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segunda-feira, 31 de julho de 2017

"Boa Noite, Mamãe", de Severin Fiala e Veronika Franz (2016)



Tenso...
Tenso do início ao fim.
"Boa Noite, Mamãe", prende  a tenção do espectador desde as primeiras passagens em que os irmãos gêmeos Elias e Lukas, no milharal, no túnel, no lago. se confundem e se misturam instigando as primeiras de muitas dúvidas que o filme propõe.
A mais importante destas questões, a central pelo menos, é a que envolve a mãe das crianças, que em seu retorno para casa, depois de uma cirurgia plástica, ainda com ataduras no rosto, parece revelar um comportamento diferente do seu habitual despertando nos meninos a dúvida  de se aquela seria verdadeiramente a pessoa que diz ser, ou seja, sua mãe. Ela, ríspida, rigorosa, impaciente, egoísta, chega mesmo a ignorar um dos gêmeos fazendo com que ambos, revoltados e desconfiados, unam-se mais do que nunca e comecem a conspirar cometendo primeiramente desaforos infantis mas logo passando a pequenas vinganças à mulher que não reconhecem como mãe. Só que à medida que a desconfiança cresce por uma série de pequenos detalhes como a foto escondida da mãe com uma mulher muito parecida com ela, ou a diferença da cor dos olhos da mãe para a "pessoa" que encontra-se na casa, aumenta também a intensidade dos atos de rebeldia dos garotos e de sua investigação em busca da verdade que procuram, culminando na captura, cativeiro e torturas psicológica e física daquela mulher a fim de que confesse não ser quem diz e que revele o paradeiro daquela a quem substitui.
Mas se não é a mãe, quem seria
a mulher por trás daquelas ataduras?
Classificar "Boa Noite, Mamãe" como um filme de terror em função de suas cenas visualmente chocantes, pelo sinistro visual mumiático da mãe ou por uma suposta sobrenaturalidade, seria uma simplificação quase ofensiva para um filme com tamanha qualidade e méritos cinematográficos diversos. As cenas são minuciosamente pensadas, os diálogos econômicos são precisos, a fotografia neutra é irreparável e o roteiro é extremamente bem desenvolvido deixando, propositalmente, uma série de pontas soltas de modo a provocar dúvidas no espectador e deixá-las vivas até o final.
As fotos borradas, o silêncio, o vazio da casa, o isqueiro, à ida á floresta... Por quê a casa esta à venda? Qual a causa da cirurgia plástica? Houve um acidente? Que tipo de acidente? Foi incêndio? Se houve, os meninos têm algo a ver com a causa? Por que então a bronca pelo isqueiro? Sabemos que houve um divórcio, mas por que? Por que, como ela afirma, "as coisas ficaram mais difíceis depois do divorcio"? O que ficou mais "difícil"? O temperamento dos meninos?
Os diretores austríacos Severin Fiala e Veronika Franz até vão nos dando algumas respostas aos poucos, vão nos alimentando com algumas migalhas, é verdade, mas fazem questão de não nos matar a fome. Questões continuam inteligentemente em aberto mantendo nossa tensão e expectativa no nível máximo o tempo todo.
Vi várias manifestações sobre o filme e estas lacunas acabam deixando margem a diversas interpretações e versões não somente sobre o final como mesmo sobre o desenrolar, o desenvolvimento da trama, o que vejo como extremamente positivo ainda que muitas dessas manifestações também tenham sido depreciativas entendendo que o filme teria sido mal feito, mal conduzido ou mal acabado, o que pode-se entender pela acomodação que o cinema norte-americano, que dá tudo mastigadinho, já conseguiu incutir em grande parte do público. "Boa Noite, Mamãe" não dá sustos nem tem reviravoltas mirabolantes, seu pavor vem exatamente de nossa impotência total diante do que está adiante de nós. Perturbador e inquietante, o longa é construído, montado, arquitetado de tal maneira que consegue deixar o espectador desconfortável do início ao fim. Durante pouco mais de uma hora e meia somos tão reféns das crianças quanto aquela mulher que se diz ser sua mãe. E que talvez seja...
A assustadora cumplicidade dos gêmeos e seus misteriosos cochichos.



Cly Reis

sábado, 29 de julho de 2017

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Drops: exposição "Neon", de Gelson Radaelli - Margs - Porto Alegre/RS


Porto Alegre se torna a cada dia uma cidade mais e mais “bunda mole”. Poucas coisas das que nos identificam enquanto nativos da capital gaúcha escaparam da deterioração física e/ou imaterial. Gelson Radaelli e sua obra são das coisas que prevalecem. Dono de uma arte abstrata muito pessoal, tanto quanto forte e inquietante, Radaelli acaba de inaugurar uma exposição alusiva aos 30 anos de intensa produção artística no Margs - Museu de Arte do RS, intitulada “Neon”. Pelo pouco que vi, interessei-me muito. São pinturas a óleo com as características pinceladas largas do artista em preto, branco e cinza sobre um fundo rosa. Ainda não fui, mas é certo que passarei lá para conferir a novas telas de Radaelli e, se possível cumprimentá-lo, pessoa simpática que ele é. Posteriormente, volto aqui ao blog para contar o que vi.

Uma das obras novas de Radaelli em exposição no Margs

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Exposição “Neon”
obras recentes de Gelson Radaelli
local: Margs - Museu de Arte do RS
endereço: Praça da Alfândega, s./n., no centro de Porto Alegre
período: de 26 de julho até 10 de setembro, de terças a domingos, das 10h às 19h.
Entrada franca.

por Daniel Rodrigues

"Led Zeppelin IV: Led Zeppelin", de Erik Davis, coleção O Livro do Disco - ed. Cobogó (2014)



A coleção “O Livro do Disco” sempre acaba nos reservando uma certa surpresa a cada exemplar. Depois da análise pormenorizada com detalhes técnicos do "Unknown Pleasures" do Joy Division; da avaliação também faixa a faixa, mas muito mais emocional de "Daydream Nation" do Sonic Youth; e de uma abordagem mais ampla e temática da obra "A Tábua de Emeralda" de Jorge Ben; agora este “Led Zeppelin IV” traz outro tipo de apreciação.  O trabalho examina o disco clássico do Led Zeppelin predominantemente sob o prisma do misticismo que envolve não somente a obra mas também, é claro, por origem, a banda. O jornalista Erik Davis debruça-se com afinco e seriedade sobre todos os aspectos que compõe a mística em torno das lendas que envolvem a banda e seus integrantes e amplia esta investigação para a obra por eles produzida procurando, sem muita dificuldade dada toda o material que a banda proporciona, mistérios e significados contidos nela. No que diz respeito especificamente ao quarto disco do Led Zeppelin, o autor entende que o próprio conjunto de símbolos que sugere um nome intraduzível para a obra por si só já determina que ele contenha elementos místicos e informações ocultas, o que já o torna digno de uma análise aprofundada. Assim, o livro vai desde os quatro ícones gráficos; passa pela capa com seu velhote misterioso; pelo monge com o candeeiro no encarte; pelas referências literárias; pelas supostas relações demoníacas do guitarrista Jimmy Page; pela ordem das faixas e por possíveis significados ocultos em seus títulos; pela lenda da satânica rotação ao contrário de “Stairway to Heaven”; e, inevitavelmente, dentro de tudo isso, uma análise musical faixa a faixa, não sem deixar de considerar também os aspectos místicos que possam ter influenciado em suas letras ou composições.
De modo a manter coerente uma linha de pensamento, estabelecendo uma ligação de uma canção com a seguinte, atravessando o disco da primeira à última faixa, o autor cria uma espécie de trajetória hipotética de um personagem ficcional, Percy, que enquanto imagem, devo dizer que não me agradou muito e em alguns momentos pareceu-me forçado e em outros uma liberdade autoral pretensiosa. Mas de um modo geral o produto final vale e é muito rico e instrutivo trazendo diversas informações e curiosidades para fãs e aficionados por música e pelo lado obscuro dos artistas, especialmente uma banda tão envolta em lendas como é o caso do Led Zeppelin.




Cly Reis