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sexta-feira, 6 de maio de 2011

cotidianas #80 - A Festa da Turma


Todo ano, sem falta, reencontravam-se para a festa da turma. Às vezes faltava um, outra hora faltava outro, mas via de regra, os de fé sempre acabavam comparecendo. Era assim desde o final da faculdade, desde o ano seguinte quando o Dé resolveu chamar a galera para um churrasco pra não deixar morrer a amizade. Boa iniciativa que a turma acolheu.
Agora doze anos depois do primeiro encontro a coisa continuava no mesmo clima: muita amizade, muita palhaçada, muita zoeira e muita cerveja. É lógico que a situação tinha mudado um pouco: alguns tinham casado, outros já tinham casado e separado, outros já tinham filho, outros não puderam ir à festinha porque era o dia que podiam visitar o filho, outros não podiam ir porque tinham sido transferidos no trabalho para o Acre, um outro lá já tinha morrido, outro tinha deixado a bebida, outro não podia comer açúcar, etc. , mas driblando as dificuldades, adaptando-se às situações, revezando um aqui outro ali de uma no pro outro, continuavam se vendo e sempre na maior camaradagem.
Numa festa dessas a Gislaine aparece com uma foto:
- Olhem só o que eu achei dentro de um livro...
- Cara! É do tempo da faculdade!
- Olha só, é a gente na praia aquela vez da excursão!
- Que barato! - atalhou o Lélio
- Que horror! - rebateu a Cris - Olha os cabelos. E a gente ainda achava isso bonito na época.
E todos riram.
- E os maiôs, gente... O que dizer desses maiôs? - suspirou a Gladys num tom de desapontamento.
E todos riram de novo.
- Isso sem falar nas sungas - hahahaha - Olha a sunga do Carlos. Olha o Beto, parece uma saracura - e novas risadas entusiasmadas.
- E quem é esse aqui? Magrelo de cabelo comprido? E essa sunguinha...
A Gislaine reconheceu:
- É o Pereira.
- Pereira! É tu, Pereira? - que a essas alturas vendo que iam acabar o reconhecendo, foi ficando pra trás do amontoado de gente que tentava ver a foto.
- Pereira, mas tu era muito magro, Pereira. E que sunguinha ridícula! A pior das nossas, hein! A minha tá feia - admitiu o Beto - mas a tua é o 'ó do borogodó'.
E mais risadas.
- Ah, eu vou ter que scanear pra botar no Orkut, na nossa comunidade.
- Isso, isso. - empolgou-se a Cecília.
- Manda pra mim.
- Vou por no meu Face.
Todos gostaram da ideia. Todos menos um: o Pereira.
- Não, não, não quero minha foto assim na internet.
- Ah, deixa de bobagem, Pereira. Que que tem?
- Não, não, me dá isso aqui - dizia enquanto tentava pegar a foto da mão da Gislaine que se esquivava pra tentar impedi-lo.
- Ai, para, Pereira. Que saco! Vou guardar isso aqui. - disse guardando na bolsa - Depois eu vejo o que que eu faço.
Depois daquilo o Pereira, costumeiramente muito falante, alegre, brincalhão, ficou estranhamente quieto o restante da noite. Foi embora mais cedo do que de costume saindo com ar meio sorumbático e despedindo-se de todos à distância com um mero aceno de mão.
Na festa do ano seguinte o Pereira não apareceu. A turma não estranhou muito porque faltas eventuais aconteciam, e volta e meia eram surpridas por uma agradável surpresa, como a do Arthur que viera do Acre para ver a mãe e aproveitara para comparecer à festa, mas a ausência do Pereira se repetiu no ano seguinte, e no outro, e no outro...
O Pereira nunca mais foi visto por ninguém da turma, aliás nunca mais fora visto por niguém, e ninguém sabia ao certo do seu paradeiro tampouco se o sumiço tinha a ver com a 'ameaça' de exibição da foto. A tal foto, por sua vez, nunca foi scaneada nem colocada em redes sociais. A Gislaine colocou dentro de um livro e nunca mais lembrou onde estava.

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2 comentários:

  1. Só faltou dizer que tem sempre um que não pode beber por alguma razão e ficando sóbrio consegue se lembrar bem do passado. Naquele caso, era eu.

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  2. O relato da festa foi tão emplogante, que conseguiste passar, com muita habilidade, a alegria do encontro, a surpresa diante descoberta da foto,a emoção de voltar no tempo, o sentimento de se ver ridículo, em função da moda da época, a reação do Pereira e a preocupação da turma com o seu desaparecimento.
    Entrei tanto na história, que, também quero notícias do Pereira. Iara

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