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terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

COTIDIANAS nº 550 ESPECIAL 10 ANOS DO CLYBLOG - O cara que expulsou Peter Hook do camarim



"O cara que expulsou Peter Hook do camarim"
por Castor Daudt



   
Peter Hook, foto: Kevin Cummings
E
m 1988, eu ainda era guitarrista do DeFalla, estávamos fazendo a turnê de lançamento do nosso 2° disco (It's Fuckin' Borin' to Death/BMG-Ariola/1988).
A banda vinha de uma maratona de quase 2 anos tocando, gravando e viajando sem parar, desde a formação clássica em 86 (Biba Meira/bateria, Castor Daudt/guitarra, Flu/baixo e EduK/voz).
Tínhamos boa reputação entre críticos, músicos e jornalistas especializados. Daí, quando bandas estrangeiras famosas vinham tocar no Brasil, se viável, a assessoria de imprensa do selo arrumava uns encontros. A banda australiana The Church, por exemplo, mandou ingressos e liberou backstage pra gente nós shows deles no Projeto SP, inclusive eles foram nos assistir no Aeroanta!
No show do New Order em 88, no Ibirapuera, em SP, não pudemos ir, pois tínhamos show na mesma noite.
Mas os caras do New Order, depois do show deles, foram nos assistir na famosa casa de shows, o Dama Xoc!
Depois do show eu fiquei sozinho no camarim, descansando. Era raro ter um minuto de sossego, na época.
De repente entra um cara meio estranho, no camarim, e eu, a contragosto, me vejo obrigado a dizer:
- "Oba amigo, desculpe, aqui é só pra banda, equipe e convidados, por favor saia!".
Rapidamente entrou um comitê de segurança explicando que os caras do New Order queriam oferecer cocaína pra gente cheirar com eles, (se fosse possível), no camarim!
Foi então que reconheci!
O cara era o Peter Hook, baixista!! Super gente fina, sou fã dele!
Tudo esclarecido, ficamos até altas horas em altos papos... nenhum retardado lembrou de tirar fotos...
(Ah...os caras tinham comprado 1 kg de cocaína e estavam deslumbrados! Eu lembro de avisá-los pra pegarem leve, que o negócio não era brincadeira!
O baterista parecia um zumbi, um cadáver ambulante: pálido, magro, cansado).
Enfim, foi uma noite inesquecível, muitas risadas, altos papos sobre música, arte, quadrinhos, cinema... só inutilidades que a gente gosta, né?
E até hoje, eu sou o cara que expulsou o Peter Hook do camarim... hahahahaha!
(Ah, nunca faço isso, foi azar do Hook...).



***








Castor Daudt é guitarrista, baterista, compositor e cantor do grupo DeFalla.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Prodigy - "The Fat Of The Land" (1997)





“A nossa atitude é:
estamos aqui,
amem-nos ou odeiem-nos.
Se isso é ser punk,
 então somos punk”
Liam Howlett




Sem dúvida pioneiros como o Suicide colocaram a cara a tapa apresentando seu som eletrônico em pleno movimento punk naquele contexto pouco recomendável pra que alguém viesse com "maquininhas" fazendo música. É certo que grupos como o Front 242 já uniam minimalismo e agressividade ao eletrônico ali pela metade dos anos 80, e que músicos talentosos como Trent Raznor já punham o maquinário a serviço do peso para produzir seu intenso e barulhento som industrial. Mas mesmo com todos estes precedentes creio ser justo afirmar que nunca a música eletrônica foi tão suja, tão pesada, aproximou-se tanto do punk quanto em "The Fat of The Land" do Prodigy, lançado em 1997.
O grupo encabeçado pelo prodígio Liam Howlett já havia dado mostras de sua inclinação para o peso em seu disco anterior, o ótimo "Music For Jilted Generation" (1994) com o "metalzão" "Their Law" e a eletrizante "Voodoo People", mas "The Fat Of The Land" catalisava aquelas tendências de uma maneira mais efetiva materializando assim um produto final simplesmente bombástico.
O visual que o grupo assumia naquele momento, em especial seu MC Keith Flint, uma espécie de Bozo do inferno, levava muitos a pensar que estavam se "fantasiando" de punks de modo a estabelecer uma coerência visual com a proposta musical que então apresentavam aproveitando assim para entrar na onda roqueira que ainda predominava naquele final de anos 90. É evidente que o mundo pop tem todo seu show-business e o grupo aproveitou a rebarba do grunge para encarnar um tipo mais rocker, mas que o lado rebelde, transgressor e punk não era meramente uma encenação, definitivamente não era. Suas rusgas com autoridades por conta de restrições a raves e festas afins já vinha de longa data e a já mencionada "Their Law" do disco anterior não somente era uma pedrada sonora como na letra, em poucas palavras como é característico do gênero, metia o dedo na cara dos legisladores e da polícia: "Fodam-se vocês e suas leis".
Agora eles atacavam de novo e vinham com mais munição: sexo, drogas, assassinatos, incêndios, caos... O carro-chefe de "The Fat of The Land" era nada mais nada menos que uma música de título ambíguo que sugeria estupro, agressão mas que na verdade tratava-se de uma expressão popular para o consumo de heroína. "Smack My Bitch Up", uma pancada eletrônica de ritmo fenético e uma certa  levada árabe, como se não bastasse sua sonoridade alucinante, trazia a tiracolo um videoclipe alucinante de câmera na mão, em primeira pessoa, repleto de putaria, consumo de drogas, álcool, violência e todo tipo de comportamento inadequado, tão hardcore, tão inapropriado, que chegou a ser banido da MTV americana e de televisões de vários outros países. Quer mais punk que isso?
"Breathe", que a segue no álbum, não deixa por menos num petardo sonoro que flerta com o grunge e chega a lembrar "Anarchy in the U.K." dos Sex Pistols no refrão pela voz rasgada e pela entonação. "Diesel Power" dava uma aliviada na violência  e carregava no funk com uma letra bem interessante sobre a tecnologia e a loucura do mundo moderno; e a frenética "Funky Shit" cheia de gritinhos de torcida de colégio e  com seu sampler do tema da S.W.A.T. mantinha o nível lá em cima.
Aí chega "Serial Thrilla" entrando de voadora com os dois pés nos peitos! Uma mistura explosiva do funk de "Diesel Power" com a potência de "Smack My Bitch Up" que levaria até um aleijado pra pista de dança. "Mindfields" é mais climática, lembra algo como uma trilha de filme de espionagem ruim, e "Narayan" que a segue, extensa, cheia de variações, parece não corresponder ao tamanho de suas pretensões. Já a incendiária "Firestarter", é outro daqueles exemplos do punk aplicado a música eletrônica de maneira perfeita. Uma bomba, um coquetel molotov de samples sinuosos e ziguezagueantes, uma batida drum'n'bass aceleradíssima e perturbadora, e um vocal nervoso e ameaçador. A boa "Climbatize", crescente e bem elaborada, é uma boa ponte para o final do disco e "Fuel My Fire" que põe a tampa no caixão, ao contrário das demais que tinham doses de peso em músicas predominantemente eletrônicas, tem nos efeitos, samples e programações meros coadjuvantes para uma tijolada sonora conduzida por guitarras, baixo e bateria de verdade, além de vários convidados, numa espécie de festa punk de encerramento do álbum.
Que Kraftwerk, Silver Apples, Throbbing Gristle, Suicide, tiveram papéis mais importantes na história da música eletrônica, não existe discussão, que outros contemporâneos do Prodigy  como Chemical Brothers e Orbital tenham mais recursos e alternativas creio que não seja um absurdo afirmar, mas que "The Fat Of The Land" à sua maneira inaugurava naquele momento um novo capítulo na história do gênero, me parece que seja algo que não esteja muito longe da verdade.

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FAIXAS:
  1. Smack My Bitch Up (5:430
  2. Breathe (5:35)
  3. Diesel Power (4:18)
  4. Funky Shit (5:16)
  5. Serial Thrilla (5:11)
  6. Mindfields (5:40)
  7. Narayan (7:07)
  8. Firestarter (6:43)
  9. Climbatize (6:38)
  10. Fuel My Fire (4:19)

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Ouça:
Prodigy - The Fat Of The Land


Cly Reis