Há exatos 17 anos, numa sexta-feira 13, a HímenElástico fazia seu primeiro show na cidade de Alvorada, vizinha a Porto Alegre, num lugar chamado Woodstock Bar.
A HímenElástico fora o projeto musical-criativo de 4 primos malucos que costumavam passar madrugadas (sóbrios) falando e inventando doideiras de todo tipo; gráficas, verbais, musicais, ou de qualquer outra forma. Essa hemorragia criativa nos estimulou; a mim, meu irmão Daniel, e meus primos Lúcio e Lê; a tentarmos, mesmo sem tocar nada, a ter uma banda. Não era este afinal o espírito punk? Era! E era isso também que nos servia de base. O Lúcio estivera pouco tempo antes de cabeça no punk da periferia paulista Cólera, Garotos Podres, tinha também descoberto os Kennedy's, Exploited e havia levado a mim e meu irmão que fazíamos uma linha um pouco mais Rock-BR da época (Legião, Titãs, RPM). O Lúcio também tava numas de rap na época e a novidade pra mim era interessante. O tal do Public Enemy era bom pra caralho. Tínhamos também todos acabado de ouvir o "Cabeça Dinossauro" dos Titãs e talvez aquilo tenha sido a mola propulsora definitiva. Poucas notas, agrassividade, letras minimalistas. Dava pra fazer rock! Vamos ter uma banda? Mas e essa diferença toda? Eu gostava de Smiths, meu irmão de Caetano, o Lúcio de Ratos de Porão e o Lê de Thayde. Deu no que deu: uma mistura das mais interessantes, criativas e originais.
O nome era uma brincadeira entre o "Homem-Elástico" e algo bem malicioso, tanto que escreve-se originalmente o nome da banda com o Φ grego, deixando a palavra hΦmem com uma possível dupla leitura.
Nosso som ficou muito próximo ao do nosso disco modelo, o "Cabeça Dinossauro". Lembrava um bocado Titãs, especialmente na minimalista "Nem uma, coisa nem outra" que parecia não fazer muito sentido mas (sinceramente) era extremamente questionadora, versando sobre o TER, o querer sempre mais, o não se dar por satisfeito. Era tão simplesmente-complexa que, em verdade, entre um ajuste e outro, um complemento, uma palavra aqui outra ali, a letra demorou três anos pra ficar pronta; e depois musicalmente, acrescido som à letra, fôra uma de nossas melhores.
Não tínhamos muito compormisso exceto com nós mesmos e com a nossa diversão. Tanto que não temos grandes registros gravados. A maioria são em cassete e sem muita qualidade. Ensaiamos pra valer mesmo no dia do tal do show em Alvorada. Apresentação que o Lúcio conseguiu com alguns contatos e nos botou na jogada. Só que aí teríamos que estar mais preparados e então marcamos duas horas de estúdio no fim da tarde pra ficarmos afiados pro show à noite. Deu certo. Estávamos na ponta dos cascos. O problema foi que uma hora antes do show, com a voz desgastada, com o frio terrível que fazia e acho que um pouco pela ansiedade, a voz se foi. Só sei que estava apavorado numa mesa pouco antes de entrar no palco e veio um cara de uma outra banda e recomendou, "sabe o que que é bom pra isso? cachaça. toma uma cachaça pura que isso passa rapidinho". Segui a orientação e não deu outra.
Obra do destino ou sei lá o que, mas entramos no palco exatamente à meia-noite do dia 13 de agosto (o que na verdade já era dia 14, mas pra efeito poético-sinistro ainda seria sexta-feira 13 até raiar o sol). Em um ambiente especialmente decorado para a data
tão especial, à penumbra e cheio de caveiras com velas, abrimos o show com a "Marcha-Fúnebre" emendando com nossa vinheta de abertura tradicional inspirada naqueles gritos de pelotões do exército que correm na rua: "Dá um beijo no cangote, Carolina/ Uh, Uh, Uh, Carolina...", e que já emendava com a matadora "Ex", uma das nossas preferidas, também muito minimalista que contava com uma incrível agrssividade intrínsca. A coisa seguiu na boa, acho que a galera gostou, tocamos tudo que tínhamos ensaiado até o
grand-finale com "Nem Tudo Está Perdido" que com sua letra apocalíptica e executada de maneira tão catártica acabou configurar um final apoteótico da nossa apresentação.
No final fui cumprimentado sincera e entusiasticamente por um cara da Space Rave, banda de Porto Alegre que continua no circuito com algum êxito e ainda esnobei a loirinha que eu tinha dado em cima antes do show, mas que só depois da apresentação veio se querendo. Agora é tarde, baby.
Como disse, não tínhamos grande compromisso com a coisa, apesar de gostarmos muito. Eu tinha faculdade, éramos duros pra bancar estúdios, meus primos moravam longe e no fim das contas não levamos a coisa muito adiante. Mas até hoje, bem imodestamente, logo eu que sou extremamente chato para o que faço e para o que ouço, considero a HímenElástico uma das melhores coisas nacionais que já ouvi nos últimos tempos. Eu teria um CD daquela banda. Ouço bandas hoje e penso: "Cara, a Hímen já fazia isso naquele tempo e sem o menos recurso". Era criatividade pura.
Parabéns
hermenêuticos pelo aniversário do showzinho de Alvorada.
ESCLARECIAMENTO AOS
NÃO-HERMENÊUTICOS: Hermenêutico nesse caso não tem a menor relação com seu significado original que é de interpretação de livros sagrados ou de leis, blá, blá, blá. Adotamos a palavra para designar tudo aquilo que fosse relativo à HímenElástico.
Assim sendo, faz 17 anos do primeiro show Hermenêutico!