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segunda-feira, 23 de outubro de 2023

cotidianas #811 - Claudine

 



Ai, a Claudine andando!

A via nos corredores do colégio e ficava admirando aquele jeito dela andar. A Claudine se movia de uma maneira única, ímpar,  singular.

Ela não caminhava, ela flutuava, pairava, deslizava. Parecia andar nas pontas dos pés, pisar com cuidado para não ferir o chão. Um andar ao mesmo tempo determinado e sensual. Lânguida como uma garça e determinada como uma tigresa. Aquele cabelo avermelhado vivido como uma crina de fogo de um cavalo de raça, daqueles de trote elegante e seguro.

Pensava comigo mesmo que, se um dia tivesse a Claudine para mim, não lhe pediria mais nada - carícias, sexo, prazeres vulgares - só  pediria que andasse para mim. "Anda, Claudine, anda".

Seria mais como um bichinho de estimação do wue uma mulher. Um hamster naquele extraordinário corpo feminino.

Eu sonhava com a Claudine... Sonhava que um dia estaríamos em nossa casa e eu a conduziria a uma dependência qualquer de nosso lar, cobrindo-lhe os olhos com as mãos e, chegando a esta sala, descortinaria-lhe a surpresa à sua frente, para a qual ela sorriria com entusiasmo e me agradeceria dependurando-se em meu pescoço e tascando-me um beijo. Perto da janela, com ampla vista para a cidade inteira, na nossa cobertura, iluminada pela luz diáfana da manhã, estaria posicionada uma vistosa e reluzente esteira, moderníssima de última geração. "Anda, Claudine, anda", eu diria para ela.

Ela, com um brilho de alegria nos olhos, subiria, ligaria o aparelho que lentamente entrava em funcionamento e ela era então obrigada a sincronizar seu movimento com o da máquina. E eis que ela estava caminhando. Só para mim.

Ela então lembraria, como que num susto, "Ih, tenho que buscar as crianças na escola."

Ao que eu a acalmaria, "Não se preocupa, Claudine, só caminha, só caminha."

Ela então falava alguma coisa... mas eu não ouvia.

...

Sua voz saía muda.

O que ela tentava me dizer?

...

De repente eu entendia:

"Oi, você que é  o Carlos?"

Ahn?

Acordo de meu delírio e me deparo com alguém tocando meu ombro.

"Oi, desculpa incomodar. Tudo bem? Me falaram que você é bom de física... eu queria saber se você me daria uma ajuda...?"

Hesitei, gaguejei, meio abestalhado fiquei olhando para ela por um instante...

"Meu nome é Claudine, eu sou da outra turma. A gente nunca se falou...", explicou ela um tanto constrangida. "É essa parte aqui...", mostrou o conteúdo de física, sacando o caderno. "Se você puder me ajudar...", sugeriu de forma graciosamente suplicante, esperando meu parecer.

"Claro, claro", respondi quase automaticamente.

"Então tá. Obrigada. Tenho que ir agora que a professora já tá entrando. A gente combina depois. Valeu mesmo". E saiu, desta vez, numa corridinha desajeitada, para sua sala de aula.

Eu também tinha que me apressar antes que o professor me barrasse a entrada. Peguei a mochila, botei nas costas, suspirei fundo e segui em direção à sala de aula. Eu flanava pelo corredor.



Cly Reis 

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