"Quando escrevi sobre o Echo and the Bunnymen e sobre o R.E.M.,
no fim dos anos 80,
o processo pareceu relativamente fácil.
Na época, eu não entendi que isso se devia ao fato de os dois grupos serem entidades em total funcionamento,
com integrantes seguros na companhia uns dos outros
a ponto de
apenas me contarem sobre os demais
o que gostariam de ouvir sobre si mesmos,
e suficientemente jovens para não serem especialmente
protetores com seus legados
ou terem deixado para trás qualquer lembrança ruim(...)
Com os Smiths o processo foi muito complicado."
Tony Fletcher
Sempre vou com uma certa reserva quando
leio biografias de artistas porque muitas vezes os relatos que compõe o trabalho não
passam de um amontoado de fofocas, diz-que-me-diz, achismos,
especulações, fatos nunca confirmados ou sem evidências, restando
apenas, de realidade mesmo, apenas fatos incontestes de domínio
público que saíram no jornal, entrevistas concedidas e coisas do tipo (aí é mole). Mas fui surpreendido positivamente pela ótima biografia de
uma das minhas bandas favoritas, “The Smiths – A Light That Never
Goes Out – A Biografia”, onde autor, Tony Fletcher, um
jornalista, biografo já experimentado, rodado, experiente com outras
bandas, mergulha fundo na história do quarteto de Manchester, The Smiths, buscando elementos desde as origens históricas das famílias, do
povoamento de Manchester, do contexto social da cidade, do país, até
chegar à formação dos meninos em escolas católicas severas, em
bairros operários, deparando-se com crise, desemprego, mas com as
descobertas musicais que os levariam a serem o que foram.
Contemporâneo dos integrantes dos
Smiths e até mesmo presente em alguns episódios, o autor destrincha
com habilidade os fatos que envolveram a curta trajetória da banda,
relatando-os de forma competente numa narração muito bem
estruturada e envolvente.
Para os fãs, o livro só fará
reforçar a admiração pela banda, pelas suas virtudes, suas
técnicas individuais, suas inspirações, e por seu repertório,
embora revele de forma bastante imparcial e impiedosa a personalidade
difícil, egocêntrica e quase insuportável de Morrissey,
revelando-a, entre outras razões, como um dos principais motivos
para o fim prematuro do grupo.
Mas, de todo modo, é absolutamente
fascinante conhecer um pouco da descoberta mútua de Morrissey e
Marr, o início da parceria, as primeiras composições, conhecer um
pouco mais sobre cada música, o sucesso, a idolatria e tudo mais.
“The Smiths – A Biografia” é
extremamente revelador no que diz respeito ao regime praticamente
amadorístico com o qual a banda conduzia suas questões
empresariais, fato tão decisivo para a abreviação da história da banda como para o fato de torná-la diferenciada e fazer com que não caísse na vala comum de bandas de megasucesso; aprofunda a questão do envolvimento com drogas por
parte do baixista Andy Rourke; mergulha nas turnês e em seus
bastidores, conseguindo no êxtase e nas catarses do público;
esmiúça o processo construtivo, passo a passo, de vários canções
do grupo, com destaque especial para “How Soon Is Now?”, um dos
maiores clássicos da banda e uma de suas grandes pérolas, cheia de
camadas de guitarra e outros recursos de estúdio; e ajuda a
esclarecer o fim, até então nunca muito bem explicado.
Nada daquelas biografias chatas,
cansativas. Não! Ótimo livro, leitura fluída, fácil sem ser
limitado e ainda por cima de uma banda do meu coração. Uma vida
curta mas cheia de histórias, polêmicas, conflitos e
desdobramentos. Pouco tempo de existência mas o suficiente para
escrever seu nome definitivamente na história do rock.
Cly Reis
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