Terminou no último dia 19 a série de recitais para piano e violino que o maestro e compositor norte-americano Philip Glass fez no Brasil neste mês de setembro nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Porto Alegre. Na companhia de minha mãe – que até pouco tempo não o conhecia, mas é uma boa curiosa –, pude conferir a apresentação carioca, em pleno Teatro Municipal. Um luxo e um prazer a todos que puderam admirar um pouco da vasta e incomparável obra deste que é um dos maiores gênios vivos da música moderna, uma alma revolucionária e transformadora.
O fato de se restringir a apenas dois instrumentos não tirou a graça em nenhum momento da apresentação. Muito pelo contrário. Acostumado a compor para grandes orquestras ou mesmo conjuntos de câmara, Glass, inventivo compositor e exímio pianista, é também autor de magníficas obras solo, e foi este o recheio do que pôde ser apreciado pelo público. Estavam lá, só em piano e/ou violino, suas marcas: os acordes repetidos, as estruturas minimalistas, as melodias circulares, as variações tonais escritas com perfeição. A música de Glass flerta com o rock, com a música eletrônica, com a simplicidade saudável do pop, mas sempre com o pé firme no clássico. Ou seja: uma música completa para os nossos tempos. Para que outros instrumentos, né?
Com repertório todo de sua autoria, ele e o violinista norte-americano Tim Fain presentearam, em pouco mais de uma hora e meia, a numerosa plateia com dez números, começando pela inédita e “Três Estudos para Piano”, cujo primeiro movimento é simplesmente espetacular. Seguiu-se a longa e variante “Partita para violino solo”, escrita por Glass especialmente para as mãos hábeis e de pura sensibilidade de Fain. Depois do intervalo, vieram “Metamorphosis”, para piano, e a brilhante “Music from The Screens”, para piano e violino. A primeira parte, “The Orchard”, toda em contraponto, remete direto às fugas de Bach, porém com cores que modernizam o barroco. “France” e “The French Lieutenant” completaram esta que foi das mais aplaudidas da noite.
Glass e seu piano magistral |
Show terminado, minutos de aplausos. Mas viria mais. No bis, Glass anunciou em português (aliás, como fizera sempre que falava ao microfone, lendo ou não) duas de suas obras-primas: “Opening/Closing”, da célebre série das “Glassworks”, gravadas por ele em 1981. Fui com grande expectativa para que tocasse essa. E ele tocou. Uma peça onde lirismo romântico e modernismo estão incrivelmente bem casados. Depois desta, podia até ir embora que já me dava por satisfeito. Mas aí Fain sacou seu violino e mandou ver a hipnótica e cáustica “Knee 4”, da “ópera-punk” "Einstein on the Beach" um dos ÁLBUNS FUNDAMENTAIS deste blog. Mesmo sem as vozes do coral, e tocando apenas uma parte da original, o violinista finalizou o recital em alto estilo com esta peça de difícil execução e requerente de muita técnica e velocidade.
Agora não precisava mais nada. Piano, violino e a magistral música de Philip Glass, além da beleza redentora do Municipal e a calorosa companhia de minha mãe. Noite de gala.
por Daniel Rodrigues
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