O Corrêa já não
tinha gostado nada de saber que a direção tinha contratado o tal de
Luís Paulo, zagueiro, dizia-se clássico, que havia sido destaque do
último campeonato nacional. Gostara menos ainda quando vira o fulano
no dia da apresentação: brinquinho, fala mansa, sombrancelha
feita...Puta merda! Aquilo não ia dar certo. Sem falar que zagueiro
não podia ter nome composto. Só se fosse o nome seguido da alcunha,
tipo, Tião Pedrada, Zeca Cavalo ou alguma coisa assim. Mas, agora,
Luís Paulo? “Luís Paulo”, aquilo era nome de cabeleireiro.
Zagueiro pro Corrêa
tinha que ser zagueiro. Zagueiro mesmo!!! Essa coisa de zagueiro
jogar bonito pro Corrêa não existia. O Corrêa era daqueles que
jogavam o cara no alambrado e saía fazendo cara de inocente. Sair
jogando nada. Zagueiro tinha no máximo entregar direitinho pro
volante e olhe lá. O certo mesmo era espanar e sentar a bicanca pro
ataque. Mas não! O presidente tinha embestado com aquela coisa de
melhorar a saída de bola, a transição. Essas frescuras do futebol
de hoje. Ele bem que tentara convencer o vice-de-futebol que era
bobagem, que tinha que impor respeito na defesa, que um cara daqueles
na hora de decidir ia fraquejar, mas o homem da direção argumentava
que era pra equilibrar com a característica do Corrêa, um mais
duro, o outro mais técnico. Técnico,... tá bom...
A desconfiança do
Corrêa só aumentou no dia da estreia do novo reforço. No
vestiário, na hora de fardarem o Corrêa viu que o tal Luís Paulo
depilava o peito. Putz! Aquilo não. Aí já era demais. Tinha
certeza que ia dar merda.
Entraram em campo. O
tal Luís Paulo era saudado pela torcida, imprensa, comissão técnica
e por quem que fosse como om grande zagueiro do momento. Uma prova de
que o futebol tinha salvação, de que nem só de chutões e faltas
vivia um defensor.
Até que as coisas iam
bem. De certa forma, mesmo com a implicância do Corrêa, parecia que
os dois se completavam mesmo, metade técnica, metade força, se bem
que não haviam sido muito exigidos naquele jogo até então. Grande
superioridade, time no ataque praticamente o tempo todo, dava até
por garoto com nome de cabeleireiro se exibir um pouco subindo pro
ataque ou ligando os meias com um passe de efeito, mas o problema é
que o jogo não saía daquele incômodo zero a zero.
A teoria toda do
zagueiro clássico ia bem até que lá pela metade do segundo tempo,
ali pela intermediária, o tal do Luís Paulo recebeu a bola meio
enforcada mas mesmo assim tentou se livrar do atacante com uma ginga
de corpo pra sair jogando. Pressionado pelo centroavante cascudo,
velho de guerra, se enrolou todo, se estatelou no chão e o goleador
dos caras saiu com ela dominada praticamente sozinho em direção ao
gol. O Corrêa que já estava prevendo que uma hora aquela palhaçada
ia dar errado estava extremamente atento e por isso não muito longe
da jogada. O atacante avançava veloz vertical em direção ao gol
enquanto o Corrêa fazia uma diagonal desesperada atalhando o
caminho. Percebendo a aproximação do zagueiro que corria em sua
direção como um guepardo faminto em perseguição a uma gazela, o
atacante tentou precipitar o chute ainda antes da entrada da área,
mas assim que o avante adversário armara o tiro, o Corrêa com um
impulso de mais ou menos uns três metros, voou com os dois pés em
direção ao centroavante, levantando tudo que encontrara pela
frente. Só o que se viu foi o atacante se contorcendo de dor e um
buraco do tufo de grama levantado no gramado.
O Corrêa nem esperou o
cartão que tinha certeza que tomaria e já sabia a cor. Levantou e
foi caminhando em direção ao vestiário. Às suas costas uma
pequena confusão se formava, jogadores se empurravam, juiz exibia o
cartão vermelho e o departamento médico atendia o atacante que não
voltaria para o jogo naquele dia e provavelmente aos gramados por
alguns meses.
Antes de descer para o
vestiário lançou um olhar fuirioso para o técnico e disse;
- Ó o teu zagueirinho
aí. Ele que não acostume que eu não vou salvar a pele dele sempre.
E desceu.
O sacrifício do Corrêa
naquele jogo não adiantou muito. A falta na frente da área, ali
pela meia esquerda, foi batida com maestria pelo lateral-direito do
time adversário. No ângulo. Indefensável.
Cly Reis
Nenhum comentário:
Postar um comentário