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terça-feira, 6 de janeiro de 2015

"Contos de Amor e Crime: Um Romance Violento", de Afobório - 2014 (ed. Os Dez Melhores)



"Eu estava na fila, junto com os outros.
Enquanto isso, as baratas formavam outra fileira, lá embaixo.
E me sentia encurralado por elas, pelos guardas, pelas muralhas
e pela comida com gosto de terra e ferrugem que davam pra gente (...)
Aliás naquele instante, eu invejava as baratas por três motivos:
primeiro, elas estavam livres,
mesmo que em fila;
segundo; elas deviam gostar daquela gororoba;
e terceiro, eu percebia que, quem ia se foder
com essa coisa de mais segurança e mais disciplina era a gente.
As baratas estavam numa situação muito melhor que a nossa."
trecho de "Contos de Amor e Crime"



Desde o primeiro momento quando firmamos uma parceria com a editora Os Dez Melhores fiz questão de salientar para o editor-chefe, o Afobório, que sempre que resenhasse ou comentasse as publicações lançadas por eles, o faria de maneira totalmente isenta, independente e imparcial sem preocupações de conveniência para a parceria, com o que ele concordou plenamente. Assim, fico muito à vontade para elogiar o bom livro “Contos de Amor e Crime: Um Romance Violento”, do próprio Afobório, porque ele bem sabe que se não tivesse gostado, sem dúvida, manifestaria.
“Contos de Amor e Crime” é uma pedrada, um banho (escaldante) de realidade. Dinâmico, objetivo, muito bem conduzido e estruturado, o romance de capítulos curtos e amarrados de forma engenhosa, por Afobório, narra o caminho tortuoso e violento de um jovem negro e pobre, que na favela, às voltas com o meio, com as companhias, as necessidades, com a violência, com contexto todo, enfim, quase naturalmente cai na trilha do crime. Afobório faz com que os relatos do jovem Jozz soem extremamente reais, contundentes e impactantes, quase que esbofeteando o leitor, tamanha o choque de realidade que impõe. A prostituição da mãe, o padrasto violento, o tráfico no morro, o amor, a ascensão no tráfico, a prisão, a vida desumana na cadeia, a dura sobrevivência, a expectativa de ver o mundo de novo, tudo isso é conduzido com pulso, firmeza, mas com uma fluência quase poética pelo autor.
Como observaçãos, acho apenas que a narração em primeira pessoa e o envolvimento tamanho do autor com o tema, com as injustiças, com o preconceito, com a desigualdade social, etc., o traem em determinados momentos fazendo-o cair num discurso panfletário, quase de palanque, quando na verdade a própria história, por si só, já se encarrega bem o suficiente de dar o recado. Mas nada tire o brilho do livro. Nem poderia. “Contos de Amor e Crime” é cheio de qualidade e lhe sobram virtudes e méritos.
Um romance envolvente até pela sua constituição como um conjunto de pequenos contos que se completam. Personagens que não nos deixam ficar indiferentes. Frases curtas, objetivas, certeiras e diretas como balas. Uma leitura fácil pela acessibilidade mas difícil pelo tema e pela proposta. Assim é “Contos de Amor e Crime”. Seu subtítulo não poderia ser mais adequado: é um romance violento e a partir do momento que você começa a ler, está no meio de um tiroteio, só que as balas de Afobório são violência, sexo, drogas,injustiça, ética, miséria, racismo... E, amigo, se você não sair atingido por pelo menos uma dessas balas, ah,... você não deve ter sangue nas veias.




Cly Reis

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