Curta no Facebook

Mostrando postagens com marcador Vágner Rodrigues. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Vágner Rodrigues. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

"Matthias & Maxime", de Xavier Dolan (2019)

 



Que filme bem pé chão, para se assistir de boa. Quase faz você se sentir dentro das festas do grupo de amigos do filme, rindo, se constrangendo, ficando com raiva e sentindo a tensão no ar.  Dolan, diminui um pouco sua empolgação em querer mostrar que sabe muito de cinema e volta ao “comum” (mesmo tento alguns “dolanismos” no longa), e que bom que ele faz isso.

"Matthias e Maxime" são amigos de longa data cujo relacionamento é testado quando atuam em um curta-metragem cujo roteiro exige que eles se beijem o que acaba fazendo com que ambos questionam suas identidades sexuais quando a experiência desperta sentimentos há muito adormecidos de um pelo outro.

Eu não acho correto dizer; “Que filmes de Dolan não são para todo mundo”, porque qualquer filme, por melhor ou pior que seja, pode servir para qualquer pessoa, mas que Dolan tenta impor uma linguagem mais poética, rebuscada, "artística” em sua obra, isso não se pode negar. Sabe o aluno mais inteligente da sala, que sempre quer ir no quadro responder as questões dos Professores, para mostrar que sabe da matéria? Esse e Xavier Dolan. Temos bons personagens que são muito bem apresentados. Apenas achei as questões familiares de Max pouco proveitosas. Se por um lado nos passa mais empatia com em relação ao personagem, por outro, são de pouco gsnho para a evolução do filme. A relação com a mãe e com o irmão, acaba tendo muito tempo de tela, e, no entanto, nada é resolvido.

As atuações não são espetaculares mas são bastante naturais e sentimos a energia do grupo de amigos. As cenas, muito bem dirigidas, nos colocam, muitas vezes, dentro das festas como se fossemos mais um dos membros do grupo. Mesmo com seus exageros, não tem como não exaltar a competente direção de Dolan. Seus enquadramentos são muito bem pensados e dialogam muito bem com a narrativa. Na maioria dos enquadramentos em que temos Max e Matt em cena juntos, há algo, objeto ou pessoa, entre os dois, mostrando, não somente com o texto mas também com a imagem, como é difícil para os dois ficarem juntos, por mais próximos que estejam. Até mesmo na principal cena, a do beijo, a câmera fica entre os dois.

Perto, porém longe.

Parece simples o longa mas não é.  Somos “enganados” pela naturalidade do filme, por seu texto ser simples e direto, mas é um cinema muito bem feito. Texto e imagem em uma união perfeita. A abordagem sobre a sexualidade e os sentimentos que os rapazes sentem um pelo outro é bem desenvolvida,  a relação tem crescimento e Dolan não tem pressa em acelerar as coisas. E o melhor: tendo a temática LGBTQ, o longa não termina numa tragédia, ninguém morre ou sofre grave acidente, como de clichê de  diversos longas nessa temática. O “problema” aqui é interno. É o saber de si.

Quando chegamos na fase saindo da adolescência, entrando na fase adulta, o mundo cobra muito para que já tenhamos tomado todas as decisões na vida, com o futuro completamente traçado, mas sabemos que não é assim, ainda mais quando nem conhecemos a nós mesmos direito. Confuso, não é? Dolan consegue fazer muito bem um recorte dessa época da vida onde não basta você se aceitar, ainda ter que lutar para ter aceitação da sociedade e de viver em padrões definidos. É complicado isso mas é fundamental para sua felicidade e o primeiro passo é se aceitar do seu jeito. O mundo que lute.

Uma bela direção de arte.
(Obs: Tem uma personagem no filme que pode ser vista como uma autocritica do diretor,
 ou ele apenas está tirando sarro da visão que os críticos de cinema tem dele)



por Vagner Rodrigues


segunda-feira, 19 de outubro de 2020

"O Diabo de Cada Dia", de Antonio Campos (2020)

 


Um pastor profano (Robert Pattinson), um casal perverso (Jason Clarke e Riley Keough) e um xerife corrupto (Sebastian Stan) são alguns dos habitantes sinistros de Knockemstiff, uma região remota de Ohio onde o jovem Arvin Russell (Tom Holland) enfrenta as forças externas que ameaçam sua família.

Como diria o pensador moderno, Paulo Ricardo do grupo RPM: “Até onde vai à sua fé?”. "O Diabo de Cada Dia" consegue criar algo muito interessante colocando no liquidificador violência, religião, vingança e sexo, nos entregando, ainda, no final, um prato saboroso, de comer rezando de joelhos (Está bem, não é para tanto é pecado de minha parte dizer isso).

É um ótimo estudo de personagens pois “O Diabo de Cada Dia” consegue nos mostrar a psique de alguns deles, nos atraindo para dentro da história. Para alguns, o longa pode ser arrastado e monótono, para outros, contemplativo, e confesso que, para mim, ele fica no meio termo. Alguns momentos ele acerta em diminuir o ritmo, e apostar no silêncio, em outras, dá até sono.

Muito interessante a forma como a religião liga os personagens e suas vidas, tanto seus passados e presente quanto o futuro, e essa ligação acaba sendo o diferencial do filme. A fé é usada como ferramenta e justificativa para quase todos os atos dos personagens principais, e quando ela não é utilizada diretamente, ela serve como “gatilho” para ações. 

Supernormal construir um santuário para
obrigar seu filho a rezar todos os dias...

Um elenco cheio de estrelas onde todos acabam tendo um bom tempo de tela, sendo que o destaque vai para Robert Pattinson que faz um pastor que, de longe, é um dos personagens mais odiosos; e para Tom Holland, que vive afetado pelo fantasma de seu pai, um extremista religioso, aliás um típico extremista.

Mesmo com seu ritmo uma tanto vagaroso, “O Diabo de Cada Dia” consegue nos prender com seu roteiro bastante envolvente. O longa traz um bom debate sobre a influência da religião na vida das pessoas, mostrando como ela pode ser usada para manipulá-las e, ao invés de incentivá-las a fazer o bem, pelo contrário, tirar delas o que estas têm de pior. Mostra como muitos acabam seguindo cegamente a um líder religioso e aceitando toda e qualquer interpretação que esse líder tem das “palavras de Deus”, a utilizando da forma que mais lhe convém. 

Um filme em que pode-se dizer que não tem mocinho, nem vilão. É cada um fazendo as coisas para o seu próprio bem e, até mesmo você, espectador, vendo a mesma atitude de diferentes personagens, pode julgar uma forma como correta a outra não. Bem fechadinho, ótimo estudo de personagem e cenário, “O Diabo para Cada Dia” é uma ótima pedida para os adoradores da Netflix, Amem!!!

Dois homens que seguem a palvra de Deus.
Pelo menos aos olhos deles mesmos.



por Vagner Rodrigues


quinta-feira, 4 de junho de 2020

"Os Miseráveis", de Ladj Ly (2019)



Toda violência gera um pouco de tensão e essa obra, "Os Miseráveis", é carregada disso: tensão!

Stéphane (Damien Bonnard) é um jovem que acaba de se mudar para Montfermeil e se junta ao esquadrão anti-crime da comuna. Colocado no mesmo time de Chris (Alexis Manenti) e Gwada (Djibril Zonga), dois homens de métodos pouco convencionais, ele logo se vê envolvido na tensão entre as diferentes gangues do local.

Com um ar bem documental, “Os Miseráveis” se torna bem realista, e nos coloca nas ruas juntamente com os personagens em suas ações poiciais. Embora esse clima de tensão seja aquilo de que mais gostei no longa, em alguns momentos ele parece tentar ser documental demais usando, por exemplo, câmera na mão em momentos frenéticos e o resultado é que o espectador acaba ficando um tanto perdido na cena. Fica tudo muito perto, a câmera fica tremendo tanto que chega a dar até tontura.

Policial bom, policial mau e tudo misturado.
O filme é mais um trabalho que se destaca pelo teor crítico. Ele consegue nos passar um visão bem direta dos problemas sócias da periferia de Paris, apresentando os problemas das diferenças de etnias, de religiões, de gangues e seus conflitos constantes, o que é agravado, como se não bastasse tudo acontecer numa zona muito pobre, pelo fato de contar também com uma polícia extremamente violenta. "Os Miseráveis" mostra que Paris, não é apenas cidade luz e dos casais apaixonados, ela também tem o lado preto, pobre e oprimido (infelizmente, como a maioria dos lugares).

Achei fantástica a escolha do diretor em não deixar os personagens unidimensionais. (Eu falo bastante sobre isso né?). Temos, sim, um pouco da mecânica do policial bom e o policial mau, mas a linha entre dois e muito estreita. O que é mau usa violência, o medo, mas com objetivo de manter uma certa ordem e harmonia no bairro, respeitando as lideranças locais. O que é bom tenta resolver tudo no diálogo, mas quando vê seus colegas usando a força, não se opõe totalmente e certas vezes demonstra uma passividade que de certa forma pode ser traduzido como um consentimento.

Há muita coragem no filme, isso não se pode negar, assim como tem muita força, mas em às vezes essa força parece ser até excessiva, o que torna, a propósito, a sequência final um pouco confusa. Não chega a estragar o filme mas inegavelmente prejudica seu melhor desenvolvimento. Gosto de como o diretor, Ladj Li mostra a “verdadeira identidade francesa, com o povo todo junto, vibrando, com a final da Copa do Mundo de 2018, quando sua câmera vem como se desse um zoom, ao longo do filme, mostrando detalhes com seu enredo, expondo seu olhar como um drone sobrevoando a sociedade, evidenciando que se você olhar de perto, não existe essa união. A realidade é outra: polícia autoritária e violenta, misoginia, jovens negros marginalizados.
Isso é o Bra...ops,... a França.

A juventude parisiense em mais uma de suas diversas lutas diárias.


 

 por Vagner Rodrigues

segunda-feira, 4 de maio de 2020

"Uma Vida Oculta", de Terrence Malick (2019)



Franz Jägerstätter (August Diehl) é um fazendeiro austríaco que se torna herói em circunstâncias um tanto quanto inusitadas. Quando ele é convocado a lutar junto ao exército alemão durante a Segunda Guerra Mundial, ele se recusa e acaba, com apenas 36 anos de idade, condenado à pena de morte por traição à pátria.
Um exagero de filme em vários aspectos, tanto positivos como negativos. De positivo, temos a fantástica, a deslumbrante fotografia, planos maravilhosos, diálogos certeiros, uma trilha primorosa; mas por outro lado temos também um exagero no tempo: 3 horas de duração. É muito tempo para um filme que pede de você para que você fique contemplando a vida simples de Franz na fazenda e sua rotina. Isso torna o filme cansativo e cheio de cenas repetitivas.
Por mais que o filme seja muito longo e lento, seus questionamentos abordados, no entanto, compensam bastante. O longa nos faz pensar sobre nossos princípios, até onde iríamos por eles, se seríamos capazes de perder a vida tão somente para não romper com essas premissas de vida e com aquilo que acreditamos. “Uma Vida Oculta” ocupa-se, mais especificamente, em trazer esses questionamentos para o lado religioso, para os princípios da fé, mas o espectador pode facilmente levá-los para outros campos da vida que eles continuarão, ainda assim, tão válidos e pertinentes.
Assim como o longa nos presenteia com lindas imagens do cenário, os momentos de diálogo são tão belos quanto. Um épico, longo e um pouco cansativo, é verdade, mas reflexivo e belo. Apesar da duração e da morosidade, pode-se afirmar sem erro que trata-e de mais um grande filme de Terrence Malick.

Até onde você iria para lutar por seus princípios?


por Vagner Rodrigues

sexta-feira, 13 de março de 2020

"Os Mortos Não Morrem", de Jim Jarmusch (2019)



Uma boa ideia, um diretor  tentando sair de zona de conforto, um grande elenco... tem tudo para dar certo, porém em “Os Mortos Não Morrem” ficou no quase.
Numa pacata cidadezinha, os mortos começam a sair dos seus túmulos e causar caos. Cabe a três policiais e uma estranha legista escocesa, unirem-se para derrotar a ameaça.
O elenco, muito inchado, não ajuda o filme. Por mais que o foco principal da história seja a dupla de policiais, o longa vai apresentando inúmeros personagens, dando espaço para eles, para no fim, não aprofundar em nenhum. Tem vários personagens que aparecem e, não só não  fazem o roteiro andar como, pelo contrário, truncam o filme. A gente até pensa, “Bom agora vai desenvolver esse personagem aí, e história vai avançar”, mas não. Foi só mais cena desnecessária que poderia ser substituída por outra com os próprios personagens principais, o que até poderia gerar empatia com eles, algo que, por sinal, acontece muito pouco.
O grande ponto positivo é que , não tira o seu principal aspecto dos filmes, trabalhar de forma reflexiva seus personagens indo mais para intrapessoal do que para o interpessoal. Existem boas críticas sociais e o longa trabalha muito com a ideia do consumismo, do quanto vivemos dedicados ao material, ao ter, e essa crítica e a reflexão dela resulta, funcionam bem no longa.
Apesar do elenco todo ser talentoso, nem todos os personagens são bem aproveitados. Tilda Swintom, por exemplo, como "legista escocesa” poderia ter mais espaço e até merecia mesmo, pois seu personagem é muito bom. Os que realmente conseguem passar algo a mais são Bill Murray e Adam Driver, formando uma dupla de policiais bem bacana, com diálogos bons, e que garantem um humor na medida certa ao filme, com destaque para as cômicas cenas de quebra da quarta parede.
Tinha tudo para ser um grande filme, grande elenco, um ótimo diretor, uma história interessante, porém algo não saiu bem. Não chegou a ser um desastre mas o longa decepciona um pouco pela grandiosidade do seu elenco. Nem todos os personagens tem seu espaço no filme e muitos acabam ficando unidimensionais, faltando, talvez trabalhá-los em camadas. Mas o humor na medida certa e o fato de assistir a um filme de zumbis onde o grande chamariz não são as mortes e cabeças explodindo mas sim a reflexão de como perseguimos algumas ideias, produtos, bens materiais tão cegamente quanto um bando de zumbis, já vale muito a pena. É uma crítica ao povo americano, a Donald Trump, mas serve perfeitamente para nós, e alguns mitos, vestirmos a carapuça aqui no Brasil.

Não custa nada elogiar de novo essa dupla que faz toda a diferença no filme.



por Vagner Rodrigues

sábado, 7 de dezembro de 2019

"A Dama e o Vagabundo", de Charlie Bean (2019)




A história de amor entre a Dama (Tessa Thompson), uma cocker spaniel mimada, e um vira-lata chamado Vagabundo (Justin Theroux), que salva a cadelinha do perigo de vagar sozinha perdida pelas ruas. Leve, lindo e muito fofo, assim é “A Dama e o Vagabundo”. A Disney acerta mais uma vez, em uma obra live-action, além de manter o espirito Disney, ainda consegue colocar representatividade no longa.
O filme sofre, como todos live-actions, das comparações com as animações originais, por tirar algumas coisas e acrescentar outras, as quais para mim, em sua maioria foram decisões acertadas. Neste caso específico, o longa ganha no seu enredo com mais história para os personagens mas perde um pouco de romantismo e quanto a isso, o roteiro poderia ter colaborado tirando um pouco de cenas do homem da carrocinha para focar mais no casal de protagonista e crescimento do sentimento entre eles. Por ser um filme com orçamento menor, ele também tem problemas nos efeitos especiais, na movimentação dos animais em algumas cenas, mas nada que atrapalhe o bom andamento.
 A obra, e muito “fofa”, você percebe que é um trabalho feito com muito carinho, atenção e muito cuidado. Nesse quesito “fofura” o filme é nota 1000, pois desde os cachorrinhos que são muito lindos e simpáticos, até a voz dos dubladores (que ficaram perfeitas), tudo funciona conforme a magia Disney manda. Mas não é só a fofura que se destaca no longa: o que podemos dizer sobre a diversidade que o longa mostra? Em grande maioria os personagens do filme são negros. Até em papeis menos relevantes, de uma cena só, está lá: atores negros. Mas também temos latinos, asiáticos, indianos... todos representados em um cinema globalizado que reflete o mundo à sua volta. Um cinema ideal onde TODOS são representados.
Com um ar moderno dialogando com o mundo atual mas sem perder a essência Disney, “ A Dama e o Vagabundo” me fez refletir sobre o papel do cinema na sociedade e seu poder em relação a ela através da diversidade étnica dos personagens mas ao mesmo tempo me fez ficar vidrado em cães fofos, brincando, dando vontade de adotar mais um filhote, me sentindo uma criança outra vez. A última vez que tive essa sensação foi com “Baby: O Porquinho Atrapalhado” e foi maravilhoso voltar a sentir isso oura vez.
Eu nunca canso da magia da Disney e a"A Dama e o Vagabundo" é cheio dessa magia.



por Vagner Rodrigues

domingo, 1 de dezembro de 2019

"Guerra Fria", de Pawel Pawlikowski (2018)



Durante a Guerra Fria entre a Polônia stalinista e a Paris boêmia dos anos 50, um músico amante da liberdade e uma jovem cantora com histórias e temperamentos completamente diferentes vivem um amor impossível.
Se a narrativa bem construída de "Guerra Fria" não te prender, se as ótimas atuações não chamarem atenção, se as canções belíssimas, não tocarem você, tenho certeza que a fotografia MAGNÍFICA vai te encantar.
O afastamento que temos do casal principal, pelo jeito frio dos dois demonstrarem amor é uma coisa quer pode não agradar muito. As cenas íntimas, ou de demonstrações de afeto no início do longa não parecem convincentes e não passam aquela ideia de que eles moveriam montanhas para ficarem juntos. Porém isso não é algo que atrapalha muito, uma vez que, embora inevitavelmente ocorra esse afastamento do espectador, o longa deixa claro que existe amor entre eles.
O que se destaca mesmo no filme é a beleza visual com sua fotografia deslumbrante. O preto e branco passa mesmo a sensação de que tenha sido rodado nos anos 50 e todo figurino e cenários funcionam muito bem, nos colocando, de fato, na Europa, no pós Segunda Guerra e início de Guerra Fria. O controle de câmera de Pawel Pawliskowski, também é algo de se destacar. Ele consegue enquadramentos perfeitos que são verdadeiras obras de arte, dignas de emoldurar e colocar no principal cômodo de sua casa.
Cada enquadramento mais lindo do que o outro!

Esteticamente perfeito, "Guerra Fria” nos entrega uma narrativa diferente com diversos cortes e pulos no tempo sem nos deixar perdidos, nos mantendo dentro do longa o tempo inteiro. O casal principal, por mais frio, gélido que seja, em muitos momentos, nos passa credibilidade e no faz ficar grudados no filme até a última e belíssima cena. O resultado final é uma obra de arte visual com um o jeito pouco convencional de contar uma história. Uma história com um casal frio que não se entrega às emoções, mas também nunca as abandona.

E o contexto histórico... Que obra, meus amigos!



por Vagner Rodrigues

segunda-feira, 28 de outubro de 2019

"Coringa", de Todd Phillips (2019)




Uma obra de arte perigosa

por Vagner Rodrigues

Gotham City, 1981. Em meio a uma onda de violência e a uma greve dos lixeiros, que deixou a cidade imunda, o candidato Thomas Wayne (Brett Cullen) promete limpar a cidade na campanha para ser o novo prefeito. É neste cenário que Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) trabalha como palhaço para uma agência de talentos, com um agente social o acompanhando de perto, devido aos seus conhecidos problemas mentais.

Uma direção perfeita, tecnicamente impecável, uma atuação espetacular, uma das melhores construções de arco de personagem que já vi, fazem de “Coringa” uma obra de arte, que, no entanto, pode vir a se tornar extremamente perigosa se for interpretado de certas maneiras.

É, mas o fato de classificá-lo como perigoso, não deixa de ser também um mérito, uma vez que mostra o personagem principal como um homem que apenas está respondendo, tomando ações para confrontar a forma com que pessoas e o sistema, o tratam, levando um cidadão a atitudes e ações extremamente violentas, que na obra, dentro deste contexto, acabam mostrando-se justificadas. E digo que pode ser perigoso, no caso de qualquer um assistir ao filme e acabar se identificando com Arthur (o que é bem possível devido ao realismo da trama) e tudo aquilo servir como inspiração e um gatilho para atitudes parecidas. Então, cuidado! Procure conversar com alguém sobre o filme, ok?

Como obra cinematográfica, o longa chega perto da perfeição. Desde de um roteiro bem escrito, uma fotografia sublime, e uma direção que sabe o que quer, onde pretende chegar e nos levar. Mas o que torna o filme realmente memorável é atuação de Joaquin Phoenix. O homem está possuído em cena! Tudo, definitivamente TUDO, que ele faz no filme é ESPETACULAR! Uma atuação com o corpo todo, uma fisicalidade assustadora e visceral. Seus olhares, suas falas, até os momentos que está em silencio conseguem ser espetaculares. Me chamou muito atenção a mudança de postura de Arthur quando se transforma em Coringa: deixa de ser aquela pessoa com aparência fraca, corcunda para se tornar um homem poderoso, intimidador.

Um dos melhores estudos e construção de personagem dos últimos tempos no cinema. Um protagonista que sai do ponto A e vai até o ponto B muito bem conduzido pelo roteiro e direção, o que é ótimo de observar. Ver que ao final da história, não só o personagem mudou você também mudou. Isso é cinema e o seu melhor como arte. Aquilo que instiga, faz refletir e ainda é delicioso de se assistir. E como se não bastasse tudo isso, "Coringa" é uma bela homenagem a Scorsese e seu cinema da nova Hollywood.

Vá com calma, acompanhe toda jornada desse palhaço louco, tenha medo, mas não deixe de acompanhá-lo pelas perigosas ruas de  Nova..ops.. , quero dizer... Gotham.

Pura genialidade! Uma aula de atuação.
Algo que não se esquece tão cedo.


****************************

A descida ao inferno

por Daniel Rodrigues

Poucos filmes me geraram tamanha expectativa antes de assisti-lo como “Coringa”, de Todd Phillips. Mas neste caso, foi mais do que expectativa: foi medo mesmo. Medo de ficar decepcionado com a comum ideologização permeada de parcialidade do cinema comercial norte-americano, com a superficialidade com que tratam muitas vezes assuntos profundos ou, pior, com a recorrente banalização de temas ricos como se fossem apenas produtos de entretenimento. Geralmente tento estar com a mente aberta ao que o filme me trará, não raro sem ler nada a seu respeito antes. Mas com Coringa era impossível, pois tinha receio que o deturpassem, e isso me irritaria muito, uma vez que me é um personagem caro. Já não basta o que fizeram com o seu arquirrival, Batman, cuja DC Comics, sem controle de seu personagem mais icônico na transposição para o cinema – diferentemente da Marvel para com as suas marcas – deixou que o Homem-Morcego fosse mais inexpressivo que os vilões nas versões de Tim Burton, virasse um existencialista falastrão na trilogia de Christopher Nolan e alterasse totalmente o porquê de seu embate com Superman por pura falta de colhões em reproduzir a obra original dos quadrinhos.

Com o Coringa não podiam cometer o mesmo erro. Não podiam desperdiçar uma mitologia tão rica, a oportunidade e contar uma história inigualavelmente promissora como ainda não se tinha feito. Quem como eu acompanhou os HQ’s de Batman nos anos 80 e 90 sabe o quanto este personagem é especial e – mesmo com o fio condutor que monta a sua biografia desde que foi criado – complexo. E foi exatamente isso que o filme de Phillips conseguiu: construir um personagem denso e crível, não apenas respeitando a sua saga como amarrando aspectos sociológicos e psicológicos com surpreendente minúcia. 

O ponto que mais me preocupava antes de assistir era o de se querer dar a um maníaco assassino como Coringa um caráter meramente vitimista para sustentar o clichê de que a sociedade moderna é a principal responsável por criar monstros como ele. Subterfúgio, claro, usado unicamente para imobilizar as consciências e manter tudo como está em favor daqueles que comandam o sistema. É quase isso, uma vez que a opressão social, política, ideológica e a consequente invisibilidade que esta condição subalterna dá aos desfavorecidos ou diferentes como ele é, sim, combustível para a formatação da persona Coringa a que o personagem Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) acaba por assumir em sua caminhada de loucura e dor. O problema é que Coringa é um velho conhecido, uma vez que não se trata de um personagem como os de vários filmes em que os elementos narrativos vão dando subsídios para que se construa do zero na cabeça do espectador o psicológico e a identidade dele. Trata-se, no caso do principal vilão dos quadrinhos do Batman – quiçá de toda a história dos HQ’s – de uma “pessoa” a quem já se sabe onde vai chegar e quais os traços essenciais o compõem enquanto sujeito. Ou seja: precisavam ser bastante críveis para me convencer.

Por isso, a questão é mais profunda quando se fala em Coringa. Entretanto, o roteiro do filme é muito feliz ao abarcar todos esses aspectos e ir ao cerne das coisas. Além da visível esquizofrenia e a propensão à psicopatia, controladas até certo ponto pelo sistema através não só de medicações como da opressão social, há nele uma motivação estritamente subjetiva e humana, que é a família. O histórico de maus tratos, o desajuste familiar e a condição de pobre, inadequado e fracassado poderiam até ser equalizadas se continuasse levando uma vida medíocre e sem visibilidade como de fato tinha. 

Mas é a perda da figura central da mãe (a quem ele duplamente perde, simbólica e materialmente, uma vez que ele mesmo a mata) a chave para o desencadeamento do que lhe havia de pior, para que se concretizasse o Coringa que conhecemos. Representa a ruptura, a definitiva descida ao que estava represado, a qual o cenário da escadaria simboliza na trama o caminho: para cima, a redenção, para baixo, o inferno. A mãe, única pessoa a quem ele podia dedicar carinho, era a como o pino de uma granada: se fosse removida, a bomba explodiria. E foi. Uma justificativa altamente plausível que, aí sim, juntada aos fatores externos da igualmente violenta sociedade é um prato cheio para o surgimento de indivíduos perigosos como Coringa. Ele é vítima, sim, mas é também produto do descuido da sociedade para com o dessemelhante, o cidadão não-comum, que não se encaixa nos padrões estabelecidos. Fosse pelo talento de artista, a encarnação do dualístico e bufão clown, fosse pela loucura latente que lhe prejudicava a socialização, nunca lhe deram atenção. Ninguém. Sua resposta veio em forma de um empedramento doentio e de vingança. Agora teriam que lhe dar atenção, da pior maneira possível.

O ótimo resultado de “Coringa” é em grande parte fruto da atuação exuberante de Phoenix – o que, aliás, mesmo com a desconfiança do que o filme apresentaria, tinha certeza de que seria brilhante. A construção que Phoenix dá a Coringa considera a trajetória dos HQ’s, a literatura, o imaginário social e todos os outros que vestiram o personagem antes dele no audiovisual. É possível enxergar Jack Nicholson, Heath Ledger, Cesar Romero e Jared Leto, assim como estão ali o Coringa dos HQ’s “A Piada Mortal”, “Asilo Arkham” ou “O Cavaleiro das Trevas”. Porém, Phoenix, até por esta capacidade cênica muito sensível de síntese, consegue o feito de superar todos. 

Mas fora o encanto que protagonista causa, tudo funciona em “Coringa”. A obra, mesmo que tenha na atuação justificadamente a sua maior força, é incrivelmente coesa, harmônica, forte e crítica. Um tapa na cara sem concessões ao modo de vida norte-americano e ao que a nação mais rica do mundo vende ao mundo como modelo de felicidade. Além disso, a fotografia suja e fantasmagórica, a trilha sonora econômica e muito bem escolhida, a direção de arte impecável e a edição, que faz questão de deixar subentendimentos em nome do foco da narrativa, são igualmente destaques. 

Dentro da crítica aos modelos norte-americanos que o longa traz, a referência a dois filmes de Martin Scorsese – não à toa ambos estrelados por Robert De Niro, brilhante no papel do apresentador de tevê Murray Franklin – são sintomáticas. Primeiro, “Taxi Driver” (1976), quando Arthur, em seu mundo interno, aponta um revólver para a televisão e para os “inimigos imaginários” de sua sala. A condição de degradação mental a que o ex-combatente do Vietã vivido por De Niro e a de um rejeitado como Arthur são sujeitados expõe o quanto a política dos Estados Unidos é capaz de gerar indivíduos tão desassistidos e doentes. Igualmente, “Coringa” retraz, ao abordar o stend-up comedy e os programas de auditório em que as massas riem do que lhe é imposto como piada, o controvertido “O Rei da Comédia” (1983). Naquele, a piada sem/com graça é o sequestro do astro da televisão Jerry Langford (Jerry Lewis) pelo obsessivo e igualmente invisível Rupert Pupkin (De Niro) para que este apresentasse seu número no lugar do apresentador oficial. A reflexão que “Coringa” levanta, assim como o filme de Scorsese, é um questionamento do que é “felicidade” numa sociedade acrítica e controlada pela indústria do entretenimento como a atual.

“Coringa” não tem nada a ver com os filmes de super-heróis explosivos, frenéticos e plastificados como os que Hollywood vem fazendo às pencas. É um drama sobre uma pessoa inventada mas talvez tão mais real quanto um ser humano de carne e osso. Um drama sobre um triste arquétipo da doença e da violência as quais somos submetidos hoje. Um drama sobre alguém que bem que poderia existir. E será que não existe mesmo?

Coringa na escadaria: a definitiva descida para o seu inferno interior


sexta-feira, 4 de outubro de 2019

"Amor Até as Cinzas", de Jia Zhang-Ke (2018)



Uma historia de amor não é, necessariamente, apenas entre duas pessoas. Há todo um fator tempo espaço, o lugar onde se vive, enfim, tem muita coisa tudo envolvida numa história de amor e “Amor até as cinzas” mostra isso brilhantemente.
Datong, China, 2001. Uma bela e jovem dançarina chamada Qiao está apaixonada por Bin, um mafioso local. Durante uma briga entre gangues rivais, ela dispara uma arma para proteger seu namorado e isso lhe custa cinco anos de prisão. Após sua liberação, Qiao vai procurar Bin para tentar e começar tudo de novo.
Mesmo conseguindo trabalhar bem as passagens de tempo e na forma que demonstra a relação dos dois amantes ao longo do filme, a única parte que “ Amor Até as  Cinzas”, desliza é na divisão de atos. Seu segundo é extremamente longo, com sequências desnecessárias que não fazem o filme avançar e podem causar um certo cansaço no espectador mais agitado. Rápido spoiler: uma das sequências desnecessárias de “Amor Até as Cinzas” é a que se passa no barco. Tem o roubo dos documentos de Qiao, muita coisa acontece, coisas acontecem também na cidade e, no entanto, apenas um dos fatos é realmente relevante para trama. Há um excesso de coisas desnecessárias nesse segundo ato.

Apesar de ser um filme sobre “máfia”, ele não tem sequências de ação (na verdade tem uma só, mas que é espetacularmente deliciosa de tão boa, muito bem filmada e de tensão  muito bem construída).  O foco é no diálogo, na relação dos dois personagens principais, em como um está ligado no outro mesmo com passar de tempo, da distância e das mudanças. Uma relação de duas pessoas nunca é só de duas pessoas, tem todo um contexto. Vemos que uma separação não significa o fim de tudo, mas que nada nunca mais será como antes. Talvez melhor ou pior, mas não igual. Por outro lado, o longa é uma critica a uma China que se abre, se moderniza, mas não valoriza seu povo, preocupada apenas em crescer. Assim como a relação de Bin e Qiao, que imersa em si mesma, esquece que existe um mundo à sua volta. 
Qiao e Bin, no momento "torta sabor Climão",
em um dos seus reencontros.
Fan Liao como Bin e Tao Zhao no papel de Qiao, formam um casal perfeito, apesar de muitas vezes parecerem um tanto frios, (e realmente são). Suas trocas de olhares e os diálogos entre os dois transbordam sentimentos. Outra coisa fantástica do longa é o fato do diretor utilizar a China e sua realidade social como pano de fundo de sua narrativa, contando a história do pais e fazendo críticas, mas tudo isso sem jogar na cara do espectador. Tem o desemprego nas cidades mais afastadas por causa do fechamento das fabrica e o avanço da tecnologia (basta reparar nos celulares dos personagens ao longo do filme), a mudança nos meios de transporte, no estilo de vida e até mesmo das gangues, e todo esse contexto cultural e social é muito explorado ao longo da obra. Outro aspecto para se dar muito a atenção é o de como os personagens estão presos em seu relacionamento ao mesmo tempo que estão presos às suas localidades e costumes, não percebendo as evoluções do país e as mudanças à sua volta.
Não é nada fácil ser líder de gangue...




por Vagner Rodrigues

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

"Todos Já Sabem", de Asghar Farhadi (2018)



O encontro de um ótimo diretor com um ótimo elenco só poderia render um espetacular filme, com uma história que nos prende até o último segundo, como uma festa que a gente não quer ir embora.
Quando sua irmã se casa, Laura (Penélope Cruz) retorna à Espanha natal para acompanhar a cerimônia mas por motivos de trabalho, o marido argentino (Ricardo Darín) não pode acompanhá-la. Chegando no local, Laura reencontra o ex-namorado, Paco (Javier Barden), que não via há muitos anos. Durante a festa de casamento, uma tragédia acontece. Toda a família precisa se unir diante de um possível crime de grandes proporções enquanto se questionam se o culpado não está entre eles. Na busca por uma solução, segredos e mentiras são revelados sobre o passado de cada um.
É um roteiro muito bem construído e amarrado. Alguns podem achar que ele enrole demais, perca um certo tempo, especialmente no segundo ato, nos momentos de dramas e inúmeras cenas de diálogos. mas acredito que essa paciência, essa ausência de pressa, tenha sido uma forma que o diretor encontrou para nos colocar mais próximos e íntimos dos personagens.
As atuações estão nos detalhes, no choro, numa troca de olhares, nos diálogos, em pequenas frases. Penélope Cruz, Ricardo Darín e Javier Bardem mantém seus níveis altos de atuação, contudo, o que brilha mesmo é o roteiro. O longa consegue ir de um início divertido, leve e alegre para um drama pesado, de fotografia escura, em um apagar e acender de luzes. O diretor Ashgar Fahradi soube com maestria criar um clima de suspense, tensão e mistério e um ótimo exemplo disso é o momento em que descobrimos o sequestro, no pagamento do resgate. Você sente que tudo pode acontecer.
 As vantagens de se viver numa cidadezinha tranquila já sabemos, mas e as desvantagens? As fofocas, a falta de privacidade, todo mundo sabendo a vida de todo mundo, a dificuldade de se guardar segredos são, assim como brigas por terras, fantasmas do passados, amores mal resolvidos, e patriarcalismo, são elementos presentes no instigante “Todos já sabem”. O filme consegue abraçar todos estes itens e ainda contar uma história intrigante, com uma narrativa fluida que, mesmo após seu término, nos deixa inquietos, pensado no que será daquela família e daquela cidade depois de toda essa história.
Do drama profundo, da dor...

...à festa e alegria, e mais festa.




por Vagner Rodrigues

sábado, 20 de julho de 2019

"Carmem & Lola", de Arantxa Echevarría (2018)



Primeiramente, quero deixar claro que não estou tomando lugar de fala, pois o filme é sobre o olhar feminino sobre a sexualidade ou, para ser mais objetivo, a homossexualidade. Por mais que me esforce para entender o drama, a enorme dificuldade das mulheres que passam por essa situação, que é a de se “descobrir” gay, sendo mulher numa cultura machista como a que vivemos em nossa sociedade, na qual me incluo pois ainda tenho inúmeros desafios a superar e me desconstruir, é uma tarefa difícil, assim, o que farei será objetivamente avaliar o impacto da obra em mim, e o que posso dizer, desde já, é que o que vi foi incrível e de grande contribuição para ampliar minha mente. Obrigado, Arantxa Echevarría!
Carmen é uma adolescente cigana que vive na periferia de Madri. Como qualquer outra cigana, ela está destinada a viver uma vida que se repete geração após geração: casar e criar o maior número de filhos possível. Mas um dia ela conhece Lola, uma cigana incomum que sonha em ir para a faculdade, desenha grafites de pássaros e é diferente. Carmen rapidamente desenvolve uma cumplicidade com Lola e descobre um mundo que, inevitavelmente, as leva a serem rejeitadas por suas famílias.
O ritmo do longa pode ser a única coisa que eu faça ressalvas. O segundo ato é um tanto lento, arrastado e algumas cenas e tomadas são repetitivas, o que pode até fazer um sentido para diretora mas para o espectador fica apenas parecendo mais do mesmo.
Ai, ai... É possível dançar numa piscina?
A maneira como o longa trabalha a relação das duas personagens, se descobrindo sexualmente, o início da atração das duas, é muito bonito. Não comete o erro de cair para o lado mais erótico e vai  muito pelo olhar, pelos toque de mãos, numa conversa, como na cena dança no casamento de Carmen, por exemplo.
A narrativa do filme segue na construção do relacionamento das duas de uma manira muito poética e bela até chegarmos no terceiro ato, que é um soco na cara (REALMENTE BEM FORTE). O longa vem retratando toda a realidade dura das mulheres ciganas na sociedade espanhola, privadas de sonhos e objetivos e nesse universo Carmen tem um sonho, de casar e ter filhos mas logo descobre que esse não seu sonho, e sim da sua família. Já Lola, quer estudar, ser professora, porém sofre, pois seu pai é totalmente contra seus objetivos querendo apenas que ela o ajude na feira e encontre um bom homem para casar. No último ato filme a questão religiosa e o pecado fazem o fechamento com chave de ouro. O filme ganha em drama, é tudo muito pesado e a vontade de chorar vem com força.
Pode ser mais uma história de amor mas não é "só" uma história de amor. Mesmo nos dias de hoje, não e fácil explorar o tema da sexualidade no cinema, ainda mais a sexualidade gay. Arantxa Echevarría trabalha muito bem sua história, constrói sua narrativa de maneira simples, sutil, mostrando detalhes como as formas de pássaros espalhados pelo filme, mas quando tem que ser contundente, abordando temas  como da cura gay, ela dá um soco para nos nocautear.
Ótima chance de observarmos uma cultura à qual não temos muito acesso e informação, a do povo cigano, que, se por um lado sempre foi vítima de muito preconceito, dentro de seu segmento, o comete também.
Sorria, chore, apaixone-se, lute e assista “Carmen & Lola”.
A alegria de uma noiva...



por Vagner Rodrigues

sábado, 8 de junho de 2019

"Cafarnaum", de Nadine Labaki (2018)



Duro, sujo, pesado, real, dramático e sublime. Mesmo não dando nenhum motivo para você sorrir, “Cafarnaum" tem o poder de conquistar.
Aos doze anos, Zain (Zain Al Rafeea) carrega uma série de responsabilidades: é ele quem cuida de seus irmãos no cortiço em que vive junto com os pais que estão sempre ausentes graças ao trabalho em uma marcenaria. Quando sua irmã de onze é forçada a se casar com um homem mais velho, o menino fica extremamente revoltado e decide deixar a família. Ele passa a viver nas ruas junto aos refugiados e outras crianças que, diferentemente dele, não chegaram lá por conta própria.
Miséria, descaso e abandono,
são línguas universais, infelizmente.
Se não gosta de ver filmes que vão lhe fazer chorar, se destruir por dentro de tanto pensar na crueldade do ser humano, se você só gosta de ver filmes para se distrair, comer pipoca e sentar no sofá ou no cinema e se desligar do mundo, por favor não assista a esse longa.
O longa, que desfila inúmeras qualidades, chega a beirar o documentário de tão real. A diretora acerta em cheio, em todos detalhes técnicos e nas escolhas que faz do roteiro. Na parte técnica, ela acerta em usar câmera na mão garantindo assim uma sensação de movimento; e nos seus planos fechados, embora apresente também planos abertos lindíssimos. O posicionamento da câmera à altura dos olhos de Zain mostra-se uma escolha muito feliz, fazendo com que vejamos o filme na visão do menino. Na parte do roteiro, o acerto é não cair no drama em exagero. Quando tudo fica muito pesado, Nadine Labaki troca rapidamente o protagonismo para só depois, retornar para Zain.
Uma das melhores coisas é  atuação do menino Zain. O menino passa uma verdade e você compra todos os sentimentos do garoto que, não maioria das vezes não são bons. Uma atuação impecável, uma direção que beira a perfeição em um filme que te faz ver o pior dos humanos: o abandono, a exploração de trabalho infantil, as diferenças culturais como o casamente de meninas de 11 anos com homens adultos. Um longa perturbador para deixar você inquieto e questionar sua vida. Será que você é predestinado a tudo que acontece na sua vida? Será que não há o que fazer? É tudo coisa do destino?

Choques culturais muitas vezes chegam a assuntar.



por Vagner Rodrigues

segunda-feira, 15 de abril de 2019

"Under the Silver Lake", de David Robert Mitchell (2018)


Caramba, que bagunça boa! Mistério atrás de mistério escondidos nesta referência ao cinema clássico, tudo sob uma fotografia suja e uma trilha envolvente que mexe com a nossa cabeça de maneira loucamente insana e positiva.(Ou não...)
Sam (Andrew Garfield) é um jovem meio perdido na vida, que um dia encontra a garota perfeita: sua vizinha (Riley Keough), com quem passa uma noite. No dia seguinte, ela desaparece. Não existem mais sinais da garota e todas as suas coisas desapareceram do apartamento onde habitava. Sam começa a investigar o caso buscando todos os indícios possíveis: os pequenos rabiscos na parede, as mensagens escondidas em músicas... Seria tudo isso parte de uma grande conspiração ou estaria Sam ficando louco?
Não vai ser fácil digerir o filme e suas tramas malucas (Sim, bem malucas! Com direito a mensagens escondidos em discos de vinil tocados ao contrário). Além de ser longo, a falta de rumo da obra em alguns momentos pode afastar o espectador.
Com roteiros bem originais e inventivos em mãos, David Robert Mitchell mostra que tem talento e que, pelo menos pela mostra inicial, sua carreira é muito promissora. Um grande destaque é a forma como ele cria uma atmosfera de suspense e como sua trama consegue ir de um lado para outro sem deixar pontas soltas.
Achei muito divertida e imersiva a atuação de Andrew Garfield que consegue entregar um bom papel fazendo com que "compremos" as teorias que cria e nos motivando a segui-lo. É um longa que brinca com o sonho e realidade, loucura e sanidade. Algo para pensar, abrir a mente e se deixar perder em pensamentos sem sentido. Prepare sua teia, digo, sua mente para um delicioso labirinto.
A minha cara após assitirà cena do piano foi exatamente essa.




por Vagner Rodrigues

domingo, 27 de janeiro de 2019

"Nasce Uma Estrela", de Bradley Cooper (2018)



A música é algo fascinante e contagiante, o cinema igualmente, os dois juntos então... ♡. Imagina então quando esse encontro é muito bem feito. É o caso do fabuloso "Nasce Uma Estrela" dirigido por Bradley Cooper e estrelado por ele mesmo e por uma atriz chamada Stefani Germanota, que talvez você conheça como Lady Gaga.
O experiente músico Jackson Maine (Bradley Cooper) descobre a jovem artista desconhecida Ally (Lady Gaga) por quem acaba se apaixonando. Ela está prestes a desistir de seu sonho de se tornar uma cantora de sucesso, até que Jack a convence a mudar de ideia. Porém, apesar de a carreira de Ally decolar, o relacionamento pessoal entre os dois começa a desandar à medida que Jack luta contra seus próprios demônios e problemas com álcool.
Um dos aspectos que pode ser um descuido do filme mas que não tira o seu brilho é o fato de explorar pouco o mundo externo. Ele se relaciona demais com os dois personagens principais explorando pouco a relação deles com o mundo fazendo assim com que as consequências de suas ações fiquem no micro. No final das contas, temos cenas importantes, situações relevantes mas das quais resultam pouco impacto no mundo musical, no mainstream, na cultura pop.
Lady Gaga, muito mais do que um

rostinho bonito e uma bela voz.
Porém qualquer defeito cai perante a ótima direção de Bradley Cooper. O seu trabalho com a câmera é algo de chorar de tão lindo, seu enquadramento de personagem, sublime, e a forma como mostra as cenas de show faz a gente se sentir praticamente dentro do palco.
A trilha é perfeita e chega a ser impossível não cantarolar as músicas do filme.  Lady Gaga fabulosa, o filme faz questão de desconstruir a imagem visual que temos dela, desde a primeira cena, e funciona maravilhosamente bem, mas, na minha opinião, a atuação de Bradley Cooper está simplesmente de outro mundo. O cara engole todo mundo quando está em cena. Você não vê o ator, apenas o personagem.
É o tipo de filme, que vai ganhando força conforme ele vai passando e a porrada vai ficando cada vez mais forte. Cuidado para não ir a lona no final do filme.
Não esperava muito desse longa e, sinceramente, fui surpreendido. Trabalho que é brilhantemente dirigido por um diretor que claramente sabe o que quer quando está com a câmera na mão. Uma bela história de amor, um bom recorte de como é a conturbada vida da fama. Um longa para ser visto e escutado porque ele não desafina em nenhum momento.
Podem dar o Oscar pra esse cara, por favor!




por Vagner Rodrigues