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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

"Roma", de Alfonso Cuarón (2018)



"Roma" é um filme lento. Mas isso não é demérito algum. De desenvolvimento é lento, sua dinâmica é lenta, os movimentos de câmera são lentos e ele não tem a menor pressa para, utilizando bem suas mais de duas horas, conquistar o espectador. O filme é focado na personagem Cleodegaria Gutiérrez, ou simplesmente Cleo, ( Yalitza Aparicio) uma empregada de uma família de classe média no México, no início dos anos '70, que se envolve com um rapaz, engravida dele e é abandonada por ele. Ela teme ser despedida da casa onde trabalha e mantém uma relação afetiva muito próxima com os filhos dos patrões, mas ao contrário do que imaginava, é acolhida pela patroa que, com uma viagem do marido sob pretexto profissional, vê-se sozinha e fragilizada para cuidar dos filhos. Em meio ao momento político conturbado, manifestações estudantis, conflitos, guerrilhas, , terremoto, recessão, vamos acompanhando a jornada de Cleo, o andamento de sua gravidez e as mudanças ocorridas no ambiente familiar da casa em que trabalha com a ausência do pai.
Cleo, ao fundo, com a família para a qual trabalha.
Alfonso Cuarón, vencedor do Oscar de melhor diretor por "Gravidade", em 2014, vai construindo seu filme e nos aproximando dos personagens, da doce e tímida protagonista; da mãe, Sofia, que sabendo que o marido não vai voltar decide ir à luta e seguir a vida; das crianças que vivem sua infância da melhor maneira possível em meio àquele turbilhão social, familiar e emocional, e com tudo isso, quando percebemos, na segunda metade, estamos completamente envolvidos com eles, o que culmina na emocionante cena da praia que, praticamente define o filme. A propósito desta cena de feitura notável, a opção por uma fotografia em preto e branco, sempre plasticamente interessante, e por uma câmera, na maioria das vezes, praticamente estática num ponto, percorrendo a cena de um lado a outro, cobrindo três ou quatro situações de cena ao mesmo tempo, são acertos estéticos e formais do diretor, que qualificam sobremaneira seu trabalho e seu produto final.
"Roma" que, na verdade não tem nada a ver diretamente com a capital italiana e, sim, com o bairro Colonia Roma, onde vive a família do filme e onde viveu o diretor na infância, não à toa é repleto de referências ao cinema italiano, ao neo-realismo de Rosselini e a seu "Roma, Cidade Aberta", a "Mamma Roma" de Pasolini, e em muitos momentos a Fellini, mas curiosamente não ao filme homônimo do mestre italiano que homenageia Cidade Eterna, e sim a "8 1/2" como na cena da chegada de Cleo à favela e na do túnel que são as mais evidentes.
Por mais que seja inegavelmente belo e tocante, acredito que o longa de Cuarón não deva levar o Oscar de melhor filme. Por mais que a Academia já tenha me surpreendido com prêmios para "Birdman" e "O Artista", acredito que um filme como "Roma" faça, menos que os citados, o tipo de filme que agrada o americano e se distancia do que o grande público espera do "vencedor de melhor filme". Isso sem falar na questão do streaming que ainda é um certo tabu para Hollywood e que, embora com um grande número de indicações este ano, representaria, para mim, uma grande surpresa se superasse essa barreira tão cedo e ainda mais no nível de premiação máxima. Porém, pelos méritos de direção de Cuarón, pelo capricho, pela beleza, não duvido que, no fim da noite do dia 24 de fevereiro, este talentoso mexicano tenha outra estatueta de melhor diretor para colocar na prateleira ao lado da que ele já tem.
A fotografia, assinada pelo próprio Cuarón, é um dos grandes destaques do filme.



Cly Reis

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