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sábado, 11 de fevereiro de 2017

"Vontade de Mundo" – Exposição coletiva – Coleção João Sattamini - Museu de Arte Contemporânea (MAC) – Niterói/RJ




Como já falei aqui no blog – e acho que sempre vou falar quando lá estiver –, ir ao Museu de Arte Contemporânea de Niterói, o MAC, é por si um passeio e um exercício artístico, independentemente do que estiver em exposição. Aquele desenho de Oscar Niemeyer, que respeita e se integra com o redor, com a natureza exuberante do Mirante da Boa Viagem com mar, morros, verde, declives e aclives, faz com que o visitante também se integre àquela arquitetura. Niemeyer, através da beleza reveladora de sua arte, faz-nos revelar tal integralidade enquanto seres pertencentes a esta natureza. 
Impressionante pela técnica e efeito a obra de Del Santo

Dito isso, volto as atenções à exposição em destaque, que está no local até 2 de abril: "Vontade de Mundo". A mostra algumas guarda parecenças com outra que vimos em nossa estada no Rio de Janeiro em dezembro, “A Cor do Brasil”, no Museu de Arte do Rio de Janeiro (MAR), pois ambas têm como base o acervo do colecionador João Sattamini. Isso faz com que alguns artistas, como Mira Schendel, Iberê Camargo e Aluísio Carvão, por exemplo, apareçam nas duas. Porém, o conceito, este sim, é totalmente próprio em cada uma delas. Nesta do MAC, consideravelmente menor que a outra, mesmo que exposta no salão principal, são 30 obras selecionadas, cerca de 90% menos do que a do MAR, que traz mais de 300! 

Afora o fator quantidade, "Vontade...” traz como tema não a cor como mote, mas um (questionável) sentido de unidade por meio de incontáveis mundos possíveis em cada obra de arte. O objetivo deste recorte é provocar cada visitante a tecer relações entre as obras entendidas como um mundo em si aberto ao tempo. Essa leitura é de certa forma facilitada na segmentação dada: Mundos sem Nome, Invisível, Casa, Amor e Comunidade. Segmentação esta, todavia, um tanto resvalante.
O sempre minimalista e surpreendente Antonio Dias

Mira, a quem já me referi, como sempre impressiona com sua acrílica sobre tela de 1985, assim como um dos meus queridos da arte moderna brasileira, Antonio Dias com o invariavelmente interessante “Projeto para One & Three”, de 1974, uma acrílica e fita crepe sobre papel sobre madeira. “Linear cubo”, de Dionísio Del Santo, de 1976, também impressiona tanto pela técnica (óleo e fios de algodão sobre tela colada em aglomerado) quanto pelo efeito estético e de tridimensionalidade obtido. Ainda, merece destaque a escultura em bambu pintado a óleo de Ione Saldanha – cujas peças da mesma série se encontram na exposição do MAR, Quem também está no MAR e no MAC é o gaúcho Iberê Camargo com seu não-figurativo carregado. Nesta, não poderia ter caído em outra classificação que não a de Mundos sem Nome.


Quadro de Hermelindo Fiaminghi na série Mundos sem Nome


Se o conceito de “Vontade...” é um tanto aberto, numa forma quase preguiçosa de aproveitar esse o acervo de Sattamini, as obras que a compõem são de inegável qualidade. Se me perguntarem se vale a pena ir ao MAC para conferir a exposição, diria de pronto que “sim”. Afinal, mesmo que não se goste, tem o próprio MAC para se apreciar.
Enlameada, obra de Iberê, sempre expressivo


Mais uma vez, o mínimo dizendo muito


Arte indígeno-moderna de Ione Saldanha no bambu pintado a óleo
Simples e brilhante quadro a esmalte de Ione Saldanha

Instalação de Jorge Duarte toda em metal


Um dos quadros da série que tematiza o Amor

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“Vontade de Mundo” da Coleção MAC Niterói – João Sattamini 
local: Museu de Arte Contemporânea de Niterói - MAC
período: até 2 de abril 
de terça a domingo, das 10h às 19h 
Ingresso: R$ 10 
Entrada gratuita às quartas-feiras 

Curadoria: Luiz Guilherme Vergara


Por Daniel Rodrigues

sexta-feira, 11 de abril de 2014

“Antonio Dias – Potência da Pintura” – Fundação Iberê Camargo – Porto Alegre/RS







"Estudos pictóricos de antônio Dias"
Estivemos Leocádia Costa e eu numa das exposições daquelas que nos dissemos: “não podemos deixar de ir”. Pois a referida mostra é “Potência da Pintura”, do artista plástico paraibano Antonio Dias, que está na Fundação Iberê Camargo até 18 de maio. Vimos obras deste craque da arte contemporânea em dois momentos quando estivemos no Rio de Janeiro em 2013: na grande (e até dispersiva) mostra coletiva “O Colecionador”, no MAR (Museu de Artes do Rio de Janeiro), no Rio, e na sucinta (mas bela) exposição "Biografia Incompleta", no MAC (Museu de Arte Contemporânea), em Niterói, a qual me motivou a escrever sobre à época. Portanto, a oportunidade de rever Antonio Dias e numa individual na nossa cidade é um programa dos que consideramos imperdíveis. 
De fato, valeu a pena a visita. Com curadoria do crítico e historiador Paulo Sergio Duarte, apresenta um recorte da produção mais recente de Dias. São pinturas e esculturas produzidas entre 1999 e 2011 que revelam os questionamentos atuais do artista, que se volta com força para as questões pictóricas do pigmento, do plano e da composição. Porém, não deixando de lado a ideia de tridimensionalidade (característicos de sua produção dos anos 60 e 70, mais conhecida pelo público), uma vez que usa elementos da estrutura de objetos bidimensionais de forma sutil em quadros e esculturas que se descolam do tempo, do simples “aqui e agora”, reelaborando outra (e talvez improvável) dimensão temporal. As linhas dos quadros, impositivamente retas, se conjugam entre si ora para trás, ora para frente, criando duas ou até três “camadas” de tempo, encaixando-se, sobrepondo-se, desafiando-se umas às outras.
"Gigante dormindo e cachorro latindo"
No texto do curador, este questiona com perspicácia o “valor” cronológico da recentidade das obras de Dias, subjetivando tal aspecto: “O que temos diante de nossos olhos não é uma acumulação de trabalho, nem a acumulação de um patrimônio tal como o capital de um portfólio de aplicações nas bolsas de valores; o que temos é o resultado mais recente de uma luta simbólica entre a matéria e o pensamento que atravessou muitas brigas até chegar a esse ponto; esse é o trabalho do artista”.
Criada na geração de artistas dos anos 50/60 que reelaboraram a maneira de ver a modernidade e seus ícones: sexo, violência, capitalismo, tecnologia, segregação político-social, indústria cultural e outros (antevendo, aliás, com olhar bastante mordaz a pós-modernidade), Antonio Dias segue com seu olhar perspicaz sobre o funcionamento desequilibrado da sociedade atual – basta verificar o precário equilíbrio das latas na obra “Duas Torres” (2002), que, embora não seja brilhante em termos de execução, remete claramente à fácil sujeição dos seres humanos ao perigo vista nos ataques terroristas do 11 de Setembro.
Em termos de técnica, são interessantíssimas as texturas e sensações pictóricas distintas e até díspares (do vermelho-sangue puro à psicodelia hi-tech e a aparência envelhecida). Já as pequenas esculturas em bronze e cerâmica (“Gigante dormindo e cachorro latindo” e “O bem e o mal”, por exemplo) dão-nos a verdadeira noção da vacuidade da era “big brother”: casas que, sem telhado, abertas à devassidão da privacidade, nos abrigam a espiar as formas desproporcionais de objetos e seres soltos no vazio e na secura monótona da vida alheia.
Passado, presente e futuro dialogando
em um possível equilíbrio
Se tais obras refletem o pensamento crítico de Dias, não poderia faltar o sarcasmo que marca toda a boa geração de artistas plásticos a qual ele pertence (leia-se: Rubens Gerchman, Hélio Oiticica, Rogério Duarte e outros). O artista usa seu humor de maneira mais aguda na obra saborosamente intitulada “Seu marido”. Embora deslocada do restante da mostra (foi colocada no átrio da Fundação, inclusive, longe quatro andares das restantes), constitui-se num retrato divertido e crítico do homem contemporâneo. Trata-se de um boneco cujas formas de cabeça, pernas, braços, tronco e rabo (?!) se indistinguem: todas repetem o mesmo formato de uma espécie de bastão amarelo e peludo. Aparentemente apático, de tempos em tempos o “bicho” desperta, sacudindo-se todo de forma patética e despropositada por alguns instantes, até que volta àquela insossa imobilidade inicial.

Seria este sacolejo estúpido o único movimento possível da defasada figura do macho doméstico nos dias de hoje? Forte suposição. Com meu respeito a todas as senhoras: qualquer semelhança conceitual (e, quem sabe, até corpórea...) com seus homens de dentro de casa não é mera coincidência. 

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Eu e "Seu Marido"


SERVIÇO:

exposição: "Antonio Dias – Potência da Pintura"
onde: Fundação Iberê Camargo  (Av. Padre Cacique, 2000 – Porto Alegre/RS)
até: 18 de maio de 2014
horário: terça a domingo, das 12h às 19h, quintas até as 21h (entrada gratuita)
Curadoria: Paulo Sergio Duarte













terça-feira, 1 de outubro de 2013

"Biografia Incompleta" Exposição Coletiva – Museu de Arte Contemporânea - Niterói /RJ (08/08/2013)









Eu reencontrando o MAC, em Niterói
Ao lado da amorosa companhia de Leocádia Costa, que empresta seu olhar fotográfico para este registro, voltei ao MAC, em Niterói (RJ), o qual havia visitado em 2011 e me impressionado muito com aquele traçado em forma uma flor, de um cálice, lindo de qualquer ângulo que se contemple. Dois anos depois, constatei que a admiração pela obra de Niemeyer continua intacta naquela arquitetura tão poética e em plena simbiose com a natureza local, simbiose aparentemente improvável haja vista o desenho futurista e quase extraterrestre que é o prédio do museu.

A obra de Antônio Dias
que deu nome à mostra
Como se não bastasse a beleza e grandiosidade da natureza e da arquitetura num radiante domingo de sol e praia, que já valeriam o passeio, deparei-me com exposições maravilhosas em seu interior. Uma delas é a da mostra Biografia Incompleta, que reuniu obras do colecionador João Sattamini que compreende quase 30 anos com peças de alguns dos principais artistas da vanguarda das artes plásticas brasileira: Antonio Dias, Loio-Pérsio, Nelson Leirner, Raymundo Colares e Rubens Gerchman. Tomadas de sarcasmo, crítica e personalidade, as obras desses artistas ligados ao neoconstrutivismo, corrente das artes plásticas brasileira iniciada nos anos 60 que, de forma pungente e mordaz, traz novos elementos ao construtivismo e ao abstratismo próprios de uma nova realidade urbana, como a cultura de massas (quadrinhos, cinema americano, publicidade, erotismo) e a vida social (violência, religiosidade, censura, política, indústria). Incrivelmente atuais para um “Brasil ano 2000”.

Acrílico sobre madeira Raymundo Colares
Isso fica evidente nas obras de Raymundo Colares, que, em telas que brincam a tridimensionalidade, explora os elementos kitsch, dos quadrinhos, da dinâmica da montagem do cinema e até do àquela época já midiatizado universo do automobilismo. “Objeto ônibus”, da série de 1969, é um tinta esmalte industrial sobre metal que traz bem esta ideia. Outra, um belo acrílico sobre madeira, é magnífico em sua simplicidade conceitual, movimento e ideia de equilíbrio.

Antonio Dias, um dos dois únicos vivos entre os cinco artistas junto com Nelson Leirner, é dono de uma obra altamente peculiar marcada pelo minimalismo e pela exploração minuciosa de texturas visuais, porém não menos crítica, valendo-se, por exemplo, da secura visual dos códigos binários da linguagem dos computadores para expor sua indubitável simbologia maniqueísta. Além disso, revela fortemente a massificação imperialista através dos debochados grafismos em inglês. Sua identificação com o pop é absurdamente atual. Uma das obras expostas, “The Place”, poderia ser a capa de qualquer disco de artista tecno. O aspecto enterteinment, no entanto, se esvai rapidamente: a crítica, presente, está na observância de que o escrito “mente” (mind) encontra-se disperso no nada (preto da tela), enquanto que a palavra “mapa” (“map”), ou seja, aquilo que a mente deveria circunscrever, é justamente a que está localizada dentro de um espaço delimitado. Outro quadro, o que dá nome à exposição, é um acrílico sobre tela que lança, em poucos elementos simbólicos, a dimensão das utopias do mundo moderno: o “desejo” tão distante do percurso do traço.

"Milagre", de Nelson Leirner
A seleção de Leirner é outra espetacular. Numa linguagem própria que, igualmente, caminha entre o severo e o deboche, vale-se de técnicas inovadoras e até insólitas (colagem de asas de borboleta em sua Santa Ceia), além de miniaturas e recursos “não nobres” para as artes plásticas, como a serigrafia e o off-set da publicidade.  A religiosidade católica, moral e eticamente comprometida, assim como a violência urbana, convivem sem nenhuma fronteira. Dois brilhantes: “Milagre”, serigrafia e pintura sobre madeira em que Nossa Senhora de Fátima ganha traços e dimensões pop e tupiniquins ao colocar-lhe aos pés suplicantes mendigos da cidade grande; e, a mais impressionante, “São Sebastião do Rio de Janeiro” (2002), assustadoramente atual numa cidade de balas perdidas e de dessacralização dos mitos pela ação humana, um conjunto de imagens sacras enfileiradas ao lado de “patrióticas“ flâmulas em que cada um dos santos têm cravado no peito uma bala de revólver. Impossível não se lembrar dos versos de “Estação Derradeira”, de Chico Buarque: “São Sebastião crivado nublai minha visão/ Na noite da grande fogueira desvairada”.

Se Leirner tem correlação com a MPB, Rubens Gerchman está essencialmente ligado à vanguarda da música brasileira. Dono de uma arte que mistura erotismo e dinheiro, violência  e beleza, morro e asfalto, futebol e escola de samba, tradição e ruptura, Gerchman, irônico e crítico ao extremo, é diretamente ligado ao tropicalismo (é dele a arte da capa de “Tropicália”, de 1967, e, inspirados em uma peça homônima sua, Caetano Veloso e Gilberto Gil escreveram, para este mesmo disco, a canção “Lindonéia”, cheia de críticas à esquizofrenia mortífera e ao endeusamento do belo da sociedade moderna), o que fica evidente em suas obras daquela época (décadas de 60 e 70): coloridamente tropicais e conscientemente globalizadas e cáusticas.
"Monalou", a Monalisa
fascista de Gerchman
Suas “monalisas” dão diretamente este tom: uma, “Monalou” (tinta óleo sobre fotográfica colada em eucatex, 1975) a quebra do elemento clássico (a perspectiva ao fundo da personagem, aqui chapada e carregada de simbologia política), a outra, a revelação/massificação (a Gioconda com beiços de negra). Maravilhoso e forte, igualmente, o quadro em que um acontecimento da mídia dos anos 60, o sumiço de um ajudante de obra durante a Ditadura Militar pego pela polícia por um suposto porte de drogas, serve de denúncia e mostra de inconformismo. Ele se vale da linguagem corriqueira e sensacionalista dos jornais e da dissolução folclore/cultura pop para evidenciar de forma ainda mais reveladora a realidade obscura. Alguma semelhança com o caso Amarildo não é mera coincidência.

Igualmente revolucionário em conceito (seu falso díptico, que, na verdade, forma um tríptico, é muito interessante), porém trabalhando volumes e cores com a intenção de não atribuir-lhes nenhuma associação figurativa, acabou deixando Loio-Pérsio um tanto deslocado dentro da mostra se comparado ao impacto e transgressão dos outros autores. Um lapso da curadoria (Luiz Guilherme Vergara) totalmente perdoado, tendo em vista o enorme acerto da seleção como um todo.



Abaixo, mais alguns momentos da mostra:



Denúncia social na obra
de Rubens Gerchman

Eu diante da versão tupiniquim
da Monalisa de Gerchman

O 'díptico-tríptico' de Loio-Pérsio

"Ônibus ônibus",
Raymundo Collares

"The Place", de Antônio Dias,
capa de disco de tecno

Visitantes se deparando com o São Sebastião
crivado de balas, de Leiner