"O Bezerra é o cara mais rock'n roll que eu conheço."
Paulo Ricardo, RPM
“Mas Bezerra da Silva é pagode!”, precipitar-se-ia algum eventual enfezado leitor ao ver “Alô Malandragem, Maloca o Flagrante” nos ÁLBUNS FUNDAMENTAIS. Ora, amigos, em primeiro lugar, eu não diria que Bezerra da Silva venha a tratar-se extamente de pagode, seria mais apropriado provavelmente dizer samba, samba de raiz ou partido-alto talvez, mas de qualquer modo, ainda que admitindo-se a precisão do seu termo, em momento algum eu afirmei que a seção deveria dedicar-se exclusivamente ao rock e seus assemelhados, a ver-se que por aqui já passaram Miles Davis, Tom Zé, Chico Buarque e outros. Mas mesmo que fosse com este fim, não haveria artista popular mais apropriado que Bezerra da Silva para representar essa relação do pagode (que seja), do samba do morro, do partido-alto com o rock. A crítica social, a digressão, a amoralidade, a rebeldia, a negação, a contravenção, são todos elementos comuns à música de Bezerra com o rock’n roll.
Entre malandros, dedos-duro, cornos, piranhas, bêbados, traficantes e policiais, Bezerra com sua interpretação escrachada confere à música um valor, até antropológico, por assim dizer, com a realidade do morro, da vida nas favelas, o modo característico de falar, as gírias e expressões, os costumes, os procedimentos, as descrições físicas e humanas, tratando tudo com o bom humor e a capacidade intrínseca do brasileiro de rir da própria desgraça.
Tem a denúncia social de "A Rasteira do Presidente"; tem um enterro interrompido pela polícia porque o caixão estaria cheio de muamba na hilária “Defunto Grampeado”; tem uma breve descrição de um espancamento a uma mulher que fora apanhada no flagra ‘enfeitando’ a cabeça do marido (“Quem Usa Antena é Televisão”); tem outra zoação com 'chifrudos' na engraçadísima "Sua Cabeça Não Passa na Porta"; tem a demonstração de desprezo e com os ‘caguetes’ evidenciadas em "Maloca o Flagrante" e "Língua de Tamanduá", e que aparece também em “Malandragem Dá um Tempo”, sendo esta última com o acréscimo da naturalidade ao tratar do uso de drogas; e ainda a relação malandro-mané em “Direitos do Otário”.
É interessante destacar, e muita gente não sabe, que Bezerra não escrevia as músicas, apenas as interpretava com aquele sua maneira toda particular de cantar. As letras incrivelmente bem-humoradas e certeiras eram compostas por ilustres desconhecidos do morro com os mais curiosos nomes como Pedro Butina, Cláudio Inspiração, Beto Sem-Braço e 1000tinho.
Disco muito legal e extremamente divertido. Sexo, drogas, violência, marginalidade... Quer mais rock’n roll que isso?
*****************************
FAIXAS:
• 1. Malandragem Dá Um Tempo
• 2. Defunto Grampeado
• 3. Quem Usa Antena É Televisão
• 4. Maloca O Flagrante
• 5. Vovô Cantou Pra Subir
• 6. A Rasteira do Presidente
• 7. Meu Bom Juiz
• 8. Língua de tamanduá
• 9. Na Boca do Mato
• 10. Sua Cabeça Não Passa na Porta
• 11. Os Direitos dos Otários
• 12. Compositores de Verdade
***************************
Ouça:
Que baita resenha. Como passaste bem a ideia divertida e inteligente do disco! Esse disco me faz lembrar dos almoços na casa da vó Isaura ao som desse Bezerra e tantos outros 'pagodes' bons: "Caxambu" do Almir Guineto; o primeiro do Zeca, um discaço; coisas boas da Alcione; o samba-rock do Bebeto. Bons tempos também da extinta (e marginalizada) rádio Princesa.
ResponderExcluirParabéns. A resenha me fez lembrar de tudo isso, de todo aquele clima de família e, por que não, de descobertas de coisas que até hoje gosto, como este do Bezerra (que eu herdei o LP do pai).
Dã.
Um dos meus discos preferidos do Bezerra, diretamente da Gravadora Cometa, a gravadora onde trabalham os melhores artistas do planeta!
ResponderExcluirSílvio Santos rules!