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segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Prodigy - "The Fat Of The Land" (1997)





“A nossa atitude é:
estamos aqui,
amem-nos ou odeiem-nos.
Se isso é ser punk,
 então somos punk”
Liam Howlett




Sem dúvida pioneiros como o Suicide colocaram a cara a tapa apresentando seu som eletrônico em pleno movimento punk naquele contexto pouco recomendável pra que alguém viesse com "maquininhas" fazendo música. É certo que grupos como o Front 242 já uniam minimalismo e agressividade ao eletrônico ali pela metade dos anos 80, e que músicos talentosos como Trent Raznor já punham o maquinário a serviço do peso para produzir seu intenso e barulhento som industrial. Mas mesmo com todos estes precedentes creio ser justo afirmar que nunca a música eletrônica foi tão suja, tão pesada, aproximou-se tanto do punk quanto em "The Fat of The Land" do Prodigy, lançado em 1997.
O grupo encabeçado pelo prodígio Liam Howlett já havia dado mostras de sua inclinação para o peso em seu disco anterior, o ótimo "Music For Jilted Generation" (1994) com o "metalzão" "Their Law" e a eletrizante "Voodoo People", mas "The Fat Of The Land" catalisava aquelas tendências de uma maneira mais efetiva materializando assim um produto final simplesmente bombástico.
O visual que o grupo assumia naquele momento, em especial seu MC Keith Flint, uma espécie de Bozo do inferno, levava muitos a pensar que estavam se "fantasiando" de punks de modo a estabelecer uma coerência visual com a proposta musical que então apresentavam aproveitando assim para entrar na onda roqueira que ainda predominava naquele final de anos 90. É evidente que o mundo pop tem todo seu show-business e o grupo aproveitou a rebarba do grunge para encarnar um tipo mais rocker, mas que o lado rebelde, transgressor e punk não era meramente uma encenação, definitivamente não era. Suas rusgas com autoridades por conta de restrições a raves e festas afins já vinha de longa data e a já mencionada "Their Law" do disco anterior não somente era uma pedrada sonora como na letra, em poucas palavras como é característico do gênero, metia o dedo na cara dos legisladores e da polícia: "Fodam-se vocês e suas leis".
Agora eles atacavam de novo e vinham com mais munição: sexo, drogas, assassinatos, incêndios, caos... O carro-chefe de "The Fat of The Land" era nada mais nada menos que uma música de título ambíguo que sugeria estupro, agressão mas que na verdade tratava-se de uma expressão popular para o consumo de heroína. "Smack My Bitch Up", uma pancada eletrônica de ritmo fenético e uma certa  levada árabe, como se não bastasse sua sonoridade alucinante, trazia a tiracolo um videoclipe alucinante de câmera na mão, em primeira pessoa, repleto de putaria, consumo de drogas, álcool, violência e todo tipo de comportamento inadequado, tão hardcore, tão inapropriado, que chegou a ser banido da MTV americana e de televisões de vários outros países. Quer mais punk que isso?
"Breathe", que a segue no álbum, não deixa por menos num petardo sonoro que flerta com o grunge e chega a lembrar "Anarchy in the U.K." dos Sex Pistols no refrão pela voz rasgada e pela entonação. "Diesel Power" dava uma aliviada na violência  e carregava no funk com uma letra bem interessante sobre a tecnologia e a loucura do mundo moderno; e a frenética "Funky Shit" cheia de gritinhos de torcida de colégio e  com seu sampler do tema da S.W.A.T. mantinha o nível lá em cima.
Aí chega "Serial Thrilla" entrando de voadora com os dois pés nos peitos! Uma mistura explosiva do funk de "Diesel Power" com a potência de "Smack My Bitch Up" que levaria até um aleijado pra pista de dança. "Mindfields" é mais climática, lembra algo como uma trilha de filme de espionagem ruim, e "Narayan" que a segue, extensa, cheia de variações, parece não corresponder ao tamanho de suas pretensões. Já a incendiária "Firestarter", é outro daqueles exemplos do punk aplicado a música eletrônica de maneira perfeita. Uma bomba, um coquetel molotov de samples sinuosos e ziguezagueantes, uma batida drum'n'bass aceleradíssima e perturbadora, e um vocal nervoso e ameaçador. A boa "Climbatize", crescente e bem elaborada, é uma boa ponte para o final do disco e "Fuel My Fire" que põe a tampa no caixão, ao contrário das demais que tinham doses de peso em músicas predominantemente eletrônicas, tem nos efeitos, samples e programações meros coadjuvantes para uma tijolada sonora conduzida por guitarras, baixo e bateria de verdade, além de vários convidados, numa espécie de festa punk de encerramento do álbum.
Que Kraftwerk, Silver Apples, Throbbing Gristle, Suicide, tiveram papéis mais importantes na história da música eletrônica, não existe discussão, que outros contemporâneos do Prodigy  como Chemical Brothers e Orbital tenham mais recursos e alternativas creio que não seja um absurdo afirmar, mas que "The Fat Of The Land" à sua maneira inaugurava naquele momento um novo capítulo na história do gênero, me parece que seja algo que não esteja muito longe da verdade.

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FAIXAS:
  1. Smack My Bitch Up (5:430
  2. Breathe (5:35)
  3. Diesel Power (4:18)
  4. Funky Shit (5:16)
  5. Serial Thrilla (5:11)
  6. Mindfields (5:40)
  7. Narayan (7:07)
  8. Firestarter (6:43)
  9. Climbatize (6:38)
  10. Fuel My Fire (4:19)

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Ouça:
Prodigy - The Fat Of The Land


Cly Reis

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

"Kraftwerk: Publikation - A Biografia", de David Buckley - ed. Seoman (2015)




"Nós falávamos a mesma língua (...)
Éramos Sr. Kling e Sr. Klang."
Ralf Hütter,
sobre quando conheceu Florian Schneider


"As ideias refletidas no nosso trabalho são internacionalistas e também
uma mistura de diferentes formas de arte (...)
a ideia de não separar
a dança aqui, a arquitetura ali e a pintura lá.
Nós fazemos tudo e a união da rte com a tecnologia
constituía o Kraftwerk..."
Ralf Hütter
sobre o trabalho da banda, em 2006



Se as caixas "The Catalogue" e, mais recentemente, a ao vivo "The Catalogue 3D" repassam musicalmente a carreira e  obra do grupo Kraftwerk, um dos mais importantes de todos os tempos pelo seu pioneirismo e definição de uma linguagem, a biografia "Kraftwerk: Publikation - A Biografia" de 2015, faz o mesmo em forma de palavras, indo ainda mais fundo do que as compilações, mergulhando nas origens do projeto chegando desde seus primeiros formatos e configurações.
O livro do autor britânico David Buckley faz uma retrospectiva cronológica desde o momento em que os então jovens Ralf Hütter e Florian Schneider decidem unir suas ideias e pretensões artísticas, até os dias de hoje quando já encontra o atual projeto 3D que baseou o último lançamento.
Fato é que a não ser que Ralf ou Florian resolvam em algum momento lançar suas próprias biografias, nenhum material será melhor e mais completo que "Kraftwerk: Publikation", uma vez que este traz colaboração substancial de uma das vozes de dentro do grupo, da formação clássica e idolatrada, nada mais nada menos do que Karl Bartos, percussionista e integrante desde 1975, que concordou em ser entrevistado e dar seus relatos e versões sobre fatos duvidosos e matérias até então obscuras da história da banda que permaneciam ainda sem esclarecimento exatamente pela característica tão arredia e reservada que seus integrantes sempre mantiveram com a imprensa.
Mas além de Bartos, o grande trunfo jornalístico do biógrafo, o livro ainda conta com depoimentos de pessoas ligadas à banda como o amigo Ralf Dörper e a artista gráfica Rebecca Allen; de contemporâneos como o pessoal do Can e do Tangerine Dream que transitaram na mesma incipiente cena vanguardista alemã; e ainda ex-integrantes como Wolfgang Flur, também da formação clássica; Michael Rother, ex- Neu! e integrante da primeira fase, e ainda Ebenhardt Kranemann, membro do breve período do Kraftwerk, pasmem!, sem Ralf Hütter.
O excelente trabalho de Buckley examina cada um dos discos (mesmo os mais antigos, pouco considerados pela banda) com nomes de capítulos criativos que remetem a cada um dando detalhes técnicos dos mesmos e contextualizando-os ao momento de seus lançamentos, revelando motivações, ideias e peculiaridades que levaram às suas respectivas concepção. A surpresa geral causada por "Autobahn"; o minimalismo de 'Radio-Activity"; o pioneirismo inigualável de Trans-Europe Expressl; a antecipação da disco com "The Man-Machine"; a antevisão da internet de 'Computer World"; o refugo em "Techno Pop" que viria a tornar-se "Electric Café" e a materializar-se conforme o pretendido apenas em "The Mix"; e a finalização de um projeto em "Tour de France Soundtracks", tudo é abordado em "Publikation" com muita pesquisa, informação e seriedade. E mais: curiosidades como os "dois Kraftwerks", a procura de Michael Jackson para uma parceria; os detalhes de seu acidente ciclístico de Hütter, sua personalidade centralizadora; e a demissão do músico português Fernando Abrantes por, supostamente, fazer uma mixagem muito original de "Music Non Stop" e dançar muito entusiasticamente fugindo do padrão caracteristicamente robótico da banda, são apenas alguns dos lances interessantes e marcantes da obra.
Com um volume caprichado, a edição nacional, além dos prefácios do próprio autor, e do ex-kraftwerk Karl Bartos, conta ainda com um prólogo do jornalista Camilo Rocha, ex-Bizz, e um muito legal do DJ Paulo Beto do projeto eletrônico Anvil FX. "Kraftwerk: Publikation" é uma viagem obrigatória pela longa autoestrada da carreira deste extraordinário grupo que, sem dúvida alguma, tem seu nome gravado com honras na história da música.


Cly Reis

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Kraftwerk – “Tour de France Soundtracks” (2003)





Ouvindo o álbum,
 você quase pode ouvir o som do vento
batendo no seu rosto”.
Jim DeRogatis,
crítico musical

“O Tour (de France) é como a vida:
uma forma de transe.
E o transe está baseado na repetição.
As máquinas são perfeitas para criar isso”
Ralf Hütter



Uma das definições do dicionário para "tecnologia" é: "Ciência cujo objeto é a aplicação do conhecimento técnico e científico para fins práticos". Porém, há também o entendimento de que tecnologia também é "o conjunto dos termos técnicos de uma arte ou de uma ciência". Juntando as duas subentende-se: é possível o ser humano criar arte a partir da tecnologia e vice-versa. Os papéis se confundem nessa hora.

Neste sentido, é interessante notar que todos os principais marcos da tecnologia dos últimos 200 anos criadas pela humanidade tenham se tornado música nas mãos do Kraftwerk. O trem do medley "Trans-Europe Express"/"Metal on Metal"; o rádio em suas mais diversas funcionalidades do disco "Radio-Activity"; o automóvel em “Autobahn”; o telefone em “Telephone Call”. Até a amplificação do som de um átomo eles forjaram (“Atom”, de “Kraftwerk 2”). Mas mesmo tendo sido responsáveis por legar à civilização moderna o imaginário dos sons de bits e bites dos computadores (em "Computer World", de 1981), a tecnologia que realmente encanta a dupla Ralf Hütter e Florian Schneider, as cabeças geniais do mítico grupo alemão, é a talvez mais lúdica e esportiva delas: a bicicleta. “Tour de France Soundtracks”, de 2003, último trabalho da econômica banda não apenas trabalha este tema como o explora de forma brilhante.

O passeio sobre duas rodas do Kraftwerk, contudo, começou em 1983, quando lançaram o single “Tour de France” em homenagem à tradicional competição ciclística. Uma ode à beleza do ato de pedalar e à interação do homem com a tecnologia, que traz uma base criada sobre a respiração uma humana, um ritmo funkeado envolvente e um magistral riff de teclado em tom alto, colorido. Traços mais do que sonoros e, sim, sensoriais, que põem o ouvinte a também percorrer as ensolaradas estradas francesas sobre o selim. De relativo sucesso à época, a faixa deveria fazer parte de um novo disco, projeto que foi substituído três anos depois por “Electric Café”. “Substituído” é o termo certo, pois não “descartado”. Duas décadas depois (o que, para os parâmetros krafterkianos não é um absurdo, haja vista que lançaram nesse ínterim apenas dois discos, sendo apenas um de inéditas), quando dos 100 anos da Tour de France, Ralf e Florian desengavetam um projeto comporem uma trilha sonora para um filme explorando todas as etapas da corrida, desde a preparação do atleta até o ápice.

O filme não saiu, mas nem precisava. As músicas substituem qualquer imagem. Ou melhor: as supõem, as suscitam. A narrativa é tão cinematográfica quanto – sendo sinfônica ao mesmo tempo. Ao estilo dos temas longos de abertura de álbuns, uma de suas especialidades (a exemplo de “Boing Boon Tschak”/”Tecno Pop”/”Music Non-Stop” de “Electric Café”, ou a faixa-título de “Autobahn”), inicia com um prólogo, que anuncia em notas espaciais, mas não dispersas, frases que dotarão toda a trilha. Em ritmo de house music e trazendo uma variação do riff original, a primeira etapa do tema central entra com a tradicional voz robótica do VoiceModeler operado por Florian. Isso tudo num charmoso francês, idioma usado em todas as letras e sentenças faladas. “Étape 2” e “3”, seguem na mesma batida, agora explorando as variações de textura do trance, mas tendo como base a mesma ideia sonora: os frisos do pneu da bicicleta girando e promovendo som, num transe. “Chrono”, última desta primeira parte, intercala momentos instrumentais com os elementos-chave da temática-base, terminando com o “robô” anunciando que foi dada a largada: “Les coureurs/ Chronométrés/ Pour l'épreuve/ De vérité/ Radio Tour information/ Transmission/ Télévision/ Tour de France…”.

Primeiro ato concluído, pista preparada para o Kraftwerk passear com sua arte. Desacelerando um pouco a intensidade da pedalada e introduzindo uma percussão metálica variante e multiforme, “Vitamin” é a primeira dos preparativos para a corrida – afinal, todo corredor que se preze tem de atentar ao que manterá a sua máquina em condições de prova. Ralf lê uma sequência de ingredientes de suplementos (“Adrenalin endorphin/ Elektrolyt co-enzym/ Carbo-hydrat protein/ A-b-c-d vitamin”), enquanto teclados cumprem percussão e o grave, pondo acima as texturas e o riff, que também não passa longe do de “Tour de France”.

Das melhores do disco, “"Aéro Dynamik" retomando a batida da parte introdutória, é a própria tradução do conceito homem-máquina representado pelo Kraftwerk desde que surgiram, no final dos anos 60, na industrial Düsseldorf: o corpo sonoro projetado no espaço como metáfora do movimento humano vencendo os átomos no ar. “Percussivo e dinâmico”, como define o próprio Ralf. A letra diz em francês o que é de fácil entendimento a qualquer língua, pois universal: “Perfection Mekanik/ Materiel et Technik/ Condition et Physik/ Position et Taktik/ Aero Dinamik”.  "Titanium", misto de trance e ambient, acrescenta-lhe uma leve variação rítmica e harmônica, enfatizando agora o metal extraforte utilizado para a fabricação das “magrelas”. A percussão torna-se ainda mais metálica, por óbvio, do que em “Vitamin”.

Das melhores do álbum e da carreira da banda, "Elektro Kardiogramm", começa dizendo a que veio. Batidas de coração são ouvidas em um ritmo interessante, rítmico. O ritmo do próprio corpo. E isso não é licença poética, pois são gravadas dos batimentos cardíacos do próprio Ralf Hütter enquanto pedalava! E a genialidade não para por aí: este som, orgânico e científico ao mesmo tempo, é sinterizado eletronicamente ao de uma respiração, também embalada pelo ciclo da pedalada. O riff, igualmente na mesma escala que circunscreve o de todas as faixas, é em tempo 3x4. Tudo isso encapsulado por uma batida que acompanha o fluxo sanguíneo, mas o embala ritmicamente. É de "Elektro Kardiogramm" que saem os versos “Minimum Maximum”, que dariam nome à turnê e ao disco ao vivo de 2005. Afinal, a verdadeira interação entre homem, natureza e tecnologia. Como diz o biógrafo da banda, David Buckley, que considera a faixa um dos pontos altos do disco, é “uma exploração sonora da unidade formada por ciclista e bicicleta, homem e máquina”.

"La Forme", mais introspectiva, impressiona pelo ar quase oriental de seu riff de teclados deslizante. A percussão, só no “chipô” e “bumbo”, igualmente econômica e nipônica, dão ainda mais classe a esta faixa, a qual remete a obras do passado da banda, como “Neon Lights” e “Computer Love”. Depois de preparar a forma, vem a recuperação do corpo. Esta engata com "Régéneration", vinheta preparatória que faz a ponte entre a última meditação antes de lançar-se na prova de fato. É chegada a hora da magnífica "Tour de France", tal qual fora composta em 1983, porém repaginada pela limpeza da sonoridade digital ainda não alcançada àquela época. Das maiores peças pop de todos os tempos, é o símbolo e o ápice da ideia de interação homem e tecnologia. Respirações ofegantes de ciclistas são intensificadas no electrobeat – que retraz a batida pontilhada de “Numbers” –, enquanto o som de um baixo com slaps é recriado eletronicamente e os teclados passeiam pela paisagem, transmitindo cor e liberdade. “Dá quase para sentir o ácido lático se acumulando nas pernas enquanto a música se desenvolve”, brinca Buckley numa passagem do livro “Kraftwerk Publikation: a biografia”.

Suave e deslizante, “Tour de France Soundtracks” resgata em parte a bagagem do grupo criador da eletro music: a sonoridade elegante e limpa, a valorização do ritmo, a perfeição dos detalhes, a exploração das texturas sonoras e o conceito globalizado e integral que pontua toda a obra de menos de 10 álbuns mas de vasta influência na música moderna. Há quem torça o nariz para este disco, alegando que deixa a desejar em relação aos trabalhos antológicos do Kraftwerk como “The Man-Machine” e “Trans-Europe Express”. Talvez um pouco de preconceito pela ausência de Karl Bartos e Wolfgang Flur, “percussionistas” da formação clássica – substituídos aqui pelos engenheiros de som (mas que se mostram músicos altamente competentes) Fritz Hilpert e Henning Schmitz. Quiçá também a vulgarização natural ocorrida pelo avanço da computação no século XXI (o que, em música, o Kraftwerk é corresponsável nos últimos 50 anos, diga-se) tenha deixado a impressão de que a banda ficara ultrapassada. Pensamentos compreensíveis, pois deles sempre se espera o mais do que de qualquer outro. Soma-se a isso ainda o fato de raramente lançarem alguma coisa, o que aumenta ainda mais sua mítica e, automaticamente, a cobrança.

Porém, como disse o jornalista inglês Chris Jones, “se você (assim como eu) ainda encara o Kraftwerk como uma divindade que deu ao mundo algumas das mais encantadoras e influentes músicas eletrônicas de todos os tempos, então vai amar este disco”. Afinal de contas, conclui sabiamente o designer e fã ardoroso dos alemães Peter Saville: “mesmo um álbum medíocre do Kraftwerk é um trabalho de uma genialidade sublime”. Caso de Tour de France Soundtracks”, onde a capacidade humana opera com a tecnologia a serviço da mais bela arte, seja ela vinda de seres vivos ou artificiais.
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FAIXAS:
1. "Prologue" (Ralf Hütter/Florian Schneider/Fritz Hilpert) - 0:31
2. "Tour de France Étape 1" (Hütter/Schneider/HilpertMaxime Schmitt) - 4:27
3. "Tour de France Étape 2" (Hütter/Schneider/Hilpert/Schmitt) - 6:41
4. "Tour de France Étape 3" (Hütter/Schneider/Hilpert/Schmitt) - 3:56
5. "Chrono" (Hütter/Schneider/Hilpert/Schmitt) - 3:19
6. "Vitamin" (Hütter/Schneider/Hilpert) - 8:09
7. "Aéro Dynamik" (Hütter/Hilpert/Schmitt) - 5:04
8. "Titanium" (Hütter/Hilpert/Schmitt) - 3:21
9. "Elektro Kardiogramm" (Hütter/Hilpert) - 5:16
10. "La Forme" (Hütter/Hilpert) - 8:41
11. "Régéneration" (Hütter/Hilpert) - 1:16
12. "Tour de France" (Hütter/Schneider/Schmitt/Karl Bartos) - 5:12

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OUÇA O DISCO:






domingo, 16 de junho de 2013

Kraftwerk - "Computer World" (1981)



"Computar é a maior diversão"


Sim, definitivamente eles são homens do futuro! Eles voltaram do futuro e caíram no século XX, quando os computadores ainda eram equipamentos complexos, possuídos apenas de grandes empresas ou de poucos privilegiados, alguns de porte gigantesco, elemento do imaginário de ficções científicas, para nos contar que este mesmo mundo estaria interligado por estes aparelhos, em rede, que estaríamos todos vigiados sem privacidade, que seríamos todos catalogados e reconhecidos apenas por números, que alguns tantos amariam estas máquinas  como se fossem pessoas, que o maior prazer de muitos seria ficar diante de uma tela e que teríamos aparelhos portáteis que nos tornariam praticamente... robóticos.
Loucura?
Podia parecer.
Mas não se cumpriu?
(Só não somos, exatamente, 'operadores' de calculadoras portáteis, mas sim de mini-computadores de mão multifuncionais, o que no espírito da coisa, da praticamente na mesma)
Sim, por meio de um disco, “Computer World” de 1981, os robôs do Kraftwerk antecipavam tudo isso. Depois de terem anunciado a tecnologia da comunicação, a mecanização da sociedade, a intensificação do trânsito nas grandes cidades, eles então nos diziam que o mundo seria dominado pelos computadores. Sim, sem dúvida eles vieram do futuro. Sempre achei que não eram humanos, mesmo.
E as músicas? Ah... Sinfonias modernas com a cara dos novos tempos. Minimalismo, detalhe, construção, ousadia, genialidade. De um brilhantismo e uma leitura atualíssima ainda hoje, em pleno século XXI. Bom, talvez porque ainda não tenhamos chegado ao tempo em que elas foram produzidas.

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FAIXAS:
1. Computer World
2. Pocket Calculator
3. Numbers
4. Computer World ..2
5. Computer Love
6. Home Computer
7. It’s More Fun to Compute


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Ouvir:
Kraftwerk Computer World


Cly Reis

terça-feira, 6 de março de 2012

Kraftwerk - "Trans-Europe Express" (1977)




"Os fundamentos da moderna música eletrônica dançante estão todos neste disco."



“Ah, mas já tem um Kraftwerk nos AF, não viste ? é o "Radio-Activity"!” Vi sim, criatura, mas aonde é que tá escrito que cada artista só pode ter um Álbum Fundamental, hein ? Bom, devo dizer que meu primeiro contato com esta obra foi através de uma fita que não sei quem me emprestou e no final das contas não cheguei a escutar. Tempos depois resolvi comprar no setor de discos das lojas Renner, ali no centro de Porto Alegre, subsolo. Cheguei em casa e coloquei o LP para tocar. E é um disco bárbaro de somente 7 faixas ! Como todo álbum fundamental tem começo, meio e fim e cada música cumpre essa função magistralmente.  Este disco é o resultado de 5 álbuns anteriores, e pode-se notar escutando-os (que comprei todos depois desse) que a base das idéias já estavam contidas lá, mas lhes faltavam recursos técnicos e tecnológicos para chegar ao ponto que chegaram nesse disco. Os fundamentos da moderna música eletrônica dançante, sequenciadores, batidas, climas estão todos ai nesse disco de 77. Inicia com “Europe Endless”, que serve como cartão-de-visitas do disco. Esta música lança os fundamentos de toda uma geração que iria despontar como astros pop 10 anos depois. Tem um “linha de baixo” marcante e pontilhada por sequenciadores e uma bateria eletrônica que vão dando o clima de viagem que marca todo o disco. Em seguida vem “Hall of Mirrors” a música da Starsax “o calçado da geração jeans” como era conhecida a música no Rio Grande do Sul, pois era a trilha sonora de um comercial de sapatos para o público jovem na década de 80. É uma música bem mais lenta que a anterior mas que possui um clima muito bem elaborado e que se for possível deve ser escutada com fones de ouvido pra sentires os efeitos passeando pela tua cabeça. E o lado A do disco termina com “Showroom Dummies” que é uma música bem estranha, que se pode considerar o primeiro “reggae eletrônico” do mundo, por falta de definição melhor. Vira-se o disco e começa o lado B com “Trans-Europe Express” que com sua batida hipnótica e teclados que de vez em quando marcam climas um tanto sinistros, mas ótimos e uma voz que repete Trans-Europe Express e vai narrando por onde esse trem já teria passado. E esta música já emenda na “Metal On Metal” que essa sim, mãe de todos os sons que nos anos 90 viriam se chamar de industriais etc e tal. Toda pessoa que já foi a uma indústria percebeu que as máquinas possuem um ritmo de trabalho e um som e é isto que essa música faz, reproduz o ritmo industrial pela música. Para mim é a música mais linda deste disco. Depois dessa faixa bem marcada, vem um exercício musical eletro-clássico chamado “Franz Schubert”, muito interessante e que serve de ponte para a musica final do disco (ou vinheta) que é a “Endless Endless”. Termina o disco e eu me levanto e aplaudo de pé !

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FAIXAS:
1. "Europe Endless" (9:35)
2. "The Hall of Mirrors" (7:50)
3. "Showroom Dummies" (6:10)
4. "Trans-Europe Express" (6:52)
5. "Metal on Metal" (6:44)
6. "Franz Schubert" (4:25)
7. "Endless Endless" (0:55)

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Ouça:
Kraftwerk Trans-Europe Express



quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Kraftwerk - "Radio-Activity" (1975)



"O Kraftwerk é tão influente quanto os Beatles na música popular na segunda metade do século XX."



Eles são uma espécie de últimos herdeiros da tradição musical alemã. Filhos indiretos de Schubert, Bach e Beethoven. Representam ainda hoje um patamar elevado de vanguarda, experimentação, originalidade e ousadia no que diz respeito a método e técnica, e de concretismo e minimalismo no tocante à linguagem; sem renegar, contudo, sua evidente influência da música clássica, na qual sempre mantém um pezinho mesmo quando levam sua sonoridade industrial aos limites.
O Kraftwerk, especialmente nos anos 70, tratou de 'humanizar" sons mecânicos, industriais, tecnológicos e dar vida ao que não tinha som até então. E que ironia, logo eles com seu aspecto, comportamento e sonoridade quase mecânicos.
Foi assim com "Radio-Activity", álbum conceitual, todo concebido a partir do tema básico ENERGIA. Ela e seus usos, resultados, reflexos e consequências, sendo explorados em todas as suas formas e meios de emissão, propagação, produção, etc. "Radio-Activity" vai de ondas de rádio a materiais radioativos; de simples sinais sonoros a energia nuclear. A genial abertura, por exemplo, é um contador geiger que aproximando-se da fonte de radiação, acelera seu sinal e por fim incorpora-se à percussão da faixa-título, "Radioactivity".
As composições minimalistas e mais ritmadas que nos álbuns anteriores, inserem perfeitamente o disco no contexto pré-punk da metade dos anos 70. "Airwaves", uma das melhores, é exemplo evidente da proposta e daquele panorama musical. Acelerada, palpitante, com um ritmo mais agressivo e constante.
Já "Radioland", antecipa a tendência dark do início dos anos 80 com uma batida marcada e ôca; soturna e sombria.
Faixas como "News" e "Radio Stars", podem ser subestimadas numa primeira audição, parecer meros ruídos ou repetições cansativas, mas se bem ouvidas e analisadas com a devida atenção, revelam uma musicalidade muito peculiar, só que nós, meros mortais (excessivamente humanos) não teríamos descoberto isso sozinhos até que alguém resolvesse chamar de música.
Ainda a se destacar a ótima "Antenna" com sua levada mais elétrica, também já influenciada pelos punks precoces, e a derradeira "Ohm Sweet Ohm", mais uma homenagem ao rádio, numa melodia que cresce de um ritmo melancólico a um final grandioso.
A capa é outro elemento interessante: além do nome dúbio (rádio + atividade), a arte é de uma simplicidade e de uma genialidade admiráveis. Uma frente de rádio antigo na capa, e na contra, a parte de trás do aparelho. Só isso. E precisava mais? Tecnologia, energia, evolução, modernidade, comunicação, música... tudo ali. Imagens que valem por muitas palavras e suscitam inúmeros sons.
O mais incrível é, hoje, a gente ouvir qualquer coisa, não apenas da cena eletrônica mas mesmo do universo pop e rock e ver que ali tem Kraftwerk; desde um conceito, um ruído, uma base, um sampler, uma ideia. Talvez só encontremos tamanha evidente influência no universo pop-rock com os Beatles.
Kraftwerk está em tudo!
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FAIXAS:
  1. "Geiger Counter" – 1:07
  2. "Radioactivity" – 6:42
  3. "Radioland"– 5:50
  4. "Airwaves" – 4:40
  5. "Intermission"– 0:39
  6. "News"– 1:17
  7. "The Voice of Energy" – 0:55
  8. "Antenna" – 3:43
  9. "Radio Stars"– 3:35
  10. "Uranium"– 1:26
  11. "Transistor" – 2:15
  12. "Ohm sweet Ohm" – 5:39
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Ouça:
Kraftwerk Radio-Activity


Cly Reis

segunda-feira, 23 de março de 2009

Kraftwerk - Festival Just A Fest - Praça da Apoteose - RJ (20/03/09)




Há algum tempo atrás fui assistir a uma apresentação "despretensiosa" em um domingo de manhã no Parque Farroupilha, em Porto Alegre, de Paulinho da Viola e surpreendentemente, pra mim que já tinha visto U2, Madonna, Cure ao vivo, aquele pequeno show superou em qualidade estes de monstros do pop rock, os quais aprecio muitíssimo. O show do sambista brasiliero só veio a ser superado na minha avaliação, pelo do Pearl Jam em Porto Alegre em 2005. Nem gostava tanto dos caras na época mas fui ver só porque há tempos não havia um show grande em POA e aquela era uma oportunidade, e, NOSSA!, o Pearl Jam destruiu! Quase pôs a baixo o Gigantinho. Um repertório consagrado e de tirar o fôlego, com uma intensidade, vibração e garra que foram de arrepiar, incrementado pela participação de Marky Ramone tocando bateria em "I believe in miracle" dos próprios Ramones. Aquilo foi quase inacreditável.

E eis que na última sexta-feira o Peral Jam perdeu o seu trono!

Sempre tivera grande expectativa para ver ao vivo o Kraftwerk, mas às vezes, a própria expectativa exagerada frustra. Que nada!!! Kraftwerk ao vivo foi tudo o que eu imaginava, queria ver e ouvir ( e + um pouco ainda!).
Pra quem acha que um show do Kraftwerk não passa de quatro caras parados mexendo nos seus laptops com programações pré-gravadas e com um monte imagens passando num telão ao fundo, não nota, com certeza, a profundidade, a penetração, o trabalho de composições que são preciosas e elaboradas, e que são executadas AO VIVO (sim) com a precisão de um relógio, de uma máquina, que é exatamente o conceito com o qual o grupo trabalha, e que é lógico, traz bases pré-gavadas também, mas até mesmo o próprio Radiohead que viria depois apresentava este recurso também. As imagens projetadas, por sua vez, são parte componente do espetáculo, uma vez que estão sincronizadas às letras, a ruidos, às batidas de forma ativa e integrada e se por uma lado, não se vê uma performance ativa e vibrante dos membros da banda, o contexto visual o faz por eles. E é essa a idéia!
"The Man Machine" na abertura já sai dando esse recado: nós somos "homens-máquina", e daí pra frente são só clássicos e composições geniais. "Radioactivity" destruidora com seu conceito RADIO-RADIOATIVIDADE-ENERGIA perfeitamente integrado em som, imagem e performance, "Trans-Europe Express" emenda "Metal on Metal" em outra seqüência de arrepiar, "Aerodynamic" como parte de "Tour de France" trouxe fotos antigas e trechos de filmes antigos da volta ciclística da França, que interagiam admiravelmente com a música. "Showroom Dummies" cantada em francês virou "Les Manequins" e completou o passeio musical de moda e estilo da banda com "The Model".
Depois de um intervalinho em que a banda sai do palco, eles retornam em roupas com detalhes fosfluorescentes lembrando o visual do disco "Electric Café" e, acabam o show exatamente com uma música deste álbum, "Music Non Stop", como sempre toda misturada com "Boing Boom Tschak" e Technopop".
A propósito deste intervalo, todo mundo está careca de saber que em algum momento os robôs vão ser colocados no palco e vão se mover naquela espécie de balé mecânico, mas é sempre uma expectativa vê-los e é um barato quando eles substituem a banda no palco durante "Robots", pelo tempo suficiente para aquela pausinha para a água. Afinal de contas, eles também são gente. (?)

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OUTROS TOQUES:

1. Nem com o Cure que é minha banda do coração fiquei tão REPLETO quanto, agora, assistindo ao show do Kraftwerk.

2. Felizmente cheguei ao Sambódromo já ao final do show do Los Hermanos e só tive que agüentar duas músicas. Nossa! Eles me impressionaram! São muito PIORES do que pareciam.
É muito ruim!

3. Minha intenção antes de ver o show dos alemães era a de ficar mais um pouco no show do Radiohead, pelo menos pra ver os caras tocando "Creep", mas acabando o show dos "robôs", me pergunta se eu, com a alma cheia, vou ficar vendo Radiohead? Quem vê Kraftwerk não fica pra ver Radiohead.

4. Não fui o único a ir embora. É lógico que não esvaziou o local, não ficou às moscas, mas notei pelos menos umas 50, 60 pessoas indo embora. Outros que, como eu, não precisavam de mais nada.

5. Todo mundo sabe da influência do Kraftwerk para a música eletrônica em geral, mas por esses dias, vendo as publicações que faziam referência ao show, li algumas manifestações impressionantes, mas que não ficam muito longe da verdade, como por exemplo que o Kraftwerk seria possivelmente a banda mais influentes do século passado ao lado apenas dos Beatles e também li que figuraria entre as cinco maiores bandas de pop/rock de todos os tempos. Exagero? Provavelmente não.

6. Complemento dizendo que na minha opinião a música do Kraftwerk é a continuidade da tradição alemã de música clássica representada por nomes como Händel, Bach, Orff entre outros, tendo dado o passo adiante em modernidade que é necessário em todas as épocas, para todas as artes, em todas as culturas, fazendo a interação de linguagens como a arquitetura, as artes-plásticas, o design e a tecnologia alemãs, traduzindo todos estes elementos em MÚSICA.


Cly Reis

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Kraftwerk confirmado





Confirmado!!!
Os "robôs" estão de volta.
Agora já está até no site do festival. O tal do JUST A FEST vai ter Los Hermanos (aaarrgghhh!!!), um tal de Vanguard que eu nem sei do que se trata e a "atração principal", o Radiohead. Mas cá entre nós, a atração principal fica por conta dos 'homens-máquina" do Kraftwerk, tanto é que nem o próprio site do festival consegue esconder colocando na página de divulgação do evento e venda de ingressos, logo a seguir da chamada do Radiohead a informação: "CONFIRMADA PARTICIPAÇÃO DO KRAFTWERK".
É pelo que todos estão esperando na verdade.


Dêem uma olhada aí no site do festival

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Kraftwerk volta ao Brasil



Ao que parece, surpreendentemente, o grande Kraftwerk volta ao Brasil em março, e incrivelmente, ABRINDO para o Radiohead.
É, parace piada que um mito como o Kraftwerk não seja a atração principal em um evento junto com uma banda que não é lá tudo isso, como é o caso do pessoalzinho do seu Yorke.

Mas tudo bem! O importante é que venha!
Não está 100% confirmado. O site do tal do festival Just a Fest diz que as atrações convidadas ainda estão por confirmar, mas várias outras fontes como jornais e sites já listam os alemães como uma das atrações do festival.
O evento deve acontecer apenas aqui no Rio, no dia 20 de março, e em São Paulo no dia 22.
Vou esperar ainda a batida de martelo quanto ao Kraftwerk mas, em se confirmando, vou tratar de garantir o meu ingresso.