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terça-feira, 25 de agosto de 2015

"Adeus à Linguagem", de Jean-Luc Godard (2015)



"Aqueles que não têm imaginação
buscam refúgio na realidade."
frase que aparece na tela
no início do filme



Um dos poucos diretores que me fazem correr para o cinema para assistir a seus filmes é Jean-Luc Godard, talvez por ser um dos últimos vivo de uma turma que mudou o cinema. Fellini já foi, Truffaut já foi, Hitchcock já foi, Kubrick foi, Pasolini, Bergman, Tarkovski, Glauber... Quem está aí? Scorsese, Copolla, Saura, Allen, Wenders...talvez Trier, mais atualmente. Mas Godard é um daqueles poucos que se confunde com a história do cinema, uma dos que criaram uma escola, um dos que estabeleceram uma nova linguagem. E é a propósito de linguagem que trata seu novo filme, aliás, é, em tese, uma despedida dela. "Adeus à  Linguagem" é, como vem sendo seu cinema nos últimos anos, muito mais um exercício anaítico, estilistico, filosófico e visual do que um filme convencional com trama, cronologia, personagens, cenários, etc.
A natureza, um dos elementos investigados por
Godard em seu ensaio cinematográfico
tem belíssimas imagens proporcionadas pelo 3D
Exatamente por se fixar na LINGUAGEM, Godard explora e extrapola todas as suas possibilidades, não importando-se, mesmo, de causar desconforto no espectador com imagens desfocadas, ruídos, cortes abruptos, diálogos incompletos e incoerentes, entendendo que tais recursos por si só já fazem parte de uma indução de sentidos e portanto ao ser apresentada e interpretada, já passa a ser linguagem. Godard examina  LINGUAGEM de forma absolutamente ampla, destrincha a palavra e todos seus significados para, no fim das contas mostrar o quão deficiente está a comunicação das pessoas, as relações humanas. Examina a linguagem do corpo, da filosofia, da cor, da sensação, da estranheza, da natureza, das relações humanas, do silêncio e tanto lhe interessa a amplitude do tema que, mesmo a breve trama centrando-se em um casal que discute a relação àquela moda francesa t´pica da nouvelle vague, o personagem principal, se é que podemos chamar assim, a aprtir de certo momento passa a ser um cachorro, que de certa forma simboliza a pureza da linguagem, a perfeita comunicação através da não-comunicação.
Roxy, o cão do próprio Godard,
é, de certa forma,
o protagonista do filme.
Se já corro para ver um Godard no cinema normalmente, este em 3D, me fez ir mais rápido ainda ao cinema, uma vez que produções alternativas assim não duram muito em grandes salas com qualidade e tecnologia para exibição deste recurso, até porque os donos do negócio estão mais é interessados em tirar logo o chato do filme europeu que vai ser visto por meia dúzia de gatos pingados pra lotar a casa com algum Vingadores ou Senhor dos Aneis da vida. Na verdade, perdi a paciência com o 3D rapidamente. Vi duas ou três coisas, uma só que valera a pena, e de resto pareceu-me que não compensava visualmente para a dor de cabeça a incômodo que me causava a utilização daqueles óculos. Mas, enfim, tinha curiosidade para ver como um cineasta bom, com ideias, viesse a utilizar o recurso.
Os tradicionais letreiros do diretor,
lançados na tela, também servem-se 
produtivamente do 3D.
Sim, já tinha visto o Hugo Cabret do Scorsese mas devo admitir que me decepcionei um pouco. Todo mundo ficou muito fascinado e tudo mais, mas para mim pareceu meramente um grande carnaval estético com uma pitada poética cinematográfica que não foi suficiente para torná-lo um bom filme, mas isso já é outra história. Quanto a Godard, acho que utilizou a LINGUAGEM 3D muito bem no que se propunha e o resultado, para quem já cansou de ver só explosões saltando da tela, é interessante e válido. Desfoca o 3D, o duplica de forma genial, ironiza o próprio título utilizando um  "Ah", num plano avançado e um "Dieux" ao fundo naqueles seus tradicionais letreiros na tela, salienta um móvel, uma mão, um elemento qualquer saltando da tela, brinca com as palavras, com a comunicação, com o visual, com a linguagem. O que posso dizer é que a tecnologia colaborou com a LINGUAGEM do diretor que tem sua identidade tão consolidada e sua linha de discussão já tão estabelecida, que mesmo que quisesse dar adeus a ela, não conseguiria. Bem-vindo à nova linguagem, Godard.




Cly Reis

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