Eu me escorando num dos pilares da "Ruína" de Lichtenstein |
Numa
rápida passagem por Belo Horizonte antes de irmos a Ouro Preto, Leocádia e eu pudemos desfrutar de algumas coisas boas da capital
mineira. Conhecemos o mítico bairro Santa Tereza, berço do Clube da
Esquina de Milton Nascimento, Lô Borges, Fernando Brant, Wagner Tiso
e tantos outros talentos; almoçamos no colorido Mercado Central no
tradicional – e concorrido – restaurante Casa Cheia; e ainda
conhecemos alguns das obras de Oscar Niemeyer no Complexo da
Pampulha: o Museu de Arte, a Casa de Baile e a deslumbrante Igreja
São Francisco, embrionárias da arquitetura moderna.
O impactante óleo
"Cabeças Grandes"
de Picasso
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Porém,
para nossa surpresa e felicidade, fomos recomendados por um francês
dono do hostel onde nos hospedamos a visitar uma exposição no CCBB,
num lindo prédio art nouveau dos anos 20 (antigo Comando
Geral das Forças Revolucionárias, durante a Revolução de 1930),
na Praça da Liberdade, centrão da cidade. Até tínhamos ideia de
ir a alguma exposição, mas quando ele nos mencionou que, nesta em
especial, haveria obras de Andy Warhol, Pablo Picasso e Jean-Michel Basquiat providenciamos logo de incluir em nosso roteiro. A tal
mostra é "Visões na Coleção Ludwig", que reúne 70 obras provenientes do acervo do colecionador alemão Peter Ludwig, sediada
no Museu Estatal Russo de São Petersburgo, e o Cly Reis já havia
comentado aqui quando da passagem da mesma pelo Rio de Janeiro. Com
curadoria de Evgenia Petrova e Joseph Kiblitsky, conta com
obras-primas da arte pop, do neoexpressionismo alemão, do
fotorrealismo e outros movimentos de arte a partir dos anos 1960 até
hoje.
Boquiaberto com a obra
coassinada por
Basquiat e Warhol
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Fora
os já citados, havia artistas que gostamos muito e de significância
para nosso universo ideológico, como o norte-americano Roy
Lichtenstein, numa gigante serigrafia pop art com clara
referência a Dalí e De Chirico; o alemão Joseph Beuys, cuja
escultura em bronze de 1949 (“Mulher animal”) traz seu
característico toque sarcástico; e o sueco Claes Ondenburg, a quem
Leocádia já conhecia me apresentou a obra “Banana-splits e
sorvetes de degustação”, pequena instalação em gesso, cerâmica
e aço que mina tanto o consumismo quanto as indústrias bélica,
alimentícia e do sexo. Com outros, vimos pela primeira vez (Robert
Rauschenberg, Anselm Kiefer, Claudio Bravo, Julia Zastava e George
Baselitz, por exemplo). Uns interessantes, outros, nem tanto; mas, de
um modo geral, bem legal. A começar pela impressionante tela a óleo
“Cabeça de criança” (1991), de Gottfried Helnwein, com 6,50m
tomados de hiperrealismo, que já nos saltara aos olhos no belo pátio
interno do prédio.
Escultura de Beuys,
sempre contundente
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No
entanto, o que realmente nos impactou foram os mestres. Já na
primeira sala após a entrada, deparamo-nos com um enorme Picasso, o
óleo sobre tela “Cabeças grandes”, de 1969. Emocionante, de
tirar o fôlego. Tivemos certeza de estarmos diante de um feito
histórico, o que até agora, de certa forma, ainda não nos
recobramos. Afinal, ver um Picasso ao vivo é sempre uma experiência
incrível – só havia tido essa oportunidade em apenas duas
ocasiões no passado. Pintura que alia a natureza
figurativo-geométrica do cubismo a uma tocante liberdade no traço e
nas paletas dignas de um artista apaixonado por sua profissão e
totalmente maduro (o catalão morreria dali a apenas 4 anos). A
sensação de choque seguiu-nos logo ao lado: um Warhol, um retrato
do próprio Ludwig, imagem, inclusive, usada na arte oficial da
mostra. Uma serigrafia bem a seu estilo, com toques cubistas no corte
da figura em linhas geométricas, construindo-a em blocos de cores e
implicações psicológicas distintas, além de seu peculiar traço
(provavelmente, em giz) pincelando algumas linhas do desenho.
As simbólicas e nefastas taças de sorvete de Ondenburg |
Mais
adiante, na terceira sala, ainda não refeitos do impacto de ver
essas peças, assim mais um Lichtenstein, um Beuys e outros bem
interessantes, uma nova maravilha: outro enorme óleo sobre tela,
este fruto da parceria entre Basquiat e Warhol, de 1984, ambos já
nos seus últimos anos de vida. Numa palavra: impressionante. Toda a
violência, inquietação e poesia do neo-expressionismo de Basquiat,
expostos sem concessões nas imagens borradas e inconclusas; nos
escritos que ora se completam, ora são propositadamente rabiscados;
nas figuras cadavéricas e sofridas; na referência ao grafite e à
arte urbana; na repetição doentia de elementos e símbolos. Tudo
isso, se mistura com naturalidade ao já mencionado traço warhiano:
a combinação vermelho-azul da raiz da pop art; o uso de
signos da publicidade e do cartoon. Os dois artistas conseguem
realizar uma feliz junção de referências, estilos e escolas: o
jovem Basquiat, com sua genialidade a serviço de uma desenfreada
busca inconsciente; e Warhol, experiente, doente e muito mais vivido
que o companheiro e cujas marcas que a vida impusera (boas e ruins)
se transportavam para as obras dessa última grande fase de sua
carreira.
A modelo Claudia Schiffer
em foto de Gunter Sachs
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Visto
esses, o resto era só aproveitar. Já estava garantida a visitação.
Ainda tivemos a oportunidade de ver a clássica “Cleópatra Claudia
Schiffer”, foto publicitário-artística do alemão Gunter Sachs
que virou referência nas revistas de moda nos anos 90. Enfim, uma
boa indicação que recebemos e que fazemos a quem estiver ou for à
gostosa Beagá.
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Visões
na Coleção Ludwig
Visitação
até 20 de outubro, de quarta a segunda das 9h às 21h
Local:
Centro Cultural Banco do Brasil Belo Horizonte - CCBB
Praça
da Liberdade, 450 – Funcionários - Belo Horizonte - MG
Ingresso:
gratuito
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