de ter votado no PT, ter perdido a confiança em quem governou o país e acabou em tribunais respondendo por corrupção... Ok, Lobão. Mas daí a apoiar a eleição de uma criatura, visivelmente, incapaz, limitada e mal-intencionada como o atual presidente brasileiro, é muita ignorância, ingenuidade ou burrice. Um cara que tinha tudo pra dar errado, não apresentou nenhuma proposta durante a campanha se apoiando somente em um montão de bravatas e, por isso mesmo fugiu dos debates como o diabo da cruz; baseou sua campanha em notícias falsas; destilou ódio e preconceitos contra negros, indígenas, homossexuais, além de manifestar contumaz desprezo pela classe artística, da qual, exatamente o senhor João Luiz Woerdenbag, mais conhecido como Lobão, faz parte, não podia dar outra coisa senão o que deu.
Faz parte do meio artístico mas, a bem da verdade, por outro lado, também faz parte de uma classe-média alta elitista, mimada que, nos anos 80, recém saída da ditadura, via seus filhos, rebeldes sem causa, lutarem sem saber bem pelo quê, por causas como diretas, igualdade social, contra a fome, muito mais pelo embalo e pela modinha, do que por qualquer convicção. Tudo uns filhinho de papai que, na hora que perceberam que estavam perdendo privilégios, deixaram cair a máscara.
Lobão até se arrependeu - pelo menos é o que ele diz. Mas agora, depois de ajudar a eleger aquele ser ignóbil que ocupa a cadeira da presidência, aí já é tarde e já condenou o país a um retrocesso vai ser duro de reverter. Quando criaturas como Lobão, Roger, do Ultraje, Paula Toller, Rodolpho do Raimundos, mostram esse tipo de atitude, de posicionamento de caráter, eu tenho que dar razão para a aquela música que um cara muito legal do rock nacional dos anos '80 compôs: O rock errou.


O cara que bradava contra o sistema...  
John Lydon - O Rei dos Punks, o cara que gritava por anarquia, que bradava contra o poder, contra a caquética monarquia britânica, quem diria..., apoia Donald Trump. Pois é. Preferências políticas à parte, de direita, esquerda, democratas, republicanos, liberais, socialistas, já estar cansado das "bobagens intelectuais" da esquerda, como o próprio Lydon afirma, tudo bem, a gente entende, mas, agora, um cara que já simbolizou a atitude contra o poder, contra o opressor, daí a se manifestar, veementemente, a favor de uma pessoa elitista, odiosa, arrogante, egoísta, megalomaníaca, racista, xenófoba, um negacionista que, por conta de sua ignorância, falta de humanismo e empatia, ignorou a presente pandemia e, por conta de seu discurso, sua falta de ações efetivas, condenou milhares de seus compatriotas (e, por tabela, outros tantos milhões, indiretamente, pelo mundo afora) à morte, é inaceitável.
Como se não bastasse apoiar abertamente um maluco egocêntrico e considerá-lo a "última esperança e o verdadeiro representante da classe operária (???), o ex-líder dos Sex Pistols, vêm dando indesculpáveis demonstrações de intolerância e racismo. Além de "passar pano" no episódio de George Floyd, dizendo que existem policiais brancos ruins mas que aquilo teria sido apenas um episódio isolado, e ter ofendido com injúrias racistas o integrante da banda Block Party, Kele Okereke, durante um festival, diante de pessoas que confirmam o incidente, Joãozinho Podre ainda vem afirmando e reafirmando que os jovens ingleses que participam de manifestações contra o racismo são uns "mimadinhos" que, segundo ele, "têm merda na cabeça". Tá certo que a simpatia nunca foi mesmo uma marca forte na vida de John Lydon, mas agora com essas ele não se ajuda a que continuemos tendo algum respeito por ele ou pelo que já representou.
"Eu posso estar certo, eu posso estar errado", era o que ele mesmo cantava, já nos tempos de PIL, e creio que, diante das últimas atitudes não é muito difícil constatar qual das alternativas prevaleceu.


Morrissey exibindo, sem pudor,
 seu apoio à direita britânica.
Morrissey - O que mais me dói ver o lixo humano que se tornou. Morrissey era uma espécie de amigo, o cara que a gente ouvia porque parecia que sentia como a gente e exprimia suas dores, seus problemas, suas angústias, da maneira como gostaríamos de manifestar, com sinceridade, sem medo de se expôr, como um ser humano que só quer ser amado. Pois bem..., como é que essa pessoa se tornou esse ser deplorável que temos acompanhado ultimamente é algo misterioso para mim. Talvez nem tanto. Se formos prestar atenção alguns sinais já vinham sendo dados mas, nós fãs, nem levávamos em consideração, tipo, "Morrissey não é assim", ou passávamos um pano, bem bonito, justificando por alguma descontextualização ou má interpretação. Achávamos graça das declarações mal-educadas do ídolo, classificando como uma acidez típica dos gênios, quando efetivamente, deveríamos estar preocupados com o que aquilo representava.
Na verdade, aquele "England is mine...", de "Still Ill", ainda da época do The Smiths, já era um indicativo e eu é que não entendia totalmente... As coisas começaram a ficar mais claras em "National Front of Disco", canção de 1998, uma evidente alusão à Frente Nacional, partido de extrema direita inglês, contestada por alguns mas que, naquele momento, muita gente (inclusive eu) preferiu interpretar como uma "figura" compositiva dentro do contexto poético da música. Só que de uns tempos pra cá, Moz resolveu confirmar publicamente o que insistíamos em negar: tornara-se (se é que em algum momento não fora) um fascista de direita, racista, xenófobo e desprezível. Depois de usar, durante a turnê de seu álbum "Low in the High School", um broche do partido For Britain (foto), de perfil excludente e xenófobo, o cantor reafirmou em um programa de TV norte americano seu apoio às plataformas do partido e ainda, durante a entrevista, minimizou, e até ridicularizou o racismo, afirmando que, atualmente, a expressão é sem sentido e que uma pessoa será acusada de racista, nos dias de hoje, simplesmente, por discordar da opinião dos outros. No balaio de disparates, Morrissey ainda comparou a suposta perseguição que a imprensa impõe a ele, e o boicote que alega sofrer de gravadoras e da mídia ao nazismo e, a propósito de Terceiro Reich, de quebra, afirmou que Hitler seria de esquerda. 
Ah, e tem a que chineses são uma "subespécie", que fronteiras são coisas maravilhosas e foram feitas para serem respeitadas" (sobre imigrantes), que Obama, na verdade, era "branco por dentro", tem a de expulsar fãs do próprio show acusando-os de terem sido mandados pela imprensa, a de sugerir que a criança assediada por Kevin Spacey sabia o que estava fazendo ao ir para o quarto com um homem adulto... Olha..., eu não sei como eu ainda ouço as músicas dê-se cara! Pra falar a verdade, hoje, sempre que eu tenho vontade de ouvir alguma coisa dos Smiths ou de sua carreira solo, eu penso, "Eu vou ouvir esse merda?". Aí eu, a muito custo, separo o homem do artista e lembro do que ele mesmo falou em uma de suas letras: "Não se esqueça das canções que lhe fizeram chorar/ e das canções que salvaram sua vida"
Aí ele me convence e eu o ouço mais uma vez.
(Por enquanto...).


Cly Reis

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

"A Garota de Rosa-Shocking", de Howard Deutch (1986) vs. "Alguém Muito Especial", de Howard Deutch (1987)


Sabe aquela máxima do futebol que diz que "em time que está ganhando não se mexe"? Pois é,... não se aplica se John Hughes for o cartola. Depois do sucesso de "A Garota de Rosa-Shocking", o produtor e roteirista, insatisfeito com o produto final e contrariado pelo fato do desfecho original, escrito por ele, ter sido mudado para agradar o público, resolveu, um ano depois, rodar outro filme, "Alguém Muito Especial", para fazer as coisas do jeito que realmente queria. Para isso resolveu trocar toda a comissão técnica, demitindo, num primeiro momento, até o treinador mas voltando atrás logo em seguida e dando a ele, novamente, o comando do projeto. Ambos os filmes foram dirigidos por Howard Deutch, que na primeira versão fez um filmes típico de adolescentes dos anos 80, bem ao estilo de John Hughes, como em "Gatinhas e Gatões", "Mulher Nota 1000", "Curtindo a Vida Adoidado, bem descontraído, colorido, com personagens bem carismáticos, ritmo ágil e uma trilha sonora recheada de hits da década. Já na segunda versão, embora mantenha o clima juvenil, gere situações engraçadinhas, Deutch conduz um filme mais sério e com abordagens um pouco mais profundas sobre as relações humanas, dinheiro, futuro, aparências e escolhas pessoais e profissionais.
Uma diferença crucial é a mudança do gênero dos personagens principais de um filme para o outro: enquanto no primeiro a protagonista é uma garota, Andie, que é vidrada no bonitão ricaço da escola; no segundo, até para dar uma virada geral no panorama, o personagem central é um rapaz, Keith, cujo alvo é uma bela garota, Amanda Jones, que até não é tão endinheirada, mas só anda com a classe alta. No primeiro, Blane, o boa pinta, até está a fim de Andie e arrasta uma asa violenta pra ela, mas se leva muito pelas aparências e no que vão pensar os amigos e a família rica; Amanda, por sua vez, no remake, parece inalcansável num primeiro instante, com um namorado risquinho e babaca e andando com a turminha esnobe da zona nobre da cidade. No entanto, em ambos os casos, nossos heróis estão tão cegos com a beleza dos seus desejados que não percebem que o verdadeiro amor está debaixo dos seu narizes. Duckie, o engraçado e esquisitão amigo de Andie é até contundente em alguns momentos e não esconde dela sua paixão; já a alternativa baterista Watts, embora mais discreta quanto a seus sentimentos, até disfarçando, se escondendo, fazendo beicinho, também não deixa de transparecer o que tem em seu coração.
Assim, escalados, os dois times entram em campo. O time de rosa-choque sai na frente por uma jogada individual. Molly Ringwald, uma das atrizes símbolo dos anos 80 e, no caso particular, uma protagonista bem mais marcante do que é Eric Stoltz na refilmagem, assume o protagonismo do jogo e tira o primeiro zero do placar. Só que a refilmagem, com um esquema de jogo mais bem mais pensado, com um conjunto melhor, empata o jogo.

"A Garota de Rosa-Shocking"
 Duckie na loja de dicos dublando "Try a Little Tenderness"

"Alguém Muito Especial" 
Watts ensinando Keith a beijar



 Em outra jogada individual, Duckie, numa performance incrível na cena da loja de discos, em que dubla "Try a Little Tenderness", de Otis Redding, marca o segundo para o time original. Mas se o melhor amigo de lá marca um, o do remake responde também com o seu. Mary-Stuart Masterson, como Watts, está tão espetacular que chega a dar vontade de pegar no colo e consolá-la cada vez que ela chora ou se decepciona pelo amigo. Sua atuação de luxo é outro gol para a segunda versão. 2x2. Mas aí vem a trilha sonora do filme de 1986 e aí é um golaço. É New Order tabelando com Echo and The Bunnymen, tocando para Otis Redding, que passa pra The Smiths, que rola para OMD e... toca a múúsicaaaa! 3x2 para "A Garota de Rosa-Shocking". Mas se o quesito é música, a referência aos Rolling Stones nos nomes dos três personagens principais, Keith, Jones e Watts garante novo empate para "Alguém Muito Especial". 3x3.
Jogo se encaminhando para o final. A segunda versão quer ser melhor e para isso a cartolagem intervém. A ordem vem lá de cima, da sala da diretoria, e o técnico do time de 1987 obedece e queima sua ultima troca. Sobe a placa: sai o final em que um protagonista fica com um personagem dos sonhos e entra o final em que o protagonista fica com quem realmente o merece. Gol do remake! Golzinho chorado , aos 44 do segundo tempo. Que virada!
A torcida vaia o resultado, acha injusto. Mas não adianta, o time de 1986 é mais badalado mas o de 1987 é melhor.

Substituição:
Sai "final de conto de fadas" e entre "final mais justo e realista".
Vitória com o dedo do treinador (mas com a mão da diretoria).



A Garota Rosa até pode ser a queridinha da galera, mas descobriu que tem alguém que é mais especial.








por Cly Reis

quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Morrissey - Bar Opinião - Porto Alegre/RS (Março /2000)



Morrissey chicoteando o ar
com o fio de seu microfone em uma apresentação
da Oye Esteban Tour.
Ele entrou no palco fazendo pose de esnobe, empinando o nariz e, logo ele que em hipótese alguma serviria à Coroa Britânica, surgia à nossa frente, transbordando ironia, ao som de "For Her Majesty's Secret Service", dos filmes de James Bond. Um sonho começava a se realizar. Se eu não podia mais ver The Smiths, uma das minhas bandas do coração, ao menos poderia ver seu ex-vocalista, não menos idolatrado por mim. Apesar de tão marcante na minha vida, muitos detalhes e até músicas me escapam da memória mais imediata, e acho que, de certa forma esse é um charme de uma época em que não ficava-se mais preocupado em fotografar e filmar, com os celulares pra cima, do que em ver e curtir o espetáculo.
O que lembro é que Morrissey vinha com uma banda jovem de uns garotos topetudos que pareciam saídos de "Juventude Transviada" ou de algum outro filme de James Dean. Não lembro de todas as músicas, é claro, mas me marcou bastante o fato de terem executado "The teachers are afraid about the pupils", música de um disco que, embora interessante, bem pegado no rock, "Sowthpaw Grammar", de 1995, tinha uma estrutura "difícil", iniciado e finalizado com duas canções quilométricas, ambas de letras curtas e de longa duração instrumental e "The Teachers...", por sinal, era uma delas, exatamente a qua abria o disco. Uma canção bastante boa, intensa, mas cuja execução, ali, ao vivo, não ficou das melhores, com uma base pré-gravada que não funcionou bem, rodando levemente descompassada em relação à original do disco, o que compromeu um pouco não somente o trabalho dos músicos, como até mesmo a própria performance vocal do cantor. Do mesmo disco lembro também de terem tocado a vibrante "Boy Racer" e ainda guardo vivo na retina Morrissey serpenteando o fio do microfone, como um chicote, acompanhando os primeiros acordes da música. Lembro com emoção de "Alma Matters" com o público entoando seu refrão como um hino, em coro com Moz, num dos momentos grandiosos do show. Dos Smiths, Morrissey e sua banda tocaram poucas, o que já era esperado pelo que se sabia de shows anteriores daquela turnê, até porque naquele momento profissional, o artista se empenhava com mais ênfase para que fosse reconhecido mais pelas virtudes de sua carreira solo do que pela trajetória exitosa de sua antiga banda. Mas com uma discografia de qualidade bem satisfatória e uma produção bastante prolífica e interessante, o repertório smithiano, embora superior ao da carreira solo do cantor, acabou não fazendo tanta falta e o show atendeu a todas as expectativas.
Lembro também que Moz usava naquele show camisetas com estampas vintage que ficava trocando o tempo inteiro e jogando a usada para a galera que disputava o pedaço de pano suado acirradamente. Embora bem posicionado para assistir à apresentação, não estava perto o suficiente para poder concorrer ao souvenir. Mas aquilo era dispensável. Minha maior recompensa eu já havia ganhado e era extamente estar ali. E isso ninguém podia tirar de mim.
Depois disso até já vi Morrissey, aqui no Rio de Janeiro, mais uma vez e quase vi uma terceira vez quando ele teve que cancelar por problemas de saúde, mas aquele show no Bar Opinião, em Porto Alegre, guarda o encanto de ser ainda o momento mágico de ter à minha frente pela primeira vez um dos meus maiores idolos e um dos grandes nomes da história do rock. Preferia que fosse com Johnny Marr mas... já que não tinha jeito mesmo, parte do desejo estava cumprido e, diga-se de passagem, a parte mais significativa. Sim, eu tinha visto Morrissey.

Morrissey - Oye Esteban Tour 1999/2000
O vídeo, a seguir, mostra trechos da turnê Oye Esteban, em várias localidades, sendo que a partir do minuto 5, pode-se ver boa parte da apresentação de São Paulo, ocorrida poucos dias depois da de Porto Alegre e bastante parecida com a que relatei aqui.





Cly Reis

segunda-feira, 24 de junho de 2019

The Smiths - "Hatful of Hollow" (1984)



"Eu me arrependo da produção dela agora."
Morrissey,
sobre "What Difference does it Make?"
no disco de estreia.

"Decidimos incluir as faixas extra
de nossos singles de 12 polegadas
para pessoas que não tinham todos eles
e para tornar completamente acessível."
Morrissey,
quando do lançamento de "Hatful of Hollow"

""How Soon Is Now?" foi
imediatamente reconhecida
como algo diferente,
algo que ia muito além do que
os Smiths já haviam tentado ou lançado;
algo completamente original,
uma música totalmente diferente de qualquer outra,
ela os impulsionou a uma categoria
inteiramente nova."
Tony Fletcher,
autor da biografia "The Smiths: A Light That Never Goes Out"



Tinha uma música, que eu sabia que era da banda The Smiths, que eu acabara de conhecer, que eu havia ouvido algumas vezes, curtia de montão, mas não sabia o nome. O refrão, que encerrava a canção, era bem marcante e repetia algo infinitamente até o final, misturando a voz do vocalista a uma espécie de coro infantil até desaparecer de todo em fade-out.  No meu limitadíssimo inglês entendia que ele cantava algo como "The teacher", "I'm the preacher" e, às cegas, adotando como prováveis títulos aquelas possibilidades que meu entendimento da língua inglesa sugeria, persegui a tal da música tentando descobrir de que disco ela seria. Pesquisei na revista Bizz, perguntei a amigos, fiquei atento às rádios e nada... Obviamente, não batendo os nomes existentes de canções com aqueles possíveis que eu supusera, percebi que nem eles, nem algo parecido, se constituíam efetivamente no título da canção. Deveria descobri-la ouvindo nos álbuns, faixa a faixa, tentando identificar o tal refrão que me seduzira. Um amigo tinha o "Hatful of Hollow" e consegui que ele me emprestasse. Não encontrei a que procurava mas fui surpreendido ao reconhecer outras que também já ouvira de passagem, mas não sabia que era da banda. "Please, please, please let me get what I want", por exemplo, eu conhecia de algum filme adolescente dos anos 80, que depois vim a lembrar que era do "Curtindo a vida adoidado". Outra delas era "Girl Afraid", uma impagável surpresa, uma vez que eu costumava escutá-la na abertura de um programa local sobre surf lá em Porto Alegre, o Realce, e sempre achava o máximo aquela guitarra e ficava me perguntando de quem seria uma coisa maravilhosa como aquela.
Mas havia outras maravilhas ali e naquele disco eu conheci a beleza encantadora de "William, it was realy nothing", a doçura charmosa de "This charming man", a intensidade sonora da sensual "Handsome Devil", a elegância da pessimista "Heaven knows I'm miserable now", e possivelmente, a melhor música dos Smiths, que me impressionou desde o primeiro instante, "How soon is now?", uma peça musical de feitura complexa que combinava camadas de guitarra sobrepostas, criando uma atmosfera tensa e quase sombria, com uma letra da mais exposta vulnerabilidade, interpretada de forma tão envolvente e dramática que era impossível que o ouvinte ficasse indiferente a seu comovente apelo por amor e atenção.
Enfim, o "Hatful of Hollow" me deu muito mais do que a, até então, misteriosa música que eu procurava. Com aquele disco eu passei definitivamente a apreciar e conhecer The Smiths.  As interpretações intensas daquele vocalista, a versatilidade, a inventividade e a técnica daquele guitarrista de poucas distorções e quase nenhum solo, aquele time azeitado com "coadjuvantes" que brilhavam nos momentos certos e aquelas letras que eu, em contato com o encarte pela primeira vez, começava a descobrir e me identificar faziam com que aquela minha estada com o álbum fosse algo especial e criasse uma relação de carinho com ele a partir de então. 
Na época achava que "Hatful of Hollow" fosse um álbum. Um álbum de carreira. Tempos depois foi que com a saber que se tratava de mais uma das tantas coletâneas, compilações, compensações, correções, contrapartidas que os Smiths costumavam fazer. No caso foi uma combinação da vontade de fazer justiça a alguns singles que não haviam recebido a devida importância quando do lançamento como "William, is was really nothing"; de exibir com a devida grandiosidade sua nova pérola, que a banda sabia ser um material diferenciado, "How soon is now?"; e de redimir uma certa insatisfação com a produção e mixagem do primeiro álbum e o resultado final de algumas músicas como "What difference does it make?", por exemplo, que Morrissey considerava que havia ficara melhor nas seções da BBC e que foi incluída em "Hatful of Hollow", do que na que entrara no disco de estreia da banda. Mesmo com essa estrutura de Frankenstein, um single aqui, uma demo ali, uma inédita acolá, "Hatful of Hollow", era tão bem montado e coeso que soava como um álbum e, mesmo com o conhecimento de sua natureza seletiva, permaneceria com um pouco desta aura de álbum concebido e, para nós fãs, com a reverência que este status costuma merecer.
E a música que eu procurava?
A tal da canção era "Panic" e o tal do verso que eu não identificava, ordenava, com o sarcasmo ácido e sádico de Morrissey, enforcar um DJ que tocava constantemente músicas que não diziam nada sobre a sua vida. "Hang the DJ, hang the DJ...", entoavam insistentemente o vocalista e o coro até o final da faixa. Fui encontrá-la mais tarde, no "The World Won't Listen", outra dessas coletâneas de motivações peculiares que os Smiths costumavam organizar. Mas aí, quando encontrei "Panic" ela já não era mais a única que me interessava. Eu havia tido contato com canções que falavam a mim muito sobre minha vida. A minha busca já havia chegado ao fim.
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FAIXAS:
  1. "William, It Was Really Nothing" - versão original do single (2:09) 
  2. "What Difference Does It Make?" - versão do programa de John Peel na Radio 1 da BBC, diferente da lançada no álbum "The Smiths" (3:11)
  3. "These Things Take Time" - versão do programa de David Jensen na Radio 1 da BBC (2:32)
  4. "This Charming Man" - versão do programa de John Peel na Radio 1 da BBC, diferente da versão do single e do álbum "The Smiths" (2:42)
  5. "How Soon Is Now?" - versão original do single posteriormente incluída na versão CD do álbum "Meat Is Murder" (6:44) 
  6. "Handsome Devil" - versão do programa de John Peel na Radio 1 da BBC, não tendo sido lançada nenhuma versão oficial de estúdio além desta (2:47)
  7. "Hand in Glove"  - versão original do single, diferente da lançada no primeiro álbum "The Smiths" (3:13)
  8. "Still Ill" - versão do programa de John Peel na Radio 1 da BBC, diferente da versão do álbum "The Smiths" (3:32)
  9. "Heaven Knows I'm Miserable Now"  versão original do single (3:33)
  10. "This Night Has Opened My Eyes" - versão do programa de John Peel na Radio 1 da BBC, não tendo sido lançada nenhuma versão oficial de estúdio além desta (3:39) 
  11. "You've Got Everything Now" - versão do programa de David Jensen na Radio 1 da BBC, diferente da versão do single e do álbum "The Smiths" (4:18)
  12. "Accept Yourself" - versão do programa de David Jensen na Radio 1 da BBC, diferente da versão do lado B do single "This Charming Man" (4:01)
  13. "Girl Afraid" - versão original, lado B do single "Heaven Knows I'm Miserable Now" (2:48)
  14. "Back to the Old House" - versão do programa de John Peel na Radio 1 da BBC (3:02)
  15. "Reel Around the Fountain" - versão do programa de John Peel na Radio 1 da BBC, diferente da lançada no álbum "The Smiths"  (5:51)
  16. "Please, Please, Please, Let Me Get What I Want" - versão original, lado B do single "William, It Was Really Nothing" (1:50)

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Ouça:



Cly Reis

sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

The Smiths Cover Brasil - Food Park Carioca - Rio de Janeiro/RJ (02/12/2018)



Aproveitando que era pertinho de casa, numa estrutura gastronômico-musical no estacionamento de um supermercado na Tijuca, o Food Park Carioca, e num horário bastante favorável, fui, no último domingo, ver novamente, depois de um bom tempo, a The Smiths Cover Brasil, sem dúvida a melhor banda cover do cultuado quarteto de Manchester que foi um dos grandes nomes dos anos 80 e que ainda carrega uma legião de fãs até hoje mesmo tanto tempo depois de sua extinção. Admirador que sou do trabalho do grupo há bastante tempo, especialmente de seu vocalista, meu amigo Roberto Freitas, fui conferir sua apresentação sem qualquer dúvida de que presenciaria, mais uma vez, uma performance competente e empolgante. E não teve erro! Uma banda encaixada, azeitada, dominadora do repertório e de suas particularidades arrebatou o público do Food Park, diversificado mas, de um modo geral, conhecedor do que ouvia, com algumas das melhores canções que os Smiths já produziram, muitas delas sucessos dos anos 80.
Roberto, o Morrissey da The Smiths Cover Brasil,
à frente de seu bom time.
Roberto Freitas, que, muito convenientemente, guarda uma certa semelhança física com Morrissey, está ainda melhor do que das vezes anteriores em que o vi interpretar o cantor. Seguro e solto nos vocais e completamente à vontade, mas sem exageros, na caracterização e nos trejeitos. A banda, devo admitir que não é a mesma que vi das vezes anteriores, mas pelo que se viu é de excelentes músicos e está muito bem ensaiada garantindo, independente da escalação, a qualidade já renomada da Smiths Cover Brasil que, só para confirmar isso, percorre o Brasil inteiro com shows desfilando o repertório da banda de Manchester.
"What Difference Does It Make?" intensa, "Girl Afraid" competentíssima, "Barbarism Begins At Home" barbarizando, uma "This Charming Man" de arrepiar, "Some Girls Are Bigger Than Others " dedicado às mulheres, "The Boy With The Thorn In His Side" dedicada a mim, "Suedehead" com o seu já habitual refrão entoado em uníssono exclusivamente pelo público, uma emocionante "Please, Please, Please Let Me Get What I Want", e um "There's A Light That Never Goes Out" no meio da galera são apenas alguns dos grandes momentos que destaco do show da The Smiths Cover Brasil que, para nossa felicidade continua, com sua homenagem a esta que foi uma das maiores bandas de todos os tempos, nos brindando com a possibilidade de ter um pouco daqueles nossos ídolos pertinho da gente. Como eu disse para o próprio Roberto ao final da apresentação, "Não é o The Smiths, é claro. Mas às vezes emociona como se fosse". 

The Smiths Cover Brasil - trecho de "There's A Light That Never Goes Out"



Cly Reis

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

T-Rex - "The Slider" (1972)




A capa e seu verso,
concebidas por Ringo Starr
"Aí veio “The Slider”
e nele tinha "Metal Guru".
Foi uma música
que mudou a minha vida.
Eu nunca tinha ouvido
nada tão bonito e tão estranho,
e ainda assim tão cativante.“
Johnny Marr,
Ex-guitarrista do The Smiths




Marco do glam-rock, “The Slider”, álbum da banda britânica T-Rex confirmava uma recente idolatria em torno de seu líder, o carismático e sagaz Marc Bolan. O Tyrannossaur Rex,  nome original da banda que ficou mesmo conhecida por sua simplificação abreviada, contava, entre tantos fãs com a admiração de ninguém menos que David Bowie, fã declarado, que, de certa forma, se inspiraria em toda a proposta estético-sonora de Bolan e sua turma para construir seu ícone Ziggy Stardust.  Enquanto a produção ficava a cargo de Tony Visconti, parceiro de Bowie no álbum "Space Oddity", a arte do álbum, marcante, com Bolan usando uma cartola, foi concebida por ninguém menos que o Beatle Ringo Starr, também admirador confesso do trabalho do T-Rex. Estava mal de fãs o T-Rex? Bowie e Ringo?
A gostosa “Metal Guru” e a envolvente “Telegram Sam”, que posteriormente viria a ganhar uma versão bem interessante pela banda Bauhaus, foram os grandes sucessos do disco mas o ótimo “The Slider” não se limitava a estas duas. A faixa título é contidamente pesada, “Rock On” e “ Buick Mackane” são rocks venenosos e contagiantes, enquanto a adorável “Mystic Lady” e a balada acústica “Ballroom of Mars” são momentos mais suaves nos quais Bolan desfilava todo o potencial de seu vocal ácido e elegante.
“The Slider” é um dos discos mais importantes e um dos mais influentes da história do rock, tendo inspirado um grande número de artistas a partir de seu lançamento, tanto estética quanto musicalmente.  Que o digam Morrissey, Green Day, Bauhaus, Siouxsie, My Chemical Romance, R.E.M., só para ficar em alguns.
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FAIXAS:
1. "Metal Guru" (2:25)
2. "Mystic Lady" (3:09)
3. "Rock On" (3:26)
4. "The Slider" (3:22)
5. "Baby Boomerang" (2:17)
6. "Spaceball Ricochet" (3:37)
7. "Buick Mackane" (3:31)
8. "Telegram Sam" (3:42)
9. "Rabbit Fighter" (3:55)
10. "Baby Strange" (3:03)
11. "Ballrooms of Mars" (4:09)
12. "Chariot Choogle" (2:45)
13. "Main Man" (4:14)

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Ouça:



por Cly Reis

segunda-feira, 30 de abril de 2018

Copa do Mundo The Smiths - Final


Chegou o grande momento!
Chegou a hora da tão  esperada final.
"Girl Afraid", canção  que oficialmente  não  saiu em álbum, mas aparece na compilação Hatful of  Hollow mas que aparece em outras coletâneas da banda de Manchester, com bravura, derrubando adversários difíceis, chega à final para encarar "There's A Light That Never GosOut", canção do clássico disco "The Queen Is Dead", considerado por muitos o melhor do grupo, e por outros tantos até mesmo, o melhor álbum de rock de todos os tempos. Será?
Mas aqui não importa fama, cartaz, favoritismo. Tudo se decide dento de campo e, como diria aquele antigo narrador, "Você quer bola rolando? Ta aí o que você queria!". 

***

GIRL AFRAID
x
THERE'S A LIGHT THAT NEVER GOES OUT


Fernanda Calegaro: No início, pensei que a competição acabaria em uma final sarcástica entre Heaven Knows I’m Miserable Now e This Charming Man, por exemplo. Mas nossa final transporta ao parque de diversões, sendo assim, There’s a Light That Never Goes Out desempata no início do segundo tempo e avança com dois golaços pra montanha-russa alguma ficar entediante. 5X3.
THERE'S A LIGHT THAT NEVER GOES OUT vence!

Eduardo Almeida: E chegamos a final. Grandes equipes ficaram pelo caminho. Confesso ter ficado surpreso com essa final. Mas como já diziam: futebol é uma caixinha de surpresas. Duas equipes fortes com táticas distintas. Ritmos de jogo diferentes. E com calma, There's a Light marca seu gol e termina o primeiro tempo na frente. Pra quem achava que com seu ritmo mais acelerado, Girl Afraid não iria manter a velocidade do seu jogo, se enganou. Voltou pro segundo tempo com um ritmo mais cadenciado, e empata o jogo logo no início. Ambas as equipes tem boas oportunidades de marcar, mas suas defesas estão atentas. Até que dá um apagão na defesa de There's A Light, e Girl aproveita e vira o jogo. TIALTNGO parte pra cima, aperta GIRL, coloca duas bolas na trave, mas não tem sorte. O goleiro chega ir para a área adversária para tentar um gol que levaria a um empate e a decisão por penaltis. Mas não conseguem..... Final: Girl Afraid 2 X 1 There's A Light That Never Goes Out.
GIRL AFRAID vence!

José Júnior: Estádio lotado, garotas e garotos medrosos... chegou a grande final. Girl Afraid começa o jogo com um ataque melódico. There's A Light That Never Goes Out toma a posse da bola e começa o jogo marcando um gol de letra. GA reage empatando o placar. Dois timaços, duas músicas emblemáticas dividem a atenção da platéia, onde não há vaia, somente gritos de torcidas unidas. E a bola corre como se um caminhão de dez toneladas a mantivesse no chão. There's A Light dribla, num estilo Garrincha, e manda o gol da vitória!
THERE'S A LIGHT THAT NEVER GOES OUT vence!

Patrícia Ferreira: O jogo que tem There Is A Light That Never Goes Out com a força da torcida. Encara Girl Afraid que vai pra cima atacando com veemência. Quase há um empate ... Ops!!! Mas o tira-teima mostrou a real vencedora: There is light 😍
THERE'S A LIGHT THAT NEVER GOES OUT vence!

Daniel Rodrigues: O placar pode até dar a entender que foi um jogo de igual pra igual. De dois adversários de qualidade, foi com certeza. “Girl”, mais que o azarão que chegou até a final depois de passar por clássicos como “The Queen is Dead” e “The Boy With The Thorn In His Side”, é, sem dúvida nenhuma, uma grande música dos Smiths. Guarda vários dos elementos essenciais da banda: guitarra original de Marr, bateria possante de Joyce, baixo surf music de Rourke e, claro, a performance e letra irrepreensíveis de Morrissey. No outro lado do campo, no entanto, tem “There’s”, das mais célebres canções da banda, um de seus hinos. Balada sensível daquelas que tocam sempre que se escuta. Como disse no início, parecia um jogo equilibrado. Foi assim que o primeiro tempo transcorreu: “There’s” larga na frente ali pelos 25 min e 10 min depois “Girl” empata. Tudo igual. Só que no segundo tempo, pesou a camiseta. Para bem e para mal. “Girl”, atrevida e de jogo contagiante, mostrou que tinha dado tudo que podia na Copa, e não conseguiu resistir ao volume de jogo coeso e bem estruturado de There’s”. O hit de “The Queen is Dead” impôs seu estilo cadenciado e marcante e guardou, aos 32 min, o gol da vitória. O gol do título. 2 x 1 para “There’s”, que se consagra a campeã da Copa Smiths!
THERE'S A LIGHT THAT NEVER GOES OUT vence!

Cly Reis: Duas grandes equipes chegam à final. Girl Afraid menos badalada quando se fala em paradas de sucesso ou predileção dos fãs, e There's A Light That Never Goes Out gozando do status de megahit e semi-hino smithiano. Nessa avaliação, vemos TIALTNGO com um leve favoritismo, mas o rock'n roll é uma caixinha de surpresas e, como já diria aquele folclórico cartola, o jogo só acaba quando termina. 
Pois bem, e não é que Girl Afraid já sai surpreendendo com um gol na primeira jogada? Aquele riffzinho inicial de Johnny Marr garante 1x0 no placar antes do primeiro minuto de jogo. Mas There's A Light não deixa por menos e também em sua primeira incursão ao ataque, aquela introdução que precede o primeiro verso de Morrissey, e que sempre me faz amolecer as pernas, garante o empate. 1x1 em menos de três minutos. Que jogo, senhoras e senhores!!!
O jogo continua com as equipes trocando ataques nas suas caraterísticas, Girl Afraid um pouco mais impetuosa, TIALTNGO mais cadenciada, mas ambas levando perigo ao gol adversário. Até que o refrão de There's A Light That Never Goes Out desequilibra: "And if a double-decker bus/ Crashes into us/ To die by your side/ Is such a heavenly way to die". Aquele desprendimento da vida em noe de ficar ao lado da pessoa amada é um golaço indefensável. Girl Afraid sente o gol, fica meio perdida em campo e na seuqência, na segunda parte do refrão, "And if a ten-ton truck/ Kills the both of us/ To die by your side/ Well, the pleasure - the privilege is mine", leva outro. É a pá de cal. There's A Light dá números finais ao jogo. 3x1. Soa o apito final e THERE'S A LIGHT THAT NEVER GOES OUT vence!



THERE'S A LIGHT THAT NEVER GOES OUT
CAMPEÃ DA 
COPA DO MUNDO 
THE SMITHS



Obrigado aos convidados Patrícia Ferreira, Fernanda Calegaro, Eduardo Almeida, José Júnior, Cláudia B. Melo e João Carneiro que participaram dessa nossa brincadeira. Vocês foram demais!