Inteligência artificial.
Possível?
Perguntar se é possível, a essas alturas, creio que já não seja mais necessário diante de todas as demonstrações que a tecnologia nos fornece diariamente e de todas as possibilidades e previsões que já se mostram tão palpáveis num horizonte próximo.
Mas é a tecnologia que nos demonstra isso? Sim e não. É ela através das mãos do homem. O Homem como criador. Como Deus!
A questão é até que ponto uma inteligência criada pelo próprio ser humano pode chegar e não ser meramente maquinal e mimética? Uma criação perfeita. Este é um dos pontos principais de "Ex-Machina: Instinto Artificial", um dos filmes mais instigadores que assisti nos últimos tempos.
Caleb (Domhnall Gleeson), um funcionário de uma grande empresa de informática, algo entre o Google e o Facebook, é "sorteado" para passar uma semana na casa do dono da companhia, Nathan (Oscar Isaac) um excêntrico e desleixado gênio da informática recluso em sua vasta propriedade isolada do resto do mundo. Lá, Caleb descobre que a intenção do nerd milionário não é ficar jogando conversa fora e bebendo durante uma semana, embora esta última atividade lhe agrade sobremaneira, uma vez que o álcool parece combustível para sua genialidade. A ideia de Nathan, dono da Bluebook (qualquer semelhança não é mera coincidência) é apresentar para o convidado sua nova criação, seu AI (artificial inteligence), Ava (Alicia Vikander), um protótipo de aspecto humano e rosto atraentemente angelical, e fazer com que ela interaja com um humano que não seja ele, o criador, de modo a testar sua inteligência, capacidades de convivência e verificar eventuais falhas a serem corrigidas.
Caleb diante de Ava.
Transparências e reflexos definem os cenários
e permeiam a trama.
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O filme, entre paredes de concreto, vidros e espelhos, forma um verdadeiro labirinto, espacial e psicológico, onde em determinados momentos não temos mais certeza sobre quem está manipulando quem e qual a verdade por trás das intenções de cada um naquela conturbada relação a três dentro de uma claustrofóbica fortaleza tecnológica subterrânea.
Não quero entrar em detalhes porque cada seção de Caleb com Ava é mais reveladora ao mesmo tempo que mais intrigante, mas um dos grandes méritos do filme, além de manter um suspense e tensão quase insuportáveis para o espectador (insuportável no sentido positivo) e de seus efeitos especiais premiados com o Oscar, é colocar a relação objeto-criador, seja o objeto homem ou máquina e seja o criador homem ou Deus, como algo um pouco mais complexo do que pode-se pensar de uma maneira natural examinando, por extensão, as relações éticas e morais que envolvem o mundo da informática. O inquietante "Ex-Machina" examina de maneira inteligente a solidão, o isolamento, necessidade de interação, a influência do meio sobre o indivíduo, a privacidade, as relações de poder, a genialidade, o limite do homem e por que não, a evolução.
Sem spoilers, diria que preferia um final menos concreto, mais aberto, que dentre todas as possibilidades criadas durante a história mantivesse grande parte delas em aberto, mas posso dizer que se ele não beneficia o filme, do modo como eu egoisticamente preferia, como acontece ele não traz grande prejuízo.
"Ex-Machina" é um inquietante jogo onde o homem brinca de Deus e sua criação de Homem, absorvendo dele seu melhor e seu pior. A pressuposição de que talvez a partir de uma criação como essa um novo mundo onde convivam homens e máquinas possa estar sendo constituído está jogada na mesa.
Será?
Não sei.
Mas é bom lembrar que no princípio era o Verbo.
Cly Reis
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