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quinta-feira, 22 de março de 2018

Aretha Franklin - "I Never Loved a Man The Way I Love You" (1967)




"R-E-S-P-E-I-T-O"




Só "Respect", clássico de Otis Redding que talvez tenha ganhado sua leitura definitiva e eternizada na voz de Aretha Franklin, já seria o suficiente para fazer de "I Never Loved a Man (The Way I Love You)" um álbum fundamental, mas o trabalho que fez dela definitivamente a rainha do soul não se limita a essa brilhante versão. Em seu primeiro disco pela Atlantic Records, Aretha teve, depois de muito tempo relegada a uma mera intérprete de standards na Columbia, a oportunidade de mostrar todo seu talento e foi aí que a cantora sentindo-se valorizada, com confiança e liberdade artística cresceu em si mesma, escolheu repertório, assumiu diversas composições, ousou nos arranjos e literalmente soltou a voz. O blues de piano marcante "Down In Own My Tears"; o gospel melancólico que dá nome ao disco "I Never Loved a Man..." com sua chorosa linha de matais; "Save Me", típica canção soul cheia de ritmo e embalo; as dilacerantes baladas "Baby Baby Baby" e "Do Right Woman, Do Right Man"; a tórrida "Dr. Feelgood"; e a reflexiva balada de Sam Cooke sobre preconceito racial "A Change Is Gonna Come", são outros grandes momentos do disco que justificam plenamente o fato de Aretha ser considerada até hoje por muitos a maior cantora de todos os tempos.
Em tempos de intolerância e turbulência social, "Respect" que na voz de Aretha tomou um novo significado e foi adotado como uma espécie de hino feminista, torna-se mais atual do que nunca e renova sua abrangência e relevância neste momento de reafirmação da mulher dentro da sociedade. O que é impressionante é que, em pleno século XXI, mais de meio século depois de Aretha Franklin ter dado esse grito de resistência, ainda seja necessário que mulheres tenham que pedir algo tão elementar e básico como... RESPEITO.

Cly Reis

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FAIXAS:
1. "Respect" - Otis Redding 2:29
2. "Drown in My Own Tears" - Henry Glover 4:07
3. "I Never Loved a Man (The Way I Love You)" - Ronnie Shannon 2:51
4. "Soul Serenade" - King Curtis, Luther Dixon 2:39
5. "Don't Let Me Lose This Dream" - Aretha Franklin, Ted White 2:23
6. "Baby Baby Baby" - Aretha Franklin, Carolyn Franklin 2:54
7. "Dr. Feelgood" - Aretha Franklin, Ted White 3:23
8. "Good Times" - Sam Cooke 2:10
9. "Do Right Woman, Do Right Man" - Dan Penn, Chips Moman 3:16
10. "Save Me" - Aretha Franklin, Carolyn Franklin, King Curtis 2:21
11. "A Change Is Gonna Come" - Sam Cooke 4:20


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Ouça:
Aretha Franklin - I Never Loved a Man The Way I Love You





sábado, 25 de dezembro de 2021

Jingle Black - 7 vezes em que Papai Noel caiu na soul music


O black loucão George Clinton dando
uma de Papai Noel
Se tem coisa que a gente gosta é pegar como gancho o Natal para fazer paralelos com temas como cinema, literatura e música. Aí quando se junta a isso uma outra paixão, que é fazer listas, então: é só servir a ceia! Nessa
vibe natalina, pensamos em trazer aqui uma lista bem musical para esta época de Festas, mas com um, digamos, groove diferente. Sim: artistas da soul music que produziram obras com a temática natalina. E são vários! Comum no mercado fonográfico norte-americano desde os anos 50, tanto para músicos desta vertente quanto de outros gêneros, como a música popular, o country, o rock e até o jazz, claro que o clima festivo e de confraternização da data se encaixaria muito bem com os sons suingados e animados da música black. Não deu outra: a química perfeita.

E se os gringos foram os que lançaram a moda, aqui no Brasil o pessoal da soul não fica para trás, não! Tem brazucas de respeito nesta listagem também, todos hábeis em colocar Papai Noel pra remexer os quadris. Afinal, se é cabível a discussão de que Jesus Cristo era preto, porque não sondar que o Bom Velhinho também não possa ser “da cor”? Pelo menos na música, em vários momentos ele foi, e aqui vão alguns bons exemplos.

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The Supremes – “Merry Christmas” (1965) 

Diana Ross e suas parceiras foram a tradução do melhor que a gravadora especializada em black music Motown podia ter. Supremas na interpretação, elas cabiam perfeitamente ao estilo de arranjo e produção musical do selo, bem como no esquema de marketing da indústria fonográfica da época, a qual tinham uma boa fatia de mercado. Claro que, com todos esses atributos, não demoraria para que gravassem o seu disco especial de Natal, o que ocorreu três anos depois da estreia do grupo vocal. Clássicos do cancioneiro natalino como “Silver Bells”, “Santa Claus is Coming To Town” e “My Favorite Things” são um arraso na voz delas. OUÇA AQUI



James Brown & The Flamous Flames 
– ”James Brown Sings Christmas” (1966) 

Um velho barbudo e branco tentando bancar de rei só porque é Natal? Isso é inadmissível para quem é o Rei do Soul. James Brown não deixou por menos e gravou não um, mas três álbuns natalinos ao longo da carreira, os quais foram compilados em 2010. O melhor deles, no entanto, é o primeiro: ”James Brown Sings Christmas”, de 1966. Acompanhado da sua competente banda à época, a Flamous Flames, e com arranjos caprichados que bebem no gospel e no R&B, tem como grande detalhe ser um disco totalmente autoral, ou seja, dispensa as tradicionais regravações de standarts. É James Brown impondo a sua autoridade - Papai Noel que vá ciscar noutro lugar. OUÇA AQUI



The Jackson 5
 – “Christmas Album” (1970) 

Curiosamente, foi uma família de Testemunhas de Jeová que gravou um dos melhores álbuns de Natal todos os tempos. Outros que, assim como as Supremes, traduziam muito bem o espírito e o estilo da Motown, os Jackson 5 também modernizaram os clássicos natalinos em versões recheadas de funk e groove. Michael Jackson, então com 12 anos, já dava sinais de que, de fato, era diferenciado, mas os irmãos não ficam mal na foto, não. Além disso, a produção de Hal Davis e, principalmente, os arranjos do craque Gene Page – autor da memorável trilha do filme blackexplotation “Blackula” –, abrilhantam ainda mais o trabalho. Foi o álbum de Natal mais vendido de 1970 a 1972, com mais de 3,5 milhões de cópias em todo o mundo. OUÇA AQUI



Cassiano
 música “Hoje é Natal” de "Cuban Soul" (1976) 

Quem acha que só gringo dos States manja de soul, está muito enganado. No Brasil, pelo menos um gênio do gênero existiu e se chamava Genival Cassiano. Em seu segundo disco solo, “Cuban Soul” ou “18 Kilates”, este paraibano brilha como uma verdadeira joia. Dono de um estilo de cantar e compor inigualáveis, Cassiano tem no disco a parceria de Paulo Zdanowski em todo o repertório (que traz maravilhas como “Coleção”, “Onda” e o hit “A Lua e Eu”). Mas especialmente a faixa de abertura traz o tema natalino, na tristonha “Hoje é Natal”. Com sua melodia cheia de nuances e encadeamentos que somente um músico de mão cheia e muito inspirado sabe fazer, a música é brilhante como o título do álbum sugere. OUÇA AQUI



Gerson King Combo
 – “Jingle Black" (1977) 

Como um verdadeiro Black Moses, o cara tinha escrito a tábua da música soul brasileira em “Mandamentos Black” naquele mesmo ano. Ou seja: tava com toda a licença para tornar preto também o Papai Noel. É isso que Gerson King Combo faz com seu vozeirão e ritmo contagiante em “Jingle Black”, o sugestivo título do compacto lançado em 1977, em pleno auge de sua popularidade nos bailes funk da Zona Sul. Curiosamente, a música, escrita por ele com Pedrinho da Luz e Ronaldo Correa, traz no seu lado oposto a maravilhosa “Good Bye”, provavelmente a melhor canção do repertório do James Brown Brasileiro. No mercado negro, o raro minidisco com apenas duas faixas custa aproximadamente 200 Reais. E vale. OUÇA AQUI



Bootsy Collins
 – “Christmas Is 4 Ever“ (2006) 

Numa lista de soul natalina em que há a sonoridade tradicional, passando pelo modelo Motown, pelo funk e pelas baladas, não podia faltar a turma P-Funk, que mais do que ninguém soube subverter ao máximo o gênero adicionando-lhe psicodelia, peso e muita irreverência. E Bootsy Collins foi quem puxou o trenó no disco “Christmas Is 4 Ever”, em que reúne uma galera como George Clinton, Bernie Worrell e Bobby Womack e os rappers MC Danny Ray, Snoop Dogg e DJizzle em leituras muito inspiradas de temas típicos, mas também outras originais. O resultado é um som moderno e contagiante, em que canções tradicionais como “Jingle Bells” viram “Jingle Belz”, “Winter Wonderland”, “WinterFunkyLand” e “This Christmas”, “Dis-Christmiss”. Bem a cara malucona de Bootzilla e seus amigos. OUÇA AQUI



Aretha Franklin
 – “This Christmas, Aretha” (2008) 

A Rainha do Soul, diferentemente dos Jackson 5, foi bastante fiel às raízes protestantes de sua formação religiosa e filosófica a ponto de demorar décadas para gravar, de fato, um disco de Natal. Somente mais de meio século depois de estrear para a música que Aretha Franklin topou a empreitada no bonito “This Christmas, Aretha”. Tem standarts? Claro, mas também temas autorais como "'Twas the Night Before Christmas", dela e de Clement C. Moore, e um dueto com o filho e também cantor Edward Franklin na faixa-título. Valeu a pena a flexibilizada de Aretha: o disco alcançou a posição de nº 102 na parada de álbuns da Billboard. OUÇA AQUI



Snoop Dogg
 – “Snoop Dogg Presents Christmas In Tha Dogg House” (2008) 

Ícone do gangsta rap, Snoop Dog ficou bem conhecido com canções natalinas ao emplacar, em 2014, o tema do filme “A Escolha Perfeita 2”, cantando em dueto com Anna Kendrick "Winter Wonderland/Here Comes Santa Claus”. Mas anos antes o próprio já havia compilado várias de suas gravações com esta temática em “Snoop Dogg Presents Christmas In Tha Dogg House”. No clima “preto ostentação”, o rapper tem a companhia de diversos artistas como Chris Starr, Lil Gee, Hustle Boyz, Uncle Chucc e Soopafly. Pioneiro, o álbum foi disponibilizado apenas em formato digital, isso antes do mercado de música ser dominado pelo streaming. Títulos característicos da linguagem do gueto: "My Little Mama Trippin on Xmas", "Christmas in the Hood”, "Xmas on Soul" e "Christmas Outro". OUÇA AQUI


Daniel Rodrigues

domingo, 8 de março de 2020

7 discos feitos para elas cantarem

ESPECIAL DIA DA MULHER
Eles compõem. Mas a voz é delas

por Daniel Rodrigues
com colaboração de Paulo Moreira

Michael Jackson e Diana Ross:
devoção à sua musa
Mestre Monarco disse certa vez que, embora a maioria quase absoluta de sambistas compositores sejam homens, nada sairia do zero sem a autoridade das pastoras. Se aquele samba inventado por eles entrasse numa roda de pagode e as cantoras da quadra não o "comprassem", ou seja, não o considerasse bom o suficiente para ser entoado, de nada valia ter gasto tutano compondo-o. Era como se nem tivesse sido escrito: pode descartar e passar para o próximo. Isso porque, segundo o ilustre membro da Velha Guarda da Portela, são as cantoras da comunidade que escolhem os sambas, que fazem passar a existir como obra de fato algo até então pertencente ao campo da imaginação. A voz masculina, afirma Monarco, não tem beleza suficiente para fazer revelar o verdadeiro mistério de um samba. A da mulher, sim.

Cale e Nico: sintonia
Talvez Monarco se surpreenda com a constatação de que seu entendimento sobra a alma da música vai além do samba e que não é apenas ele que pensa assim. Seja no rock, no pop, no jazz ou na soul music, outros compositores como ele partilham de uma ideia semelhante: a de que, por mais que se esforcem ou também saibam cantar (caso do próprio Monarco, dono de um barítono invejável), nada se iguala ao timbre feminino. Este é o que casa melhor com a melodia. Se comparar uma mesma canção cantada por um homem e por uma intérprete, na grande maioria das vezes ela é quem sairá vencendo.

A recente parceria de Gil
e Roberta Sá
Isso talvez não seja facilmente explicável, mas é com certeza absorvível pelos ouvidos com naturalidade. Por que, então, o Pink Floyd poria para cantar "The Great Gig in the Sky" Clare Torry e não os próprios Gilmour ou Waters? Ou Milton Nascimento, um dos mais admirados cantores da música mundial, em chamar Alaíde Costa especialmente para interpretar "Me Deixa em Paz" em meio a 20 outras faixas cantadas por ele ou Lô Borges em “Clube da Esquina”? Ao se ouvir o resultado de apenas estes dois exemplos fica fácil entender o porquê da escolha.

Nesta linha, então, em homenagem ao Dia da Mulher, selecionamos 7 trabalhos da música em que autores homens criaram obras especialmente para as suas “musas” cantarem. De diferentes épocas, são repertórios totalmente novos, fresquinhos, dados de presente para que elas, as cantoras, apenas pusessem suas vozes. “Apenas”, aliás, é um eufemismo, visto que é por causa da voz delas que essas obras existem, pois, mais do que somente a característica sonora própria da emissão das cordas vocais, é o talento delas que preenche a música. Elas que sabem revelar o mistério. “Música” é uma palavra essencialmente feminina, e isso explica muita coisa.

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Elizeth Cardoso – “Canção do Amor Demais” (1958)
Compositores: Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes

"Rua Nascimento Silva, 107/ Você ensinando pra Elizeth/ As canções de 'Canção do Amor Demais'", escreveu Tom Jobim na canção em que relembra quando, jovens, ele e o parceiro Vinicius compuseram um disco inteirinho para a então grande cantora brasileira: Elizeth Cardoso. Eram tempos de pré-bossa nova, movimento o qual este revolucionário disco, aliás, é o responsável por inaugurar. Mesmo que o gênero tenha ficado posteriormente conhecido pelo canto econômico por influência de João Gilberto e Nara Leão, o estilo classudo a la Rádio Nacional da “Divina” se encaixa perfeitamente às então novas criações da dupla, que havia feito recente sucesso compondo em parceria a trilha da peça “Orfeu da Conceição”, de 3 anos antes. Um desfile de obras-primas que, imediatamente, se transformavam em clássicos do cancioneiro brasileiro: “Estrada Branca”, “Eu não Existo sem Você”, “Modinha” e outras. O próprio João, inclusive, afia seus acordes dissonantes em duas faixas: a clássica “Chega de Saudade” e a talvez mais bela do disco “Outra Vez”.

FAIXAS
1. "Chega de Saudade"
2. "Serenata do Adeus"
3. "As Praias Desertas" 
4. "Caminho de Pedra"
5. "Luciana" 
6. "Janelas Abertas"
7. "Eu não Existo sem Você"   
8. "Outra Vez" 
9. "Medo de Amar" 
10. "Estrada Branca" 
11. "Vida Bela (Praia Branca)" 
12. "Modinha"  
13. "Canção do Amor demais"
OUÇA

Dionne Warwick‎ – “Presenting Dionne Warwick” (1963)
Compositores: Burt Bacharach e Hal David 


Raramente uma cantora começa uma carreira ganhando um repertório praticamente todo novo (cerca de 90% do disco) e a produção de uma das mais geniais duplas da história da música moderna: Burt Bacharach e Hal David. Mais raro ainda é merecer tamanho merecimento. Pois Dionne Warwick é esta artista. A cantora havia chamado a atenção de David e Bacharach, que estavam procurando a voz ideal para suas sentimentais baladas. Não poderia ter dado mais certo. Ela, que se tornaria uma das maiores hitmakers da música soul norte-americana – inclusive com músicas deles – emplaca já de cara sucessos como "Don't Make Me Over", "Wishin' and Hopin'", "Make It Easy on Yourself", "This Empty Place".



FAIXAS
1. "This Empty Place"
2. "Wishin' and Hopin'"  
3. "I Cry Alone"  
4. "Zip-a-Dee-Doo-Dah" (Ray Gilbert, Allie Wrubel)
5. "Make the Music Play"
6. "If You See Bill" (Luther Dixon)
7. "Don't Make Me Over"
8. "It's Love That Really Counts"
9. "Unlucky" (Lillian Shockley, Bobby Banks)
10. "I Smiled Yesterday"
11. "Make It Easy on Yourself"
12. "The Love of a Boy"
Todas de autoria David e Bacharach,, exceto indicadas
OUÇA

Nico – “The Marble Index” (1968)
Compositor: John Cale

Diferente de Dionne, Nico já era uma artista conhecida tanto como modelo, como atriz (havia feito uma ponta no cult movie “La Dolce Vita”, de Fellini) como, principalmente, por ter pertencido ao grupo que demarcaria o início do rock alternativo, a Velvet Underground, apadrinhados por Andy Wahrol e ao qual Cale era um dos cabeças ao lado de Lou Reed. Já havia, inclusive, gravado, em 1967, um disco, o cult imediato “Chelsea Girl”. Porém, coincidiu de tanto ela (que não gostara do resultado do seu primeiro disco) quanto Cale (de saída da Velvet) quererem alçar voos diferentes e explorar novas musicalidades. Totalmente composto, produzido e tocado por Cale, “Marble”, predecessor do dark, é sombrio, denso, enigmático e exótico. A voz grave de Nico, claro, colabora muito para essa poética sonora. A parceria deu tão certo que a dupla repetiria a mesma fórmula em outros dois ótimos discos: “Deserthore” (1970) e “The End” (1974).

FAIXAS
1. "Prelude"
2. "Lawns of Dawns"
3. "No One Is There"
4. "Ari's Song"
5. "Facing the Wind"
6. "Julius Caesar (Memento Hodié)"

7. "Frozen Warnings"
8. "Evening of Light"


Aretha Franklin – “Sparkle” (1976)
Compositor: Curtis Mayfield 


Na segunda metade dos anos 70, quando a era disco e a black music dominavam as pistas e as paradas, foi comum a várias cantoras norte-americanas gravarem discos com esta atmosfera. Aretha Franklin fez a seu modo: para a trilha sonora de um filme inspirado na história das Supremes, chamou um dos gênios da soul, Curtis Mayfield, para lhe escrever um repertório próprio. Deu em um dos melhores discos da carreira da Rainha do Soul, álbum presente na lista dos 200 álbuns definitivos no Rock and Roll Hall of Fame. As gingadas “Jump” e “Rock With Me”, bem como as melodiosas ‘”Hooked on Your Love”, “Look into Your Heart” e a faixa-título, não poderiam ter sido compostas por ninguém menos do que o autor de “Superfly”.



FAIXAS:
1. "Sparkle" 
2. "Something He Can Feel" 
3. "Hooked on Your Love" 
4. "Look into Your Heart" 
5. "I Get High" 
6. "Jump" 
7. "Loving You Baby"
8. "Rock With Me"


Diana Ross – “Eaten Alive!” (1985)
Compositor: Barry Gibb



Já que lembramos das Supremes, então é hora de falar da mais ilustre do conjunto vocal feminino: Diana Ross. Com uma longa discografia entre os discos com a banda e os da carreira solo, em 1985 ela ganha de presente do amigo e admirador Barry Gibb, líder da Bee Gees, baladas e canções pop esculpidas para a sua voz aguda e sentimental. De sonoridade bem AOR anos 80, o disco tem, além de Gibb, a da devoção de outro célebre músico à sua idolatrada cantora: Michael Jackson. Seu ex-parceiro de palcos, estúdios e de cinema, o autor de “Thriller” coassina a esfuziante faixa-título para a sua madrinha na música. Merecida e bonita homenagem.



FAIXAS:
1. “Eaten Alive”
2. “Oh Teacher” 
3. “Experience” 
4. “Chain Reaction”
5. “More And More” 
6. “I'm Watching You”
7. “Love On The Line” 
8. “(I Love) Being In Love With You” 
9. “Crime Of Passion” 
10. “Don't Give Up On Each Other”


Gal Costa – “Recanto” (2011)
Compositor: Caetano Veloso

A afinidade de Caetano e Gal é profunda e vem de antes de gravarem o primeiro disco de suas carreiras juntos, em 1966, “Domingo” – quando ele, aliás, compôs as primeiras músicas para a voz dela, como as célebres “Coração Vagabundo” e “Avarandado”. Ela o gravaria várias vezes durante a longa carreira, não raro com temas escritos especialmente. “Recanto”, disco que já listamos em ÁLBUNS FUNDAMENTAIS e entre os melhores da MPB dos anos 2010, é, de certa forma, a maturidade dessa relação pessoal e musical de ambos. “Recanto Escuro” e “Tudo Dói” são declarações muito subjetivas de Caetano tentando perscrutar a alma de Gal, o que vale também para o sentido inverso. Referência da música brasileira do início do século XXI, o disco, que tem a ajuda fundamental de Kassin e Moreno nos arranjos e produção, é, acima de tudo, a cumplicidade entre Caê e Gal, estes dois monstros da música, vertida em sons e palavras.

FAIXAS
1. Recanto Escuro
2. Cara do Mundo 
3. Autotune Autoerótico 
4. Tudo Dói 
5. Neguinho 
6. O Menino
7. Madre Deus 
8. Mansidão 
9. Sexo e Dinheiro 
10. Miami Maculelê 
11. Segunda


Roberta Sá – “Giro” (2019)
Compositor: Gilberto Gil 


Talvez este seja o único caso entre os listados em que a cantora não está à altura do repertório que recebeu. Não que Roberta Sá não tenha qualidades: é afinada, graciosa e tem lá a sua personalidade. Mas que sua interpretação fica devendo à qualidade suprema da música do mestre Gil fica. “Giro”, no entanto, é bem apreciável, principalmente faixas como “Nem”, “Afogamento”, “Autorretratinho” e “Ela Diz que Me Ama”, em que a artista potiguar consegue reunir novamente Gil e Jorge BenJor, num samba-rock típico deste último: os contracantos, o coro masculino como o do tempo do Trio Mocotó e a batida de violão intensa, a qual Gil – conhecedor como poucos do universo do parceiro –, se encarrega de tocar.




FAIXAS
1. “Giro”
2. “O Lenço e o Lençol”
3. “Cantando As Horas”
4. “Ela Diz Que Me Ama”
5. “Nem”
6. “Fogo de Palha”
7. “Autorretratinho”
8. “A Vida de um Casal”
9. “Xote da Modernidade”
10. “Outra Coisa”
11. “Afogamento”

terça-feira, 24 de novembro de 2009

200 Melhores Músicas de Todos os Tempos

Saiu uma dessas listas da Rolling Stone com as 200 melhores músicas de todos os tempos.
Concordo com muitas, é lógico, discordo de alguma ordem que outra mas fundamentalmente me parece uma lista excessivamente conservadora. Só foi no certo. Não arrisca quase nada acima dos anos 80. Pode ser que o crítico, os críticos, os votantes, sei lá quem, realmente achem que não existe nada que valha a pena nos últimos tempos, mas assim parece uma lista de melhores até 1975, com raras exceções.
Exceção louvável é ver o Nirvana com justiça já figurar nas 10 primeiras posições.
Vale pela curiosidade:

1. Bob Dylan "Like a Rolling Stone" 1965
2. Rolling Stones "(I Can't Get No) Satisfaction" 1965
3. John Lennon "Imagine" 1971
4. Marvin Gaye "What's Going On" 1971
5. Aretha Franklin "Respect" 1967
6. Beach Boys "Good Vibrations" 1966
7. Chuck Berry "Johnny B. Goode" 1958
8. Beatles "Hey Jude" 1968
9. Nirvana "Smells Like Teen Spirit" 1991
10. Ray Charles "What'd I Say" 1959
11. The Who "My Generation" 1966
12. Sam Cooke "A Change Is Gonna Come" 1965
13. Beatles "Yesterday" 1965
14. Bob Dylan "Blowin' in the Wind" 1963
15. The Clash "London Calling" 1980
16. Beatles "I Want to Hold Your Hand" 1964
17. Jimi Hendrix "Purple Haze" 1967
18. Chuck Berry "Maybellene" 1955
19. Elvis Presley "Hound Dog" 1956
20. Beatles "Let it Be" 1970
21. Bruce Springsteen "Born To Run" 1975
22. The Ronettes "Be My Baby" 1963
23. Beatles "In My Life" 1966
24. Impressions "People Get Ready" 1965
25. Beach Boys "God Only Knows" 1966
26. Beatles "A Day in the Life" 1967
27. Derek and the Dominos "Layla" 1971
28. Otis Redding "Sitting on the Dock of the Bay" 1968
29. Beatles "Help!" 1965
30. Johnny Cash "I Walk the Line" 1956
31. Led Zeppelin "Stairway To Heaven" 1971
32. Rolling Stones "Sympathy For The Devil" 1968
33. Ike and Tina Turner "River Deep, Mountain High" 1966
34. Righteous Brothers "You've Lost That Lovin' Feelin'" 1964
35. The Doors "Light My Fire" 1967
36. U2 "One" 1991
37. Bob Marley and the Wailers "No Woman No Cry" 1974
38. Rolling Stones "Gimme Shelter" 1969
39. Buddy Holly and the Crickets "That'll Be the Day" 1957
40. Martha and The Vandellas "Dancing In The Street" 1964
41. The Band "The Weight" 1968
42. The Kinks "Waterloo Sunset" 1967
43. Little Richard "Tutti Frutti" 1956
44. Ray Charles "Georgia On My Mind" 1960
45. Elvis Presley "Heartbreak Hotel" 1956
46. David Bowie "Heroes" 1977
47. Simon and Garfunkel "Bridge Over Troubled Water" 1969
48. Jimi Hendrix "All Along The Watchtower" 1968
49. The Eagles "Hotel California" 1977
50. Smokey Robinson and the Miracles "The Tracks Of My Tears" 1965
51. Grandmaster Flash and The Furious Five "The Message" 1982
52. Prince "When Doves Cry" 1984
53. Sex Pistols "Anarchy In The UK" 1977
54. Percy Sledge "When A Man Loves A Woman" 1966
55. The Kingsmen "Louie Louie" 1963
56. Little Richard "Long Tall Sally" 1956
57. Procol Harum "Whiter Shade Of Pale" 1967
58. Michael Jackson "Billie Jean" 1983
59. Bob Dylan "The Times They Are A-Changin'" 1963
60. Al Green "Let's Stay Together" 1971
61. Jerry Lee Lewis "Whole Lotta Shakin' Goin' On" 1957
62. Bo Diddley "Bo Diddley" 1957
63. Buffalo Springfield "For What It's Worth" 1968
64. Beatles "The She Loves You" 1964
65. Cream "Sunshine of Your Love" 1968
66. Bob Marley and the Wailers "Redemption Song" 1968
67. Elvis Presley "Jailhouse Rock" 1957
68. Bob Dylan "Tangled Up In Blue" 1975
69. Roy Orbison "Cryin'" 1961
70. Dionne Warwick "Walk On By" 1964
71. Beach Boys "California Girls" 1965
72. James Brown "Papa's Got A Brand New Bag" 1965
73. Eddie Cochran "Summertime Blues" 1958
74. Stevie Wonder "Superstition" 1972
75. Led Zeppelin "Whole Lotta Love" 1969
76. Beatles "Strawberry Fields Forever" 1967
77. Elvis Presley "Mystery Train" 1956
78. James Brown "I Got You (I Feel Good)" 1965
79. The Byrds "Mr. Tambourine Man" 1968
80. Marvin Gaye "I Heard It Through The Grapevine" 1965
81. Fats Domino "Blueberry Hill" 1956
82. The Kinks "You Really Got Me" 1964
83 Beatles "Norwegian Wood" 1965
84. Police "Every Breath You Take" 1983
85. Patsy Cline "Crazy" 1961
86. Bruce Springsteen "Thunder Road" 1975
87. Johnny Cash "Ring of Fire" 1963
88. The Temptations "My Girl" 1965
89. Mamas And The Papas "California Dreamin'" 1966
90. Five Satins "In The Still Of The Nite" 1956
91. Elvis Presley "Suspicious Minds" 1969
92. Ramones "Blitzkrieg Bop" 1976
93. U2 "I Still Haven't Found What I'm Looking For" 1987
94. Little Richard "Good Golly, Miss Molly" 1958
95. Carl Perkins "Blue Suede Shoes" 1956
96 Jerry Lee Lewis "Great Balls of Fire" 1957
97. Chuck Berry "Roll Over Beethoven" 1956
98. Al Green "Love and Happiness" 1972
99. Creedence Clearwater Revival "Fortunate Son" 1969
100. Rolling Stones "You Can't Always Get What You Want" 1969
101. Jimi Hendrix "Voodoo Child (Slight Return)" 1968
102. Gene Vincent "Be-Bop-A-Lula" 1956
103. Donna Summer "Hot Stuff" 1979
104. Stevie Wonder "Living for the City" 1973
105. Simon and Garfunkel "The Boxer" 1969
106. Bob Dylan "Mr. Tambourine Man" 1965
107. Buddy Holly and the Crickets "Not Fade Away" 1957
108. Prince "Little Red Corvette" 1983
109. Van Morrison "Brown Eyed Girl" 1967
110. Otis Redding "I've Been Loving You Too Long" 1965
111. Hank Williams "I'm So Lonesome I Could Cry" 1949
112. Elvis Presley "That's Alright (Mama)" 1954
113. The Drifters "Up On The Roof" 1962
114. Crystals "Da Doo Ron Ron (When He Walked Me Home)" 1963
115. Sam Cooke "You Send Me" 1957
116. Rolling Stones "Honky Tonk Women" 1969
117. Al Green "Take Me to the River" 1974
118. Isley Brothers "Shout - Pts 1 and 2" 1959
119. Fleetwood Mac "Go Your Own Way" 1977
120. Jackson 5, "I Want You Back" 1969
121. Ben E. King "Stand By Me" 1961
122. Animals "House of the Rising Sun" 1964
123. James Brown "It's A Man's, Man's, Man's, Man's World" 1966
124. Rolling Stones "Jumpin' Jack Flash" 1968
125. Shirelles "Will You Love Me Tomorrow" 1960
126. Big Joe Turner "Shake, Rattle And Roll" 1954
127. David Bowie "Changes" 1972
128. Chuck Berry "Rock & Roll Music" 1957
129. Steppenwolf "Born to Be Wild" 1968
130. Rod Stewart "Maggie May" 1971
131. U2 "With or Without You" 1987
132. Bo Diddley "Who Do You Love" 1957
133. The Who "Won't Get Fooled Again" 1971
134. Wilson Pickett "In The Midnight Hour" 1965
135. Beatles "While My Guitar Gently Weeps" 1968
136. Elton John "Your Song" 1970
137. Beatles "Eleanor Rigby" 1966
138. Sly and the Family Stone "Family Affair" 1971
139. Beatles "I Saw Her Standing There" 1964
140. Led Zeppelin "Kashmir" 1975
141. Everly Brothers "All I Have to Do is Dream" 1958
142. James Brown "Please Please Please" 1956
143. Prince "Purple Rain" 1984
144. Ramones "I Wanna Be Sedated" 1978
145. Sly and the Family Stone "Every Day People" 1968
146. B-52's "Rock Lobster" 1979
147. Iggy Pop "Lust for Life" 1977
148. Janis Joplin "Me and Bobby McGee" 1971
149. Everly Brothers "Cathy's Clown" 1960
150. Byrds "Eight Miles High" 1966
151. Penguins "Earth Angel (Will You Be Mine)" 1954
152. Jimi Hendrix "Foxy Lady" 1967
153. Beatles "A Hard Day's Night" 1965
154. Buddy Holly and the Crickets "Rave On" 1958
155. Creedence Clearwater Revival "Proud Mary" 1964
156. Simon and Garfunkel "The Sounds Of Silence" 1968
157. Flamingos "I Only Have Eyes For You" 1959
158. Bill Haley and His Comets "(We're Gonna) Rock Around The Clock" 1954
159. Velvet Underground "I'm Waiting For My Man" 1967
160. Public Enemy "Bring the Noise" 1988
161. Ray Charles "I Can't Stop Loving You" 1962
162. Sinead O'Connor "Nothing Compares 2 U" 1990
163. Queen "Bohemian Rhapsody" 1975
164. Johnny Cash "Folsom Prison Blues" 1956
165. Tracy Chapman "Fast Car" 1988
166. Eminem "Lose Yourself" 2002
167. Marvin Gaye "Let's Get it On" 1973
168. Temptations "Papa Was A Rollin' Stone" 1972
169. R.E.M. "Losing My Religion" 1991
170. Joni Mitchell "Both Sides Now" 1969
171. Abba "Dancing Queen" 1977
172. Aerosmith "Dream On" 1975
173. Sex Pistols "God Save the Queen" 1977
174. Rolling Stones "Paint it Black" 1966
175. Bobby Fuller Four "I Fought The Law" 1966
176. Beach Boys "Don't Worry Baby" 1964
177. Tom Petty "Free Fallin'" 1989
178. Big Star "September Gurls" 1974
179. Joy Division "Love Will Tear Us Apart" 1980
180. Outkast "Hey Ya!" 2003
181. Booker T and the MG's "Green Onions" 1969
182. The Drifters "Save the Last Dance for Me" 1960
183. BB King "The Thrill Is Gone" 1969
184. Beatles "Please Please Me" 1964
185. Bob Dylan "Desolation Row" 1965
186. Aretha Franklin "I Never Loved A Man (the Way I Love You)" 1965
187. AC/DC "Back In Black" 1980
188. Creedence Clearwater Revival "Who'll Stop the Rain" 1970
189. Bee Gees "Stayin' Alive" 1977
190. Bob Dylan "Knocking on Heaven's Door" 1973
191. Lynyrd Skynyrd "Free Bird" 1974
192. Glen Campbell "Wichita Lineman" 1968
193. The Drifters "There Goes My Baby" 1959
194. Buddy Holly and the Crickets "Peggy Sue" 1957
195. Chantels "Maybe" 1958
196. Guns N Roses "Sweet Child O Mine" 1987
197. Elvis Presley "Don't Be Cruel" 1956
198. Jimi Hendrix "Hey Joe" 1967
199. Parliament "Flash Light" 1978
200. Beck "Loser" 1994

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Otis Redding - "Live in Europe" (1967)


"Ele parecia um cavalo de raça
esperando pelo sinal para correr (...)
Quando o show anterior acabou,
Otis entrou por trás do palco,
agarrou o microfone e começou a andar
de uma ponta a outra do palco.
Eu não acreditei no que estava acontecendo:
uma energia que eu nuca tinha visto antes."
Al Bell,
produtor musical
e executivo da Stax



Um dos ao vivo mais eletrizantes que eu já ouvi na minha vida. Energia pura. A gente sente, ouvindo, que uma espécie de êxtase delírio, catarse paira no ar nas apresentações de Otis Redding que fazem parte do disco "Live in Europe" (1967) que apanha fragmentos preciosos dos shows realizados em Paris, na turnê coletiva de artistas da gravadora Stax pela Europa.
Com apresentações curtas por causa do número de artistas que a gravadora levara para as apresentações no Velho Mundo, Otis Redding já tinha que chegar com o pé na porta mostrando que não vinha para brincadeira e por isso mesmo o soulman já saía largando a esfuziante "Respect", cuja interpretação mais marcante, provavelmente, seja a de Aretha Franklin, mas a dele, o autor, não menos clássica, mostra-se, espacialmente ao vivo, tão grandiosa quanto. O povo já ia ao delírio logo de cara.
Sem deixar cair a bola, o disco traz na sequência a vibrante "I Can't Turn You Loose", baixando a rotação logo em seguida com "My Girl", clássico dos Temptations carregada nas doses certas de romantismo, doçura, sensualidade e pungência; e com a dolorida balada "I've Loving You too Long" conquistando ainda mais o público francês.
"Shake", de Sam Cooke, ganhava uma versão de andamento acelerada e muita intensa em que o cantor chegava a rasgar o vocal em alguns momentos, mandando ver e quebrando tudo, acompanhado de sua competentíssima e não menos endiabrada banda.
O clássico riff rasgado de guitarra de Keith Richards, de "(I Can't Get No) Satisfaction" dos Rolling Stones, dava lugar a uma introdução vibrante de baixo, que sucedida por um naipe de metais empolgante, culminaria numa interpretação surpreendente e memorável de Redding, numa daquelas covers que a gente chega a pensar se não chega a ser melhor que a original.
"Fa-Fa-Fa-Fa-Fa" , um soul típico bem característico, tem a participação bacana do público no refrão e "These Arms of Mine" outra balada chorosa, esta com toques gospel, encaminha os momentos finis do álbum.
Assim como fizera com os Stones, Otis dava então a um clássico dos Beatles uma releitura interessantíssima. "Day Tripper" nas mãos do soulman e sua banda ganhava um andamento mais acelerado, um vocal mais ensandecido e uma metaleira marcante.
Final tradicional em todos os shows da turnê europeia, "Try A Little Tenderness", envenenada, frenética, alucinada, em uma interpretação pulsante e atuação de palco memorável enlouquecia definitivamente o Olympia de Paris. Em uma performance histérica na qual a banda terminava a música várias vezes para que o cantor a trouxesse de volta retomando-a ainda mais insanamente, não era difícil perceber ao fundo o público vindo abaixo. Êxtase, num final de espetáculo de deixar qualquer um paralisado, catatônico, incrédulo!
Otis Redding apresentaria-se ainda em  junho daquele mesmo 1967 no festival de Monterey onde teria sua consagração definitiva, infelizmente, por pouco tempo, uma vez que sua carreira e sua vida seriam tragicamente interrompidas por um desastre aéreo ainda no final daquele mesmo ano. Até por isso, "Live in Europe" ganha um papel mais importante dentro da discografia do artista, a de mostrar a qualidade, a performance, o brilhantismo, o carisma e a intensidade de Otis Redding em cima do palco, neste que foi o único registro ao vivo em álbum de sua carreira.
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FAIXAS:
1. Respect 3:43
2. Can't Turn You Loose 3:29
3. I've Been Loving You Too Long (To Stop Now) 4:08
4. My Girl 2:43
5. Shake 2:56
6. (I Can't Get No) Satisfaction 3:01
7. Fa-Fa-Fa-Fa-Fa (Sad Song) 4:04
8. These Arms Of Mine 3:47
9. Day Tripper 3:06
10. Try A Little Tenderness 5:07

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Ouça:
Otis Redding Live in Paris Full Concert

Cly Reis

quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Música da Cabeça - Programa #72


O adeus de uma rainha, a celebração a outra. Assim foi com a despedida a Aretha Franklin, a Rainha do Soul, e os 60 anos da Rainha do Pop, Madonna, fato que marcou a semana e que marca a edição do nosso programa desta quarta-feira. Programa que ainda tem a rivalidade sadia dos ícones do rock Rolling Stones, Beatles e Beach Boys. Não tem como não ser legal. Mas lhes digo: tem mais ainda! Que tal, então, completar com Johnny Cash, Alceu Valença, Carl Orff e outras coisas? É motivo de sobra pra não perder o Música da Cabeça de hoje, às 21h, na Rádio Elétrica. Produção e apresentação: Daniel Rodrigues.


Rádio Elétrica:
http://www.radioeletrica.com/

sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Wayne Shorter - "Adam's Apple" (1966)

 

“’Adam’s Apple’, a faixa-título, representa à sua maneira uma espécie de jazz contemporâneo universal e o ímpeto da dance music combinados, uma atualização do blues mais familiar e um veículo para as divertidas jornadas às paradas de sucesso”. 
Don Heckeman, do texto da contracapa original do disco

Parecia interminável a inspiração de Wayne Shorter naqueles idos de anos 60. Não que o lendário saxofonista e compositor norte-americano não tivesse também representativa produção já nos anos 50, principalmente na The Jazz Massangers de Art Blakey na qual foi revelado, ou nas décadas que se seguiram dos anos 70 em diante. Ocorre que, principalmente no intervalo entre 1964 e 1970, anos em que esteve sob o selo Blue Note rodeado do que de melhor havia em capital humano e técnico, a obra do jovem Shorter, então na faixa dos 30 anos, dá a impressão de ter entrado num looping criativo. Foram vários discos dignos de perfeição, que pareciam encadear-se e lançados em curtos espaços de tempo entre um e outro -- não raro, num mesmo ano como “Night Dreamer”, “JuJu” e “Speak No Evil”, os três de 1964, ou “The Soothsayer”, “Et Cetera” e “The All Seeing Eye”, todos de um ano depois. Mudavam os integrantes, adicionavam-se elementos sonoros, experimentavam-se formatos, e a qualidade mantinha-se, como se fosse tudo a continuidade de uma mesma coisa.

E era. Devidamente selada pelo estilo marcante de tocar de Shorter – capaz de ir do mais feroz grito dissonante à absoluta leveza lírica –, esta sequência mágica de obras resulta, em 1966, em “Adam’s Apple”, seu 10º álbum solo e o 7º pela Blue Note. Nesta obra, o band leader está acompanhado de um trio afiadíssimo e com o qual tinha total entrosamento: Reggie Workman, na bateria; Joe Chambers, ao baixo; e o fiel escudeiro Herbie Hancock, ao piano. Experimentando aqui, reiterando características ali, “Adam’s...” é indubitavelmente mais um dos discos clássicos de Shorter desta fase áurea, o qual, inclusive, traz alguns de seus temas mais conhecidos.

Começando pela faixa-título, a primeira investida incisiva de Shorter no estilo jazz-soul. Lee Morgan, Donald Byrd, Blue Mitchell e o próprio Hancock já haviam aderido ao groove popular de James Brown, Otis Redding e Aretha Franklin, mas Shorter, be-boper de formação, não havia se entregado completamente ainda. “Adam’s Apple”, no entanto, é puro R&B, é o funk nas escalas jazzísticas que tanto o próprio Shorter se valeria anos mais tarde com a sua Weather Report, banda sinônimo do fusion. São quase 6 min de pura sonoridade pop: riff que gruda nos ouvidos; sax soando inteiro nas modulações de intensidade; piano martelando um ritmo que faz mexer os quadris; baixo dançante; e a bateria - um detalhe à parte - numa aula de marcação rítmica, tanto no chipô quanto na variação caixa/tom-tom. Shorter não resistia à tentação do pop e dava uma mordiscada graúda na maçã de Adão.

Como todo bom Shorter, não podem faltar as baladas, aquelas as quais ele se esbalda em elegância. Em “Adam’s...”, o músico faz isso em dois momentos: a versão de “502 Blues (Drinkin' And Drivin')”, um blues inebriado de paixão em que dá para se sentir, literalmente, dirigindo pela noite de Nova York enchendo a cara por um amor não correspondido; e na linda “Teru”, que retraz propositalmente acordes de outro de seus temas românticos, a clássica “Virgo”, de “Night Dreamer”.

Elemento fundamental para a estética de Shorter nesta e em várias outras épocas de sua longa carreira, o piano do amigo Hancock carrega toda uma atmosfera mágica que une classe, sensibilidade e arrojo. Essa característica, que perpasse toda a fase da Blue Note, quase como uma coassinatura, está fortemente presente em “El Gaucho”, uma bossa nova em que, mais uma vez, Workman se destaca executando com muito estilo e variabilidade timbrística o sincopado ritmo latino. Temas como este já davam a entender, aliás, porque Shorter e Hancock, em especial entre os quatro, se entrosariam tão bem com a música brasileira pouco tempo dali.

“Footsprint”, embora menos “pop” que a música que dá nome ao álbum, é um dos temas mais conhecidos do vasto repertório autoral de Shorter, compositor gravado desde muito cedo por outros jazzistas, inclusive. Talvez seja justamente isso que tenha feito este belo tema bluesy cair nas graças de um outro artista: Miles Davis. E quando este ícone do jazz gostava de algo, sabia-se o destino: adquiria-se outro status. Adotada por Miles, que a gravou em seu “Smiles”, de 1967, “Footsprint” entrou no set-list do trompetista e foi largamente executada em turnê pela Europa e Estados Unidos naquela metade dos anos 60 contando, inclusive, com o próprio Shorter na banda. Não podia dar em outra coisa que não se tornar um clássico do jazz, aqui gravada pela primeira vez.

No continuum shortesiano, não pode faltar também aquela música que desassossega o ouvinte, como são “Night Dreamer”, do disco ao qual dá nome, ou a enigmática “Dance Cadaverous”, de “Speak No Evil”. Aqui, é o caso de “Chief Crazy Horse”, com sua construção harmônica modal (num show à parte de todos, aliás) e variações de escala e compasso. Certamente a mais desafiadora para a banda, o que, dados o entrosamento e perícia do quarteto, não foi nenhum problema.

Como disse o crítico e editor da American Record Guide Don Heckeman, Shorter tem o talento e a técnica para fazer tudo o que deseja, mas o que mais o impressionava no então jovem músico era a capacidade de compor obras coesas a partir desta plasticidade e versatilidade. Para ele, “Adam’s...” é exatamente isso: “uma conquista ainda melhor em sua totalidade, uma vez que nos fornece um corte transversal revelador daquela que é a mais rara das qualidades: a maturidade artística”.

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FAIXAS:
1. "Adam's Apple" – 6:49
2. "502 Blues (Drinkin' and Drivin')" (Jimmy Rowles) – 6:34
3. "El Gaucho" – 6:30
4. "Footprints" – 7:29
5. "Teru" – 6:12
6. "Chief Crazy Horse" – 7:34
7. "The Collector"* (Herbie Hancock) – 6:54 
Todas as composições de autoria de Wayne Shorter, exceto indicadas
*Faixa bônus do relançamento em CD

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OUÇA O DISCO:

Daniel Rodrigues