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quinta-feira, 11 de outubro de 2018

"Uma Noite de Crime: Anarquia", de James DeMonaco (2014)



“Deus abençoe
os Pais Fundadores
e a América:
 uma nação renascida“
lema do governo em
"Uma Noite de Crime: Anarquia"



"Uma Noite de Crime: Anarquia" seria apenas mais um filme de ação, de terror, de correria, de perseguição não fosse por seu argumento sagaz e extremamente pertinente. Quando assisti pela primeira vez, sem maiores expectativas, há pouco mais de um ano, o filme do diretor James DeMonaco me chamou atenção pela verossimilhança com condutas que se afiguravam e ganhavam corpo, não somente nos Estados Unidos que não muito adiante dali elegeria Donald Trump, como no mundo afora e especialmente no Brasil, até então ainda timidamente depois das manifestações populares de 2013 e diante do, então, aceno de candidatura de um presidenciável radical de direita. Se naquele momento, "...Anarquia" parecia uma inteligente alegoria sobre um totalitarismo conservador, racista e classista, na atual situação brasileira, em vias de eleger um representante com ideias muito próximas às do governo fictício do filme, parece uma realidade não muito improvável.
Num futuro não muito distante, diante de problemas sociais e violência urbana crescentes, um hipotético partido conservador, os Novos Pais Fundadores, tendo assumido o governo dos Estados Unidos, institui a Noite do Expurgo, um período de doze horas em que os cidadãos americanos têm o direito de extravasar toda a violência que bem entenderem em troca de se comprometerem a, no restante do ano manterem uma... "conduta exemplar". Só que o que acontece é que na prática quem acaba "aproveitando" mesmo o tal Expurgo são os "cidadãos de bem" que, com mais grana, com mais estrutura, utilizam a concessão governamental para "limpar" as cidades americanas dos indesejáveis: opositores, negros, pobres, mulheres. Nesse cenário de pânico um casal encurralado por expurgadores, uma mãe com sua filha adolescente e um justiceiro do bem que ronda as ruas livrando inocentes do massacre, têm que driblar os exterminadores de minorias e dar um jeito de se safar deles da maneira como conseguirem, numa caçada humana frenética.
Ricos pagam para que se capturem vítimas,
negros, pobres, mendigos, para sua diversão.
"Uma Noite de Crime - Anarquia" não é um grande filme. Escorrega em clichês, tem diálogos pobres, situações risíveis e cenas previsíveis. Diria que a intenção foi melhor do que a ação. Mas  a gente assiste a cada coisa desse tipo com menos conteúdo e sai enchendo a boca com "Que filmaço!", não? "... Anarquia" tem pelo menos o mérito de, entre tanto tiro, porrada e bomba, sugerir uma válida reflexão.
Sequência do fraco "Uma Noite de Crime" de 2013, que partia da mesma premissa mas se limitava ao ambiente da casa de um político que sem querer abrigara um negro alvo dos expurgadores, e tendo dado origem a mais duas sequências, este segundo tem o grande mérito de sair para a rua e estender definitivamente a questão a um nível social cutucando em temas como racismo, machismo, privilégios, legalização de armas, ódio de classes, fascismo, todos tópicos com os quais devemos nos preocupar, e muito, diante do possível novo governo que parece tomar forma.
Que o novo presidente não vai implementar um expurgo no Brasil, é claro que não vai, mas seu discurso de ódio e preconceito, de certa forma, avaliza que seus seguidores, e muitos deles diga-se de passagem são bastante radicais, corroborando com os alvos das declarações de seu representante máximo, façam pelas próprias mãos as "limpezas" que entenderem "necessárias". Ameaças como as de "Vocês viados vão ser todos metralhados quando ele for presidente", proferida a um rapaz agredido no Rio de Janeiro, "Sapata tem tudo que morrer", escrita na parede de um banheiro numa universidade em São Paulo, e "Morte à negrada", impressa em cartazes em Porto Alegre e outros tantos que tem surgido pelo Brasil afora, especialmente nos últimos meses, dão um indicativo de que o massacre autorizado do filme, não é tão absurdo assim. “Deus abençoe os Pais Fundadores e a América: uma nação renascida“...



Cly Reis

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