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quinta-feira, 21 de março de 2019

"Carrie, A Estranha", de Brian De Palma (1976) vs. "Carrie, A Estranha", de Kimberly Peirce (2013)



Um olhar feminino sobre questões como adolescência, sexualidade, relação mãe e filha talvez justificasse o fato da diretora Kimberly Peirce tentar refilmar o cultuado "Carrie, a estranha", dirigido originalmente por Brian de Palma, a partir da obra de Stephen King, porém, como nenhum destes aspectos levantados tem relevância suficiente na nova versão, o filme da diretora norte-americana torna-se completamente dispensável. E olha que nem vou me dar o trabalho de falar inexpressiva da refilmagem de 2002 ou da infame "sequência de 1999.
Mais interessado em provocar sustos, jorrar sangue e exibir efeitos visuais, o remake na ânsia de rejuvenescer o contexto acaba tornando-se apenas mais um terror tem cheio de clichês. Se essa atualização tem alguma vantagem em relação ao antigo é no que diz respeito à difusão da imagem da pobre Carrie em redes sociais por meio dos celulares. Esse, sim, considero uma bola dentro da nova versão, amplificando o alcance da exposição e agravando ainda mais a humilhação sofrida pela garota. De resto, a refilmagem erra em uma série de escolhas e não apresenta, no fim das contas, quase nenhum mérito.
Do outro lado temos a versão original, de 1976, na qual a condução de Brian de Palma, que sabendo exatamente o que quer de cada cena, cada segmento, cada enquadramento, lhes dá tratamentos diferenciados de acordo com a tensão que pretende imprimir. Desde quebras de ritmo e inversões de expectativa como na cena inicial em que um momento de ternura entre adolescentes, filmado em câmera lenta e emoldurado por uma música suave, é interrompido pela surpresa de um misterioso sangue, numa espécie de recriação da cena do chuveiro de Hitchcock mas desta vez com o sangue do florescer da puberdade de uma menina. Ou quando da escolha do casal Carrie e Tommy como reis do baile, quando a cena, sob uma trilha triunfante, toda conduzida em câmera lenta, como se a protagonista quisesse que aquele momento durasse para sempre, tem quebrado seu encanto com a queda do balde de sangue sobre a nossa protagonista, desencadeando todos os acontecimentos trágicos do baile. Sequência esta, por sinal, na qual se dá o maior show da direção de De Palma no filme, com a manifestação dos poderes da garota sob uma edição alucinante, divisões de tela que deixam o espectador aturdido, closes rápidos, aceleração de movimentos, variações de iluminação que ajudam a induzir as sensações do público e toda uma maestria na execução que fazem está cena uma das grandes passagens da história do cinema.

cena da fúria de Carrie (1976)

Além de tudo isso, a escolha da protagonista, no mais recente, a bonita e graciosa Chlöe Grace Moretz, "normal" demais, do ponto de vista físico, parece-me pouco apropriada, ao passo que o antigo contava com a esmilinguida Sissi Spacek, um verdadeiro bichinho-da-goiaba que chegava a dar pena só de ver, muito mais pertinente à situação de bullying que, no atual, praticamente só pode se apegar à condição religiosa da garota, uma vez que, no mais, ela não difere muito das outras. Julianne Moore até se sai bem como a mãe fanática religiosa na nova versão, mas nada consegue superar aquela interpretação, em alguns momentos quase obscena, de Piper Laurie no original. Se na original, Sue, a garota arrependida do bullying com Carrie, a que pede para que o namorado leve a esquisita à festa, é discreta e adequada ao papel (Amy Irving), no remake é uma Barbie chamativa e destalentosa; enquanto o garotão, Tony Ross que até está simpático no novo, mas é tão insignificante que durante boa parte do filme a gente fica procurando por ele, no velho filme é marcante na figura de William Katt, praticamente um rock star (lembra Robert Plant em seu melhor momento), um anjo loiro, tão impressionante e imponente que não teria como não olhar para ele e não saber que aquele rapaz é "o cara" da escola. E a nossa vilã? O que dizer dela? Ai, a garota que implica mais incisivamente com a nossa heroína é simplesmente sofrível!!! Uma atriz inexpressiva que abusa das caras e bocas com clichês de atuação constrangedores, que não dá nem para comparar com a clássica atriz de Brian De Palma, Nancy Allen, que, embora também um tanto teatral demais, serve perfeitamente dentro do tipo de proposta dramática das cenas do diretor.
O original faz quatro ao natural. Aquele jogo que até poderia ter sido mais, mas o time grande tira o pé porque não tem mais o que provar. Um, por que tem mais recurso técnico, time bom que toca quando tem que tocar e parte pra cima na hora que tem quer definir a jogada (ou seja, conduz com sabedoria as cenas de drama, dá o ritmo certo o tempo todo e deixa o espectador sem respirar nas cenas de terror). Dois, pela escalação. Um time muito mais bem escolhido com o jogador certo em cada posição (a mãe, impecável; a vilã, perfeita; o galã, muito adequado e a 'matadora', não poderia ter sido melhor escolha), enquanto o adversário além de escalar jogadores fracos, colocou alguns fora da função onde poderiam render mais. Três, pelo pequeno plano-sequência que sai da mesa do casal, denuncia a troca dos votos, passa por baixo da escada, acompanha a corda do balde, chega até ele em cima do palco e reencontra frontalmente Tommy e Carrie na mesa prestes a se consagrarem rei e rainha do baile. Golaço! E mais um pela cena final. Lenta, "despretensiosa"... Quando parece que não vai acontecer mais nada, dá um cagaço no espectador mais despreparado. Foi o caso comigo. O timezinho remake até faz um por conta da boa inserção dos celulares e mídias sociais na história, mas fica por aí mesmo. Saiu barato!

À esquerda a Carrie de Brian De Palma e à direita, a de Kimberly Peirce.

Sissy Spacek, a Carrie, de Brian de Palma, literalmente, incendeia a torcida
e dá um banho de água fria nas pretensões do filme de Kimberly Peirce de se igualar ao original. 
Um verdadeiro baile! 





Cly Reis