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terça-feira, 4 de julho de 2017

"Docinho da América", de Andrea Arnold (2016)


Sabe aqueles filmes que chegam te levam do ponto A até o ponto B, e assim vão tranquilamente? Bom, “American Honey” é muito diferente disso. O longa é “simples” mas sua estrutura narrativa não, deixando você (EU) perdido, sem saber ao certo para onde estaria indo. Mas quando chega lá, ops!... Esse filme chega em algum lugar?
Star (Sasha Lane), uma adolescente que busca viver aventuras, decide se juntar a um caixeiro viajante e cruzar o território do meio-oeste dos Estados Unidos vendendo assinaturas de revistas. No meio da viagem, ela entra em uma loucura de festas, crimes e amores.
É uma obra longa com ritmo bastante lento, muitas cenas contemplativas e muita câmera na mão. As sequências dos jovens dentro da van são bem repetitivas e a falta de exploração do background de alguns personagens devo admitir foram elementos que me atrapalharam um pouco. No entanto, estes pontos não conseguem tirar a qualidade quase documental do filme.
Olhando assim por cima, o filme parece não ter profundidade por não se concentrar muito em seus personagens centrais (na verdade ele não se aprofunda em nenhum personagem). Contudo, o foco principal parece ser mostrar de maneira muito crua a realidade da juventude americana, que mesmo vivendo numa era de liberdade, sexo, drogas e rap, acaba tendo que se manter presa a amarras sociais como trabalhar e ganhar dinheiro. Esse recorte apresentado da juventude americana é muito bem feito e torna interessante acompanhar essa sede de liberdade sem, no entanto, apresentar nenhum objetivo claro na vida. Apenas vivendo e ao mesmo tempo enfrentando os estereótipos típicos americanos, como família, religião, tradições, convenções sociais, etc.
O nosso "casal" Jake e Star.
Por mais que os jovens do filme possam parecer “malucos”, ele nos apresenta um belo conceito de família. Bem longe de ser uma família tradicional, o laço entre aqueles jovens é, sim, o de uma família. Uma família onde todos se cuidam, se protegem e se cobram mutuamente. O elenco é composto basicamente de atores desconhecidos, com exceção para Shia LaBeouf no papel do malucão Jake, que parece ter mergulhado de vez em pepeis desse tipo (e vou confessar que o prefiro assim). A estrela principal, Star (Sasha Lane), em seu primeiro papel já entrega uma ótima atuação, tão autentica em suas atitudes que nem parece que estar atuando.
Uma obra que vai além de road movie sobre jovens maconheiros numa van (tá, pode ser isso também). e"Docinho da América" nos mostra uma realidade de uma geração de jovens americanos, enfrentando os perigos de sua própria sociedade. Há diversos momentos em que o espectador chega a temer pela segurança de Star, em situações que não chegam a ser extremas mas que infelizmente muitas vezes são extremamente comuns nos dias de hoje como assédios e coisas do gênero. Esse tom realista, documental é o grande charme do longa que pode parecer meio sem rumo assim como os personagens, assim como a vida, e terminar assim no meio do nada, assim como esse texto.
A trupe de jovens vendedores de assinaturas de revista.
Ou seriam jovens em busca de seus sonhos?



por Vagner Rodrigues

domingo, 2 de julho de 2017

cotidianas #517 - Análise Descontraída


Morro sem entender 
Porque a ciência constrói por um lado
E destroi pelo outro

Morro sem entender 
Porque já pisaram na lua
Se não se sabe da Atlândida 
Do homem das neves 
Ou do monstro de Loch Ness


Morro sem entender 
Porque fazem cidades
Que crescem fogosas debaixo de vulcões

Morro sem entender
A espécie que fez
30 milhões de leis
Pra se fazerem cumprir os 10 mandamentos

Êta, mundo velho
Você me parece ainda um ovo
Ou então precisa urgentemente se acabar
Pra nascer de novo

Morro sem entender
Buscando meu tempo perdido
Estudando latim que era uma língua morta
Não se deve matar , mas na guerra pode
E entra ano , sai ano em qualquer carnaval
O rei momo é sempre gordo

Êta, mundo velho
Você me parece ainda um ovo
Ou então precisa urgentemente se acabar
Pra nascer de novo

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"Análise Descontraída"
(Erasmo Carlos)

Ouça:
Erasmo Carlos - "Análise Descontraída"

quinta-feira, 29 de junho de 2017

Morrissey - "Your Arsenal" (1992)





"['I Know It's Gonna Happen Someday' é]
Morrissey imitando Bowie."
David Bowie



Não, aquele topete não é por acaso. Fã de nomes como Elvis e James Dean, e apreciador da cultura dos anos 50 e 60, Morrissey sempre deixou transparecer essa predileção, desde a época dos Smiths com capas de discos como a de "The World Won't Listen" na qual um grupo de jovens ao estilo rockabilly aparece meio de costas na capa, nas de singles como o de "Bigmouth Strikes Again" na qual James Dean aparece montado em uma lambreta, ou do single "Shoplifters of the World Unite"  com Elvis Presley, e em músicas  como "Rusholme Ruffians", pra citar um bom exemplo, uma vez que esta , diretamente inspirada no Rei do Rock, ganhou inclusive na versão ao vivo do disco "Rank", um medley de introdução com "(Marie's the Name) His Latest Fame", tal a semelhança entre as duas. 
Embora seus discos solo tivessem trabalhos de produção bem variados, de certa forma o espírito rock'roll sessentista sempre esteve intrínsecamente presente nos trabalhos, fosse em seus astros decadentes, nas brigas de gangues ou nos garotos rebeldes. Era o universo, os personagens, "o mundo de Morrissey".
E essa veia rock'roll aparece com força mesmo é no terceiro disco do cantor. Em "Your Arsenal", Moz convocava uma gangue de jovens topetudos e carregando no rockabilly revitalizava seu som e reoxigenava sua trajetória naquele momento.
Pra não deixar dúvida das intenções, já sai chamando de cara com a espetacular  "You're Gonna Need Someone on Your Side" um rockabilly invocado, distorcido e acelerado de riff minimalista que destila todo o habitual rancor de Morrissey, "Day or night/ There's no diference/ You're gonna need  someone on your side" ("Dia ou noite, não faz diferença/ Você vai precisar de alguém a seu lado").
"Glamorous Glue" é  um típico glam-rock em uma das tantas referências, diretas ou indiretas a David Bowie no disco. Não  por acaso, uma vez que "Your Arsenal" fora produzido por Mick Ronson, guitarrista do Camaleão na época  do clássico ht"Ziggy Stardust". "We Let You Know" surge como uma balada acústica e, entre ruídos  de multidão, vai crescendo até explodir num final grandioso, numa das grandes interpretações  de Morrissey no disco.
A polêmica "The National Front of Disco", salvo sua, talvez, infeliz referência à Frente Nacional, que custou a Morrissey acusações  de racismo e xenofobia, é  uma baita duma música! Um pop rock tão delicioso e empolgante que faz perdoar qualquer equívoco involuntário deste grande letrista.
Não  menos deliciosa é  "Certain People I Know", outro rock com cara de anos 60, desta vez com uma pegada um pouco mais country.
"We Hate When Our Friends Become Successfull", o grande hit do disco e um dos maiores da carreira do cantor, talvez tenha um dos melhores refrões que eu já  tenha escutado na vida, apenas com a risada de Morrissey soando mais sarcástica  do que nunca, no que muitos dizem ser um deboche ao, até então, fracasso da carreira solo do ex-parceiro de Smiths, Johnny Marr.
Moz banca um Roberto Carlos e homenageia os gordinhos na adorável "You're The One For Me, Fatty", que, brincadeiras à  parte só  faz repetir a atenção que o artista sempre  dedicou aos menos lembrados.
As duas baladas que se seguem, "Seasick, Yet Still  Docked" e "I Know It's Gonna Happen Someday" são bastante parecidas embora esta última seja bastante superior com uma carga emotiva impressionante numa interpretação extremamente intensa de Morrissey, assumidamente  muito inspirada nas baladas de David Bowie, terminando inclusive aos acordes de "Rock'n Roll Suicide".
Mais uma peça  carregada de rock, "Tomorrow", se encarrega de botar ponto final em tudo com destaque para o baixo de Boz Boorer, de certa forma, grande impulsionador da tendência roqueira daquele momento da carreira de Morrissey.
Morrissey com "Your Arsenal" honrava o topete e fazia a alegria dos fãs mais afeitos ao seu lado rock. Com uma discografia  idolatrada, embora nem sempre muito inspirada, "Your Arsenal" era e continua sendo um dos trabalhos  mais coesos de sua carreia e para muitos, o melhor disco de sua história sem o parceiro Johnny Marr. Morrissey abria seu arsenal e mostrava armas que não vinham sendo usadas com a devida ênfase. O resultado foi um balaço.

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FAIXAS:
  1. "You're Gonna Need Someone on Your Side"
  2. "Glamorous Glue"
  3. "We'll Let You Know"
  4. "The National Front Disco"
  5. "Certain People I Know"
  6. "We Hate It When Our Friends Become Successful"
  7. "You're the One for Me, Fatty"
  8. "Seasick, Yet Still Docked"
  9. "I Know It's Gonna Happen Someday"
  10. "Tomorrow"

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Ouça:
Morrissey - Your Arsenal



Cly Reis