Muita paciência com esse filme. Claro, se você apenas olhá-lo como filme por si só, vai se decepcionar. Mas se
olhar com uma visão mais ampla sobre a carreira de Clint Eastwood, tudo que a figura
dele como ator representou, e o que ele quer desmistificar agora, aí está o
real valor do filme.
"Cry Macho" em si não consegue apresentar uma história, que nos
prenda. A maioria dos personagens não tem carisma, ali pelo meio o longa fica
extremamente parado, se arrasta, e isso tudo sem falar nas diversas cenas que são
resolvidas com conveniências bem forçadas.
A grande chamada para você ir
olhar o filme é, de certa forma, uma ligação com os westerns em geral ou a
filmografia de Clint (focada na fase dele como ator). Aí sim, toda a
desconstrução do personagem, que resolvia tudo no braço, para quem as mulheres eram
apenas conquistas, agora tem que resolver tudo no diálogo, se falta força, resta experiência, o respeito com as mulheres, auxiliando até nos afazeres
domésticos. Que mudança!
Essa proposta de abordar uma figura que é extremamente
importante para os filmes de faroeste de uma maneira diferente, dialoga
com os dias atuais e tenta mostrar que o cowboy pode vencer tudo na força, menos
o tempo. Junto a isso, a ressignificação da figura do “macho”, são elementos que fazem o longa ter
algo para mostrar, e talvez até marcar na carreira de Clint, embora seja inegável que poderia ser
muito melhor conduzido.
Todo mundo tem mãe e, como não podia deixar de ser, no cinema, todo personagem tem mãe. Muitas vezes elas não são mencionadas, não aparecem, são secundárias, não tem sequer relação com a história, mas sabemos que elas existem. Contudo, em outros casos, elas são tão essenciais ou têm participação tão destacada na trama que é impossível não lembrar delas. o ClyBlog destaca algumas dessas mães aqui. Sei que cometeremos injustiças, vai faltar uma que outra, alguém vai dizer que essa ou aquela não podia faltar, mas procuramos fazer uma lista interessante e heterogênea em características, estilos, época, nacionalidade, ambiente, gênero cinematográfico, etc.
Então, vamos à lista:
*(Cuidado! Pode conter spoilers)
************
Ela, inatingível, pairando sobre tudo.
1. "O Espelho", de Andrey Tarkovski (1975) - Para
mim, desde que vi pela primeira vez, "O Espelho", filme semiautobiográfico
do diretor russo Andrei Tarkovski, representa uma obra sobre mães. No filme
Maria (Margarita Terekova), uma mãe abandonada pelo marido, voluntário para o exército, vive com
seus dois filhos em uma propriedade campestre e ali acompanhamos parte do
cotidiano desse núcleo familiar corajosamente conduzido por uma mulher. Filme
cheio de simbologias e metáforas, embora traga elementos como infância,
saudade, nostalgia e seja passível de diversas interpretações, para mim, é a
maternidade o elemento que mais chama atenção e emociona. O olhar e as imagens
sempre poéticas de Tarkovski mostram aquela mulher como uma espécie de entidade
superior, uma criatura inabalável, altiva, incólume, impenetrável, mesmo com o
mundo desabando à sua volta. A cena de sonho em que ela flutua, elevada da
cama, confere a ela ares de divindade, de magia, de alguém com um poder
inexplicável que talvez até ela mesmo desconheça. E, na maioria das vezes, não
é bem assim que são nossas mães?
2. "Psicose", de Alfred Hitchcock (1960) - Esse é o caso de uma mãe que
é fundamental para a trama mas, na verdade, não está presente fisicamente
o tempo inteiro durante o filme. Hitchcock, genial como era, até nos deixa com
a pulga atrás da orelha num primeiro momento, sugerindo alguma farsa ou
assombração, uma vez que nos tornando conhecedores do fato que a mãe do dono do
motel, Norman Bates, está morta, faz aparecer um vulto feminino na janela da
casa, nos deixa ouvir uma bronca de voz feminina envelhecida no filho Norman e,
por fim mostra-nos uma senhora de cabelos brancos e coque esfaqueando a cliente
loura no chuveiro, numa das cenas mais clássicas do cinema. "Como
assim?", pergunta-se o espectador de primeira viagem. Acho que não
vou dar *spoiler porque a essas alturas, mesmo quem não viu, está
cansado de saber que é o próprio Norman que, perturbado e esquizofrênico assume
o papel da mãe, vestindo-se como ela e punindo quem quer que seja que venha a
despertar algum tipo de desejo no reprimido Norman.
É incrível mas uma das mães mais célebres do cinema, não está
verdadeiramente no filme. Loucura!
"Psicose" e sua famosa cena do chuveiro.
3. "O Bebê de Rosemary", de Roman Polanski (1968) - Rosemary (Mia Farrow) é uma
futura mãe que pressente uma ameaça ao filho que ainda está em sua
barriga, vinda de seus vizinhos, um casal de velhotes estranhos e enxeridos e,
por incrível que pareça, de seu próprio marido. Tudo começa quando se mudam
para o novo apartamento, conhecem os vizinhos e não muito tempo depois, o
esposo, um ator pouco valorizado, ganha um papel importante em um filme em
virtude da morte do ator que interpretaria o papel. O marido passa agir
estranhamente, os velhos passam a estar constante e inconscientemente presentes
em sua casa e sua vida e até mesmo administram à grávida uma estranha dieta à
base de algumas ervas de origem e efeitos duvidosos. Aos poucos Rosemary,
fragilizada física e emocionalmente, começa a desconfiar estar sendo
vítima de alguma espécie de seita para a qual o bebê que leva dentro de si,
provavelmente, virá a ser elemento chave.
Paranoia, imaginação, ansiedade, fantasia, reflexo de sua fraqueza física,
estresse da gravidez? Exagero ou não, essa mãe vai brigar até o último instante
para proteger seu filho de algo que, na verdade, nem ela sabe bem ao certo do
que se trata mas que, pelo que vai se apresentando a ela, parece algo muito,
muito maligno.
4. "Sexta-Feira Muito Louca", de Mark Walters (2003)
- Quantas vezes já não ouvimos que só estando no lugar da outra pessoa para
saber como ela se sente, não? Pois é, "Sexta-Feira Muito Louca"
promove essa possibilidade justamente em uma relação de uma mãe e uma filha.
Relação difícil, intolerância, falta de compreensão mútua... Só mesmo uma troca
de corpos para fazer com que cada uma perceba as dificuldades da vida da outra.
E nessa confusão quem sai ganhando é o espectador com situações muito
divertidas, com Jamie Lee Curtis fazendo uma adolescente no corpo de uma
"coroa", e da maluquete Lindsay Lohan curtindo uma de senhora
responsável presa num corpo de garota de colégio. Mamãe vai entender, ou talvez
lembrar, que existe pressão por notas, coleguinhas implicantes e insuportáveis,
professores chatos, paqueras, necessidade de privacidade, tempo para lazer,
etc. e talvez, a partir de tudo isso, se remodelar; e a filhota vai perceber
que ser mãe, ter obrigações, preocupações, casa, trabalho, e, principalmente
filhos aborrecentes, não é tarefa para qualquer uma.
Mães e filhas e suas histórias.
5. “Clube da Felicidade e da Sorte”, de Wayne Wang (1993) – Filme emocionante sobre mulheres que foram filhas, se tornaram mães e viram as filhas se tornarem mães.
Quatro chinesas com histórias diferentes em seu país de origem, vão parar nos Estados Unidos e lá constroem famílias, se conhecem e tornam-se grandes amigas. Muitos anos depois, após a morte de uma delas, Suyuan, é revelado à sua filha June, que as filhas gêmeas que a mãe tivera na China e que abandonara bebês durante a guerra em circunstâncias pouco esclarecidas, às quais todos acreditavam não terem sobrevivido, estavam, sim, vivas e dispostas a conhecê-la. Então, a festa de despedida de June, que embarcará para a China para conhecer as irmãs, serve de pano de fundo para conhecermos as histórias de vida de cada uma delas, de suas dificuldades na China, das particularidades das relações com suas próprias filhas quando crianças, e dos problemas da vida adulta destas como mulheres.
Traumas, reminiscências, roupa-suja, desabafos, remorsos, sacrifícios, esqueletos dentro do armário são trazidos à tona em momentos chave do filme de modo a preencher lacunas em aberto e colocar as coisas nos seus devidos lugares e apenas reafirmar aquilo que todos sabemos: que ela pode ter todos os defeito que tiver, mas que não existe ninguém como a mãe da gente.
6. "Dançando no Escuro", de Lars Von Trier (2000) - Tudo o que Selma queria era guardar um dinheirinho para fazer a cirurgia de olhos de seu filho para que ele não acabasse como ela, quase sem enxergar nada, uma vez que herdara dela a doença progressiva de perda de visão. Mas um vizinho, um policial proprietário do terreno onde ela vive num trailer com o filho, descobre sobre o dinheiro e rouba as economias da pobre coitada que, além de tudo, acabara de ser demitida da fábrica onde trabalhava. Tentando recuperar seu dinheiro, Selma acaba matando o vizinho e é presa por isso. Uma história dura, dramática, pesada, é verdade. Mas a vida de Selma, de certa forma, é embalada e seus momentos difíceis amenizada pela música. Amante dos musicais cinematográficos, Selma foge mentalmente de sua realidade imaginando estar em cenas de filmes musicais onde tudo à sua volta suscita sons e canções, desde as máquinas da metalúrgica onde trabalha ou mesmo passos, enquanto é levada pelos guardas na cadeia.
Filme do sempre controverso Lars Von Trier, com atuação brilhante da cantora Björk, no papel da protagonista, que lhe rendeu o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes.
Eis uma mãe que deu cada centavo de seu trabalho e fez tudo que estava a seu alcance pelo bem do filho. Até as últimas consequências.
"Dançando no Escuro", 107 passos
A maluca mãe de Carrie, disposta tudo para
que a filha continue pura.
7. "Carrie, A Estranha", de Brian De Palma (1976) -
Não tem como falar em mães no cinema e não lembrar da maluca, crente e
super-protetora mãe de Carrie White. Fanática religiosa, Margareth mantém a filha
afastada e alienada em relação ao mundo que a rodeia, expondo a jovem a constrangimentos diários como, por exemplo, o do início do filme em que se desespera
por ter menstruado e é ridicularizada pelas outras meninas no vestiário da
escola. Ah, mas não é uma boa ideia zoar com uma garota como Carrie com poderes
psicocinéticos que se manifestam especialmente quando ela se altera emocionalmente,
e essa galera que adora tocar um terror nos outros, vai entender isso da forma
mais dolorosa possível.
Uma das garotas do bullying no vestiário, verdadeiramente arrependida
e na boa intenção de se redimir com Carrie, convence o namorado, os gostosão da
escola, a convidá-la para o baile, de modo que a esquisitinha se enturme, socialize.
A mãe, brilhantemente vivida por Piper Laurie, tenta evitar de todas as maneiras
que a filha vá, utilizando-se de seus argumentos religiosos, chantagens
psicológicas e sua por fim de sua autoridade de mãe, mas Carrie, decidida a
viver pelo menos um dia de sua vida, começa a mostrar seus poderes em casa,
contra a própria mãe e termina de fazê-lo na festa, onde vítima de um trote de
muito mau gosto, do restante da turminha da pesada, proporciona um banho de
sangue em uma das cenas mais marcantes da história do cinema.
A velha podia ser louca, mas não dá pra dizer que ela não
avisou.
Sarah Connor não vai permitir que robô nenhum
se meta com seu filho.
8. "O Exterminador do Futuro II – O Julgamento Final", de James Cameron
(1991) - Tá certo que no início, lá no primeiro filme, por mais que tivesse
sido informada por um carinha do futuro que seria a mãe de um líder da
resistência humana numa guerra contra as máquinas, Sarah Connor estava mais
interessada era em salvar a própria pele do que de um bebê que, a bem da verdade,
ela nem tinha certeza se viria a existir mesmo. Mas a partir do momento que se
convenceu, da pior forma possível, depois de ter sido perseguida por um
ciborgue sanguinário e impiedoso, de que o papo de apocalipse das máquinas era
quente, foi determinada em ter a criança e, no pouco tempo em que teve com ele
antes de ser internada num hospital psiquiátrico, em treiná-lo e prepará-lo
para cumprir seu destino no front dos humanos contra as máquinas.
Durante todo o tempo em que esteve mantida no manicômio penitenciário por ter
destruído uma fábrica de eletrônicos e alegar que o fizera porque um robô
exterminador teria vindo do futuro para matá-la e a seu filho, Sarah (Linda Hamilton) sempre
ficou pensando numa maneira de sair dali para proteger o filho. A desconfiança que
o garoto tem, posteriormente no filme, quando a resgata do hospício, de que a
mãe está mais preocupada com a humanidade do que com ele, não demora para se
desfazer diante de toda o amor com que ela o protege.
Ela é fria é pragmática, objetiva, dura, durona, mas não poderia ser de outra
maneira quando se sabe que seu filho, além de já ser naturalmente importante
somente por ser seu filho, pode ser a salvação da humanidade.
9. "Leonera", de Pablo Trapero (2008) - Circunstância estranhas... Um
homem morto, outro ferido, uma mulher inconsciente. Um dos dois seria o
assassino? Teria sido uma quarta pessoa? Por que não ela não lembra de nada?
Teria sido drogada? Ou não quer lembrar? O fato é que nesse mistério todo, a
garota é quem vai parar na cadeia, só que grávida como se encontra, é enviada a
uma instituição onde é permitido que as internas tenham lá seus bebês e depois
permaneçam com as crianças no presídio, até os 4 anos de idade. Revoltada com a
gravidez, relutante e resistente em ter o filho, num primeiro instante, Julia
Zarate (Martina Gusmán), aos poucos vai sendo conquistada pelo seu pequeno rebento e seu
instinto e amor de mãe acabam prevalecendo, fazendo dela uma mãe atenciosa e
carinhosa, mesmo dentro daquele ambiente prisional.
O lugar, mesmo com as características tradicionais de uma instituição carcerária, em
muitos momentos acaba parecendo uma creche e a presença das crianças acaba
iluminando um pouco o lugar e garantindo-lhe, de certa forma, sempre um rasgo
de alegria e esperança.
Só que em meio às situações corriqueiras de um presídio, envolvimentos íntimos,
desavenças com outras internas, visitas do advogado, audiências de apelação,
Julia vê-se às voltas com as investidas de sua mãe para levar o neto dali
daquele ambiente que considera pouco apropriado para a criação de uma criança.
Sob pretexto de tratar um resfriado do menino, a avó consegue convencer a mãe a
tirá-lo de lá, em princípio, apenas para uma consulta médica, com a promessa de
levá-lo de volta. Só que isso não acontece e aí Julia vai fazer de tudo para
ter seu filho de volta.
Filme de uma mãe que até hesita um pouco no ofício divino que lhe é concedido
mas que a partir do momento que se sente mãe, não vai deixar que ninguém tire
isso dela. Uma leoa que protege sua cria a qualquer custo.
10. Kill Bill – vol.2”, de Quentin Tarantino (2004) – No final
do volume 1 é revelado, apenas para o espectador, que a criança que a noiva
baleada na cabeça num massacre numa igrejinha de interior, sobrevivera à chacina. Recuperada
de um coma de quatro anos, a mãe, uma assassina treinada que não perdera seus
instintos mortais, depois de se vingar de parte do grupo
que tentara matá-la, vai agora em busca do líder e ex-amante, Bill. O tempo inteiro, a grande
motivação da vingança de Beatrix Kiddo (Uma Thurman), também conhecida como a Mamba Negra, é
o fato de terem-lhe tirado seu bebê, tanto que a primeira coisa que faz quanto
desperta do coma, sem noção de quanto tempo estivera ali, é levar a mão à
barriga e perceber que não tem mais ali a criança. Aquela é a vingança de uma mãe.
Cada um que sucumbe a ela paga pelo fato de terem lhe tirado a oportunidade de poder
ter um filho, estar perto da criança, curtir cada momento. Ah, todos terão que
pagar por isso! O que ela não contava é que, às portas de seu confronto final,
ao encontrar Bill, encontraria também uma graciosa menina, doce, dengosinha e com
carinha de anjo. Ah, amigos, ela desaba! A determinação com que ela adentra a
vila onde habita o algoz, de arma em punho, pronta para aniquilar o homem que
lhe causara tanto sofrimento e privação, é completamente desestruturada assim
que vê a menina.
Ele, cavelheiresco como é, apesar de seu ofício, permite a
elas algumas horas juntas antes do inevitável duelo final entre os dois, que
serão os momentos mais gostosos e bem aproveitados por aquela mãe. Horas que
valerão por anos, até porque, ela não sabe o que acontecerá assim que sair
daquele quarto e colocar sua espada Hatori Hanzo em ação contra a de seu oponente,
o tão perseguido, Bill.
11. “Volver”, de Pedro Almodóvar (2003) - Almodóvar gosta de destacar mulheres em seus filmes e não raro, trata especificamente de mães, como acontece, por exemplo em "Julieta" (2016), "A Flor do Meu Segredo" (1995) e, é claro, "Tudo Sobre Minha Mãe" (1999). Mas não vamos cair na obviedade de destacar o filme que explicitamente dedica, já no título, sua temática às mães e sim um outro do qual gosto muito e que traz as questões das relações entre mães e filhas de uma maneira mais leve, mesmo contendo elementos dramáticos, polêmicos e sombrios. "Volver" é uma espécie de comédia surrealista onde uma mãe, Irene, brilhantemente interpretada por Carmen Maura, "retorna dos mortos" para alguns acertos, alguns ajustes, uma reconciliação com suas filhas, especialmente com Raimunda, vivida por Penélope Cruz, com quem nunca tivera, em vida, uma relação muito boa. Raimunda, diante da novidade da misteriosa volta da mãe, ainda vê-se às voltas com o assassinato cometido por sua filha adolescente Paula,que matara o padrasto que tentara abusar sexualmente dela. A não ser pelos relatos de Raimunda, não sabemos como era a mãe quando viva, mas o que sabemos é que a Irene "fantasma" é um personagem adorável que dá um brilho todo especial ao filme de Almodóvar. Um filme delicioso com uma mãe que vai nos mostrando, e às filhas, que tudo o que sempre fez, foi protegê-las, assim como a filha Raimunda faz agora em relação à sua pequena Paula. Aquele instinto que passa de mãe para filha.
12. "Indochina", de Régis Wargnier (1992) - Eliane (Catherine Deneuve), dona de uma vasta extensão de seringais na Indochina francesa e mãe adotiva de uma garota indochinesa, se apaixona e tem um romance com um oficial francês da Marinha, Jean-Baptiste, mas o rapaz também cai nas graças da filha Camille em um incidente na rua onde o militar salva sua vida. Em parte por ciúmes, em parte para protegê-la do cenário efervescente pela libertação da colônia, Eliane, rica e influente consegue fazer com que transfiram o oficial para os quintos-dos-infernos, numa ilha, literalmente, lá na cochinchina, de modo que fique longe da filha, imaginando assim que a jovem desista dele e, por fim, o esqueça. Só que aquela mãe não contava que o amor da menina pelo oficial fosse muito maior do que ela imaginava. A menina atravessa o país atrás do seu amor e, agora sem a proteção de sua posição social, como uma indochinesa comum e misturada a seu povo, conhece a relidade local, se afeiçoa à sua gente ele e se solidariza com sua luta pela independência.
A busca e Camille por Jean-Baptiste é comovente e tem momentos verdadeiramente lindos, mas em paralelo a isso, a mãe, verdadeiramente amorosa apesar do ato egoísta, desesperada, não mede esforços para encontrar a menina e move mundos e fundos para tê-la de volta. Mas aí já é tarde, a pequena e frágil Camille já virou uma revolucionária procurada e praticamente uma lenda em seu país.
O fato de ter afastado a filha da pessoa que ela amava pode parecer desqualificar Eliane no quadro das grandes mães. É verdade, ela foi um tanto egoísta, autoritária, até insensível. Mas não se engane, leitor. É o tipo do caso da mãe que acha que está fazendo o melhor para o filho, mesmo que isso tenha que custar algum sacrifício o qual, neste caso específico, era para ambas. A gente até fica com uma raivinha dela durante o filme mas na cena do reencontro das duas é de morrer de pena daquela mãe.
mostrando que mãe adotiva é tão mãe quanto qualquer outra.
"Indochina" - trailer
Uma das mortes clássicas de "Sexta-Feira 13".
Jason aprendeu direitinho com a mamãe.
13. “Sexta-Feira 13”, de Sean S. Cunnigham (1980) – Quando pensamos em “Sexta-Feira 13”, a primeira lembrança que nos vem à mente é o assassino psicopata da máscara de hóquei, Jason Voorhees, mas pouca gente lembra que quem mata no primeiro filme da franquia (* alerta de spoiler) é a mãe de Jason. Sim! Pamela Voorhees traumatizada e perturbada pela morte do filho, afogado por negligência dos monitores do acampamento de Crystal Lake, responsabiliza, de um modo geral, a todos os jovens cheios de vida e resolve que deve se vingar de todos aqueles que venham a acampar no lugar onde o filho morreu. E a mamãe capricha! É um banho de sangue com algumas cenas das mais clássicas do terror slasher como, por exemplo, a que Kevin Bacon, estreando, novinho ainda, tem a garganta atravessada por uma faca, deitado na cama. Caso em que o filho aprendeu direitinho os ensinamentos da mãe pois, dali em diante, nas sequências da franquia, é Jason quem assume o facão e mostra-se extremamente competente em sua tarefa.
Quem assistiu a “Sexta-Feira 13 – parte 1”, jamais vai esquecer a frase, dita com aquela vozinha fininha, imitando a de uma criança, sempre antecedendo mais uma atrocidade: “Mata ele, mamãe!”.
14. "A Troca", de Clint Eastwood (2009) - Agora, imagina se seu filho desaparece, você denuncia o fato às autoridades e depois de algum tempo eles vem pra você com uma outra criança e querem que você engula e aceite aquilo. Cara, é exatamente o que acontece em "A Troca", filme dirigido por Clint Eastwood e estrelado por Angelina Jolie, e o pior é que a coisa toda é baseada num fato real ocorrido em Los Angeles na década de 20.
Aquela mãe insiste, Christine Collins, reafirma que não é o mesmo menino que sumira, tenta provar de todas as maneiras, com os professores, com exames médicos, com fotos, mas a polícia não só tenta lhe impor que é o garoto que ela procura como a acusa de insanidade mental por não reconhecer o próprio filho.
Uma história angustiante em que ficamos cada vez mais envolvidos e torcendo por aquela mãe. Mas infelizmente, amigos, tenho que revelar que a situação só piora.
Caso de uma mulher que não desiste do filho, não desiste da verdade, mas que, mãe solteira, vê-se impotente e cada vez mais sufocada pelas autoridades, pelo machismo e pela conjuntura social de sua época.
15. "Mãe!", de Darren Aronofsky (2017) - Essa é a mãe de todos nós. Salvo outras possíveis interpretações, a Mãe, interpretada por Jennifer Lawrence no filme de Darren Aronofsky, representa mãe natureza, a vida. E tudo o que aquela mãe mais quer é viver em paz e preservar sua casa, que é, na verdade, a nossa casa. A casa em questão, uma propriedade retirada em reformas, é onde ela vive com Ele, um escritor em crise criativa, vivido por Javier Barden, que, vaidoso e inconsequente, permite visitas inconvenientes que cada vez mais vão tumultuando a vida e o lar dos dois. Primeiro são um homem e uma mulher, convidados por Ele (Adão e Eva); depois uma multidão mal-educada que chega para o funeral de um dos filhos do homem e da mulher, morto pelo irmão (Caim e Abel), e com seu mau comportamento, mesmo diante de todas as advertências, acabam causando um enorme vazamento (Dilúvio) e a ira da dona da casa; e por fim, quando ela já está grávida, os convidados que chegam para celebrar a nova obra do escritor que finalmente rompera seu bloqueio criativo e que assim que ela tem o bebê, em meio à sua noite de consagração, exibido, faz questão de levar e entregar seu filho, recém nascido à turba de insensatos que..., (* alerta de spoiler) literalmente, o devoram (Jesus Cristo).
Um filme complexo, para o qual cabem diversas outras interpretações ou variações, mas que não deixa dúvida quanto a uma coisa: o zelo que uma mãe tem pelo seu lar e pelos seus.
À parte as reflexões religiosas, com "Mãe!" você vai entender melhor o desespero da sua mãe quando chegava em casa e via aquele lugar de cabeça pra baixo.
Alguns outros filmes com mães marcantes que merecem destaque e poderiam perfeitamente estar na nossa lista:"O Óleo de Lorenzo", de George Miller (1992); "Mamãe Faz Cem Anos", de Carlos Saura (1979); "Mommy", de Xavier Dolan (2014); "Minha Mãe é Uma Peça", de André Pellenz (2013); "Tudo Sobre Minha Mãe", de Pedro Almodóvar (1999); "Mom", de Ravi Udyawar (2017); "Que Horas Ela Volta?", de Anna Muylaert (2015); "O Quarto de Jack", de Lenny Abrahamson (2016); "Precisamos Falar Sobre Kevin", de Lynne Ramsay (2012), "Juno", de Jason Reitman (2008); "Zuzu Angel", de Sérgio Rezende (2006)
Começaram os jogos olímpicos! As Olimpíadas estão oficialmente abertas e pra entrar no clima, o Claquete selecionou filmes que destacam esportes. Alguns são obras-primas, outros nem tanto, outros valem a pena serem vistos por alguma cena específica ou por alguma curiosidade mas o caso é que aqui juntaremos a Sétima Arte ao esporte e o resultado é uma lista bastante interessante. A lista foi feita assim de memória, sem buscar muito, sem grande pesquisa, então pode ter ficado faltando alguma coisa relevante que o leitor possa dar falta e que eu mesmo venha a morrer de remorso por não ter mencionado, assim como, logicamente, a lista não pretende contemplar todas as modalidades olímpicas, mas assim, de lembrança, sem pensar muito e destacando alguns esportes, eis aí:
No que diz respeito a cinema certamente não ha nada mais olímpico do que o clássico "Carruagens de Fogo" (1981). É impossível pensar num filme de atletismo sem pensar nele. Ambientado às vésperas das Olimpíadas de Paris, em 1924, "Carruagens de Fogo" centra as atenções em dois corredores da equipe inglesa, um judeu e outro cristão, que buscam classificação para os jogos evidenciando ao longo do drama suas diferenças de estilo, crenças e convicções. Filme que imortalizou a famosa trilha sonora do grupo Vangelis sobretudo pela cena de abertura com os atletas correndo em câmera lenta pela praia, Que criança nos anos oitenta não correu como se estivesse em câmera lenta imitando com a boca o som da canção tema do filme? Atire a primeira pedra.
Sequência inicial de "Carruagens de Fogo"
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Rúgbi não é um esporte muito popular no Brasil mas na África do Sul, apesar de todos os conflitos sociais e raciais pós-apartheid era um esporte que atraía a atenção do povo, o problema era que não conseguia unir brancos e negros uma vez que a população negra, apesar de apreciar o jogo, via o esporte como símbolo do regime segregacionista. Às vésperas da Copa do Mundo de Rugbi, em 1995, Nelson Mandela, recém eleito presidente do país e ainda sofrendo da desconfiança dos próprios negros e da resistência dos brancos, vê no esporte a oportunidade de unir o país como um todo em torno de um ideal e reforçar com isso o patriotismo e a autoestima de seu povo. "Invictus" (2009) não é um filme espetacular mas é mais um dos bons filmes de Clint Eastwood e conta com a boa performance de Matt Damon como o capitão da equipe nacional sul-africana e uma atuação extraordinária e marcante de Morgan Freeman como Nelson Mandela, pelo qual foi indicado ao prêmio de melhor ator.
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"Fuga Para a Vitória", referência em filmes de futebol.
Se o rúgbi não tem lá todo esse público por aqui, vamos falar então do esporte mais popular do país olímpico, o futebol. Sim, porque mesmo num momento desfavorável por conta da corrupção, desmandos, escândalos, desorganização, ausência de craques, resultados vexatórios, ainda é a bola redonda que manda por essas bandas. Mas o fato é que é difícil se fazer filmes de futebol. As dimensões do campo e a própria dinâmica do jogo não são facilitadores pra quem pretende fazer um longa dentro das quatro linhas. Talvez por isso, alguns dos melhores exemplos de bons filmes sobre futebol se passem fora de campo. O bom "Linha de Passe", de Walter Salles (2008) onde o sonho de um garoto pobre em alcançar o sucesso no esporte é pano de fundo para os problemas sociais na periferia de São Paulo, e o ótimo "Boleiros" de Ugo Giorgetti (1998), em que m grupo de amigos de alguma forma ligados ao futebol no passado, jogam conversa fora em um bar relembrando fatos engraçados, curiosos, tristes de suas vidas, seja na arquibancada, com um apito na ão, na casamata ou dentro do campo. Mas dentro do campo, o filme que provavelmente conseguiu o melhor resultado prático na telona, transformando-se em um clássico do cinema, é o sempre lembrado "Fuga Para a Vitória" (1982), filme que narra a história de prisioneiros aliados na Segunda Guerra Mundial que terão uma partida contra os alemães e vêem nela a oportunidade de escapar. Apesar da falta de traquejo com a redondinha de atores como Sylvester Stallone e Michael Caine, o mestre John Huston consegue cenas de grande emoção e alta plasticidade como por exemplo a do gol de bicicleta. Sabe de quem? Vou dar uma pista: sabe o filme do Pelé que o Chaves queria tanto ver?
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Curiosamente, apesar de altamente popular nos Estados Unidos e de uma plasticidade e dramaticidade favoráveis, o basquete, que até tem grande número de produções, não apresenta filmes de qualidade destacada. Talvez possa-se destacar o bom "He Got the Game - Jogada Decisiva", de Spike Lee com Denzel Washington (1998), o subestimado mas interessante e bem dirigido "Homens Brancos Não Sabem Enterrar", cujo título infeliz em português que parece mais de um filme pornô deve ter afugentado muita gente dos cinemas e repelido espectadores até hoje. Mas por incrível que pareça um dos mais lembrados quando se fala de bola no cesto e certamente o mais olímpico dos filmes deste esporte é "Space Jam - O Jogo do Século", que mistura personagens dos desenhos animados da Looney Tunes com astros da NBA. Tentando se libertar de alienígenas que os aprisionaram, Pernalonga e sua turma convocam ninguém menos que o astro Michael Jordan para jogar em seu time e conquistar a liberdade. Um grande barato.
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O tenso jogo de tênis de "Pacto Sinistro".
O tênis também rende bons filmes para a telona. Apesar de sua dinâmica para muitos um tanto monótona, o vai-e-vem da bolinha por si só já gera uma tensão toda particular que somente mestres conseguem explorar com verdadeira competência. É o caso, por exemplo, de Woody Allen no seu excelente "Match Point" (2005) no qual partidas de tênis mesmo aparecem em poucos momentos, e para falar a verdade, nem partidas são, são apenas treinos. Mas, a partir da genial cena de introdução que coloca o destino de uma bola que bate na rede e pode cair para qualquer dos lados na conta meramente da sorte, o filme passa a ser um jogo. Bola lá e bola cá. Quem vai matar o ponto e fechar partida? Mas ainda mais notável que o suspense policial de Allen, é o do mestre do gênero, Alfred Hitchcock. "Pacto Sinistro", filme de 1951, trata de dois homens que se conhecem casualmente em um trem sendo que um deles reconhece o outro como um tenista famoso, Guy Haynes, que pelo que se sabe pelos tabloides e jornais de fofoca, teria uma amante e estaria insatisfeito com seu casamento. O estranho do trem, Bruno Anthony, então propõe ao tenista uma troca de "favores", ele se livraria da esposa do tenista que insiste em não ceder o divórcio, e Haynes mataria seu pai. Ok? Claro que não! Só que mesmo sem concordância do tenista o doido dá o acordo por selado e cumpre sua parte. Só que aí ele vai cobrar a parte do outro e é aí que o negócio esquenta. Absolutamente genial! A cena da morte da esposa de Guy, a cena do carrossel e logicamente a tensa cena do jogo de tênis são daquelas coisas de assistir de joelhos. No jogo da bolinha pequena, o mestre Hitch mais uma vez bate um bolão.
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Filmes de capa e espada sempre foram comuns e muito populares no cinema. Duelos mortais, filmes de pirata, de cavaleiros, guardas reais, e até de ficção científica como as lutas de sabre de luz na série "Star Wars", mas a esgrima propriamente dita, como esporte também parece em alguns momentos interessantes na história da sétima arte. "O Último Duelo " de F. Murray Abrahams (1993); o filme estoniano "O Esgrimista" de 2015; na parte de Louis Malle, adaptação do conto "William Wilson" de Allan Poe no coletivo "Histórias Extraordinárias" de 1968; no bom mistério juvenil "O Enigma da Pirâmide" de Barry Levinson que traz as origens do detetive Sherlock Holmes, são apenas alguns exemplos da esgrima no cinema, mas gostaria de destacar aqui o divertido duelo de James Bond contra o milionário Gustav Graves em "007 - Um Novo Dia Para Morrer" (2002) em que os adversários começam a disputa disciplinados, nas regras da competição, mas que aos poucos vão as abandonando até causar um verdadeiro caos e destruição no elegante clube inglês que frequentam. Filme de mediano pra fraco mas gosto muito dessa cena que tem inclusive a participação da cantora Madonna. A cena da esgrima em duas partes: até onde o esporte estava sendo respeitado e quando Bond e o adversário mandam tudo às favas e passa a valer qualquer coisa.
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Nas cordas, no córner, no ringue. Lá se passam alguns dos grandes filmes que o cinema já nos deu. Desde o incipiente filme de Kubrick "A Morte Passou por Perto" de 1955; o clássico do neo-realismo italiano "Rocko e Seus Irmãos", de Luchino Visconti (1960); a saga Rocky, da qual os dois primeiros filmes (1977 e 1980) são os grandes clássicos mas cujo restante da franquia mantém toda uma mitologia particular; passando pelo comovente "o Campeão" de Franco Zeffirelli (1979); por "Hurricane", de Norman Jewison (1999); pelo boxe feminino no premiado "Menina de Ouro" de Clint Eastwood (2005);"o Vencedor" (2010) com Mark Wahlberg cujas cenas de luta deixam muito a desejar; até chegar ao recente (2015) "Nocaute" de ótima atuação de Jake Gyllenhaal, a Sétima Arte vem com frequência nos proporcionado filmes com bons roteiros, qualidade técnica e requinte sobre a Nobre Arte. Verdadeiros balés de direção que parecem tentar compensar ou contrapor a violência do esporte com cenas inesquecíveis. Talvez o que melhor traduza todas essas qualidades, sendo frequentemente apontado em diversas listas como um dos 5 melhores filmes de todos os tempos, seja "Touro Indomável" (1980), mais um das obras de arte de Martin Scorsese. As cenas de luta são extremamente bem filmadas, intensas, inquietantes com sua fotografia em preto e branco e ambiente esfumaçado, contudo o filme não se fixa meramente na trajetória atlética de um boxeur dentro do ringue. "Touro Indomável" conta a história de um boxeador talentosíssimo, Jake LaMotta, que tinha tudo para alçar vôos cada vez maiores mas que por seu temperamento e indisciplina, vai aos poucos pondo toda sua carreira e, por consequência, sua vida a perder. A contagem foi aberta.
Nosso convidado do Duelo do mês é o radialista, locutor,
cinéfilo e blogueiro Paulo Telles.
Morador da Lapa, no Rio de Janeiro, o famoso bairro boêmio carioca não é páreo
para o fascínio cinéfilo de nosso entrevistado. Telles divide seu tempo entre
as locuções e roteiros de rádio e as várias colaborações para blogs e revistas
de cinema. Dentre elas, a DVD Magazine, onde possui uma coluna. Seu blog, Filmes Antigos Club, está há 5 anos no ar. O espaço é dedicado a artigos sobre filmes clássicos
que fizeram história. Telles também é um dos maiores especialistas do Brasil no
tema western, tendo escrito diversos
textos e resenhas sobre o gênero. Ele se considera criterioso para fazer suas
matérias e põe a pesquisa como peça fundamental para redigir qualquer texto. Eu
decidi entrevistá-lo e explorar todo seu vasto conhecimento de sétima arte. Ele
gentilmente aceitou e colaborou com respostas bem afinadas e nos deu uma grande
entrevista. Um prato cheio de spaghetti
e western de todo tipo, fartura total
para os amantes do bang bang.
Desfrutem com armas na mão.
BINO: Paulo, vamos
entrar direto no tema western. Recentemente eu li um texto seu para a DVD
Magazine que foi um dos melhores que vi sobre o tema bang bang. Era sobre o Western Americano e o Europeu,
uma comparação, na verdade, uma diferenciação de ambos os estilos, quase um
duelo. Eu tenho notado entre amigos e cinéfilos uma divisão de preferências
entre os dois. É certo que o spaghetti
fez o western americano repensar sua estética de cowboy limpinho, mas ao mesmo tempo bebeu muito na fonte hollywoodiana de
fazer estes filmes. Quais foram as grandes contribuições que ambos os gêneros
deram um para o outro?
Eastwood e seu referencial "Os Imperdoáveis"
PAULO TELLES: Primeiramente,
saudações cinéfilas aos leitores do Clyblog e obrigado pela acolhida. Esse texto foi um dos meus primeiros redigidos no meu blog Filmes Antigos Club, criado em2010, dividida
originalmente em três partes, e foi trasladado para minha coluna Revendo por Edinho Pasquale (editor
do DVD Magazine) em um único artigo. Ambos os estilos deram uma indelével
contribuição à sétima arte, contudo, os faroestes
spaghetti ajudaram a fortalecer o gênero. Para vocês terem uma
ideia, o western (por definição do
famoso crítico Andre Bazin, o "cinema
americano por excelência") foi extremamente explorado por Hollywood
pelo menos durante os primeiros 60 anos de indústria, inclusive na TV e nos
seriados infantis de cinema (ao estilo Durango
Kid, The Lone Ranger, etc), praticamente repetindo uma fórmula,
ou melhor, dizendo, uma estética lírica e poética. Obviamente isso foi
saturando o público e a crítica, mesmo que o cinema americano nos meados da
década de 1950 tentasse inovar o gênero com temas sociais e de politização. Até
que veio um notável cineasta italiano chamado Sergio Leone a mostrar para as
plateias do mundo que o Velho Oeste era mais pungente do que os cineastas
americanos florearam, mas estes, amantes da mitologia e do folclore, não se
importavam com a fidelidade dos reais acontecimentos, e sim com a legenda áurea
e romântica dos mitos do Oeste Americano. Obviamente, isso não condizia com uma
época violenta que fora o Velho Oeste. Ele admirava os trabalhos dos mestres
Ford, Hawks, Mann, Daves, Hathaway, mas discordava do idealismo romântico e
poético que estes diretores envolviam acerca de seus cowboys e no meio em que viviam, mesmo que estes cowboys fossem de teor freudiano. Se não
fosse Leone, os westerns americanos
ficariam quase batendo na mesma tecla, e graças a ele o gênero, no geral,
sobreviveu mais um pouco e vem de certa forma, sobrevivendo. Afinal os
americanos não teriam feito obras como “Meu
ódio Será Sua Herança”, “Os Profissionais”, “Quando os Bravos se Encontram”,
“Mato em Nome da Lei”e até mesmo "Os Imperdoáveis", de Clint Eastwood, se não fosse pela
intervenção dos westerns italianos. Ambos os estilos, o americano e o
europeu, cada um com sua essência, foram importantíssimos e são de um legado
ímpar para a cinematografia mundial.
B: Um dos legados
de Ford e de outros grandes diretores foi mitificação do homem do Oeste
americano. Mas ao mesmo tempo sabemos que muito do que se via nos filmes não
correspondia à realidade ou era controverso. Um dos maiores exemplo é o famoso
tiroteio de O.K. Corral. Tivemos diversas produções sobre este tema e que
exaltaram os participantes do tiroteio, mas a pesquisa de especialistas disse
que não foi nada daquilo o que aconteceu na verdade. E outro foi uma espécie de
inversão que transformou o índio em pária social pelas produções de cavalaria,
aquela história de mocinho versus
índio. Formato que alguns diretores repensariam anos depois – Ford foi um
deles. O progresso a qualquer "custo" desnudado nas produções de
Leone confrontava os mitos fordianos e CIA. A figura do pistoleiro anti-herói e
errante é na verdade uma cutucada. Fale-nos um pouco do mito do cowboy.
PT: Como eu disse, os americanos são fascinados
pela mitologia do Oeste Americano, e isso já acontecia antes mesmo do
surgimento do cinema. Em 1883, o próprio William Frederick Cody, conhecido
mundialmente como Buffalo Bill, já vinha explorando ele mesmo seu lado de
“herói” nos seus espetáculos circenses do Oeste Selvagem. Quando o cinema já
existia como um espetáculo, Buffalo Bill foi convidado por um dos primeiros
mocinhos do Far-West, Gilbert Broncho Billy Anderson (que também
era produtor) para estrelar um filme, intitulado “The Adventures of Buffalo Bill”, justamente com a
intenção de demonstrar que, no cinema, a ideal “fábrica de sonhos”, realidade e
lenda poderiam se confundir facilmente. Dois anos depois da morte de Wyatt
Earp, em 1929, um escritor chamado Stuart Lake publicou um livro chamado “Wyatt Earp, Frontier Marshal” (“Wyatt Earp, o Delegado da Fronteira”),
onde narrava as façanhas do “Leão de Tombstone”, como era Earp alcunhado. Lake
sempre declarou que cada narrativa, cada palavra ou vírgula, foram do delegado,
mas depois voltou atrás, dizendo que todo o livro era de sua inteira autoria, e
que Wyatt nunca lhe passou informações. Contudo, já nessa época, o cinema estava
em busca de heróis para mitificar o verdadeiro mocinho, e não de personagens
freudianos ou em enredos elevados a tragédia grega como viria mais tarde. Com
base no livro de Lake, Wyatt Earp parecia se encaixar como este novo mito cowboy. Em 1937, Randolph Scott e Cesar
Romero eram respectivamente Wyatt e Doc Holliday no filme “Frontier Marshal”, um dos primeiros
filmes a abordar o duelo de O.K. Corral baseado na história de Lake, cujo
argumento serviria também para “Paixão
dos Fortes”, de John Ford, em 1946. Mas evidente que não foi apenas Wyatt Earp o objeto desta mitificação cinematográfica, e Hollywood
transformou em heróis Billy The Kid, Jane Calamity, Buffalo Bill, Jesse James,
Wild Bill Hickcok, Kit Carson e até mesmo o famigerado General Custer. Todos na
realidade estavam distantes de serem “mocinhos”, mas o cinema americano
preferiu de início laurear tais ídolos do Velho Oeste, pondo uma legenda
romântica em cada um, imprimindo lendas e descartando fatos verdadeiros.
Afinal, um famoso cineasta que todo bom amante de western prestigia já falava em um de seus grandes filmes: “Isto é o Oeste. Quando a lenda é mais forte
que os fatos, se imprime a lenda”. Isso mesmo, John Ford.
"Sem lei e sem alma"
Quanto ao famoso tiroteio do O.K. Corral, tão bem
retratado em filmes como “Paixão dos
Fortes”, “Sem Lei e Sem Alma”, e “A Hora da Pistola” (os dois últimos de John Sturges), não passou
de uma tremenda farsa. O verdadeiro tiroteio, ocorrido em 26 de outubro de
1881, durou um minuto, enquanto que no filme “Sem Lei e Sem Alma”dura 15. Nem Wyatt Earp e nem seus
irmãos foram heróis em nenhum momento de suas vidas, e sim assassinos
acobertados pela insígnia da Justiça. Ike Clanton era um homem pacífico e ele e
seus parentes foram vítimas dos Earp, porque sabiam de coisas comprometedoras a
respeito de Wyatt e Doc Hollyday, este um pobre coitado. O verdadeiro Earp era
o típico “171” do Velho Oeste: trapaceiro, mentiroso, amoral e covarde. Nem
mesmo a amizade de Earp com Holliday era verdadeira. Foram, de fato, parceiros
de copo e mesas de jogo, além de ser seu aliado e cúmplice no duelo de O.K.
Corral, mas não tinham grandes afinidades. Wyatt era de uma família de rudes
camponeses pioneiros do Oeste, e Doc de uma família refinada do Leste,
diplomado em Odontologia e de esmerada cultura. E fato é que, na última vez que
se encontraram, descobriram que eram bastante diferentes e resolveram não mais
se falar. Segundo o cinema, tal fato não deve ser impresso, mas sim a lenda
romântica de que os dois eram amigos inseparáveis. Contudo, o western como gênero cinematográfico foi
sendo revisado a partir do início de 1950, e o protótipo do herói que vinha
sendo retratado em muitos destes filmes sofreu mudanças por grande parte de
cineastas revisionistas. O herói não era 100% herói, ou definitivamente, não
era. Ele podia agir de acordo com sua forma de pensar sobre justiça, lei, ordem
e meio que vive. Poderia cometer acertos e erros como qualquer ser humano.
Enfim, foi preciso humanizar o cowboy,
e mesmo os famigerados vilões também são objetos de profunda análise pela base
psicológica.
B:
Quem foram para você os diretores e os filmes de western que melhor deram esta contribuição, vamos
dizer, social e mitológica do homem daquele meio?
James Stewart em "E o sangue semeou a terra".
mito do cowboy
PT: Acredito
que Anthony Mann e Delmer Daves foram os mais prolíferos dentro desta
contribuição à mitologia do homem dentro do Velho Oeste, muito embora os
estilos dos diretores se diferenciem. Interessante em dizer que os cinco filmes
em série estrelados por James Stewart em parceria com o cineasta Mann refletem
bem a mitologia do homem em seu meio social. Basta assistirmos obras como “Winchester 73”(1950), “E O Sangue
Semeou a Terra” (1952), “O Preço de um Homem” (1953), “Região do Ódio” (1954) e
“Um Certo Capitão Lockhart” (1955)que veremos este mito do herói grego no meio da tragédia grega, ou em
outras palavras, o mito do homem, do novo cowboy,
no meio social em que ele esta vivendo. Já Delmer Daves tem uma obra “didática”
que reflete muito bem o tema, “Como
Nasce um Bravo”,de 1958, estrelado por Glenn Ford e Jack Lemmon,
onde temos este aprendendo a ser um “cowboy
de verdade” em meio a um grupo de rudes vaqueiros liderados por Ford, um
dos grandes ícones do Far-West americano. Lemmon, um cara do Leste e
acostumado à boa-vida, tem exatamente em sua mente o mito meio que laureado do cowboy, mas quando ele vai ver, percebe
que não é nada disso.
B: Agora nos fale
dos primeiros westerns realizados nos Estados Unidos.
PT: O cinema nasceu em 1895, na França, e isto já
é falar nos primórdios da sétima arte e de sua invenção como meio de
entretenimento. Já em 1898, nos Estados Unidos, a Edison Company (de Thomas
Edison), produziu uma vinheta de um minuto de duração chamada “Cripple Creek Bar Room”, aclamado por
alguns críticos e estudiosos como o primeiro western da história. Segundo Primaggio Mantovi, autor do livro “100 anos de Western”, a cena mostrava
um pequeno saloon com alguns cowboys, um típico jogador do Velho
Oeste, e uma garçonete de aspecto masculino que pôde ter sido interpretado por
um ator. Contudo, foi “O Grande Roubo
do Trem”, datado de 1903, que mereceu a honra de ser o primeiro western, por se tratar de um primeiro
filme a contar uma história escrita especialmente para o cinema (logo, o
primeiro script para o gênero). O filme foi feito em apenas dois dias e
se tornou oficialmente o primeiro western
do cinema. Vieram pioneiros como David W. Griffith, Thomas Happer Ince, William
S. Hart, Cecil B. DeMille (mais tarde, o idealizador de grandes espetáculos
épicos e bíblicos, como “Os Dez
Mandamentos” e ”Sansão e
Dalila”), e o próprio John Ford, cada um realizando uma obra ou outra no
gênero. E não somente quando o cinema engatinhava em seus primeiros passos,
como também ainda não se tinha o recurso do som, afinal ainda era a fase silents
do cinema. David W. Griffith é considerado o pai da linguagem cinematográfica,
e realizou em 1915 o filme que é considerado, de fato, o primeiro
longa-metragem do cinema: “O
Nascimento de uma Nação”. Thomas Ince idealizou o primeiro
estúdio ao ar livre, ao comprar 20 mil acres de terra para construir sua
própria cidade do Velho Oeste, contratando depois uma trupe de cowboys autênticos e índios de verdade,
peritos em cavalgar, laçar e atirar. “War
on The Plains”e “Custer’s
Last Fight”, ambos de 1912, foram um dos primeiros westerns rodados por Ince.
vídeo O Grande Roubo de Trem
Contudo, o ano de 1914 é tido como o ano oficial do
nascimento do western no cinema,
porque até então não houve a preocupação em desenvolver um ator capaz de
encarnar o autêntico cowboy do Oeste,
ou por que não dizer, o mito. Os primeiros atores a desenvolver os heróis do
gênero foram Lionel Barrymore e Francis Ford (irmão do cineasta John) e eram
figuras presentes nos filmes de Griffith e Ince, mas o primeiro herói oficial
do gênero foi mesmo Gilbert “Bronco
Billy” Anderson. William
S. Hart e Cecil B. DeMille tiveram um interesse maior pelo gênero nos
primórdios do cinema americano. Ainda em 1914, DeMille estreou na direção com “Amor de índio”, e
posteriormente transportou para as telas, em primeira adaptação
cinematográfica, o famoso romance de Owen Wister, “The Virginian – O Paladino da Justiça”, história esta que
teria várias readaptações para o cinema em épocas futuras, inclusive originando
uma série de TV na década de 1960, muito famosa – “O Homem de Virginia”, estrelada por James Drury.Ainda
no período silents do cinema, Cecil B DeMille dirigiu os westerns “Sonhos de Moça” (“The Girl of The Golden West”), em 1915,
e refilmou, em 1918, “Amor de Índio”.
"Marked Man",
primeiro western
do mestre John Ford
William S. Hart
era um ator clássico do teatro norte-americano que tentava transferir sua
carreira para o cinema, e junto com John Barrymore e o lendário Douglas
Fairbanks (na minha consideração, o primeiro grande aventureiro da sétima
arte), seria um dos poucos a realizar este ideal, mas Barrymore não estava
interessado em westerns. Com a ajuda
de Thomas Ince, que foi seu produtor, ele realizou os westerns “Um Negócio
Perigoso”, em 1914; “Terra do Inferno”, em 1916
(considerado o primeiro western
adulto); “Serás minha escrava”,
também de 1916; “The Tiger”, em
1918; e “Wagon Tracks”, em
1919. Juntos, a dupla Hart e Ince alcançaram sucesso de crítica e público que
nem eles ao certo poderiam imagina.
John Ford começou sua carreira em 1914, como
assistente de direção, ator e até dublê, com o nome artístico de Jack Ford.
Iniciou na arte da direção em 1917, dirigindo “A Marked Man”, seu filme favorito e um dos poucos que adorava
mencionar em suas entrevistas. Entre este ano de 1917 até 1920, Ford realizou
28 westerns para o estúdio da
Universal, todos de grande importância para o gênero. Em 1924, Ford realizou
uma obra-prima, o épico do gênero “Cavalo
de Ferro”, estrelado por George O’ Brien, que havia sido dublê de
Tom Mix. Existem ainda muitas outras obras do gênero realizadas nos primeiros
anos da indústria cinematográfica, mas numerá-las todas é um trabalho que
requer ainda pesquisa de minha parte.
B: O papel da
mulher na sociedade do Oeste americano era bem secundário, penso que nas
produções do gênero western isso
também não era diferente. São raros os filmes em que tivemos mulheres como
protagonistas e com personagens fortes. O que você pensa disso?
PT: Penso que isso não é necessariamente verdade
em termos de produção do gênero. Temos ótimos filmes em que a mulher é a protagonista.
É verdade que não são muitos, mas devemos fazer justiça aos cineastas que se
lembraram delas. Anthony Mann fez isso em “Almas em Fúria”, em 1950, colocando Barbara Stanwyck como a
heroína freudiana e corajosa que desafiava a “madrasta má” vivida pela dama do
teatro americano Judith Anderson, para defender seu pai, vivido por Walter
Huston (pai do cineasta John). Stanwyck era considerada por Hollywood como a “Madrinha dos Westerns”, e tudo porque
ela era perfeita para o gênero. Ela cavalgava muito bem e sabia atirar de
verdade, sendo também uma extraordinária atriz em outros gêneros, geralmente em
papéis bem avançados para as atrizes de sua época. Barbara atuou em fitas westerns como “A Bandoleira” (ou “Na
Mira de um Coração”), dirigido por George Stevens, em 1935, onde
viveu a lendária Annie Oakley, e fez um importante papel feminino em “Aliança de Aço”, de Cecil B.
DeMille, dividindo as honras com Joel McCrea. Anos mais tarde, na década de
1960, foi a estrela de um famoso seriado de TV do gênero, “The Big Valley”(1965-1969),
onde viveu a corajosa matriarca de uma família.
Barbara Stanwyk,
madrinha do western
Também tivemos um personagem forte feminino como
protagonista num grande clássico americano do gênero dirigido por um dos
grandes artesãos da sétima arte, o brilhante Nicholas Ray. Falo de “Johnny Guitar”, realizado em 1954,
onde Joan Crawford esbanja toda a ousadia e a coragem como nunca antes exibidas
no cinema. Joan está perfeita como a dona de saloon perseguida por uma banqueira que sente um ódio mortal por
ela (vivida pela também brilhante Mercedes McCambridge), enquanto ela também é
defendida por um “herói-bandido” que sempre carrega um violão, Johnny Guitar
(vivido por Sterling Hayden). Uma das obras mais psicológicas do gênero com um
surpreendente espaço para a reivindicação feminina, tendo como pano de fundo a
disputa de duas mulheres pelo amor de um mesmo homem, onde o confronto final
entre as duas é inevitável. Em 1994, aproveitando o embalo da volta dos westerns
no mercado de cinema graças ao estrondoso sucesso de "Os Imperdoáveis", de Eastwood, veio “Quatro Mulheres e Um Destino”, dirigido
por Jonathan Kaplan, onde temos um elenco de primeira, lideradas pelas
poderosas Madeleine Stowe, Mary Stuart Masterson, Andie MacDowell e Drew
Barrymore, onde são elas as grandes protagonistas da obra. E pouco tempo
depois, veio Sharon Stone protagonizando em “Rápida e Mortal”, em 1995, contracenando com Gene
Hackman. Seja como for, as mulheres estão sempre marcando o seu território no
gênero, sejam como protagonistas ou personagens secundárias, talvez mesmo
servindo como a fonte de motivação para o herói ou o mito do Velho Oeste. Sem a
cativante presença feminina, o western
não tem graça.
B: Vamos falar de spaghetti, vamos falar de Leone. A meu ver foi um
diretor completo, inovador e vanguardista. Estava à frente de seu tempo em
relação a muitos diretores de seu país e até de Hollywood. Mesmo assim ele foi
massacrado pela crítica em sua época, algo que Peckinpah e outros também
sofreram na pele. Porque ele demorou tanto a ser reconhecido e valorizado?
Um dos principais respossáveis
pelo faroeste spaghetti,
Sergio Leone
PT: Foi, em grande parte, o preconceito de alguns
críticos. Tanto Leone quanto Sam Peckinpah utilizaram muito do excesso da
violência em suas obras, algo inovador para os padrões dos anos de 1960. Os
críticos de então acreditavam que o público poderia ficar chocado com esta nova
maneira de se fazer Western. Tanto a violência mostrada por Peckinpah quanto as
mostradas por Leone eram uma arte incompreensível para a crítica da época,
muito embora Sergio se preocupasse não somente com a violência, mas com todo um
conjunto. Contudo, ambos os diretores tiveram merecido reconhecimento lá pela
metade dos anos de 1970, quando suas obras foram revisitadas por críticos de
mente mais aberta. Outro fator que também que veio a demorar o reconhecimento
destes dois mestres foi a desconstrução do mito do cowboy romântico. Leone,
assim como Peckinpah, derrubaram de vez todas as lendas romanescas do gênero,
que já eram obsoletas já no fim da década de 1950. Alguns críticos de início
não viam isso com bons olhos, e muito menos, Hollywood. Contudo, como sabemos,
foi graças ao sucesso dos Westerns italianos que o cinema americano teve que se
reinventar para não perder a concorrência, e não deu outra. Outro motivo que
ajudou também a retardar o reconhecimento de Leone & Cia foi justamente
alguns cineastas de baixo orçamento tentarem imitar o estilo de Leone sem
sucesso, o que o incomodava, pois achava que o estavam plagiando. Por isso que
muitas vezes tivemos faroestes europeus tão pobres e inexpressivos que mal passaram
das prateleiras das locadoras de vídeo, muitos deles feitos com baixíssimo
orçamento e roteiros sem pé e nem cabeça. O próprio Sergio Leone declarou a
respeito de seus imitadores durante uma entrevista: "Sou considerado o
Pai do Western Spaghetti, mas se eu soubesse que teria feito parir tanto
fdp..."