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quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Música da Cabeça - Programa #72


O adeus de uma rainha, a celebração a outra. Assim foi com a despedida a Aretha Franklin, a Rainha do Soul, e os 60 anos da Rainha do Pop, Madonna, fato que marcou a semana e que marca a edição do nosso programa desta quarta-feira. Programa que ainda tem a rivalidade sadia dos ícones do rock Rolling Stones, Beatles e Beach Boys. Não tem como não ser legal. Mas lhes digo: tem mais ainda! Que tal, então, completar com Johnny Cash, Alceu Valença, Carl Orff e outras coisas? É motivo de sobra pra não perder o Música da Cabeça de hoje, às 21h, na Rádio Elétrica. Produção e apresentação: Daniel Rodrigues.


Rádio Elétrica:
http://www.radioeletrica.com/

quinta-feira, 9 de março de 2017

Brian Eno - “Before and After Science” (1977)




“Eu não sou músico.
 Meu instrumento é o estúdio.” 
Brian Eno


“A biologia sonora de Eno
disseca e remonta células do rock
 contemporâneo, e nesse aspecto
a sua mão é de um virtuoso.”
Piero Scaruffi, crítico e historiador musical




Parece estranho, mas à medida que vai se conhecendo mais a música de artistas do mundo pop, mais se conhece não as obras deles, mas sim a de Brian Eno. Profundamente influente sobre uma importante parcela de nomes referenciais do pop-rock nas últimas quase cinco décadas, Eno tem traços visíveis do seu trabalho refletidos nos de ícones como David Bowie, U2, Robert Wyatt, David Byrne, Massive Attack, Björk, Beck, entre outros. Seja na Roxy Music, nos discos solo precursores do pop anos 80 (“Taking Tiger Mountain” e “Here Comes the Warm Jets”) ou nos de ambient music, sua linguagem, que une num só tempo música a artes visuais e cênicas, formando um espectro sonoro-sensorial único, está presente em quase tudo que se ouviu em termos de música pop dos anos 70 em diante por influência direta ou indireta. Eno, mais que um músico, um “cientista”, como se autoclassifica, ditou o que é moderno ou não até hoje. Pois a grande síntese de todas essas pontas – da vanguarda ao folk, passando pelo blues, rock, progressivo, jazz e eletrônica – está em “Before and After Science”, disco que completa 40 anos em 2017.

O álbum, produzido pelo próprio autor em conjunto com Rhett Davies, antecipa e/ou reafirma uma série de conceitos utilizados por ele em produções a outros artistas e trabalhos solo. A concepção dos dois “movimentos” da obra é uma delas. A exemplo do que fizera em “Low” e “Heroes”, de Bowie (naquele mesmo 1977) e, três anos depois, em “Remain in Light”, do Talking Heads, “Before...” tem uma narrativa muito clara: um “lado A” agitado, num tom acima, e um “B” onde desacelera o ritmo e vai gradativamente baixando a tonalidade. Como uma sinfonia iniciada em alegro, o disco começa com o embalo afro-pop da estupenda “No One Receiving”. Eno comanda tudo tocando piano e cantando, além de fazer os efeitos de guitarra e manipular os sintetizadores e a programação de ritmo – as batidas que reverberam de tempos em tempos. Junto com ele está nada mais nada menos que Phil Collins na bateria, marcando o ritmo com maestria, e Paul Rudolph, que se esmera no baixo e na rhythm guitar, ao estilo Nile Rodgers. Para fechar o time, Davies no agogô e o exótico stick. Com seu tradicional canto tribal no refrão, que inspirou diretamente muita gente, é muito parecida em conceito e sonoridade com o que Eno dirigiria pouco tempo depois junto aos Heads (“I Zimbra” e “Born Under Punches”, ambas também faixas de abertura em discos produzidos por ele para a banda). Um começo arrasador.

Como é de sua especialidade, a segunda, “Backwater”, é um rock estilo anos 50 tomado de texturas eletrônicas, o que lhe confere certo precursionismo da new wave. E mais interessante: feita só com sintetizadores da época, todos ainda muito por evoluir, a sonoridade de “Backwater” jamais datou mesmo com a evidente defasagem tecnológica em relação à hoje, em que se pode fazer isso com menor risco de soar artificial. Afora isso, Eno está cantando muito bem, com voz inteira e potente. O próprio repetiria essa fórmula de canção em seu disco duo com John Cale (“Wrong Way Up”, 1989) na faixa “Crime in the Desert” e daria o “caminho das pedras” para o U2 em "The Wanderer”, cantada por Johnny Cash em “Zooropa” (1993).

A veia africana aparece noutro formato agora, mais brasileiro e “sambístico”. Trata-se de "Kurt's Rejoinder", um proto-samba eletrônico que traz novamente a profusão de estilos como essência. O amigo Wyatt aparece para fazer soar o timbal, que se soma, na percussão, com a bateria de Dave Mattacks. Pois este é um dos detalhes de “Kurt’s...”: parece um samba muito percussivo, mas a maior parte de sua timbrística está nos teclados de Eno e no baixo com delay de Percy Jones. Outro fator interessante da faixa são suas incursões de gravações e interferências, as mesmas que Eno exploraria com os Heads em “Remain...” numa das canções precursoras do sample na música pop, “Once in a Lifetime” – expediente, aliás que Eno e David Byrne usariam bastante no álbum dos dois, “My Life in the Bush of Ghosts de 1981, servindo de exemplo para outros vários artistas, como Malcom McLaren em seu aclamado “Duck Rock”.

Quebrando o ritmo quase de carnaval, a linda e introspectiva instrumental "Energy Fools the Magician" traz uma atmosfera de jazz fusion, lembrando bastante Miles Davis de “In a Silent Way” e “Bitches Brew”. Phil Collins está mais uma vez muito bem na bateria, marcando o tempo no prato mas sem deixar de executar viradas inteligentes. "Energy…” funciona como uma breve passagem para outra seção agitada, a que fecha o “1º movimento” do disco. Mas desta vez o ritmo não é de batucada e nem de new wave, mas sim o pop-rock exemplar de "King's Lead Hat". Primorosa em produção e mixagem, é daqueles exemplos de rock escrito na guitarra, ao melhor estilo hard rock. Eno e o craque Phil Manzanera dividem a rhythm guitar, mas é outro mestre do instrumento, Robert Fripp, quem comanda o solo. Com efeitos de teclados e de mesa, “King’s...”, em sua união de eletrônico e pós-punk, afina-se com o que ele e Bowie faziam naquele mesmo fatídico ano em temas referenciais como “Heroes”, “Beauty and the Beast”, “Funtime” e “Be my Wife”, influenciado grupos como Joy Division, The Cure e Bauhaus (estes últimos, que gravariam em 1982 “Third Uncle”, de Eno). Além disso, antecipa outro estilo musical que ganharia o mainstream anos mais tarde com as bandas New Order, Depeche Mode, Eurythmics, Ultarvox e outros: o synthpop.

Se a vigorosa “King’s...” termina a primeira parte de “Before...” lá no alto, o segundo ato já inicia mais leve com a melodiosa "Here He Comes". Com a bela voz de Eno cantando em overdub desde que os acordes da guitarra de Manzanera anunciam a largada, embora a melodia guarde certo embalo, já dá mostras que a rotação foi alterada para menos. O moog e o sintetizador de Eno conferem-lhe o clima espacial que se adensará na sequência em "Julie With...", esta, sim, totalmente ambient. Enquanto canta os belos versos com suavidade (“Estou em mar aberto/ Apenas vagando à medida que as horas andam lentamente/ Julie com sua blusa aberta/ Está olhando para o céu vazio...”), os teclados e sintetizadores desenham uma melodia cristalina como o céu limpo a que se refere na letra. Afora do baixo de Rudolph, Eno toca todos os outros instrumentos, inclusive a guitarra do curto mas belo solo, fazendo lembrar Fripp.

Mais uma especial (e espacial) do disco é "By This River", parceria dele com os krautrocks Moebius e Rodelius, mais conhecidos como a banda Cluster. O trio, que naquele ano havia gravado um trabalho em conjunto, o clássico “Cluster & Eno”, deixou guardada essa outra joia. De riff espiral marcado no piano, é sem dúvida a mais clássica do repertório, remetendo às bagatelas românticas, mas também à síntese formal do minimalismo. Nova instrumental, a ambient "Through Hollow Lands" é uma homenagem ao amigo e parceiro Harold Budd, com quem Eno fez diversos trabalhos desde aquela época. Não à toa, a música traz o clima introspectivo e contemplativo de Budd que tanto confere com este lado da musicalidade de Eno, neoclássico e new age.

Se como numa obra clássica “Before...” inicia com o allegro de “No One...”, prossegue variando allegretto e presto e em "Julie With..."/"By This River"/"Through...”  encontra características de lento e de adagietto, "Spider and I", de ares litúrgicos e caráter emotivo, é o finale desta grande peça num andamento adagio. E se “No One...” começa arrasando, “ “Spider...” é um desfecho digno.

O crítico musical da Rolling Stone Joe Fernbacher diz que “Before...” é o álbum perfeito da carreira de Eno. Faz sentido, pois, ativamente participante do que estava sendo produzindo de inovador naquele momento, como “The Idiot”, de Iggy Pop, “Vernal Equinox”, de Jon Hassell, e os já citados “Low” e “Heroes”, de Bowie – todas obras de 1977 e responsáveis por alguma sonoridade que ditaria as mentes musicais nas décadas seguintes –, Eno resumiu a sua contribuição para uma nova cara da música pop em “Before...”. "Apesar do formato pop do álbum”, disse outro crítico, David Ross Smith, “o som deste álbum é único e distante do mainstream". Compreendendo todas as suas vertentes musicais e artísticas, Eno compõe um trabalho que alia o agradável e o denso, o popular e o complexo, a vanguarda e o pop. Ao ouvir o disco, pode-se dizer sem erro que a música pop divide-se, literalmente, em “antes e depois da ciência”, a ciência inventada por este alquimista dos sons chamado Brian Eno.

Brian Eno - "No One Receiving"



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FAIXAS:
1. "No One Receiving" - 3:52
2. "Backwater" - 3:43
3. "Kurt's Rejoinder" - 2:55
4. "Energy Fools the Magician" - 2:04
5. "King's Lead Hat" - 3:56
6. "Here He Comes" - 5:38
2. "Julie With ..." - 6:19
3. "By This River" (Eno, Hans-Joachim Roedelius, Dieter Moebius) - 3:03
4. "Through Hollow Lands" - 3:56
5. "Spider and I" - 4:10
Todas composições de autoria de Brian Eno, exceto indicadas.

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OUÇA O DISCO

Daniel Rodrigues

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

cotidianas #401 - Um garoto chamado Sue



da graphic-novel "Cash - Uma Biografia"
de Reinhard Kleist
Bom, meu pai saiu de casa quando eu tinha 3 anos,
e ele não deixou muita coisa para mamãe e nem para mim,
Só este velho violão e uma garrafa vazia de bebida.

Agora eu não o culpo porque ele fugiu e se
escondeu,
Mas a coisa mais malvada que ele já fez,
Foi antes de partir, quando ele veio, e me chamou com o nome de Sue.

Bem, ele deve ter achado que era uma piada,
E isso deu em muitas risadas de um monte de amigos,
Parecia que eu tinha que lutar a minha vida
inteira.

Alguma namorada poderia rir e eu ficava vermelho,
E um cara riu e eu quebrei a cabeça dele,
Eu tenho que lhe dizer, a vida não é fácil para um
garoto chamado Sue.

Eu cresci rápido e cresci malvado,
Meu início foi difícil e meus movimentos tornaram-se
mordazes,
Eu vaguei de cidade à cidade para esconder minha
vergonha.

Mas eu me fiz um juramento para a lua e as
estrelas,
Eu procuraria os bordéis e bares,
E mataria aquele homem que me deu aquele nome
horrível.

Bem, era Gatlandburg em meios de junho,
Eu mal cheguei na cidade e minha garganta estava
seca,
Pensei: eu vou parar e tomar uma bebida.

Num velho saloon numa rua de lama,
Ali estava numa mesa sentado,
O cachorro imundo e sarnento que me chamou de Sue.

Bem, eu soube que aquela cobra era meu doce papai,
Através uma uma foto velha que minha mãe tinha,
E eu conhecia aquela cicatriz no seu rosto e seus
olhos maus.

Ele era grande e curvado, e grisalho e velho,
E eu olhei pra ele e meu sangue gelou, e eu disse,
"Meu nome é Sue! Como você vai? Agora você
morrerá!"
Sim, isto foi o que eu disse a ele.

Bem, eu o acertei forte no meio dos olhos,
E ele caiu, mas para minha surpresa,
Veio com uma faca e cortou fora um pedaço da minha
orelha.

Eu quebrei uma cadeira atravessando seus dentes,
E nós quebramos a parede e saímos na rua,
Chutando e socando na lama e no sangue e na
cerveja.

Eu lhe digo que eu lutei como um homem forte,
Mas eu realmente não consigo lembrar quando,
Ele chutou como uma mula e mordeu como um
crocodilo.

Eu o escutei rindo,
Ele foi pegar sua arma mas eu peguei a minha
primeiro,
Ele ficou lá olhando para mim e eu o vi sorrir.

A ele disse, "Filho, este mundo é cruel,
E se um homem quer viver tem que ser durão,
E eu sabia que não poderia estar lá para lhe
ajudar.

Então eu lhe dei esse nome e disse adeus,
Eu sabia que você teria que se endurecer ou morrer
E foi esse nome que lhe ajudou a ser forte.

Agora você só lutou uma luta idiota,
E eu sei que você me odeia e você tem direito,
De me matar agora e eu não o culparei se você o
fizer.

Mas você tem que me agradecer antes de eu morrer,
Pela pedra no seu estômago e pela cuspida no seu
olho,
porque eu sou o filho da puta que te chamou de
Sue".

Bem, o quê eu poderia fazer, o quê eu poderia
fazer?
Bem, eu fiquei sem ar e joguei minha arma fora,
O chamei de pai e ele me chamou de filho,
E eu voltei com um ponto de vista diferente.

Eu penso nele agora e sempre,
Toda vez que eu tento e toda a vez que eu ganho,
E se eu tiver um filho,
Eu acho que o chamarei de,
Bill ou George, qualquer coisa menos Sue!
Eu ainda odeio aquele nome!

*******************


letra traduzida de "A Boy Named Sue"
poema de Shel Silvertein
musicado por Johnny Cash

Ouça:
A Boy Named Sue - Johnny Cash

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Grant Lee Buffalo – “Fuzzy” (1993)



"O melhor álbum de 1993 folgado".
Michael Stipe



É pura mentira, mas se um dia Elvis Presley refletisse sobre o seu legado para o futuro do rock ‘n’ roll, ele almejaria que se criasse um som de raiz, usando instrumentações e timbres típicos do rock genuíno, porém que se evoluísse naquilo que fizeram precursores como ele, Little RichardJerry Lee LewisJohnny CashChuck Berry e cia.. A música ambicionada pelo Rei haveria de conter, além desses predicados, melodias belas e bem elaboradas, referenciando não apenas a ele e seus companheiros de primeiros anos, mas a outras vertentes que o rock ganharia a partir de então – o country-rock, o punk, o hard-rock, a new wave, o folk-rock, o shoegaze. Ah! E também não abriria mão de ser uma música bem tocada e bem cantada, com um vocal afinado e de timbre apreciável (consciente, dispensaria que fosse necessariamente o vozeirão dele).

Até que, 40 anos depois de inaugurar o estilo mais subversivo, popular e eletrizante da história da música, Elvis, do auge do seu trono em que se senta lá em cima, veria os rapazes da Grant Lee Buffalo lançarem seu primeiro disco: “Fuzzy”. Estava ali o que ele esperava!  Pondo o vinil pra tocar em seu toca-discos celeste, os primeiros sons que Elvis ouviria são de uma introdução ligeira da bateria na caixa com escovinhas, herdada do jazz swing e ao estilo do rock que ele inventara. “Que beleza! É isso aí, rapaziada!”, vibrou. Ele está escutando “The Shining Hour”, um rockabilly matador em que a banda de Los Angeles liderada por Grant Lee Phillips – juntamente com Paul Kimble, baixo, e Joey Peters, nas baquetas – apresenta de cara as qualidades que fazem de “Fuzzy” o disco que é: a influência direta do blues, a prevalência da sonoridade acústica, simplicidade nos arranjos (não há nenhum sopro ou cordas de orquestra) e o espírito desafiador do bom e velho rock ‘n’ roll. Embalada, “The Shining Hour” conta ainda com um piano, como a letra diz, saído de um “salão de bilhar azul de Monterey”, que sola lá pelo meio e ainda a desfecha numa nota grave e impositiva.

Em “Jupiter and Teardrop”, balada lindíssima em que Phillips, se já tinha mostrado suas habilidades vocais na primeira faixa, aqui, ele impressiona. Principalmente nos momentos de maior emotividade, a qual a canção vai ganhando à medida que se desenrola. Esse clima é ampliado pelas guitarras que, rosnantes, aparecem pela primeira vez no disco para comporem junto com a base do violão 12 cordas um clima carregado e melancólico. A letra acompanha a sonoridade, contando a triste história de um casal cujo rapaz, Teardrop, encrencado com a polícia, está prestes a ser preso novamente, forçando a distanciar-se de sua Jupter. ”Apenas uma garota que não pode dizer não/ E seu namorado em liberdade condicional/ Seus pais lhe deram o nome de Jupiter/ Para abençoá-la com uma alma de sorte/ Ele é um garoto que nunca chorou/ Quando eles o prenderam lá dentro/ E ela o apelidou de ‘Lágrima’/ Para fazer uma tatuagem de seu olho.” Ela sonha com filhos e casamento, mas teme que o pior aconteça antes do esperado: “O telefone toca/ É para ela/ ‘Tenho que ver você, Jupiter’/ ‘Estou com problemas com a lei’/ ‘Traga minha calibre 38’.” Uma crônica urbana romântica e de final trágico.

Talvez a melhor da banda, se não, seu maior sucesso – o que para um grupo alternativo como eles é algo considerável –, a faixa-título é outra balada com estrutura semelhante à anterior (base no violão, guitarras intensificando o clima semiacústico, tom tristonho), visto que ganha emotividade conforme avança. “Fuzzy”, no entanto, traz um refrão absolutamente tocante, em que Phillips, mais uma vez explorando suas qualidades de canto, lança falsetes para dizer com sentimento: “I've been lied to/ Now I'm fuzzy” (“Eu tenho mentido/ Agora estou confuso”). Em seguida, “Wish You Well”, com uma base de guitarra bem interessante, é mais pesada mas sem deixar de ser bastante melodiosa. Realce para a interessante linha de bateria, forjada em pequenos rolos no surdo com a caixa.

“The Hook”, totalmente acústica, é uma bela canção em que tudo funciona com perfeição: violão de cordas de aço, baixo acústico, bateria nas escovinhas e a voz ora deslizante ora impregnada de Phillips. Outro destaque do disco é “Soft Wolf Tread”, que inicia só na voz e frases do violão para, em seguida, explodir em peso e fúria. Assim é também “America Snoring”: melodiosa mas permeada pela distorção das guitarras e por uma bateria alta, pericialmente amplificada na produção assinada pelo próprio Kimble.

O piano estilo country volta na excelente “Dixie Drug Store” em que, por óbvio, homenageia o bluesman Willie Dixon mas, igualmente, referencia a ligação intrínseca que o blues tem com a música folk, tal como outro bluesmanMuddy Waters, fizera no clássico “Folk Singer”, de 1959 – disco em que, não coincidentemente, Dixon produz e toca. Aqui, Phillips manda ver mais uma vez nos falsetes, os quais incorpora de forma muito natural ao próprio timbre. Com essa, Elvis deve ter ficado arrepiado. “Stars n' Stripes”, delicada, é talvez a mais fraca do álbum, o que nem de longe tira a graça do trabalho como um todo.

E é justamente essa característica que desfecha “Fuzzy”: graça. Afinal, “Grace”, penúltima faixa, seguindo o mesmo conceito de “The Hook”, que revela a leveza d’”a rocha”, contrariamente, traz agora a densidade da “clemência”. Imagino que para alguém que morava numa mansão chamada Graceland deve ter sido uma feliz surpresa ouvir esse tema. “You Just Have to be Crazy”, baixando novamente os ânimos, finaliza o álbum com a mesma pegada acústica e doce já apresentada em vários momentos. A bela letra que diz: “Você apenas tem que ser louco, não você/ Você apenas tem que estar fora de sua mente/ Você apenas tem que ser louco, não você/ Você apenas tem que ser/ Verdade ou não/ Verdade ou não.”

Com todo respeito que tem a seus súditos Neil YoungBob DylanJohn LennonRaul Seixas, Robbie Robertson, Jimmy PageElton JohnRenato RussoElvis Costello, Johnny Thunders e mais centenas e centenas de roqueiros e não-roqueiros mundo afora, Elvis Presley – na minha invencionice apaixonada –, deu seu troféu para a Grant Lee Buffalo por “Fuzzy”. Foi neste disco que ele identificou aquilo que imaginava que sua música um dia chegaria a ser: sofisticada mas popular e pungente. Dá pra enxergar Elvis tirando dos ouvidos seu fone dourado, recostando-se no trono e dizendo emocionado: “Muito bem, rapazes! Aprenderam direitinho. Obrigado”.
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FAIXAS:
1. The Shining Hour
2. Jupiter and Teardrop
3. Fuzzy
4. Wish You Well
5. The Hook
6. Soft Wolf Tread
7. Stars n' Stripes
8. Dixie Drug Store
9. America Snoring
10. Grace
11. You Just Have to be Crazy
todas as faixas compostas por Grant Lee Phillips

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OUÇA O DISCO:




quinta-feira, 25 de julho de 2013

As 20 Melhores Músicas de Rock dos Anos 90

Terá sido "Smells Like Teen Spirit"
a melhor música dos anos 90?
Reouvindo uma das músicas que mais gosto do Nirvana, ocorreu-me: que outras canções de rock da década de 90 competiriam com ela? Já havia me batido essa curiosidade ao escutar outras obras da mesma época, mas desta vez a proposição veio com maior clareza de resolução. A música referida é “Serve the Servants”, que Cobain e cia. gravaram no último disco de estúdio da banda antes da morte do compositor e vocalista, o memorável “In Utero”, de 1993. Aí, interessou-me ainda mais quando percebi que o mesmo grupo, referência do período, encabeçaria a seleção. Pus-me, então, à gostosa prática de inventar uma lista: quais os 20 maiores sons de rock ‘n’ roll dos anos 90? Como critério, estabeleci que valem só composições escritas na década mesmo e sem produções contemporâneas de roqueiros veteranos, como Iggy Pop (“To Belong” podia tranquilamente vigorar aqui), The Cure (“Fascination Street”, que desbancaria várias) ou Jesus and Mary Chain (“Reverance”, como diz a própria letra, matadora). Quanto menos competir com versões definitivas para músicas mais antigas, como a de Johnny Cash para “Personal Jesus”, do Depeche Mode, ou a brilhante “The Man Who Sold the World” de David Bowie pelo Nirvana, em seu "MTV Unplugged in New York" .
Esta lista vem se juntar com outras que o clyblog  já propôs aqui (inclusive, a uma não de músicas, mas de álbuns dos anos 90) e que, como qualquer listagem que lida com gostos e preferências, é apenas uma janela (aberta!) para que outras elencagens sejam propostas. Querem saber, então, o meu ‘top twenty’ do rock noventista? Aí vai – e com muita guitarrada e em volume alto, como sempre será um bom e velho rock ‘n’ roll:

1 – “Smells Like Teen Spirit” – Nirvana (1991)


2 – “Lithium” – Nirvana (1991)
3 – “Unsung” – Helmet (1992)
4 – “Only Shallow” – My Bloody Valentine (1991)
5 – “Paranoid Android” – Radiohead (1992)
6 – “Gratitude” – Beastie Boys (1992)



7 – “All Over the World” – Pixies (1990)
8 – “Enter Sandman” – Metallica (1991)
9 – “Eu Quero Ver o Oco” – Raimundos (1996)
10 – “Wish” – Nine Inch Nails (1991)
11 – “Kinky Afro” – Happy Mondays (1990)
12 – "There Goes the Neighborhood" – Body Count (1992)
13 – “N.W.O.” – Ministry (1992)
14 - "Suck My Kiss" – Red Hot Chilli Peppers (1991)
15 - “Serve the Servants” – Nirvana (1996)
16 – "Jeremy" – Perl Jam (1991)
17 - “Army of Me” – Björk (1995)
18 - “Govinda” – Kula Shaker (1995)
19 - “Da Lama ao Caos” – Chico Scince e Nação Zumbi (1994)
20 - "Dirge" – Death in Vegas (1999)




quinta-feira, 23 de maio de 2013

cotidianas #225 - 25 Minutos para Partir



Bem eles estão construindo forcas do lado de fora da minha cela, tenho
25 minutos pra partir.
E a cidade toda está esperando para me ver gritar, tenho
24 minutos para partir.
Bem, eles me deram alguns feijões para minha ultima refeição, tenho
23 minutos pra partir.
Mas ninguém perguntou como eu me sentia, tenho
22 minutos para ir.
Bem eu escrevi para o Governador e todos seus malditos assessores  com
21 minutos pra ir
E escrevi para o prefeito, mas ele tinha saído para almoçar, tenho
20 minutos pra ir.
Então o xerife disse, cara vou te ver morrer, tenho
19 minutos pra ir.
Então eu ri na sua cara e cuspi nos seus olhos, tenho
18 minutos pra ir.
Ai vem o padre pra salvar minha alma, com
13 minutos pra ir.
E ele está falando sobre queimar, mas estou com tanto frio, tenho
12 minutos pra ir.
Agora estão testando o alçapão e faz minha espinha tremer,
11 minutos pra ir.
E o alçapão e a corda, funcionam bem, tenho mais
10 minutos pra ir.
Bem, estou esperando pelo perdão pra me deixar livre, com
9 minutos pra ir.
Mas isso é pra valer, então podem esquecer de mim, tenho
8 minutos pra ir.
Com meus pés na armadilha e minha cabeça no laço tenho mais
5 minutos pra ir
Não vai vir alguém e me soltar com
4 minutos pra ir
Eu posso ver as montanhas, eu posso ver o céu, com
3 minutos pra ir.
E é muito ruim para um homem que não quer morrer, com
2 minutos pra ir.
Eu posso ver os urubus, posso ouvir os corvos,
1 minuto pra ir.
E agora estou balançando e aí eu

vooooooou...

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"25 Minutes to Go"
letra: Shel Silverstein


Johnny Cash - "25 Minutes to Go"

Ouça:
Johnny Cash - "25 Minutes to Go"

terça-feira, 5 de março de 2013

Dossiê ÁLBUNS FUNDAMENTAIS


E chegamos ao ducentésimo Álbum Fundamental aqui no clyblog .

Quem diria, não?

Quando comecei com isso ficava, exatamente, me perguntando até quantas publicações iria e hoje, pelo que eu vejo, pelos grandes discos que ainda há por destacar, acredito que essa brincadeira ainda possa ir um tanto longe.

Nesse intervalo do A.F. 100 até aqui, além, é claro, de todas as obras que foram incluídas na seção, tivemos o acréscimo de novos colaboradores que só fizeram enriquecer e abrilhantar nosso blog. Somando-se ao Daniel Rodrigues, Edu Wollf , Lucio Agacê e José Júnior, figurinhas carimbadas por essas bandas, passaram a nos brindar com seus conhecimentos e opiniões meu amigo Christian Ordoque e a querida Michele Santos, isso sem falar nas participações especiais de Guilherme Liedke, no número de Natal e de Roberto Freitas, nosso Morrissey cover no último post, o de número 200.

Fazendo uma pequena retrospectiva, desde a primeira publicação na seção, os ‘campeões’ de ÁLBUNS FUNDAMENTAIS agora são 5, todos eles com 3 discos destacados: os Beatles, os Rolling Stones, Miles Davis , Pink Floyd e David Bowie , já com 2 resenhas agora aparecem muitos, mas no caso dos brasileiros especificamente vale destacar que os únicos que tem um bicampeonato são Legião Urbana, Titãs, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Jorge Ben, Engenheiros do Hawaii e João Gilberto, sendo um deles com o músico americano Stan Getz. A propósito de parcerias como esta de Getz/Gilberto, no que diz respeito à nacionalidade, fica às vezes um pouco difícil estabelecer a origem do disco ou da banda. Não só por essa questão de parceiros mas muitas vezes também pelo fato do líder da banda ser de um lugar e o resto do time de outro, de cada um dos integrantes ser de um canto do mundo ou coisas do tipo. Neste ínterim, nem sempre adotei o mesmo critério para identificar o país de um disco/artista, como no caso do Jimmi Hendrix Experience, banda inglesa do guitarrista norte-americano, em que preferi escolher a importância do membro principal que dá inclusive nome ao projeto; ou do Talking Heads, banda americana com vocalista escocês, David Byrne, que por mais que fosse a cabeça pensante do grupo, não se sobrepunha ao fato da banda ser uma das mais importantes do cenário nova-iorquino. Assim, analisando desta forma e fazendo o levantamento, artistas (bandas/cantores) norte-americanos apareceram por 73 vezes nos ÁLBUNS FUNDAMENTAIS, os ingleses vem em segundo com 53 aparições e os brasileiros em, 3º pintaram 36 vezes por aqui.
Como curiosidade, embora aqueles cinco destacados anteriormente sejam os que têm mais álbuns apontados na lista, o artista que mais apareceu em álbuns diferentes foi, incrivelmente, Robert Smith do The Cure, por 4 vezes, pintando nos dois da própria banda ("Disintegration"  e "Pornography"), em um tocando com Siouxsie and the Banshees  e outra vez no seu projeto paralelo do início dos anos ‘80, o The Glove. Também aparece pipocando por aqui e por ali John Lydon, duas vezes com o PIL  e uma com os Pistols; Morrissey, duas vezes com os Smiths e uma solo; Lou Reed uma vez com o Velvet e outras duas solo; seu parceiro de Velvet underground, John Cale uma com a banda e outra solo; Neil Young , uma vez solo e uma com Crosby, Stills e Nash; a turma do New Order em seu "Brotherhood" e com o 'Unknown Pleasures" do Joy Division; e Iggy Pop 'solito' com seu "The Idiot" e com os ruidosos Stooges. E é claro, como não poderia deixar de ser, um dos maiores andarilhos do rock: Eric Clapton, por enquanto aparecendo em 3 oportunidades, duas com o Cream e uma com Derek and the Dominos, mas certamente o encontraremos mais vezes. E outra pequena particularidade, apenas para constar, é que vários artistas tem 2 álbuns fundamentais na lista (Massive Attack, Elvis, Stevie Wonder, Kraftwerk) mas apenas Bob Dylan e Johnny Cash colocaram dois seguidos, na colada.

No tocante à época, os anos ‘70 mandam nos A.F. com 53 álbuns; seguidos dos discos dos anos ‘80 indicados 49 vezes; dos anos ‘90 com 43 aparições; 40 álbuns dos anos ‘60; 11 dos anos ‘50; 6 já do século XXI; 2 discos destacados dos anos ‘30; e unzinho apenas dos anos ‘20. Destes, os anos campeões, por assim dizer são os de 1986, ano do ápice do rock nacional e 1991, ano do "Nevermind" do Nirvana, ambos com 10 discos cada; seguidos de 1972, ano do clássico "Ziggy Stardust" de David Bowie, com 9 aparições incluindo este do Camaleão; e dos anos do final da década de ‘60 (1968 e 1969) cada um apresentando 8 grandes álbuns. Chama a atenção a ausência de obras dos anos ‘40, mas o que pode ser, em parte, explicado por alguns fatores: o período de Segunda Guerra Mundial, o fato de se destacarem muitos líderes de orquestra e nomes efêmeros, era a época dos espetáculos musicais que não necessariamente tinham registro fonográfico, o fato do formato long-play ainda não ter sido lançado na época, e mesmo a transição de estilos e linguagens que se deu mais fortemente a partir dos anos 50. Mas todos esses motivos não impedem que a qualquer momento algum artista dos anos ‘40 (Louis Armstrong, Ella Fitzgerald, Cole Porter) apareça por aqui mesmo em coletânea, como foi o caso, por exemplo, das remasterizações de Robert Johnson dos anos ‘30 lançadas apenas no início dos anos 90. Por que não?

Também pode causar a indignação aos mais 'tradicionais', por assim chamar, o fato de uma época tida como pobre como os anos ‘90 terem supremacia numérica sobre os dourados anos 60, por exemplo. Não explico, mas posso compreender isso por uma frase que li recentemente de Bob Dylan dizendo que o melhor de uma década normalmente aparece mesmo, com maior qualidade, no início para a metade da outra, que é quando o artista está mais maduro, arrisca mais, já sabe os caminhos e tudo mais. Em ambos os casos, não deixa de ser verdade, uma vez que vemos a década de 70 com tamanha vantagem numérica aqui no blog por provável reflexo da qualidade de sessentistas como os Troggs ou os  Zombies, por exemplo, ousadia de SonicsIron Butterfly, ou maturação no início da década seguinte ao surgimento como nos caso de Who e Kinks. Na outra ponta, percebemos o quanto a geração new-wave/sintetizadores do início-metade dos anos ‘80 amadureceu e conseguiu fazer grandes discos alguns anos depois de seu surgimento como no caso do Depeche Mode, isso sem falar nos ‘filhotes’ daquela geração que souberam assimilar e filtrar o que havia de melhor e produzir trabalhos interessantíssimos e originais no início da década seguinte (veja-se Björk, Beck, Nine Inch Nails , só para citar alguns).

Bom, o que sei é que não dá pra agradar a todos nem para atender a todas as expectativas. Nem é essa a intenção. A idéia é ser o mais diversificado possível, sim, mas sem fugir das convicções musicais que me norteiam e, tenho certeza que posso falar pelos meus parceiros, que o mesmo vale para eles. Fazemos esta seção da maneira mais honesta e sincera possível, indicando os álbuns que gostamos muito, que somos apaixonados, que recomendaríamos a um amigo, não fazendo concessões meramente para ter mais visitas ao site ou atrair mais público leitor. Orgulho-me, pessoalmente, de até hoje, no blog, em 200 publicações, de ter falado sempre de discos que tenho e que gosto, à exceção de 2 ou 3 que não tenho em casa mas que tenho coletâneas que abrangem todas as faixas daquele álbum original, e de 2 que sinceramente nem gostava tanto mas postei por consideração histórica ao artista. Fora isso, a gente aqui só faz o que gosta. Mas não se preocupe, meu leitor eventual que tropeçou neste blog e deu de cara com esta postagem, pois o time é qualificado e nossos gostos musicais são tão abrangentes que tenho certeza que atenderemos sempre, de alguma maneira, o maior número de estilos que possa-se imaginar. Afinal, tudo é música e, acima de tudo, nós adoramos música.
Cly Reis

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PLACAR POR ARTISTA:
  • The Beatles: 3 álbuns
  • The Rolling Stones: 3 álbuns
  • David Bowie: 3 álbuns
  • Miles Davis: 3 álbuns
  • Pink Floyd: 3 álbuns

  • Led Zeppelin; Massive Attack, Elvis Presley, Siouxsie and the Banshees; Nine Inch Nails, The Who; The Kinks; U2; Nirvana; Lou Reed; The Doors; Echo and the Bunnymen; Cream; Muddy Waters; Johnny Cash; Stevie Wonder; Van Morrison; Deep Purple; PIL; Bob Dylan; The Cure; The Smiths; Jorge Ben; Engenheiros do Hawaii; Caetano Veloso; Gilberto Gil; Legião Urbana; Titãs e João Gilberto: 2 álbuns

PLACAR POR DÉCADA:
  • Anos 20: 1 álbum ("Bolero", Maurice Ravel)
  • Anos 30: 2 álbuns ("The Complete Recordings", Robert Johnson e "Carmina Burana", de carl Orff)
  • Anos 50: 11 álbuns
  • Anos 60: 40 álbuns
  • Anos 70: 53 álbuns
  • Anos 80: 49 álbuns
  • Anos 90: 43 álbuns
  • Anos 00:  6 álbuns

PLACAR POR ANO:
  • 1986 e 1991: 10 álbuns
  • 1972: 9 álbuns
  • 1968 e 1969: 8 álbuns
  • 1987 e 1969: 7 álbuns

PLACAR POR NACIONALIDADE (ARTISTAS):
  • EUA: 73
  • Inglaterra: 53
  • Brasil: 36
  • Irlanda: 4
  • Escócia: 3
  • Alemanha: 2
  • Canadá: 2
  • Suiça; Jamaica; Islândia; França; País de Gales; Itália e Austrállia: 1 cada



sábado, 26 de janeiro de 2013

Danzig - "Danzig II - Lucifuge" (1990)



“Vós tendes por pai o Diabo,
e quereis satisfazer os desejos de vosso pai”
citação do livro de João, da Bíblia,
no encarte da edição original do álbum



Dia desses estava eu numa loja de CD’s comprando uma camiseta do Johnny Cash, e como não raro acontece, o som que tocava na loja me chamou a atenção. Um metal semi-acústico alicerçado no blues, interpretado com ênfase, paixão e vigor. Interessantíssimo aquilo! Fui até o balconista e perguntei do que se tratava, ao que ele me respondeu que era Danzig. Ora, já havia ouvido falar da banda mas nunca efetivamente havia escutado. A surpresa foi agradabilíssima. Perguntei o nome da música. Aquela chamava-se “I’m the One”. Estusiasmante, extasiante! Ao melhor estilo dos blueseiros da antiga mas cantado com a força do metal.

Procurei saber de onde era aquela música e a mesma fazia parte do álbum chamado “Lucifuge” que, já na primeira audição, ratificando a boa impressão inicial apresentava-se como um maravilhoso exemplar de uma espécie de blues-metal bastante original na sua concepção, execução e interpretação.

Embora utilizando-se, sim, de instrumentos elétricos, de peso e vocais impetuosos, A produção caprichada do ótimo Rick Rubin (de "BloodSugarSexMagik" dos Chilli Peppers e a série "American" de Johnny Cash , por exemplo) estreita de maneira admirável as correntes do metal com as características mais primárias do bom e velho blues tradicional dos grandes mestres, isso sem falar nas temáticas, é claro, sinistras, cheias de lendas e demônios comuns a ambos os estilos.

Além da já citada “I’m the One”, minha favorita, destaque especial também para a primeira “Long Way Back from Hell” um metal galopante, potente, forte e vigoroso; para a balada “Blood and Tears”; para o ótimo blues-metal apocalíptico "777";  e para a excelente “Killer Wolf”, referência ao lendário blueseiro Howlin’ Wolf, pelo título e pela interpretação. No restante, todas são boas canções mas, se pode-se apontar um defeito é que, talvez uniformes demais, algumas acabem soando muito parecidas com as outras. Mas nada que desdoure ou invalide todos os méritos deste ótimo trabalho.

Só algum tempo depois de conhecer o Danzig foi que descobri que o líder, vocalista, idealizador, Glen Danzig era o vocalista do extinto Misfits, que para falar a verdade, nunca me agradou muito. Já o Danzig, bastou um pouquinho daquele blues diferente, envenenado, sujo, satânico pra me pegar pelos ouvidos.
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FAIXAS:
  1. "Long Way Back from Hell" - 4:27
  2. "Snakes of Christ" - 3:59
  3. "Killer Wolf" - 4:14
  4. "Tired of Being Alive" - 4:03
  5. "I'm the One" - 4:09
  6. "Her Black Wings" - 4:47
  7. "Devil's Plaything" - 3:58
  8. "777" - 5:40
  9. "Blood and Tears" - 4:20
  10. "Girl" - 4:18
  11. "Pain in the World" - 5:46
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Ouça:
Danzig II Lucifuge



Cly Reis

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Nine Inch Nails - "The Downward Spiral" (1994)








"Eu quero te fuder como um animal

Eu quero te sentir por dentro
Eu quero te fuder como um animal
Minha existência toda é defeituosa
Você me deixa mais perto de Deus"
refrão de "Closer"




As pancadas de um espancamento que vão-se acelerando até se incorporarem à batida de “Mr. Self Destruction”, música que dá início ao disco “The Downward Spiral” (1994), servem de aviso para prevenir que o que virá a partir de então é uma pancadaria total. Aliás, o próprio nome desta primeira faixa também é muito sintomático e anunciatório sobre o teor e conteúdo da obra: as letras dolorosas, desesperadas, inconsequentes, desesperançosas afiançam, sem esforço, a auto-destruição anunciada por Trent Raznor.
Sob atmosferas de caos sonoro, peso absurdo, guitarras distorcidas ao extremo, torrentes de ruídos e efeitos, Trent Raznor, o “Homem-NIN” visita estilos como o hip-hop, o dance, o gótico, o punk sem em momento algum deixar de ser impactante, inquietante, perturbador.
A mencionada “Mr. Self Destruction” é uma sinfonia do caos com suas guitarras barulhentas juntando-se ao que parece ser todos os efeitos e ruídos de estúdio possíveis que alguém conseguisse produzir, até explodir em êxtases infernais. “Piggy”, cuja inspiração, o assassinato de Sharon Tate pelo grupo fanático de Charles Manson, já pode ser considerada no mínimo sinistra , gravada inclusive, como todo o restante do álbum, na casa onde o crime aconteceu, é lenta, às vezes quase sussurrada, mas ao final irrompe em evoluções ensandecidas de bateria, num solo primoroso e inspirado do próprio Trent.
“Ruiner” abre com um batidão rap mas logo ganha contornos naturalmente furiosos com um refrão impiedosamente gritado, extraído do ponto mais fundo de sua garganta. A acelerada “March of Pigs” impressiona pela selvageria e pelo seu tempo de bateria completamente inusitado, ao passo que o hit “Closer”, com seu ritmo compassado e bases eletrônicas variadas, quase choca pela agressividade da letra pervertida, sádica, masoquista e explícita.
O caráter predominantemente eletrônico de “The Becoming” talvez esconda o primor da composição extremamente elaborada e bem arranjada, mostrando toda a capacidade de um músico de formação clássica que faz barulho porque quer e não porque não sabe fazer música, como muitas vezes se pensa de roqueiros. Introduzida por sons de um elevador, “Reptile” é um exemplar bem característico do chamado metal industrial, numa composição inteligente fundindo peso, tecnologia e ritmo. Outra nesta linha, cheia de sons mecânicos, ruídos, barulhos estranhos e maquinários, é a do título do disco, "The Downward Spiral", uma peça bem experimental que remete ao solo de piano do final de "Closer" e, de certa forma ao violão de "Hurt".
Outra que merece referência especial é “I Do Not Want This” com seus loops de bateria interessantíssimos, muito bem elaborada, evoluindo e culminando em outro final ensurdecedor, numa fusão aterradora de efeitos, guitarras e ruídos como o NIN, acima de qualquer outro, é especialista em fazer. Ainda temos “Big Man With a Gun” insana, gritada, frenética, selvagem; a ótima instrumental, “A Warm Place”, que é um pequeno oásis de tranquilidade em meio ao apocalipse; “Eraser”, muitíssimo bem construída; e a já clássica, “Hurt”, que viria a ser imortalizada anos depois por Johnny Cash, fechando o disco sussurrada entre o som de um piano e o barulho do vento, numa canção lamentosa e dolorida.
Se o Nine Inch Nails  já tinha produzido o melhor exemplar de música industrial com o EP "Broken" , neste álbum, “The Downward Spiral”, aprimorava então a fórmula e apresentava um trabalho mais completo, encorpado e definidor. Aquilo era o tamanho do potencial de Trent Raznor, aquilo era o melhor do industrial e, sobretudo, aquilo era definitivamente Nine Inch Nails.
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FAIXAS:
  1. "Mr. Self Destruct" - 4:30
  2. "Piggy" - 4:24
  3. "Heresy" - 3:54
  4. "March of the Pigs" - 2:58
  5. "Closer" - 6:13
  6. "Ruiner" - 4:58
  7. "The Becoming" - 5:31
  8. "I Do Not Want This" - 5:41
  9. "Big Man With a Gun" - 1:36
  10. "A Warm Place" - 3:22
  11. "Eraser" - 4:54
  12. "Reptile" - 6:51
  13. "The Downward Spiral" - 3:57
  14. "Hurt" - 6:13
vídeo de "Closer" - Nine Inch Nails
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Ouça:
NIN The Downward Spiral