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sábado, 4 de abril de 2020

Front 242 - "Front by Front" (1988)






Acima, a capa original de 1988 e,
abaixo, a reedição de 1992.
"Um: Você encurrala o alvo
Dois: Você prepara a isca
Três: Você abre a rede lentamente
E quatro: Você captura o homem!"
refrão de "Headhunter"


Um dos discos mais importantes dos anos 80. Um disco consolidador de linguagem. Se o Front 242 ia até então numa linha que se aproximava muito do industrial tradicional, "Front by Front", de 1988, seu quarto disco de estúdio abria-se mais para os ritmos urbanos e delineava de forma mais concisa a vertente em que o grupo se enquadrava. De fato, classificar o Front 242 como industrial era uma simplificasção um pouco injusta,a té, uma vez que a música dos belgas privilegiava mais o corpo, o movimento do que o industrial, segmento que o originara. Assim, o termo EBM (Electronic Body Music), que a própria banda cunhara, apresentava-se precisamente apropriado. Mais agressivo e minimalista que o synth-pop e menos plástico que a house e outros estilos de dance que viriam logo em seguida dali a alguns anos, o som daqueles belgas era agressivo e ao mesmo tempo dançante na medida certa. Prova disso foi o sucesso de "Headhunter" que, com seu ritmo irresistível, transpôs as barreiras da cena alternativa, ganhando pistas de dança no mundo inteiro. Como curiosidade, vale lembrar que o potencial dançante do grande hit do Front 242 era tamanho que, anos depois, veja só, o "riff" fantástico do clásico do Front 242 viria a servir de base para um funk dos morros do Rio, a infame "Cerol na Mão", do grupo carioca Bonde do Tigrão, sendo, contudo, condenada por plágio, depois de um rápido processo, por não ter sua utilização autorizada pela banda.
Mas os méritos de "Front by Front" não  se resumem a "Headhunter". A intensa "Until Death (Us Do Apart)" que abre o disco, a ótima "First In / First Out", "Blend of Strenghts" que bebe dos ritmos negros das ruas como o break e o hip-hop, "Terminal State" com sua linha funkeada, e a excelente "Welcome to The Paradise", que traz em si, praticamente só com inserções de trechos de discursos de pastores, uma critica à indústria da fé, os fanatismos e ao charlatanismo religioso também cancelam a qualidade e a importância do álbum, comprovam toda a qualidade e importância de "Front by Front".
O álbum teve uma reedição bastante interessante, quatro anos depois trazendo as outras partes da interessante "Work 01" ("Work 242 N.Off is N.Off" e "Work 242"), bem ao estilo da banda que costuma fragmentar algum tema ao longo de seus trabalhos; a versão estendida de "Headhunter"; e a inclusão, em duas versões, de "Never Stop", outro sucesso do grupo mas que só havia saído em single. 


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FAIXAS:
1. "Until Death (Us Do Part)" 4:30
2. "Circling Overland" 4:43
3. "Im Rhythmus Bleiben" 4:14
4. "Felines" 3:34
5. "First In / First Out" 3:52
6. "Blend the Strengths" 3:13
7. "Headhunter v3.0" 4:45
8. "Work 01" 3:28
9. "Terminal State" 4:09
10. "Welcome to Paradise v1.0" 5:18


Faixas adicionais da edição de 1992:
11. "Headhunter v1.0" 5:01
12. "Never Stop! v1.0" 3:56
13. "Work 242 N.Off is N.Off" 5:18
14. "Agony" (Until Death) 2:43
15. "Never Stop! v.1.1" 4:24
16. "Work 242" 6:29

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Ouça:
Front 242 - "Font by Front"



Cly Reis

sexta-feira, 14 de maio de 2021

Aquisições porto-alegrenses

Quem me acompanha nas redes sociais vê que vira e mexe estou escutando alguma coisa “na vitrola”. Embora tenha uma boa coleção, sabe como é, né? Colecionador de discos está sempre de olho em outros para comprar. Não é comum eu ir aos sebos de Porto Alegre (ainda mais agora na pandemia), até por causa dos horários comerciais, durante os quais geralmente estou ocupado, e porque, afinal, acaba sendo mais um gasto. Mas quando surgem boas oportunidades, é impossível resistir. Pois dias atrás, vi uma postagem do antenado e generoso amigo Juarez Fonseca sobre um amigo seu que estaria, em suas palavras, “se desfazendo de sua coleção de discos de vinil. Tem Chico, Caetano, Gil, Milton, Elis, Mercedes Sosa, Jaime Roos, Jimi Hendrix, muita coisa de jazz e raridades da música gaúcha. Uma mina de ouro.” E Juarez arremata o post alertando: “todas as capas estão reproduzidas no Facebook.”

Não deu outra: com tamanha propaganda, fui conferir. O amigo era Raul Boeira, músico, compositor e violonista de Porto Alegre com mais de 50 anos de estrada. E realmente: centenas de ótimos títulos em LPs e todos visivelmente bem cuidados por Raul, que me confessou posteriormente em troca de mensagens fazer cerca de 10 anos que não mais tinha toca-discos e que não havia “razão para esse som todo ficar aprisionado aqui no armário”. Não demorou muito para eu saber que outros dois colecionadores como eu, os também amigos Marcello Campos e Lucio Brancato, já estavam empenhados em alforriar tamanha qualidade musical. Diante do desprendimento e simpatia de Raul – e, claro, do meu desejo – adquiri sete unidades da encarcerada discoteca, os quais descrevo aqui brevemente um a um. Alguns já foram parar direto na vitrola:


“Do Romance ao Galope Nordestino”,
 Quinteto Armorial (1974)

Um dos fenômenos mais originais da história da moderna música brasileira, o Quinteto Armorial representa mais do que música, mas um conceito de brasilidade. Com a benção de Ariano Suassuna, líder intelectual do movimento Armorial, que buscava criar bases brasileiras para todas as formas de arte - entra as quais, a música - a banda que lançou o hoje famoso Antonio Nóbrega, em seu primeiro disco, traz sua sonoridade sui generis que alia clássico medieval e barroco aos sons formativos do Nordeste. E o que é essa capa de Gilvan Samico?! Uma obra-prima por dentro e por fora.



“Nice Guys”,
Art Ensemble of Chicago (1979)
A banda de Lester Bowie, Malachi Favors Maghostut, Joseph Jarman, Roscoe Mitchell e Don Moye num de seus mais celebrados discos. Os inventores do pós-jazz passeiam pelo bop, avant garde, blues, fusion, reggae e art music em sua musicalidade intergaláctica. “É possivelmente o mais representativo álbum da banda, uma vitrine variada que ilustra muito do que eles fazem de melhor”. Isso não sou eu quem digo, mas a Down Beat. Destaque para “Já”, "Folkus" e "Dreaming of the Master" . E a arte caprichada da capa e contra! Impecável como qualquer produto ECM. 



“Lilás”,
Djavan (1984)
Já totalmente inserido no mercado norte-americano, Djavan lançava em grande estilo, com produção gringa caprichada, um de seus discos de maior sucesso lá e aqui no Brasil. Embora tenha recebido certas críticas pelo excesso de elementos eletrônicos à época, o disco, sexto do artista, praticamente repete o antecessor “Luz”, pois é daqueles álbuns de carreira que parecem coletânea: a faixa-título, “Íris”, “Esquinas” e “Infinito” integram o repertório, por exemplo. Suingue, complexidade harmônica, arranjos ricos, vocais grandiosos. Um luxo.




“Jogos de Dança”,
Edu Lobo (1983)
Imagino que quando convidaram Edu Lobo - que já havia coescrito com Chico Buarque para o Balé Guaíra o clássico "O Grande Circo Místico" dois anos antes - uma nova trilha para dança somente instrumental ele, afeito muito mais à música do que ao canto, vibrou com a oportunidade. O resultado é um dos melhores discos da discografia do autor de "Disparada", que antecipa em pelo menos 10 anos o conceito de trilhas que o Grupo Corpo adotaria: artistas nobres da MPB compondo para balé trabalhos especiais e que vão além dos palcos: são música para se ouvir dançando ou parado.




“Tempo Presente”,
 Edu Lobo (1880)
Outro lindo disco de Edu Lobo que consagra sua década mais produtiva, os anos 70. Junto com “Missa Breve”, “Limite das Águas” e “Camaleão”, forma a quadra de álbuns em que o legítimo filho musical de Tom Jobim passeia pelos variados estilos, da bossa nova ao baião, do jazz ao clássico. Parcerias principalmente com Cacaso e Joyce, primor de arranjos, produção caprichada de Sérgio de Carvalho. Edu, assim, em plena fase criativa é ouro em pó.





“Bandalhismo”,
João Bosco (1980)
Dos discos de Boscão da fase com Aldir Blanc que não tinha. Além da arte sempre magistral de Elifas Andreato, que aproveita cortes e dobraduras diferentes, “Bandalhismo” é mais um documento da resistência à ditadura militar e a opressão social que o Brasil vivia como os vários que a dupla compôs nessa época. Abre com a sarcástica “Profissionalismo é Isso Aí”, mas também guarda joias como “Siri Recheado e o Cacete” e “Sai Azar”, que também são deste repertório.





“Atlantis”,
Wayne Shorter (1985)
Único da leva de compras que não tenho conhecimento de como é. Disco dos anos 80 de um dos imortais do jazz, que nunca decepciona. O que se sabe de antemão é que traz ritmos brasileiros e funk em várias faixas em arranjos muito bem elaborados. São 11 músicos em estúdio contando com Shorter revezando numa instrumentação entre o elétrico e o acústico. Boas expectativas.







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+ 2

Além dos LPs que adquiri, generosamente ganhei do próprio Raul Boeira em CD dois de seus discos: “Raul Boeira: Volume 1”, de 2009, e “Cada Qual com Seu Espanto”, dele e de Márcia Barbosa, de 2016. Assim como o Shorter, ainda não tive tempo de soltá-los na vitrola, mas não demorará.



Daniel Rodrigues

quarta-feira, 21 de junho de 2017

Banda Black Rio - "Maria Fumaça" (1977)




“A Banda Black Rio é um dos maiores acontecimentos musicais desse planeta”.
Lucas Arruda


“Coisa mais séria que tem! Um dos discos instrumentais mais bem feitos no Brasil. Tudo absolutamente certo aqui: temas, timbres, só acerto.”
Ed Motta


O jazz no Brasil teve de caminhar alguns quilômetros em círculos para que obtivesse uma identificação real com o país do carnaval. Em termos de indústria fonográfica, até os anos 70 as apostas sempre estiveram sobre o samba e derivados ou outros gêneros comerciais, como o bolero, a canção romântica, a bossa-nova carioca, os festivais, a MPB e até o rock. Mesmo presente na sonoridade das orquestras das gafieiras ou na bossa nova, o jazz se misturava aos sons brasileiros mais pela natural influência exercida pelos Estados Unidos na cultura latina do que pelo exemplo de complexidade harmônica de um Charlie Parker ou Charles Mingus. Expressões bastante significativas nessa linha houve nos anos 50 e 60, inegável, mas jazz brasileiro mesmo, com “b” maiúsculo, esse ainda não havia nascido.

Por essas ironias que somente a Sociologia e a Antropologia podem explicar, precisou que o gênero mais norte-americano da música desse uma imensa volta para se solidificar num país tão africanizado quanto os Estados Unidos como o Brasil. Essa solidificação se deve a um simples motivo: assim como na criação do jazz, cunhado por mentes e corações de descendentes de escravos, a absorção do estilo no Brasil se deu também pelos negros. No caso, mais de meio século depois, pela via da soul music. O chamado movimento “Black Rio”, que estourava nas periferias cariocas no início da década de 70, era fruto de uma nova classe social de negros que surgia oriundos das “refavelas”, como bem definiu Gilberto Gil. Reunia milhões de jovens em torno da música de James Brown, Earth, Wind & Fire, Aretha Franklin e Sly & Family Stone. DJ’s, dançarinos, produtores, equipes de som, promoters e, claro, músicos, que começavam a despontar da Baixada e da Zona Norte, mostrando que não eram apenas Tim Maia e Cassiano que existiam. Tinha, sim, outros muitos talentos. Dentro deste turbilhão de descobertas e conquistas, um grupo de músicos originários de outras bandas captou a essência daquilo e se autodenominou como a própria cena exigia: Black Rio.

Formada da junção de alguns integrantes dos conjuntos Impacto 8, Grupo Senzala e Don Salvador & Grupo Abolição, a Black Rio compunha-se com o genial saxofonista Oberdan Magalhães, idealizador e principal cabeça da banda; o magnífico e experiente pianista Cristóvão Bastos; os sopros afiados de José Carlos Barroso (trompete) e Lúcio da Silva (trombone); o não menos incrível baixista Jamil Joanes; Cláudio Stevenson, referência da guitarra soul no Brasil; e, igualmente impecável, o baterista e percussionista Luiz Carlos. Com uma insuspeita e natural mescla de samba, baião, funk, gafieira, rock, R&B, fusion, soul e até cool, a Black Rio inaugurava de vez o verdadeiro jazz brasileiro. Um jazz dançante, gingado, sincopado, cheio de groove e de rebuscamentos harmônicos.

Banda das mais requisitadas dos bailes funk daquela época, eram todos instrumentistas de mão cheia. Se nas apresentações eles tinham a luxuosa participação vocal de dois estreantes até então pouco conhecidos chamados Carlos Dafé e Sandra de Sá, tamanhos talento e habilidade não podia se perder depois que a festa acabasse e as equipes de som guardassem os equipamentos. Precisava ser registrado. Foi isso que a gravadora WEA providenciou ao chamar o tarimbado produtor Mazola – por sua vez, muito bem assessorado por Liminha e Dom Filó, este último, um dos organizadores do movimento Black no Brasil. Eles ajudaram a dar corpo a Maria Fumaça, primeiro dos três discos da Black Rio, a obra-prima do jazz instrumental brasileiro e da MPB, uma joia que completa 40 anos de lançamento em 2017.

Como se pode supor, não se está falando de qualquer trem, mas sim um expresso supersônico lotado de musicalidade e animação, que transborda talento do primeiro ao último acorde. Sonoridade Motown com toques de Steely Dan e samba de teleco-teco dos anos 50/60. Tudo isso pode ser imediatamente comprovado ao se escutar a arrasadora faixa-título, certamente uma das melhores aberturas de disco de toda a discografia brasileira. O que inicia com um show de habilidade de toda a banda, num ritmo de sambalanço, logo ganha cara de um baião jazzístico, quando o triângulo dialoga os sopros, cujas frases são magistralmente escritas e executadas. A guitarra de Cláudio faz o riff com ecos que sobrevoam a melodia; Jamil dá aula de condução e improviso no baixo; Cristóvão manda ver no Fender Rhodes; Luis Carlos faz chover na bateria. Quando o samba toma conta, praticamente todos assumem percussões: cuíca, pandeiro e tamborim.

Sem perder o embalo, uma versão originalíssima de “Na Baixa Do Sapateiro”, comandada pelo sax de Oberdan, que atualiza para a soul o teor suingado da melodia, e outra igualmente impecável: “Mr. Funky Samba”. Jamil, autor do tema, está especialmente inspirado, fazendo escalamentos sobre a base funkeada e sambada como bem define o título. Mas não só ele: Luiz Carlos adiciona ritmos da disco ao jazz hard bop, e Cristóvão mais uma vez impressiona por sua versatilidade na base de Fender Rhodes e no solo de piano elétrico. Uma música que jamais data, tamanha sua força e modernidade.

O líder Oberdan assina outras duas composições, a sincopada “Caminho Da Roça” e a carioquíssima “Leblon Via Vaz Lôbo”, em que Cláudio e o próprio improvisam solos da mais alta qualidade. Outros integrantes, no entanto, não ficam para trás nas criações, caso de Cláudio e Cristóvão, que coassinam uma das melhores do disco: “Metalúrgica”. Como o título indica, são os sopros que estão afiados no chorus. O que não quer dizer que os colegas também não brilhem, caso de Luiz Carlos, criando diversas variações rítmicas, Cláudio, distorcendo as cordas, e a levada sempre inventiva de Jamil.

A versatilidade e o conceito moderno da Black Rio revisitam outros mestres da MPB, como Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira (“Baião”), onde o ritmo nordestino ganha tons disco e funk; Edu Lobo (“Casa Forte”), de quem realçam-lhe a força e a expressividade das linhas melódicas; e Braguinha, quando o lendário choro “Urubu Malandro”, de 1913, vira um suingado e vibrante samba de gafieira. Nota-se um cuidado, mesmo com a sonoridade eletrificada, de não perder a essência da canção, o que se vê na manutenção de Cristóvão nos teclados e da adaptação das frases de flauta para uma variação sax/trompete/trombone.

Outra pérola de Jamil desfecha essa impecável obra num tom de soul e jazz cool, que antevê o que se chamaria anos adiante no Brasil de “charme”. Embora a canção seja de autoria do baixista, é o trompete de Barrosinho que arrasa desenhando toda melodia do início ao fim.

Talvez seja certo exagero, uma vez que já se podia referenciar como jazz “brazuca” o som de Hermeto Pascoal, Moacir Santos, Airto Moreira, João Donato, Eumir Deodato, Flora Purim, Dom Um Romão, entre outros – embora, a maioria tenha-o feito e consolidado seus trabalhos fora do Brasil. Com a Black Rio foi diferente. Com todos pés cravados em terra brasilis, foi o misto de contexto histórico, necessidade social, proveito artístico e oportunidade de mercado que a fizeram tornar-se a referência que é ainda hoje. Uma referência do jazz com cheiro, cor e sabor latinos. Mas para além das meras classificações, a Black Rio é o legítimo retrato de uma era em que o Brasil negro e mestiço passou a mostrar a riqueza "do black jovem, do Black Rio, da nova dança no salão".

Banda Black Rio - "Maria Fumaça"


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FAIXAS
1. Maria Fumaça (Luiz Carlos Santos/Oberdan) - 2:22
2. Na Baixa Do Sapateiro (Ary Barroso) - 3:02
3. Mr. Funky Samba (Jamil Joanes) - 3:36
4. Caminho Da Roça (J. Carlos Barroso/Oberdan) - 2:57
5. Metalúrgica (Claudio Stevenson/Cristóvão Bastos) - 2:30
6. Baião (Humberto Teixeira/Luiz Gonzaga) - 3:26
7. Casa Forte (Edu Lobo) - 2:22
8. Leblon Via Vaz Lôbo (Oberdan) - 3:02
9. Urubu Malandro (Louro/João De Barro) - 2:28
10. Junia (Joanes) - 3:39

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OUÇA O DISCO


por Daniel Rodrigues

segunda-feira, 19 de abril de 2021

Roberto Carlos - "Roberto Carlos" (1975)


“Seu carisma e sua bondade levam muitas pessoas a mitificá-lo num patamar de uma entidade como um anjo ou coisa assim. Embora o chamem normalmente de ‘Rei’, já ouvi alguns o chamarem de ‘santo’ e até de ‘Deus’. Para mim, é o Amigo, com maiúscula.” 
Erasmo Carlos 

Não são infundadas várias das acusações que recaem sobre Roberto Carlos. Que ele é pouco generoso com outros artistas. Que deliberadamente “puxou o tapete” de novas estrelas que podiam ameaçar seu trono. Que deixou de usar o seu poder midiático para enfrentar a Ditadura Militar enquanto colegas eram perseguidos, presos ou mortos. Que passou a agir de forma cada vez mais excêntrica e maniática. Que tornou paulatinamente sua música cafona, principalmente, pela intensificação da imagem católica. Que faz décadas que não produz nada que o valha. Mas uma coisa é impossível contestar: Roberto é o Rei. Dizer que ele nunca compôs uma das centenas de músicas que gravou ou dedicou a outros músicos, como alguns ilógicos sustentam, é tão loucura quanto acreditar que o homem não foi à Lua ou que Elvis Presley não morreu. Amor e ódio são dois lados da mesma moeda deste personagem único no Brasil, o qual completa 80 anos de vida hoje.

É inquestionável que o Roberto Carlos Braga, nascido neste mesmo dia 19 de abril na sua natal Cachoeiro do Itapemirim, no Espírito Santo, no longínquo ano de 1941, seja altamente carismático e dono de uma das obras mais gigantescas da música brasileira, talvez a única em toda a América Latina da segunda metade do século XX a unir com tamanho êxito arte autoral e apelo popular. Da fase inicial, no final dos anos 50, em que passou dos boleros ingênuos para a quase tão ingênua Jovem Guarda, revolucionando a música e a indústria fonográfica brasileiras, à segunda e mais duradora, em que se torna o maior cantor do Brasil, há um longo caminho repleto de discos quase que invariavelmente autointitulados e regulares. Sem variação, no entanto, são seus resultados. Estima-se que, nos 62 anos de carreira, tenha vendido, até hoje, cerca de 140 milhões de discos.

A maioridade de RC, que havia se solidificado na virada dos anos 60 para os 70, não foi assim, tão linear quanto possa parecer. Amadurecido artística e pessoalmente, ele, maior nome do staff de sua gravadora, a CBS, sabia e tinha carta branca para criar obras que juntassem o frescor da fase anterior às novas perspectivas do mercado que se abriam à sua frente com o envelhecimento natural de seu público. Atinado, ele engendra isso com sabedoria e coesão. Caso deste disco de 1975, seu 15º no mercado brasileiro, em que traz, além de clássicos imortais do cancioneiro nacional, versões de outros autores, como sempre fez muito bem, e temas escancaradamente românticos, aqueles que punham as mulheres da incipiente classe média brasileira a suspirar. Mesmo essas últimas, mais bregas, como “Elas por Elas” e “Desenhos na Parece”, são tão bem apresentadas em arranjos das mãos Horace Hott e Lee Holdridge, que agradam ouvidos dos seletivos aos mais ousados.

Naquela metade dos anos 70, Roberto tinha o mundo em suas mãos. E sabia disso. Para tanto, contava com a parceria iluminada do “irmão camarada” Erasmo Carlos, com quem dividiu centenas de autorias ao longo de mais de três décadas – na grande maioria, as melhores de seu cancioneiro. “Quero que Vá Tudo pro Inferno”, hit do álbum, é exemplar neste sentido. O arranjo para a música de 1965, originalmente do álbum "Jovem Guarda", é um misto de soul e rock e mostra um compositor maduro, mas ligado a suas origens dos tempos do Clube do Rock e da adolescência no bairro carioca da Tijuca. Fã de Elvis, Little Richard e James Brown, mostrava estar viva essa ligação com a alma contestadora do rock, inclusive ainda permitindo-se dizer com naturalidade e poesia palavras "negativas" como “inferno”, coisa que a tacanhice cristã ridiculamente o impede hoje.

A dupla Roberto e Erasmo: alta produção nos anos 70
Outras três da dupla Roberto/Erasmo, todas clássicas: a balada country-humanista “O Quintal do Vizinho”, a romântica “Olha” – sucesso na voz de Maria Bethânia, em 1993, e que ganharia, 32 anos de sua estreia, uma bela versão bossa nova do coautor Erasmo com a participação de Chico Buarque – e o memorável samba-rock “Além do Horizonte” – também regravada por Erasmo, em 1980, mas aí contando com o vozeirão do tijuacano como eles: Tim Maia. Nesta, RC se vale de sua habilidade inigualável de interpretação aliada ao arranjo do maestro norte-americano Jimmy Wisner, que faz as cordas dialogarem com seu vocal.

Outra vertente que o disco solidifica é a apropriação do cancioneiro em espanhol, nova porta internacional que começava a se mostrar promissora para o artista já consagrado na Itália ao conquistar, em 1968, o Festival de San Remo com “Canzone per Te”. Ele já havia feito um disco inteiro assim em 1965, mas desde que a fase romântica deslanchara, passou a apostar mais fortemente nos países latinos. Agora era a vez de emplacar duas em pronúncia castelhana: “Inovildable”, de Julio Gutierrez, e a andina “El Humahuaqueño”, de Edmundo Zaldivar, na qual é acompanhado do grupo Los Chaskis. Ambas as faixas são usadas no repertório de "Tu Cuerpo", disco de um ano depois, o qual continha exatamente as mesmas músicas, porém todas cantadas no idioma de Cervantes.

Mais uma com o Tremendão é a balada (ainda em português) “Seu Corpo” ("No seu corpo é que eu me encontro/ Depois do amor o descanso/ E essa paz infinita/ No seu corpo minhas mãos/ Se deslizam e se firmam/ Numa curva mais bonita"), com primoroso arranjo de Chiquinho de Moraes. Importante na carreira de RC, a faixa consolida o estilo de canções com temática heteroeróticas iniciado em “Amada Amante” (1971) e “Proposta” (1973) e que resultaria em sucessos absolutos desse filão trazido por ele do brega e aperfeiçoado em hits posteriores como “Os Seus Botões” e “Cavalgada”. Muito bem intercaladas entre as composições próprias, contudo, estão as de músicos como Benito Di Paula (“Amanheceu”), Maurício Duboc (“Existe Algo Errado”) e de uma dupla de jovens nordestinos que recém começavam a carreira: Fagner e Belchior, de quem grava “Macuripe”, escolhida para fechar o álbum.

Ao completar oito décadas de vida, Roberto Carlos merece ter sua obra revisitada e reavaliada – o que resultará, certamente, numa maior apreciação de seus trabalhos dos anos 60, 70 e 80, os mais produtivos. Mas jamais menosprezada. Polêmico, o autor de "Detalhes" pode não agradar a todos, mas nunca ser chamado de artista medíocre como defendem os detratores. Afora o plausível, é fato que ele sofre, na mesma medida e como se isso fosse justificativa, com o peso dos que fazem fama no Brasil: são a representação do povo, mas também não são aceitos como alguém que ascendeu. Tornado divindade, é exatamente por isso condenado por não ser humilde pela ótica cristã e mal resolvida da sociedade. 

Deve-se saber separar o joio do trigo, no entanto. Roberto Carlos se tornou um velho chato, mas alguém dono de uma história que não se apaga. Há cantores melhores do que ele? Erasmo é melhor compositor que o parceiro? Há veracidade naquilo que o acusam? Tudo pode ser verdade, mas o fato é que sua obra guarda uma qualidade e uma importância incomensuráveis. Admitir que RC é um dos mais bem sucedidos artistas do século é talvez demais para quem ainda crê na sandice de que Erasmo é seu ghostwriter. Mas basta uma audição de discos como este de 75 para perceber que, definitivamente, não é qualquer coisa que se diga sobre ele que o faça perder a majestade.

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Roberto Carlos - "Quero que Vá Tudo pro Inferno" 
(Roberto Carlos Especial 1975)


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FAIXAS:
1. "Quero Que Vá Tudo Pro Inferno" - 3:37
2. "O Quintal do Vizinho" - 2:51
3. "Inolvidable" (Julio Gutierrez) - 3:15
4. "Amanheceu" (Benito di Paula) - 4:19
5. "Existe Algo Errado" (Maurício Duboc-Carlos Colla) - 3:38
6. "Olha" - 4:02
7. "Além do Horizonte" - 4:20
8. "Elas Por Elas" (Isolda-Milton Carlos) - 3:13
9. "Desenhos na Parede" (Beto Ruschel-Cezar de Mercês) - 3:20
10. "Seu Corpo" - 3:19
11. "El Humahuaqueño" (Edmundo Zaldivar) - 3:28
12. "Mucuripe" (Fagner-Belchior) - 4:43
Todas as composições de autoria de Roberto Carlos e Erasmo Carlos, exceto indicadas


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OUÇA O DISCO:

Daniel Rodrigues

sábado, 26 de junho de 2021

“Pink Flamingos”, de John Waters (1971)

 

Divina Escatologia

Afora os vários anos de paixão pelo cinema, de batimentos acelerados por causa de um final emocionante, um plano-sequência bem realizado ou mesmo um início de filme de tirar da poltrona, um dos grandes prazeres é deparar-se com surpresas que te motivam a comentar a respeito. “Pink Flamingos”, de 1971, clássico do cinema underground norte-americano, é um desses motivadores. O longa de John Waters, que completa 50 anos de seu lançamento, é tão escatológico, tão surrealista e ao mesmo tempo tão bem realizado e mordaz em sua capacidade crítica que é impossível passar incólume à obra. Mais do que isso: o quanto os símbolos da contracultura se transmutaram em um quadro muito mais perverso ao qual os Estados Unidos e o mundo se transformaram nestas últimas cinco décadas desde que o filme foi realizado.

Cineasta, ator, escritor, jornalista, artista visual e colecionador de arte, Waters é uma figura ímpar de quem só poderia ter saído algo como “Pink Flamingos”. Expulso do dormitório da Universidade de Nova York por fumar maconha e comparecer em uma única aula, Waters aprendeu sobre cinema com o dono de um laboratório de filmes da cidade natal, Baltimore, e um conhecido, que fornecida equipamentos de emissoras de televisão. Em 1964, o jovem aspirante a diretor lançou a primeira produção da carreira, o provocador curta-metragem “Hag in a Black Leather Jacket”, filme foi feito com apenas 30 dólares e que retrata um casamento entre um homem negro e uma mulher branca realizado por membros da Ku Klux Klan.

Ainda nos anos 60, Waters começou a formar o Dreamland, um grupo de artistas e performers atípicos interessados em dar vida às narrativas nada convencionais do diretor. Entre as figuras do seleto elenco, estava Harris Milstead, mais conhecido como intérprete de Divine, personagem a qual criaram juntos e que redefiniu o visual da drag queen. Sobrancelha arqueadas, delineados grossos e sombras coloridas que se estendem até o topo da cabeça quase careca, cabelos loiros e compridos que preenchem a outra metade, brincos brilhantes e um vestido vermelho ajustado ao corpo acima do peso considerado padrão pela sociedade. Sim: fora do padrão vigente e uma quebra, inclusive, da imagem Miss América que as drags ansiavam. Waters dizia, assim, que na sociedade moderna, nada é perfeito. Longe disso.

Deboche anti-cênico

“Pink Flamingos” tem muito de Luis Buñuel. Sem o charme do cinema do espanhol, já que a intenção não é essa mesmo. Mas noutras coisas, sim. Quando se fala em surrealismo no cinema a referência óbvia é Buñuel. Desde os pioneiros “Um Cão Andaluz” e “A Era do Ouro” (1928 e 1930, respectivamente), passando por alguns dos seus títulos mexicanos (“O Anjo Exterminador”, “Simão do Deserto”, “O Alucinado”) até os maduros da última fase na França (leia-se “A Via Láctea”, “O Fantasma da Liberdade”), toda sua obra é fortemente impregnada desta visão de mundo tão fora do real, que, por meio da exposição do absurdo, nos traz racionalmente para a realidade.

A turminha trash do subversivo filme de Waters

Um fator que contribui para esse universo é, além dos roteiros de cuidado literário, do refinamento da fotografia e do enquadramento e do olhar crítico e cruel de Buñuel sobre a sociedade moderna, a forma anti-cênica na qual dirigia os atores. Há em quase todos os seus filmes, um artificialismo dos atores em cena que reforça a carga de abstração do conteúdo e, por consequência, do não-realismo do discurso. 

Essa proposital falsidade, sentida nas falas, nos gestos e nos diversos elementos físicos da cena, chega ao tom de deboche, algo que inspira “Pink Flamingos”, dominando todo seu elenco. O “sarro surreal” já começa pelo enredo: o filme conta a história de Divine, um travesti que orgulhosamente ostenta o título de ser mais pervertido do mundo. Um invejoso casal, porém, concatena um plano para tirar-lhe essa coroa. A monstruosa fêmea descobre o plano e faz de tudo para manter seu posto, sem, para isso, poupar nenhum tipo de escatologia ou repugnância.

Saco cheio

Existem obras que não poderiam ser geradas não fosse na época em que surgiram. Caso contrário, corriam o risco de não ser compreendida, o que acontece bastante com as visionárias, ou de ser tachada de tardia, quando lançada depois de já existir um marco anterior sobre aquele tema. Mas tem aquelas que, bum! Acertam na mosca. “Pink Flamingos” se enquadra nessa estirpe. 

Waters: gênio do lixo
O cenário é a mesma Baltimore natal de Waters, nordeste dos Estados Unidos, início dos anos 70. Desde fim da Segunda Guerra, a sociedade norte-americana enriquecera, financiara o reerguimento da Europa, estabelecera seu cinema como maior espetáculo do mundo, gerara alguns dos maiores gênios da música com seu jazz. Mas, em contrapartida, passara por uma Crise dos Mísseis, vira um presidente ser assassinado em praça pública, perdera uma guerra para os coreanos e estava levando uma saraivada dos descalçados vietnamitas naquele momento. A “América” era um deboche.

O jovem americano urbano da época, de saco cheio com o establishment e com o mentiroso american way of life, passou a externar o desgosto com isso tudo através de manifestações artísticas, fosse em música, literatura, teatro ou cinema – às vezes, tudo ao mesmo tempo. Nascia o punk. Um desses talentos revoltosos era o cínico e picante John Waters, senhor de uma elegância quase lordesca e de uma mente tão perversa quanto criativa. “Pink Flamingos”, seu sétimo longa, insere-se no contexto do punk, movimento que, àquelas alturas, se engendrava na Big Apple e estava prestes a atravessar o Atlântico em direção a Londres, onde explodiria em 1975.

Embora não pertencente a este grupo, é estreita a relação de Waters com o punk. Sua abordagem sarcástica – a qual se viria inclusive em musicais, como o (off)Off-Brodway “Hairspray”, seu filme de maior sucesso, e “Cry Baby”, com o astro Johnny Depp – já nos anos 60 influenciaria cabeças como Paul Morrissey e John Vaccaro, estes dois ligados ao teatro e ao cinema e bastante atuantes na cena punk nova-iorquina. 

A divina nojenta

Tanto “Pink Flamingos” quanto os outros longas no qual o ator Harris Milstead encarnara o travesti Divine expressam uma profunda crítica à sociedade americana. Personagem-símbolo da obra de Waters, Divine serve como corpo (e que corpo: 150 kg) para a denúncia à moral yankee. Porém, ao contrário da visão moralista de “O Sol é Para Todos”, de Robert Mulligan, ou mesmo do olhar realista das classes baixas dos dramas de Elia Kazan dos anos 50, o cinema americano nunca tinha visto um caldeirão de agressões e acusações tão intenso. E, bem ao estilo punk, cínico e descrente, como se soubesse da importância do que está falando, mas achando que não vai servir para nada.

“Pink Flamingos” é um festival de bizarrice. A saber: venda de bebês, seqüestro, inseminação e cárcere de mulheres férteis (para depois, claro, vender os bebês), sexo com galinhas (não, não é um homem transando com a galinha: é um casal transando com a galinha no meio...) e mais contorcionismo anal, canibalismo, exibicionismo hermafrodita e por aí vai. Uma das cenas mais célebres, no entanto, recebeu, assim como a da Batalha da Escadaria de Odessa (de “O Encouraçado Potemkin”) ou a Cena do Chuveiro (de “Psicose”), até um título: Sorriso de Merda. Nesta, Divine come, na frente do espectador, as fezes de um cachorro – e ainda solta um até divertido sorriso para a câmera. 

"Eat shit": Divine em uma das cenas mais grotescas da história do cinema

Porém, se comparado com a loucura da sociedade americana, nada é pesado. Waters e os punks da época pareciam pressentir que aquele sistema nuclear da família, que a Igreja e o Estado estavam indo para o ralo, e que o final do século XX só guardava pioras. A violência da sociedade, vestida no filme de escárnio, parecem ter antevisto esse desregulamento do povo norte-americano, que quase todas as semanas enchem os noticiários com assassinatos em série em escolas e que elegem presidentes genocidas como Trump e Bush. No entanto, um dos elementos que condensam todas as ideias de ataque social que “Pink Flamingos” expõe com tamanha ironia é o do canibalismo. A cena em que Divine e sua família, ao invés de fugir de policiais que os atacavam, os comeram, é sintomática e metaforicamente profética.

O fato é que, passadas cinco décadas da realização de “Pink...”, sua atualidade se muta. O cenário político e social dos Estados Unidos transformou-se muito de lá para cá... ou nem tanto. Se àquela época a Guerra do Vietnã ainda atormentava a consciência norte-americana, a natureza bélica dos compatriotas de Waters manteve-se, menor ou maiormente, em todos - sem exceção - os governos que se sucederam ao traumático Nixon de então. Biden, no começo de caminhada, parece claramente optar pelo diálogo, mas nada impedirá que a máquina de guerra ianque haja se necessário à sua revelia - ou, pior, "por força maior" literalmente. No fim das contas, o povo mais rico do mundo, o exemplo para outras nações, o líder das ações políticas globais, aquele que se autoproclama afetivamente capaz e forte é, justamente, o que mais contraria tudo isso. Quão surreal é o cenário pós-Torres Gêmeas de multidões de refugiados. De crescimento abissal da pobreza extrema e de novos bilionários. De ascensão da extrema-direita e namoro com o fascismo. Nem uma mente subversiva e criativa com a de Waters imaginaria que as coisas fosse se configurar desse jeito. Acostumamo-nos com o surrealismo da vida.

trailer de "Pink Flamingos"


Daniel Rodrigues

segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Os 20 melhores discos brasileiros da década de 2010

Macalé: um dos expoentes da geração dos 60
da MPB marcando também a década de 2010
Passou rápido essa última década, hein? Tanto que só fui notar que isso estava ocorrendo quando, próximo do Ano Novo, ouvi dizerem que uma nova estava por iniciar. Tá, eu sei que vão dizer que a década mesmo só termina quando chegar 2021. Mas, convenhamos, todo mundo começa a contar a partir de um novo “zero” no calendário. Foi o que fiz. Automaticamente, meu cérebro começou a resgatar acontecimentos importantes no campo da cultura, entre estes, de discos da música brasileira que dessem conta desse ciclo que se fechava. E avaliando os trabalhos lançados entre 2010 e 2019, o saldo, aliás, é bem positivo.

Pode-se notar desde a entrada de uma nova turma de compositores/produtores no cenário musical até a reafirmação dos que já haviam conquistado espaço. Igualmente, a estabilização da geração de vozes femininas (como Tulipa Ruiz, Céu, Xênia França, Anelis Assumpção, Karina Buhr, entre outras), vindas em enxurradas sem critérios na década passada, é outro fenômeno percebido nesses dez últimos anos. Também viu-se um passo adiante dado pelo rap nacional (seja em São Paulo, Rio, Bahia ou outros estados) e na música instrumental mais “cabeça”, bem como a confirmação de que os velhos deuses da nossa música - Caetano, JardsGil, Chico, Djavan e outros -, ainda são bússola para todo mundo. Mas uma peculiaridade se percebeu fortemente: o encontro de gerações. Músicos jovens, além de conduzirem seus projetos próprios, passam a servir de base para moldar os mais antigos na modernidade que a produção musical da atualidade, digital e pós-moderna, exige.

Kiko Dinucci, da Metá Metá: a cabeça da nova geração
por trás de discos de outros artistas
Para representar essa década inspirada, então, selecionamos, em ordem cronológica, já que estamos falando da entrada da década de 20, duas dezenas de discos essenciais da música no Brasil daquilo que, transcorridos mais de 90% de sua totalidade, podemos já chamar de anos 2010. Semelhanças com outras listas sobre o mesmo tema haverá, pois alguns destaques são bastante evidentes. Uma boa parte, por exemplo, figurou no seleto grupo de ÁLBUNS FUNDAMENTAIS do blog e outros, merecedores, estão em tempo de, nalgum momento, serem alçados a tal. Mas diferenças também se notarão, e é aí que reside o legal da formação de listas: poder compará-las, concordar, discordar e, quem sabe, motivar que novas sejam compostas.

****

1. “Recanto” Gal Costa (2011)

O brilhante disco que marcou o retorno de Gal ao nível de qualidade do qual ela nunca deveria ter se afastado. Álbum irmão de “Cantar”, de 1974, "Recanto" tem, igualmente àquele, a curadoria de Caetano Veloso. O disco, no entanto, vai além: é todo de autoria do mano Caetano, com a assinatura de Kassin e Moreno Veloso na produção e arranjos. Disco que revolucionaria não apenas a carreira da cantora, mas ditaria conceito e sonoridade pra quem não quisesse ficar de fora dessa evolução em termos de música no Brasil. Do krautrock tropicalista ao baião renascentista, da industrial-bossa ao funk-maculelê: uma obra-prima da MPB moderna.

1. Recanto Escuro
2. Cara do Mundo 
3. Autotune Autoerótico 
4. Tudo Dói 
5. Neguinho 
6. O Menino
7. Madre Deus 
8. Mansidão 
9. Sexo e Dinheiro 
10. Miami Maculelê 
11. Segunda



2. “Chico” Chico Buarque (2011)

Como seus livros, os discos de Chico têm sido cada vez mais espaçados. Porém, quando acontecem, são de uma síntese tremenda. Este, seu único trabalho musical da década além de “Caravanas”, de seis anos adiante, é o retrato de um artista maduro para com sua música e de um homem consciente para com sua história. Haja vista a autoavaliativa “Querido Diário” ou a romântico-realista “Essa Pequena”. A mais afinada parceria dele com o maestro Luis Cláudio Ramos, “Chico” ainda tem pelo menos outras duas obras-primas: “Tipo um Baião” e “Sinhá”, esta última, parceria com João Bosco, Melhor Canção daquele ano no Prêmio da Música Brasileira.


1. Querido Diário
2. Rubato
3. Essa pequena
4. Tipo um baião
5. Se eu soubesse
6. Sem você nº 2
7. Sou eu
8. Nina
9. Barafunda
10. Sinhá


3. “Nó na Orelha” Criolo (2011)

O ano de 2011 foi marcante não apenas pela alta qualidade de trabalhos de artistas tarimbados como Chico  e Gal, mas também por conta da chegada de uma figura que revolucionaria a música brasileira a partir de então: o paulista Criolo. E ele não o fez repetindo os mesmos passos dos mestres. Fez, sim, pela via do rap. Dono de uma musicalidade assombrosa e de versos imagináveis somente numa cabeça como a dele, Criolo, com o auxílio luxuoso de Daniel Ganjaman, cunhou um dos melhores discos da história da música brasileira e abriu caminho para uma renovação no rap nacional: um rap brasileiríssimo em cores, rimas e sons.


1. Bogotá
2. Subirusdoistiozin
3. Não Existe Amor em SP
4. Mariô
5. Freguês da Meia-Noite
6. Grajauex
7. Samba Sambei
8. Sucrilhos
9. Lion Man
10. Linha de Frente



4. “MetaL MetaL” Metá Metá (2012)

Quando a Metá Metá (Juçara Marçal, voz; Kiko Dinucci, guitarras; e Thiago França, sax) foram convidados, em 2017, para compor a trilha sonora do balé “Gira”, do Grupo Corpo, aquele grande trabalho tinha um evidente precedente: o abundante “MetaL MetaL”, segundo disco da banda paulistana dona do jazz-rock mais afro-brasileiro que já se viu. Uma explosão de sensações, musicalidade, timbres, sonoridades. Basta ouvir “Oyá”, “Logun” ou “Cobra Rasteira” para entender o que se está dizendo. “Incrível” é o mínimo do que se pode descrever.


1. Exu
2. Orunmila
3. Man Feriman
4. Cobra Rasteira
5. São Jorge
6. Oya
7. São Paulo No Shaking
8. Logun
9. Rainha Das Cabeças
10. Alakorô
11. Tristeza Não



5. “Abraçaço” Caetano Veloso (2012)

Não é de se estranhar que o sempre criativo e produtivo, mas também aberto e inovador Caetano tirasse proveito da parceria com os novos músicos. Mas para a sua mente tropicalista essa química foi ainda mais contributiva quando, em 2006, se deparou com a Banda Cê (Pedro Sá; Ricardo Dias Gomes e Marcello Callado). A formação/sonoridade rocker de baixo-guitarra-bateria deu condições ao baiano não apenas de compor uma elogiada trilogia (“Cê”, “Zii e Zie” e este) como, mais que isso, criar um quase subgênero: o transrock. “A Bossa Nova É Foda” (Grammy Latino de Melhor Canção Brasileira) e a faixa-título são apenas duas que confirmam ser este um dos grandes momentos da longa carreira de Caê.

1. A Bossa Nova é Foda
2. Um Abraçaço
3. Estou Triste
4. Império da Lei
5. Quero ser Justo
6. Um Comunista
7. Funk Melódico
8. Vinco
9. Quando o Galo Cantou
10. Parabéns
11. Gayana



6. “Não Tente Compreender” Mart’nália (2012)

Não dá pra dizer que Mart’nália, que já soma mais de 30 anos de carreira, pertença à nova geração. Mas que foi nos anos 2010 que ela se superou, isso sim, é possível afirmar. A filha mais famosa do mestre Martinho da Vila convoca ninguém menos que outro craque, Djavan, para produzir seu álbum, o que resulta no trabalho mais bem acabado dela. O mais legal é que é um disco fácil de se ouvir: suingado, melodioso, charmoso. Além de composições suas, Mart’nália grava figuras carimbadas da MPB, como Marisa Monte, Adriana Calcanhoto, Gil, Caetano, Ivan Lins, Nando Reis e outros. E, claro: não poderia faltar Martinho.

1. Namora Comigo
2. Surpresa
3. Daquele Jeito
4. Depois Cura
5. Que Pena, Que Pena...
6. Não Tente Compreender
7. Itinerário
8. Reverses Da Vida
9. Serei Eu?
10. Eu Te Ofereço
11. Os Sinais
12. Demorou
13. Zero Muito
14. Vai Saber



7. “Aquário” Tono (2013)

Se na década de 2000 foi a turma de Kassin, Domenico e Moreno quem ditou os padrões de “inteligentsia” da música no Brasil, Bem Gil e sua trupe deram um passo adiante nos 2010. Sonoridade moderna e ao mesmo tempo doméstica; melodias complexas que soam fáceis de ouvir; perfeição de timbres e execução que faz parecer algo simples de se fazer. Tamanha completude funcionou tão bem, que foi posta a serviço do genial pré-tropicalista Jorge Mautner em seu mais recente álbum “Não Há Abismo Em Que o Brasil Caiba”, do ano passado, produzido pela banda. Eis os novos caciques da MPB.

1. Murmúrios
2. Sonho com Som
3. Como Vês
4. Tu Cá Tu Lá
5. Chora Coração
6. Leve
7. Do Futuro (Dom)
8. UFO
9. Pistas de Luz
10. Da Bahia
11. A Cada Segundo



8. “Sambadi” Lucas Arruda (2013)

Certamente Marcos Valle, a Azymuth e a turma remanescente da primeira fase do jazz-soul-AOR brasileiro vibrou quanto, em 2013, viram o Espírito Santo operar um milagre: o nascimento de um músico multi-instrumentista e multitalentoso, o capixaba Lucas Arruda. O semi-instrumental “Sambadi”, seu disco de estreia, é um alento de resistência de uma música que o Brasil por muito tempo importara, mas que também há muito não se via representada. Foi Ed Motta quem disse: “Para mim, Lucas Arruda salva esse cenário supermedíocre de hoje”. Talvez nem tanto assim, mas dá a dimensão do acontecimento que foi a sua chegada.


1. Physis 
2. Tamba, Pt. 1 
3. Batuque 
4. Who's That Lady
5. Rio Afternoon 
6. Na Feira 
7. Sambadi 
8. Carnival 
9. Alma Nov
10. Tamba, Pt. 2



9. “Vira Lata na Via Láctea”Tom Zé (2014)

Mais do que os colegas tropicalistas Gal, Caetano e Gil, o que talvez seja o de espírito mais jovem e inquieto é Tom Zé. O baiano de Irará entra na roda da gurizada e produz seu mais poderoso disco da década. Criolo, Dinucci, Tim Bernardes, Trupe Chá De Boldo e Filarmônica de Pasárgada revigoram o sarcasmo poético-erudito do autor de “Brasil Ano 2000”. Mas também tem espaço para os contemporâneos Milton Nascimento (“Pour Elis”), Fernando Faro e uma inédita coautoria com Caetano na faixa que encerra o álbum: “A Pequena Suburbana”.

1. Geração Y
2. A Quantas Anda Você?
3. Banca de Jornal
4. Cabeça de Aluguel
5. Pour Elis
6. Esquerda, Grana e Direita
7. Mamon
8. Salva a Humanidade
9. Guga na Lavagem
10. Irará Irá Lá
11. Papa Perdoa Tom Zé
12. Retrato na Praça da Sé
13. A Boca da Cabeça
14. A Pequena Suburbana



10. “Passado de Glória: Monarco 80 Anos” Monarco (2014)

Último remanescente da Velha Guarda (sim, com letra maiúscula!) do samba brasileiro, Monarco gravou, desde os anos 70, quando já era um bamba da Portela, praticamente um disco por década. Já octogenário, o mestre, com seu barítono inconfundível e suas melodias e letras marcantes, desfila canções irreparáveis de seu vasto cancioneiro. Desde composições dos anos 40 (o gracioso maxixe “Crioulinho Sabu”, escrito quando tinha apenas 8 anos) até parcerias com sambistas célebres, como Mário Lago (“Poeta Apaixonado”), Ratinho (“Verifica-se De Fato”, “Pobre Passarinho”) e Mijunha (“Meu Criador”). Sabe aquele disco que tem caráter de registro histórico-antropológico? Pois é.

1. Poeta Apaixonado
2. Verifica-se De Fato
3. Não Reclame Pastorinha
4. Tristonha Saudade
5. Insensata E Rude
6.  Estação Primaveril
7. A Grande Vitória
8. Pobre Passarinho
9. Momentos Emocionais
10. Fingida
11. Meu Criador
12. Horas de Meditção
13. Crioulinho Sabu



11. “Mulher do Fim do Mundo” - Elza Soares (2015)

A deusa negra Elza Soares já vinha de um ótimo trabalho com músicos de São Paulo por meio do craque Zé Miguel Wisnik, “Do Cóccix Até O Pescoço”, de 2012. E foi dessa proximidade com a turma paulista que a grande cantora viva de sua geração e símbolo do empoderamento feminino chegou a Guilherme Kastrup. Deu liga. Ele arrumou o campo pra que Elza entrasse em campo com o que sabe fazer melhor do que ninguém: cantar. Clássico imediato, “Mulher. do Fim do Mundo” conta com joias como a faixa-título, “Maria de Vila Matilde” e “Pra Fuder”.

1. Coração do Mar
2. A Mulher do Fim do Mundo
3. Maria da Vila Matilde
4. Luz Vermelha 
5. Pra Fuder
6. Benedita
7. Firmeza?!
8. Dança
9. O Canal
10. Solto
11. Comigo



12. “Sangue Negro” Amaro Freitas (2016)

Justo na década em que o Hermeto Pascoal começa a dar sinais de cansaço, eis que surge, também do Nordeste, um novo talento do jazz brasileiro com domínio do piano, da composição, da harmonia e, claro, do improviso: o pernambucano Amaro Freitas. Seu disco de estreia, “Sangue Negro”, é uma ode ao caminho aberto pelo Bruxo e seus cultuadores de magias sonoras. Ora modal, ora hard-bop, ora vanguarda. Ora sertão e barracão. Sintonia perfeita entre ele e seus músicos, Jean Elton (baixo), Hugo Medeiros (bateria) e os sopros de Fabinho Costa e Elíudo Souza.



1. Encruzilhada
2. Norte
3. Subindo O Morro
4. Samba De Cesar
5. Estudo 0
6. Sangue Negro





13. “No Voo do Urubu” Arthur Verocai (2016)

Só o fato de ser um dos quatro discos do maestro e compositor mais cults da música brasileira e o único na década de 2010 já seria suficiente para ser considerado importante. Mas “No Voo do Urubu” alça mais alto que isso: vai aos céus. Essencial desde seu lançamento, como bem percebeu Ruy Castro, traz desde o primor das melodias jobinianas (“Oh! Juliana”, “O Tempo e o Vento”) ao contagiante suingue funk-soul nas parcerias com Vinícius Cantuária (“A Outra”), Mano Brown (“Cigana”) e Criolo (“O Tambor”). Claro, Verocai não deixa de lado também os arranjos de cordas mozartianos e o dedilhado erudito-popular do violão.

1. No Voo do Urubu 
2. O Tempo e o Vento
3. Oh! Juliana (
4. Minha Terra Tem Palmeiras 
5. A Outra 
6. Cigana 
7. O Tambor
8. Snake Eyes 
9. Na Malandragem 
10. Desabrochando 



14. “Duas Cidades” BaianaSystem (2016)

A Bahia de Todos os Santos é um dos polos da música brasileira desde que o samba é samba. Por isso, não é de se estranhar que tenha seus representantes nesta nova geração da música brasileira. É aí que entra o BaianaSystem. Misto de reggae, dub, samba, afro-beat, rap, axé e rock, eles trazem não só a Salvador idílica como também a urbana, como suas questões sociais, raciais e políticas à flor do asfalto. “Jah Jah Revolta – parte 2” abre o disco dizendo a que veio. Isso sem falar nas excelentes “Mercado”, “Dia da Caça” e “Panela”. Mais um pra conta de Daniel Ganjaman, aliás.

1. Jah Jah Revolta - Parte 2
2. Bala na Agulha
3. Lucro (Descomprimindo)
4. Mercado
5. Duas Cidades
6. Playsom
7. Dia da Caça
8. Cigano
9. Calamatraca
10. Panela
11. Barra Avenida Parte 2
12. Azul



15. “Tribalistas 2”Tribalistas (2017)

Ainda bem que não se confirmaram os versos ditos por eles mesmos em 2002 de que “o tribalismo” iria “se desintegrar no próximo momento”. Para sorte dos fãs e da música brasileira, 15 anos depois, Marisa Monte, Carlinhos Brown e Arnaldo Antunes se reúnem novamente e, novamente, produzem um disco impecável de cabo a rabo. Das composições às execuções, das interpretações à produção. Que beleza infindável que são, por exemplo, "Diáspora", "Baião do Mundo" e "Fora da Memória"!

1. Diáspora
2. Um só
3. Fora da memória
4. Aliança
5. Trabalivre
6. Baião do mundo
7. Ânima
8. Feliz e saudável
9. Lutar e vencer
10. Os peixinhos




16. “Besta Fera”Jards Macalé (2018)

O “maldito” voltou com tudo, a se ver já pelo título. Com o aporte de um dos cabeças desta nova geração, o “Metá Metá” Kiko Dinucci, juntamente com outro talento eminente, Thomas Harres, Macao traz desde temas com esses jovens parceiros e outros, como Tim Bernardes e Rodrigo Campos, até o velho companheiro de estrada Capinam (em “Pacto de Sangue”) e a filha do amigo Glauber Rocha, Ava Rocha, com quem compôs “Limite”. Impossível ficar alheio à faixa de abertura, “Vampiro de Copacabana”, homenagem a Torquato Neto.

1. Vampiro de Copacabana
2. Besta Fera
3. Trevas
4. Buraco da Consolação
5. Pacto de Sangue
6. Obstáculos
7. Meu Amor e Meu Cansaço
8. Tempo e Contratempo
9. Peixe
10. Longo Caminho do Sol
11. Limite



17. “Abaixo de Zero: Hello Hell”Black Alien (2018)

Falando novamente em rap, não só a nova geração surpreendeu, mas também um velho militante do hip-hop brasileiro: o ex-Planet Hemp Black Alien. Após um período sabático, Gus ressignificou sua vida e sua música, lançando um disco curto, pungente e genial. Letras afiadíssimas sobre a sua realidade e vivência e também sobre sociedade, política e sistema, ganham a roupagem perfeita dada pelo produtor e parceiro Papatinho, outro “ás” da nova geração. Versos como “Quem me viu, mentiu, país das fake news/ Entre milhões de views e milhões de ninguém viu” dão a ideia do quanto o negócio é quente.


1. Área 51
2. Carta Pra Amy
3. Vai Baby
4. Que Nem O Meu Cachorro
5. Take Ten
6. Au Revoir
7. Aniversário De Sobriedade
8. Jamais Serão
9. Capítulo Zero





18. “Taurina”Anelis Assumpção (2018)

A responsabilidade de representar a tradição dos Assumpção na música não é tarefa fácil. Não para Anelis Assumpção. Após a perda do pai, o genial Itamar Assumpção, no início dos 2000, viu-se, em 2016, também sem a irmã mais velha, a igualmente musicista Serena. Toda essa hereditariedade e tradição, unidas à sua criatividade própria, resultaram no brilhante “Taurina”, terceiro disco dela. Sensibilidade feminina, empoderamento, Lira Paulistana, poesia maldita, ecos do Nego Dito: elementos musicais e conceituais não faltam, o que se pode notar em “Mergulho Interior”, “Chá de Jasmin”, “Paint my Dreams” e outras. 

1. Mergulho Interior
2. Chá De Jasmim
3. Segunda à Sexta
4.  Gosto Serena
5.  Pastel De Vento
6. Caroço
7. Mortal À Toa
8. Paint My Dreams
9.  Moela
10.  Escalafobética
11. Receita Rápida




19. "Bluesman" - Baco Exu do Blues (2018)

Na Bahia tem cururu, vatapá e... rap! Baco Exu do Blues, esse jovem talento vindo da terra de Caymmi, balançou a cena musical brasileira em 2017 com o marcante "Esu" e, logo em seguida, surpreendeu ainda mais com o premiado "Bluesman". Trap, gangsta, blues e funk se homogeinizam às mais profundas raízes da música afro-brasileira. Samples inteligentes e letras poderosas, viscerais, críticas e improváveis, como as de “Queima Minha Pele”, “Me Desculpa Jay Z” e Flamingos” e “Girassóis De Van Gogh”.


1. Bluesman
2. Queima Minha Pele
3. Me Desculpa Jay Z
4. Minotauro De Borges
5. Kanye West Da Bahia
6. Flamingos
7. Girassóis De Van Gogh
8. Preto E Prata
9. BB King




20. “Gil” Gilberto Gil (2019)

Se o autor de “Aquele Abraço” não tinha produzido nenhum disco à altura de seus grandes álbuns na década de 2010, ao apagar desta o mestre baiano tira da cartola a trilha sonora para a peça que o Grupo Corpo encenaria lindamente nos palcos. Mas, como acontece sempre com as trilhas da companhia de dança, o disco pode ser apreciado separadamente da coreografia com tranquilidade. E que maravilha Gil compôs! Espécie de réquiem em ritmos e cores brasileiras, Gil, de mãos dadas com o filho e igualmente talentoso Bem Gil, desfila suas inúmeras referências, tendo uma como principal: a própria obra. 

1. Intro Choro nº 1
2. Choro nº 1
3. Improviso Choro nº 1
4. Intro Seraphimu
5. seraphimu
6. Improviso Seraphimu
7. Intro Fragmento Lírico
8. Fragmento Lírico
9. Improviso Fragmento Lírico
10. Círculo
11. Triângulo
12. Quadrado
13. Retângulo
14. Pentágono
15. Gil


Daniel Rodrigues