"Jimi: Tudo e Meu Favor" não é uma cinebiografia tradicional, daquelas que acompanham uma vida inteira, do nascimento ou infância à glória, à perdição, à decadência ou à morte. O projeto do cineasta John Ridley concentra-se basicamente no período entre a descoberta do talento do guitarrista, num esfumaçado bar em Nova Iorque, e a gravação do primeiro disco com seus reflexos e consequências imediatas. Além de fixar-se num espaço de tempo relativamente curto, o filme desenvolve-se de uma maneira pouco convencional para o gênero, intercalando, por vezes uma linguagem quase videoclípica, de imagens rápidas, cores alucinantes e sons em profusão; com cenas longas de diálogos pausados ou às vezes até silêncios duradouros.
Jimi Hendrix, vivido espetacularmente por Andre Benjamin, mais conhecido com Andre 3000 do grupo Outkast, mostra-se introspectivo e reflexivo sobre sua obra, sua origem e sobre seus relacionamentos em sua vida em meio à polvorosa cultural de Londres na metade dos anos 60. A proposta meio filme de arte, num modelo de biografia mais contemplativa dividiu opiniões mas, particularmente, me agradou, tanto estética quanto tematicamente sendo tão válida quanto outras mais badaladas, focando-se contudo em elementos e aspectos pessoais e psicológicos, muitas vezes não levados em consideração ou não devidamente destacados em outras produções.
Como curiosidade, o filme de John Ridley, roteirista do premiado "12 Anos de Escravidão", não pode contar, por uma questão de direitos, com as músicas de Jimi Hendrix e sua banda, lidando bem com a situação com uma trilha recheada de outros nomes relevantes da época e tratando momentos em que as canções de Hendrix deveriam aparecer, como ensaios ou shows, de maneira muito inteligente com soluções bastante satisfatórias. Um desses momentos é quando Jimi e sua Experience executam "Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band", poucos dias depois do disco dos Beatles ter sido lançado, na presença dos próprios Paul, Ringo, George e John, no Saville Theatre, constituindo-se em um dos pontos altos do filme em uma situação de show em que o espectador (assim como o público na época) esperaria ansioso por ver e ouvir Jimi Hendrix executando algum de seus grandes clássicos. Jogada de mestre! Uma circunstância avessa, contrária, mas que o diretor com muita perspicácia soube colocar a seu favor.
A cena da apresentação no Saville Theatre diante dos Beatles. |
Cly Reis
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