Curta no Facebook

Mostrando postagens com marcador Pixinguinha. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Pixinguinha. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 24 de novembro de 2022

Seleção Brasileira - 11 discos nacionais que têm a cara do nosso futebol


A relação do futebol com a música, no Brasil, é algo muito especial e particular. A ginga, o ritmo, a malandragem, a criatividade, a poesia, são compartilhadas por ambos e é como se um se utilizasse das virtudes do outro. Seja pela constituição do povo, pela formação cultural, pela configuração social, por questões comportamentais, por tudo isso, o jogo de bola, popular, democrático, que se pode praticar na rua, num pátio, num terreno qualquer, com qualquer coisa que seja ligeiramente arredondado, é ligado intimamente à musicalidade do brasileiro que pode ser colocada em prática em qualquer lugar ou esfera social, numa mesa, numa lata, numa caixinha de fósforo, no morro numa roda de amigos, ou numa garagem com três caras, duas guitarras e uma bateria.

Nessa época de Copa, pensando nessa íntima ligação, selecionamos alguns discos que tem tudo a ver com esse laço. Quando artistas de música colocaram o futebol de forma significativa dentro de suas obras.

É lógico que teríamos muitos, inúmeros exemplos e possibilidades, aqui, mas ilustramos esse caso de amor futebol & música com 11 discos que têm a cara do futebol. Onze!!! Um para cada posição.

Uma verdadeira Seleção Brasileira.

Dá uma olhada aí:

*****




"A perfeição é uma meta
defendida pelo goleiro"
da música "Meio de Campo"

Gilberto Gil - "Cidade de Salvador" (1973): Embora tenha feito o tema brasileiro para a Copa do Mundo de 1998, Gilberto Gil não é exatamente um cara de referências tão constantes ao futebol em sua discografia. Tem, lá, o Hino do Bahia, em 1969, no disco ao vivo com Caetano, tem "Abra o Olho", do disco Ao Vivo de 1974, que faz menções a Pelé e Zagallo, mas, em sua obra, o álbum mais relevante nesse sentido e que mais traz referências ao esporte das massas do Brasil, é "Cidade de Salvador", de 1984. Nele temos a faixa "Meio de Campo", que reverenciava o, então jogador, Afonsinho, do Botafogo, jogador atuante, engajado, um dos pioneiros na luta pelo direito ao passe-livre, além da luta própria liberdade pessoal, uma vez que seu clube, na época, o Botafogo, exigia que ele tirasse a barba e cortasse o cabelo comprido, ao que o mesmo resistiu, exigindo a rescisão de contrato.

Como se não bastasse uma música tão relevante sobre um personagem tão simbólico do futebol brasileiro, o álbum ainda trazia a faixa "Tradição", belíssima crônica cotidiana, que, embora não fosse uma música sobre futebol, também citava o jogo, mencionando Lessa, um lendário goleiro do Bahia nos anos 50, segundo a letra, "um goleiro, uma garantia".






João Bosco - "Galos de Briga" (1976): A dupla João Bosco e Aldir Blanc, quando se trata de música com futebol, é que nem Pelé e Garrincha, Romário e Bebeto, Careca e Maradona. Eram craques! Sintonia perfeita. Embora muitas vezes na discografia de Bosco possamos encontrar referências ao futebol, como nas clássicas "Linha de Passse" e "De Frente pro Crime", em "Galos de Briga"; disco combativo, lançado em 1976, meio à ditadura militar, podemos encontrar dois exemplares dessa tabelinha entrosada: "Incompatibilidade de Gênios" e "Gol Anulado", duas brigas de casal repletas de elementos futebolísticos (e duplas interpretações a respeito da ditadura). Na primeira, o homem reclama que a mulher, zangada, ranzinza, sequer quer permitir que ele escute no rádio o jogo do Flamengo ("Dotô/ Jogava o Flamengo, eu queria escutar / Chegou / Mudou de estação, começou a cantar ..."); na outra, um marido descobre por um grito de gol que a esposa, que julgava tão perfeita e exemplar em tudo, não torcia, na verdade, pelo seu mesmo time, o Vasco da Gama ("Quando você gritou mengo /No segundo gol do Zico / Tirei sem pensar o cinto / E bati até cansar / Três anos vivendo juntos / E eu sempre disse contente / Minha preta é uma rainha / Porque não teme o batente / Se garante na cozinha / E ainda é Vasco doente (...)", e compara a sensação da frustração à de um gol anulado ("Eu aprendi que a alegria /De quem está apaixonado / É como a falsa euforia / De um gol anulado").

Blanc e Bosco tem mais um monte de futebolices em sua discografia, mas "Galos de Briga", é um dos trabalhos que melhor simboliza bem esse entrosamento.





Neguinho da Beija-Flor - "É melhor sorrir" (1982): Quando uma música tem o poder de ser adaptada para todos os grandes times de uma cidade e ser cantada por cada uma de suas torcidas num estádio lotado, essa música tem lugar garantido entre as mais significativas do futebol. "O Campeão", conhecida também por "Meu Time", de Neguinho da Beija-Flor, integrante do álbum "É Melhor Sorrir", celebra um dia de futebol, desde a preparação, a espera, a ansiedade, até o momento mágico de torcer e vibrar pelo time do coração dentro do estádio. "Domingo, eu vou ao Maracanã / Vou torcer pro time que sou fã / Vou levar foguetes e bandeira / Não vai ser de brincadeira / Ele vai ser campeão / Não quero cadeira numerada / Vou ficar na arquibancada / Prá sentir mais emoção / Porque meu time bota pra ferver / E o nome dele são vocês que vão dizer / Ô, ô, ô, ô, ô, ô, ô, ô, ô, ô, ô, ô..........", e aí completa com o nome do seu time. Quem já ouviu isso no Maracanã, só trocando o nome do time no refrão, não tem como não se arrepiar.

O restante das faixas do disco não tem ligação com futebol, mas com uma dessas, que foi oficializada como hino do estádio, que serve para quatro dos maiores clubes do país, normalmente é entoado por milhares de vozes no maior templo do futebol mundial, há motivos mais que suficientes para incluir "É Melhor Sorrir" entre os álbuns importantes na relação música-futebol.





"A defesa é segura
e tem rojão"
da música "Um a Um"

Jackson do Pandeiro - "Jackson do Pandeiro" (1955): Uma das músicas mais marcantes na qual o futebol figura com protagonismo é a clássica "Um a Um", de Jackson do Pandeiro. A letra discorre sobre todas as posições de um time, setores do campo, situações de jogo, xinga o juiz, e exalta entusiasticamente as qualidades e virtudes do time do coração ("O meu clube tem time de primeira / Sua linha atacante é artilheira / A linha média é tal qual uma barreira / O center-forward corre bem na dianteira / A defesa é segura e tem rojão / E o goleiro é igual um paredão (...)  / Mas rapaz uma coisa dessa também tá demais / O juiz ladrão, rapaz! / Eu vi com esses dois olhos que a terra há de comer / Quando ele pegou o rapaz pelo calção / O rapaz ficou sem calção!..."). E, mais atual do que nunca, não aceitando derrota ou empate em hipótese alguma, ainda adverte:  "Se o meu time perder vai ter zum zum zum". E não é assim sempre ainda hoje?





Chico Buarque - Chico Buarque (1984): Chico Buarque, apaixonado por futebol, volta e meio tem alguma coisa relacionada ao esporte mais popular do mundo em seus discos. Um detalhezinho aqui outro ali, um verso, uma metáfora, uma referência... Poderia citar um monte delas aqui, mas escolhemos a música "Pelas Tabelas", do álbum "Chico Buarque", de 1984, por reunir uma série de elementos interessantes como o Maracanã, a torcida, a tabelinha e uma multidão na rua de verde e amarelo que naquele momento, poderia ser pela Seleção ou pelas manifestações pró-diretas, mas que nos últimos tempos se transformou numa imagem de terror de fanáticos conservadores fascistas. Saudades do tempo em que sair na rua de verde e amarelo era só para comemorar vitórias da Seleção ou reivindicar direitos democráticos.

"(...) Quando vi um bocado de gente descendo as favelas/ Achei que era o povo que vinha pedir / A cabeça do homem que olhava as favelas / Minha cabeça rolando no Maracanã / Quando vi a galera aplaudindo de pé as tabelas /Jurei que era ela que vinha chegando / Com minha cabeça já numa baixela / Claro que ninguém se toca com minha aflição / Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela / Pensei que era ela puxando um cordão".





Engenheiros do Hawaii - "Várias Variáveis" (1991): Os Engenheiros do Hawaii, banda da capital gaúcha, sempre demonstrou estreita ligação com o futebol. Volta e meia usavam em suas letras expressões referentes ao jogo ("jogam bombas em Nova Iorque / jogam bombas em Moscou / como se jogassem beijos pra torcida / depois de marcar um gol" - "Beijos Pra Torcida" 1986); subiam ao palco, não raro, com camisetas de seus clubes do coração, Gessinger, gremista fanático, coma do Tricolor, é claro; e tinham, até mesmo, em uma de suas músicas, "Anoiteceu em Porto Alegre", uma narração de rádio do gol do título mundial do Grêmio, de 1983. No entanto "Várias Variáveis", de 1991, que não continha especificamente nenhuma música com qualquer menção ao esporte, destaca-se pela capa, que o justifica em estar nessa lista. Nela, entre várias engrenagens, símbolo adotado pelo grupo como marca, preenchidas com ícones pop, símbolos, imagens geográficas, históricas, comerciais, encontramos os escudos dos dois grandes clubes do Rio Grande do Sul, InternacionalGrêmio. Uma capa que dimensiona bem a importância do futebol e a paixão dos gaúchos por seus clubes situando-os entre as coisas mais importantes entre tantos elementos como ideologias, religiões, comportamento, economia, coisas que fazem mexer as engrenagens do mundo. Afinal, como dizem, o futebol é a coisa desimportante mais importante do mundo. Não é mesmo?





Novos Baianos - "Novos Baianos F.C. (1973): O que era aquilo? Uma banda? Uma família? Uma comunidade? Um time de futebol? Tudo isso! Os Novos Baianos meio que inauguraram um novo conceito de grupo musical: moravam juntos, todos colaboravam em tarefas, faziam música e, apaixonados por futebol, batiam uma bolinha. Para isso, montaram dois campos de futebol no sítio onde a banda vivia, na zona leste do Rio, onde, entre uma gravação e outra, jogavam aquela pelada, ou ao contrário, entre uma partidinha e outra, rolava algum som. Um desses momentos de descontração e atividade paralela é captado na capa do disco "Novos Baianos F.C.", de 1973, com a banda "rolando um caroço" no seu campinho em Jacarepaguá. Além do registro da foto, e da extensão (Futebol Clube) não deixa dúvidas quanto à paixão daquela turma pelo jogo de bola, o disco ainda traz a faixa "Só se não for brasileiro nessa hora", que exalta a pelada, o jeito moleque, o gosto por correr atrás da bola: "Que a vida que há no menino atrás da bola / Pára carro, para tudo / Quando já não há tempo / Para apito, para grito / E o menino deixa a vida pela bola / Só se não for brasileiro nessa hora".

"Novos Baianos F.C", de certa forma, resume o espírito do grupo. Um time. Uma equipe entrosada, quase um Carrossel Holandês onde todos se revezavam e executavam mais de uma tarefa dentro de campo. Futebol total. Ou seria música total? 





Pixinguinha - "Som Pixinguinha" (1971) - Uma das primeiras composições alusivas ao futebol foi "1x0" do mestre Pixinguinha. Gravada no final dos anos 1920, a canção instrumental, homenageava o grande feito da conquista do Campeonato Sul-Americano de 1919, numa partida contra o Uruguai, vencida arduamente, depois de duas prorrogações, pelo placar mínimo, 1x0, gol do ídolo da época, Arthur Friedenreich. 

A música até ganhou letra nos anos 1990, do músico Nelson Ângelo, que a regravou então, cantada, em parceria com Chico Buarque, mas nem precisava: instrumentalmente ela, com seu ritmo, fluidez, construção, já consegue transmitir a dinâmica de um jogo, a ginga, a expectativa do torcedor, a movimentação dentro de campo..., tudo!

A canção foi gravada, originalmente, nos anos 1920, saiu em compactos posteriores, em algumas coletâneas, mas o registro que destacamos aqui é o álbum "Som Pixinguinha", de 1971, o último disco gravado pelo mestre do choro, que viria a ser reeditado, anos depois, no Projeto Pixinguinha, rebatizado como "São Pixinguinha". Nada mais justo. Só coisas divinas. Amém, Pixinguinha! Amém!






"O centroavante, o mais importante
Que emocionante, é uma partida de futebol"
da música "Uma partida de futebol"

Skank - "Samba Poconé" (1996): Logo depois que o Brasil ganhou a Copa do Mundo de 1994, o futebol voltou a virar mania nacional. Literalmente, virou moda. As camisetas de clubes, antes restritas às peladas e aos estádios, naquele momento tomavam as ruas. Embora vários artistas manifestassem esse momento, nenhuma banda soube traduzir tão bem esse momento como o Skank. Além dos integrantes se apresentarem, não raro, com camisetas de seus clubes do coração, os grandes de Minas Gerais, Cruzeiro e Atlético, talvez tenham feito a mais empolgante e entusiástica música daquele período e uma das mais marcantes da história da música braseira, sobre futebol. "É Uma Partida de Futebol" transmitia, com rara felicidade às emoções de dentro e fora de campo, com expectativa do jogo, lances de perigo, reação da torcida, tudo com muita alegria e ritmo ("Bola na trave não altera o placar / Bola na área sem ninguém pra cabecear / Bola na rede pra fazer o gol / Quem não sonhou em ser um jogador de futebol? / A bandeira no estádio é um estandarte / A flâmula pendurada na parede do quarto / O distintivo na camisa do uniforme / Que coisa linda é uma partida de futebol (...)"). Sem dúvida, um marco na histórica relação bola-microfone, tão estreita na música brasileira.





"É camisa dez da Seleção
laiá, laiá, laiá!"
da música "Camisa 10

Luiz Américo - "Camisa 10" (1974): É o típico exemplo de artista de uma música só. Luiz Américo gravou a música "Camisa 10" para a Copa do Mundo de 1974, lamentando a ausência de Pelé, que se despedira da Seleção depois da Copa do México em 1970, e questionando as escolhas do técnico Zagallo, campeão na Copa anterior, mas de escolhas bastante duvidosas para o Mundial seguinte. A letra, inteligente, cheia de boas sacadas e trocadilhos com os nomes dos jogadores ("Desculpe seu Zagalo/ Puseram uma palhinha na sua fogueira / E se não fosse a força desse tal Pereira / Comiam um frango assado lá na jaula do leão / Mas não tem nada não!"), acabaria por confirmar os temores dos autores, Hélio Matheus e Luís Vagner, de um time confuso, mal convocado e mal escalado que não convenceu em nenhum momento e acabou eliminado de maneira impiedosa pela Laranja Mecânica de Johan Cruyff.

Lançada em um álbum sem outras alusões a futebol, "Camisa 10", além de ser, com certeza, a maior cornetada musical da discografia nacional, talvez seja a canção mais marcante da tabelinha música-futebol no Brasil.





Jorge Ben - "Ben" (1972)Jorge Benjor, talvez seja o músico com mais referências ao futebol em sua obra. Volta e meia tem! Tem menção a clube, exaltação a craque de verdade, para craque inventado, música por posição, para infração dentro de campo, pra negociação entre clubes... Tem de tudo. "África Brasil" , disco já destacado aqui no ClyBlog, nos nossos ÁLBUNS FUNDAMENTAIS, provavelmente seja o álbum que mais contém referências ao esporte, com uma música cuja letra conta o desejo de um de seus filhos em querer ser jogador de futebol ("Meus filhos, meu tesouro"), uma para o craque Zico ("Camisa 10 da Gávea), e uma para um fictício meia-atacante africano de futebol encantador, "Umbabaraúma, Ponta de Lança Africano". No entanto, a canção de Jorge Benjor mais marcante sobre futebol, é, sem dúvida, uma das mais lembradas no quesito em toda a música brasileira, está no disco "Ben", de 1972. "Fio Maravilha" descreve, quase com a precisão de um locutor esportivo, o lance mágico do atacante Fio, do Flamengo, dos anos 70, em que ele faz, segundo o autor "uma jogada celestial". Jorge Benjor, exímio construtor de imagens musicais, soma à narração do lance, a reação da torcida e o grito de reverencia e agradecimento da massa para o craque, num dos refrões mais populares da música brasileira, "Fio Maravilha / Nós gostamos de você /Fio Maravilha / Fazmais um pr'a gente ver".

Curiosamente, anos depois, Fio acabou processando Jorge Benjor pela utilização de seu nome sem autorização. O próprio Fio desistiu do processo sem sentido até porque, antes da música ele não era ninguém e, pelo contrário, era conhecido, exatamente, por perder muitos gols. Simplesmente, um hino do futebol brasileiro!



por Cly Reis

terça-feira, 10 de março de 2020

Marisa Monte - "Mais" (1991)



"Ela tem umas coisas
 que nasceram com ela:
carisma, uma beleza calma
e uma enorme cultura musical."
Nelson Motta




Ela já havia interpretado uma música deles em seu álbum de estreia e, não muito tempo depois, um encontro num especial da Rede Globo que a colocava no mesmo palco com os Titãs, além de servir de alavanca para o namoro com o baixista Nando Reis, encaminharia a parceria que se materializaria objetivamente, logo ali adiante no excelente álbum "Mais", de 1991 e ainda abriria o caminho para, mais futuramente, o projeto Tribalistas, já mencionado aqui nos A.F., de Marisa, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, que faz a percussão em grande parte das músicas. "Mais" pode até parecer, num primeiro momento, uma espécie de projeto alternativo dos Titãs com outro tipo de concepção vocal, dada a quantidade de músicas em que eles têm, no mínimo, participação nas composições. Causa ou consequência da então recente relação de Marisa com Nando, a parceria com os Titãs refletiria na linguagem do trabalho como um todo, até mesmo, de certa forma nas versões de outros artistas. Com exceção de "Rosa", de Pixinguinha, de estrutura mais complexa e letra rebuscada, a maioria das outras covers poderia caber, sem problemas num disco do octeto paulista, como no caso de "De Noite na Cama", de Caetano Veloso, por exemplo, a adaptação do folclores nordestino, "Borboleta", e até mesmo, por incrível que pareça, "Ensaboa", de Cartola, que dentro do espectro da obra do mestre da Mangueira, pode ser considerada uma de suas letras mais minimalistas e de estrutura diferenciada. Mas seria uma injusta simplificação reduzir o trabalho a uma experimentação titânica. "Mais" é muito mais! Marisa Monte canta, encanta, brinca, emociona, impressiona. Com produção do norte-americano Arto Lindsay, o disco é eclético sem ser pretensioso e tem um equilíbrio perfeito entre as faixas o que faz com que seja prazeroso e mantenha um frescor mesmo para quem já o conhece de muitas audições.
"Beija Eu", com letra de Arnaldo Antunes, comprova que o mesmo cara que fazia coisas como "Saia de Mim", era capaz de compor algo tão belo e delicado como aquela faixa de abertura, que, por sinal, não merecia outra interpretação que não à de Marisa Monte, doce e graciosa. "Volte para o seu lar", rebelde e impositiva, é a mais titânica das músicas do disco, contando com uma leitura musical perfeita de Marisa que dosou com sabedoria a melodiosidade com a pungência da letra ("Aqui nessa casa/ Ninguém quer a sua boa educação/ Nos dias que tem comida/ Comemos comida com a mão...", "Aqui nessa tribo/ Ninguém quer a sua catequização/ Falamos a sua língua/ Mas não entendemos o seu sermão"...). "Ainda Lembro", canção de amor elegante e de muito bom gosto, conta com a luxuosa participação de Ed Motta compõe com Marisa um dueto que pode se incluído entre os grandes da música brasileira. Em "De noite na cama", Marisa dá um ar leve à canção de Caetano Veloso, inúmeras vezes regravada na discografia nacional, desta vez com uma interpretação bem solta e alegre; e a "Rosa", de Pixinguinha e Otávio Cruz, a confere senão a versão definitiva, no mínimo uma das mais memoráveis. E em "Borboleta", cantiga tradicional do nordeste, Marisa Monte começa fazendo a voz pairar suavemente sobre nosso jardim sonoro para em seguida, sobre uma base acústica, desfilar seu canto doce e gracioso.
Marisa começa esticando a voz em "Ensaboa", sugerindo um cântico de lavadeiras, a música ganha um coro no refrão que também remete a um canto do trabalho conjunto na beira do tanque e de ribeirões, e culmina num pout-pourri, simplesmente extático, com "Lamento da Lavadeira", "Colonial Mentality", "Marinheiro Só", "A Felicidade" e "Eu Sou Negão". Espetacular!
"Eu não sou da sua rua", outra muito titânica, é uma espécie de "Lugar Nenhum"l mais leve e melancólica. "Diariamente", de Nando Reis, uma das melhores do disco, usa um formato em lista, como era característico dos Titãs em músicas como "Nome aos bois", do próprio Nando, só que aqui com atividades e situações rotineiras, numa anáfora conduzida de maneira brilhante pela cantora sobre uma base de violão constante e repetida.
Marisa se aventura pela primeira vez em uma composição solo e se sai bem na gostosa "Eu Sei";
"Tudo pela metade", parceria de Marisa com Nando, talvez seja a mostra mais perfeita no álbum do êxito da combinação de seu estilo com o dos Titãs, ficando bem evidenciado o ponto onde acaba um, começa o outro e onde se fundem. Um pop delicioso de refrão cativante e que fica mais bacana ainda na última vez em que se repete com um coro de crianças bem espontâneo e "bagunçado"; e "Mustaphá", uma balada zen, tranquila, com um belíssimo trabalho de violão, fecha o disco com competência.
"Mais" era a confirmação de Marisa Monte. Se passara uma boa impressão com o primeiro disco "MM", um ao vivo só de versões de outros artistas, mas deixara uma certa dúvida sobre ser ou não um daqueles fenômenos efêmeros que parecem de vez em quando, este disco mostrava que ela não era só mais uma cantora de um ou dois hits. Ela chegara para ficar. Era mais uma das grandes mulheres da música brasileira. Uma mulher com M maiúsculo! M de música, M de Marisa, M de Mais.

*******************
FAIXAS:
1."Beija Eu" -  Marisa Monte, Arnaldo Antunes, Arto Lindsay (3:10)
2."Volte Para o Seu Lar" - Arnaldo  Antunes (4:41)
3."Ainda Lembro" - (participação especial de Ed Motta) - Marisa Monte, Nando Reis (4:05)
4."De Noite na Cama" - Caetano Veloso (4:24)
5."Rosa" - Pixinguinha, Otávio de Souza (2:43)
6."Borboleta" - Folclore Nordestino (1:56)
7."Ensaboa (Lamento da Lavadeira)" - Cartola, Monsueto Menezes (4:15)
8."Eu Não Sou da Sua Rua" - Branco Mello, Arnaldo Antunes (1:29)
9."Diariamente" - Nando Reis (4:05)
10."Eu Sei (Na Mira)" - Marisa Monte (2:40)
11."Tudo Pela Metade" - Marisa Monte, Nando Reis (4:11)
12."Mustaphá" - Marisa Monte, Nando Reis (2:23)
******************
Ouça:
Marisa Monte - Mais


Cly Reis

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Música da Cabeça - Programa #127


Nenhum beijo será castigado, nenhum livro será proibido, nenhuma música será inaudita. O Música da Cabeça se junta à manifestação contra a censura e a imoralidade que tentam nos impor e traz aquilo que expressa o que a gente é: música. Gilberto Gil, Almir Guineto, Sean Lennon, Caetano Veloso, Pixinguinha e Plebe Rude são alguns dos que protestam junto conosco. Tem também o quadro “Música de Fato” e dobradinha de “Sete-List” e “Palavra, Lê” para lembrar o mestre Elton Medeiros, morto esta semana. Nenhum direito a menos no MDC hoje, às 21h, na Bienal do Livro da Rádio Elétrica. Produção, apresentação e beijo de língua: Daniel Rodrigues. #CensuraNuncaMais



Rádio Elétrica:
http://www.radioeletrica.com/

terça-feira, 22 de abril de 2014

Os 15 Melhores Discos Brasileiros de Música Instrumental

Hermeto Paschoal, presente em 3 discos da lista,
"Em Som Maior", "tide" e o seu, "Hermeto".
Nessas brincadeiras diletantes de criar listas sobre os mais diferentes temas musicais nas redes sociais (10 melhores show assistido no Teatro da Ospa, 10 melhores discos de jazz da ECM, 10 melhores músicas contra a ditadura militar, 10 músicas chatas do Chico Buarque, 10 melhores discos de soul music, e por aí vai) fui instigado a montar uma que, num primeiro momento, titubeei. “Será que eu saberia compor uma com esse tema?”, pensei. Tratava-se do “Melhor Disco Instrumental de Música Brasileira”. Mesmo com meu conhecimento musical, que não é pouco, teria eu embasamento suficiente para criar uma lista interessante e, além disso, suficientemente informada a esse respeito? Pois, para minha própria surpresa, a lista saiu, e bem simpática, diga-se de passagem. Além de não se prender a um estilo musical específico (o que se chamaria burramente de “música instrumental brasileira” pura), típico de minha forma de enxergar a música e a arte, acredito que minha listagem não ficou pra trás em comparação a de outros que se empolgaram e publicaram as suas também.
Claro que tem muita coisa que não consta na minha lista que vi na de outros, pois certamente ainda tem muito o que se conhecer dentro do mar de maravilhas sonoras que existe. Raul de Souza, Barrosinho, Os Cobras, Victor Assis Brasil, Djalma Correa e Edison Machado, por exemplo, nem cito, pois não tive o prazer ainda de conhecer seus trabalhos a fundo ou ponto de saber selecionar-lhes um disco representativo. Mas acho que, afora o gostoso dessa prática quase infantil de elencar preferências, tais lacunas são justamente o papel dessas listas: abrir novos paradigmas para que novas revelações se deem e se passe a conhecer aquele artista ou banda que, quando se ouve pela primeira vez, se pensa com surpresa e excitação: “Cara, como que eu nunca tinha ouvido isso?!” Se algum dos títulos que enumero causar essa sensação nos leitores, já cumpri meu papel.

Aí vão, então os meus 15 discos preferidos da música brasileira instrumental, mais ou menos em ordem:


1 – “Maria Fumaça”, da Banda Black Rio (1977)


2 – “Coisas“, do Moacir Santos (1965)
3 – “A Bed Donato”, do João Donato (1970)
4 – “Wave”, do Tom Jobim (1967)
5 – “Em Som Maior”, da Sambrasa Trio (1965)


6 – “Revivendo”, do Pixinguinha e os Oito Batutas (1919-1923 – coletânea de 1895)
7 – “O Som”, da Meirelles e os Copa 5 (1964)
8 – “Donato/Deodato”, do João Donato e Eumir Deodato (1973)
9 – “Sanfona”, do Egberto Gismonti (1981)
10 – “Light as a Feather”, da Azymuth (1979)
11 – “Jogos de Dança”, do Edu Lobo (1982)
12 – “Opus 3 No. 1”, do Moacir Santos (1968)
14 – “Tide”, do Tom Jobim (1970)


15 – “Hermeto”, de Hermeto Paschoal (1971)