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sábado, 1 de março de 2025

"Conclave", de Edward Berger (2024)


GANHADOR DO OSCAR DE
MELHOR ROTEIRO ADAPTADO
 

Existem algumas máximas quando se fala em cinema. Uma delas é: "isso acontece só mesmo em filmes". "Conclave", do diretor suíço Edward Berger, por melhor que seja - e é, sim, um filme bastante apreciável - não escapa de trazer à mente esse quase subterfúgio mesmo numa história baseada em fatos verídicos.

Na trama, com a morte do Papa, o Cardeal Lawrence (Ralph Fiennes) reúne um grupo de sacerdotes para eleger seu sucessor. Cercado por líderes do mundo todo nos corredores do Vaticano, e cada vez mais invadido pelo desejo de tornar-se Papa, ele descobre uma trilha de segredos profundos que podem abalar os fundamentos da Igreja Católica.

A boa atuação de Fiennes como protagonista (um dos 8 Oscar pelo qual "Conclave" concorre e passível de ganhar, o de Melhor Ator) e os excelentes trabalhos de arte, figurino e fotografia, que exploram as simetrias e composição visuais do pictorialismo secular da Igreja, ajudam a sustentar muito bem a trama de suspense que se cria em torno dos bastidores da escolha de um novo Sumo Pontífice. 

Contudo, o final, deixa a desejar. Embora funcione para a lógica do filme, cuja narrativa faz com que se torne crível a eleição de um/a papa/papisa para o sagrado - e misógino - posto do Vaticano, na vida real é muito pouco provável que tal "escárnio" acontecesse. 

Num ambiente altamente político e polarizado como o filme mostra e faz crer, onde a sede pelo poder é levada às últimas consequências (inclusive, incriminar o representante da Nigéria por puro racismo para tirá-lo do páreo, como se sucede), não é possível imaginar que deixassem incólume um cardeal de esquerda, desconhecido e envolto em mistérios só porque o antigo Papa o indicou. Ele sequer avançaria de fase no conclave, quanto menos vencer o pleito da Santa Sé. Indicação do Papa? Diriam: “Que se dane! Afinal, morto não fala (só Jesus)”.

Aquelas cobras vestidas de santidades, ainda mais os da ala reacionária e conservadora representada na figura do Cardeal de extrema-direita, Goffredo Tedesco (Sergio Castellitto), jamais iriam deixar que isso acontecesse se seus personagens não fossem "de mentirinha". Estes tipos odeiam minorias e se sentem - justificadamente - ameaçados por elas. Eles vasculhariam a vida do adversário. Fosse para valer, na segunda ocasião que o arcebispo mexicano, Cardeal Benitez (vivido por Carlos Diehz) tivesse obtido algum destaque diante do grupo, configurando-se em uma ameaça mesmo que incipiente - fato que ocorre no filme, quando este resolve pacificamente a discussão em torno da punição aos insurgentes externos à basílica - já teriam dado um jeito de lhe limar. O motivo para isso não seria nem difícil de encontrar, até porque, Cardeal Benitez não era um mentiroso, só mantinha discrição.

A sensação que se tem é a de que, faltando um argumento capaz de impactar no momento essencial do clímax, a solução a qual se recorreu para o final foi esta: um descuido da Igreja. Pouco razoável para uma instituição que sempre soube muito bem se blindar de tudo que lhe fora perigoso para sua manutenção por séculos, inclusive da própria tentativa de mulheres ao cargo. Recuperando-se um pouco da História, é sabido que a Igreja submetia os candidatos a Papa a um constrangedor teste nas partes íntimas para verificar quem tinha colhões ou não (supõe-se que o autor da obra original e o roteirista saibam disso). 

Talvez hoje no Vaticano se valham de alguma tecnologia menos invasiva e não precisem recorrer mais a métodos tão arcaicos para obter o mesmo resultado - mas que devem se precaver de alguma maneira, devem. O fato é que o desfecho de “Conclave” é daqueles que passa por verdade somente em cinema, pois dificilmente aquela gente esperta e manipuladora se deixaria ser enganada tão vergonhosamente. Isso pesa para um filme que, mesmo bom, presta-se a ser realista.

Fosse preciso, na vida real, a Santa Igreja descobria de um jeito ou de outro o segredo do Papa "não-homem": com constrangimento ou não. (Se bem que, em se tratando da Igreja, é bem possível que ainda queiram manter sádicas "tradições"...)

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trailer de "Conclave"


"Conclave"
Título Original: "Conclave"
Direção: Edward Berger
Gênero: Drama/Suspense
Elenco: Ralph Fiennes, Stanley Tucci, John Lithgow, Sergio Castellitto, Isabella Rossellini
Duração: 120 min
Ano: 2024
País: Reino Unido/Estados Unidos
Onde assistir: Cinemas

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Daniel Rodrigues


segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

"Nada de Novo no Front", de Edward Berger (2022)

 

VENCEDOR DO OSCAR
MELHOR FILME INTERNACIONAL
MELHOR ROTEIRO ADAPTADO
MELHOR FOTOGRAFIA
MELHOR TRILHA SONORA ORIGINAL


Nada de novo...

O título do filme já antecipa o que temos em pouco mais de duas horas. 

"Nada de novo no front", produção da Netflix, com nove indicações ao Oscar, incluindo melhor filme e melhor filme internacional, na minha opinião, é apenas mais um filme de Primeira Guerra Mundial. Bem feitinho, bem acabado, bem desenvolvido, ok, mas sinceramente, já vi coisas melhores acerca do assunto e muito mais impactantes visual e dramaticamente. "Lawrence da Arábia", de David Lean, e todo seu deslumbre cinematográfico; "Glória Feita de Sangue", de Kubrick, com toda sua questão ética e humana; o recente "1917", de Sam Mendes, com sua corajosa proposta de filmagem contínua. Todos, para mim, mais impactantes que o novo "Nada de Novo no Front", refilmagem do clássico de 1930, de Lewis Milestone. 

Não me entendam mal: o filme não é ruim. Boa direção, bela fotografia, tem toda a questão humana do "roubo" da juventude, do desperdício de vidas promissoras, enquanto velhos barrigudos com bigodes retorcidos decidem a vida desses jovens como se fossem peças de um joguinho de tabuleiro, mas parece que não tem nada muito além disso, e isso a gente vê em um monte de filmes de guerra.

Na história, um grupo de jovens idealistas, alista-se no exército alemão com a expectativa de heroísmos, glórias e honras à pátria mas, assim que pisam no campo de batalha percebem que a realidade não seria o jardim de infância que imaginaram. Expostos a inúteis e suicidas missões de ataque, tudo que os garotos encontram pelo caminho é, simplesmente, barbárie, crueldade, mutilações, fome, frio, dor e morte, em meio às trincheiras e os campos gelados no norte da França. Paralelamente aos combates, burocratas e militares, devidamente protegidos e abrigados em suas mansões ou instalações especiais, decidem, sem pressa e com indiferença sobre um possível cessar-fogo, ao redor de suas mesas fartas e bem servidas.

Retrato típico do que representa uma guerra, ainda nos dias de hoje, mas muito mais naquela época em que os combates se davam diretamente, no corpo a corpo e em campo aberto: velhos generais em gabinetes entregando jovens à morte, em nome de soberania, territórios, orgulho, religião, ou seja lá o que for. Enquanto via o filme, e ainda agora, lembro muito da letra de "A Canção do Senhor da Guerra", de Renato Russo muito precisa na descrição dessa situação: "Existe alguém que está contando com você/ pra lutar em seu lugar já que nessa guerra / não é ele quem vai morrer/ E quando longe de casa/ ferido e com frio o inimigo você espera/ ele estará com outros velhos/ inventando novos jogos de guerra". E não é isso mesmo?

"Nada de novo no front" pode sair da cerimônia do Oscar, no dia 12 de março, consagrado e com um caminhão de estatuetas, mas não vai mudar muito minha impressão sobre ele... Um bom filme, legal, terror da guerra, beleza, mas... para mim, deixa aquela impressão de "já vi esse filme antes". Sem nenhuma novidade no Oscar.

No alto, à esquerda, o jovem Paul, entusiasmado por ingressar no exército
 ao lado, a belíssima fotografia numa das cenas de combate;
abaixo, dois dos momentos mais intensos e chocantes do filme:
os tanques avançando sobre as trincheiras e os soldados franceses
usando lança-chamas contra o que os blindados não conseguiram amassar.



Cly Reis