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quinta-feira, 19 de outubro de 2017

"Mãe!", de Darren Aronofsky (2017)



Não vou dar spoilers. Juro! Mas preciso falar sobre “Mãe!”, novo filme de Darren Aronofsky. Se você viu o trailer deve imaginar um filme de terror, certo? Ele, de certa forma, é e não é. Uma montanha russa que te choca seria uma descrição mais apropriada. Porque você não vai ficar indiferente a ele. Pode não gostar. Pode até se irritar ou se ofender, mas indiferente você não vai ficar.

Tudo é uma grande alegoria. Não apenas um tópico da história. Toda ela! É a perspectiva de Aronofsky sobre toda a tradição judaico-cristã. Há o Éden. Há o sexto dia da Criação. Há Caim e Abel. Há uma viagem por toda a Bíblia, do antigo ao novo testamento, mas é, sem sombra de dúvida, a visão de um judeu secular sobre as narrativas canônicas.

Para Aronofsky, Deus é um criador narcisista e um péssimo governante. Há muito espaço para críticas a forma como nós, humanos, lidamos com a vida. Porém, ainda que a criação não seja nada digna de louvores, isso não diminui quem o Criador é - o que pode ser um interessante paralelo para pensarmos sobre o debate público sobre arte e o que ela representa.

Isso segue muito a lógica judaica, retratada com excelência na série “Decálogo”, do diretor polonês Krzysztof Kieslowski - que é uma grande leitura aplicada das mitzovt, ou os Dez Mandamentos -, no episódio sobre não tomar o nome de Deus em vão: tome cuidado ao pedir que Deus participe da suas decisões, você pode não gostar dos resultados. Afinal, ele é Deus, você não. Isso basta!

Jennifer Lawrence e Javier Barden no polêmico filme de Aronofsky
É a grande diferença da perspectiva judaica para a cristã. Enquanto a segunda, através da história, se esforçou para construir narrativas teológicas que justificassem o mundo e suas incongruências de uma forma palatável - ainda que profunda e belíssima, diga-se de passagem, tendo sempre o amor como centro -; a primeira aceita as incongruências como parte de algo muito superior - há vertentes do cristianismo que dialogam com isso; o jensenismo, no catolicismo, e o calvinismo, no protestantismo, são exemplos disso.

O filme retrata e fala muito sobre a perspectiva de Aronofsky sobre a cosmovisão judaica. Incomoda e muito, como disse antes. Não apenas por filmar algo que sacode nossa posição religiosa, mas principalmente por nos situar como participantes ativos no caminho de destruição que o mundo parece seguir.

O Deus de Aronofsky é judeu e não cristão. E se você está familiarizado com o antigo testamento sabe bem como Ele lida com as coisas quando elas não saem como o esperado. É uma bela experiência para mostrar que ainda que irmãs, as tradições canônicas NÃO são a mesma coisa!

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Trailer de "Mãe!"



por Eduardo Dorneles

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