A solidão é tema de dois dos filmes que concorrem ao Oscar e que tem um jeitinho diferente de ser. O primeiro é "Ela", do Spike Jonze, que fez, entre outras coisas, "Quero Ser John Malkovich" (1999) e "Adaptação" (2002). Joaquin Phoenix (maravilhoso como sempre) é Theodore, um escritor de cartas no futuro que instala um novo Sistema Operacional em seu computador que tem a voz de Samantha (Scarlet Johanssen, incrível). Com o passar do tempo, Theodore, que tenta se recuperar de uma separação, acaba se apaixonando pela voz e pela "personalidade" deste SO autodenominado Samantha. Tudo isso filmado em Xangai e Los Angeles, duas das cidades mais poluídas e desumanas do planeta. Aliás, é isso que Jonze – autor do roteiro – quer mostrar: a substituição das relações pessoais pela tecnologia. Ao sair do filme, sentei num café e fiquei olhando as pessoas ao redor e quase ninguém conversava. Mas todo mundo teclava. Interessantes são os personagens Amy (Amy Adams arrasando de novo!) e Charles (Matt Letscher). Eles são os únicos amigos de Theodore, mas, quando se separam, Charles vira monge budista (uma referência explícita aos amigos de Jonze, os Beastie Boys, cujo integrante falecido, Adam Yauch, também praticava o budismo).
O caso de amor entre Theodore e Samantha tem todos os ingredientes de
um affair "normal". Ou
seja, paixão, sexo e ciúme. Até que Samantha descobre que pode
"falar" com várias pessoas ao mesmo tempo e, até mesmo, se apaixonar
por elas. Não conto mais para não estragar a surpresa, mas Jonze demonstra que
ainda tem fé no ser humano.
O segundo filme que lida com a solidão de uma maneira absolutamente
diferente é "Nebraska",
mas um grande filme de Alexander Payne, diretor de "Eleição" (1999),
"As Confissões de Schmidt" (2002) e, especialmente, "Sideways -
Entre Umas e Outras" (2004). Um típico road-movie,
o filme conta a busca de Woody Grant (Bruce Dern, coroando uma carreira
errática, porém com mais altos que baixos) por um milhão de dólares que está
convencido que ganhou. Tanto incomoda a mulher Kate (June Squibb, impagável) e
o filho David (Will Forte, demonstrando não ser apenas comediante do programa
"Saturday Night Live"), que este resolve atravessar dois estados com
o pai para buscar o prêmio em Lincoln, Nebraska. A partir daí, Payne vai
criando um mundo que ficou parado no tempo. Woody e David vão parar em
Hawthorne, cidade natal do idoso. É claro que todo mundo fica sabendo do prêmio
e desperta a cobiça de quase toda a população.
A decisão de Payne por filmar em P&B reforça a sensação de vazio e
de abandono. Aqui sim temos "50 Tons de Cinza"! A jornada vai se
desenvolvendo, mas a solidão e a alienação de Woody em relação ao mundo
exterior vão piorando. E também se instala a comunicação entre pai e filho,
sempre complicada pelo alcoolismo de Woody. Aquelas paisagens áridas se
transformam numa metáfora das relações entre os personagens. A solidão e o
desespero das pessoas estão na ganância e na inveja dos "amigos" que
Woody deixou em Hawthorne. Um belo e melancólico filme.
por Paulo Moreira