Ao fim da longa explanação de Mr. Line, não restava a menor dúvida de que, realmente, entre as doze pessoas sentadas naquela sala, Mr. Heathrow era quem havia assassinado Lady Angie Collinsworth, dois dias antes.
Mr. Line, no entanto continuava, vaidosamente, em sua exposição valorizando detalhes e salientando pormenores, como sempre fazia nos casos que desvendava, quando foi educadamente interrompido pelo mordomo Adam.
- Mr. Line, se me permite...
- Um momento, Adam. Acredito que nenhum dos presentes queira um chá neste momento - disse Mr. Line em tom de gracejo.
Para sua surpresa, Mrs. Bridgewood manifestou-se positivamente à ideia.
- Eu aceitaria um, Adam.
- Terei prazer em trazer, Mrs. Bridgewood, mas antes creio que seja necessária minha intervenção antes que uma injustiça seja cometida.
- Do que está falando, Adam? perguntou impaciente, Lorde Stevenson, erguendo-se do braço da poltrona onde repousava sua esposa.
- Devo revelar-lhes que Mr. Heatrhow não matou Lady Collinsworth.
- Isso é um absurdo, Adam - interveio Mr. Line indignado - Eu reuni todas as evidências e ...
- Perdoe-me contrariá-lo e desculpe se traí seu aguçado e renomado instinto criminal, mas devo confessar-lhes que eu matei Lady Collinsworth.
A estupefação foi geral. Os hóspedes olhavam-se boquiabertos sem saber o que dizer. Mas foi o próprio Adam, o mordomo, que tratou de desfazer o silêncio, agora um tanto cabisbaixo:
- Aquela noite, quando subi, como de hábito para levar o chá... e... da porta pude ouvir as juras de amor dela e de Mr. Wright ... seus planos... Meu Deus! Não pude suportar. Mesmo sabendo da impossibilidade de meu amor, não podia aceitar que ela o afastasse de mim.
- Como disse? - pareceu não compreender um dos convidados.
- Oh, Aidan, eu não podia aceitar, mesmo que você não me ame, ficar longe de você. Quando milady falou em ir para a Índia, Austrália, para as colônias do reino, eu não suportei - completou o mordomo agora já chorando.
- Controle-se, Adam - retorquiu Aidan Wright um tanto confuso - O que vão pensar?
- Sei que uma única vez não me dá o direito...
- Cale-se, Adam - explodiu Aidan interrompendo abruptamente a frase do serviçal.
- Desculpe-me. Me excedi, por certo - disse enxugando as lágrimas e tentando refazer-se.
Mr. Line, que até então observava incrédulo ao relato do mordomo, voltou então a se manifestar:
- Mas, Adam, como explicar então o veneno, a entrada de Mr. Heathrow no quarto, as testemunhas, o testamento, a herança?
- Oh, sim. Deixe que explique - disse já recomposto emocionalmente - Depois de ouvir a conversa dos dois, retornei à cozinha e acrescentei uma antiga solução que meu pai, também mordomo me ensinara há muito tempo atrás. Como ela parece retardar a hora da morte da vítima, talvez isso o tenha confundido, e aos legistas, quanto à hora que Mr. Heathrow entrara no quarto com o copo d'água.
Prosseguiu ainda:
- Não posso negar que depois de consumar o ato, me veio à mente o fato de Mr. Heathrow ser beneficiário do testamento, e aquilo me deu uma certa tranquilidade. Imaginei que as suspeitas recaíssem sobre ele - fez uma pausa - Mas não posso permitir que outra pessoa, sobremaneira um homem tão respeitável quanto Mr. Heathrow, seja incriminado por minha causa. Além do mais, queria que todos, principalmente Mr. Wright soubessem a verdade e a real razão que levou a este fato... lamentável.
Um novo silêncio tomou conta da sala, desta vez quebrado por Mr. Henry Scholes que mantivera-se quieto, atento até então:
- Bem, acho que o caso está resolvido.
Afirmação que foi rebatida com um olhar furioso pelo perspicaz, porém fracassado neste caso, Mr. Line.
- Creio que deva arrumar minhas coisas. A polícia já deve estar chegando. Afinal, o chamado não será de todo desperdiçado - troçou em tom jocoso o mordomo.
Ia saindo mas ainda voltou-se para o salão, dirigindo-se a Mrs. Bridgewood.
- Trarei seu chá, Mrs. Bridgewood.
- Pensando melhor, talvez não seja uma boa ideia, Adam - replicou a senhora.
- Como preferir, madame. Com sua licença - retirando-se com uma mesura.
A polícia local não tardou a chegar. Adam despediu-se de todos polidamente apenas com breves acenos de cabeça, entrou sem qualquer resistência na viatura, sentou-se no banco de trás algemado entre dois agentes. Observado por todos da escadaria da entrada, o Ford preto contornou o chafariz, seguiu o caminho reto que levava ao portão e mal cruzando o limite da propriedade, desapareceu na tradicional bruma de Glendale Hill.
Cly Reis
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