Ilusão visual e dicotomia na obra de Damasceno |
Numa passagem rápida pelo Santander Cultural, o qual não
visitava fazia muitos meses, Leocádia Costa e eu vimos a exposição “Plano de Observação”, do badalado
artista visual carioca José Damasceno.
Um pouco por causa da própria badalação – muitas vezes exagerada ou até
injustificável nesses histéricos tempos atuais –, além do fato de serem somente
instalações – o que poderia ser apenas para mascarar a falta de aptidão em
outras técnicas mais apuradas das artes plásticas, falta que também comumente
se vê por aí –, confesso que fui com certa precaução.
Sem necessidade, pois a curta mas exuberante exposição de
Damasceno é bastante assertiva e interessante por, justamente, transpor essas
outras técnicas da arte (pintura, escultura, desenho) para o conceito 3D da
instalação. Ou seja: aquilo que na maioria dos casos se espera de uma boa obra
de instalação: poder enxergar a tradição da arte retransformada naquela composição
visual moderna. No caso das obras de Damasceno, estas te colocam numa zona que
a curadora da mostra, Lígia Canongia, diz com acerto no texto de abertura:
“entre a realidade objetiva e uma perspectiva fantasmática”. Isso porque,
escultor por princípio, ele cria espaços simbólicos que geram cruzamentos entre
esses polos dicotômicos.
Na prática, é fácil entender tais atribuições teóricas. Basta
observar por mais de um ângulo a obra
Tal perspectiva metalinguística que a obra de Damasceno suscita
é fortemente percebida nos outros sete trabalhos expostos, principalmente em
“Monitor Crayion” (2012-2014), quadro no qual ele compõe a “pintura” justamente
com aquilo que produz o traço: gizes de cera, dispostos de forma semialeatória
sobre uma grande tela sustentada em madeira e aço. A sensação de ilusão visual
se repete através do gigantismo de “Poco a Poco”, em que cinco desenhos
abstratos são montados lado a lado apenas por adesivos de vinil preto redondos,
os quais são perceptíveis em sua natureza bruta apenas quando mirados de perto.
Bastante interessante também é a crítica e sarcástica “Mass
media para modelar”, uma sala de aula com “carteiras” e “quadro negro” onde os
alunos são meras deformações inanimadas feitas de massas de modelar. Ainda, os
volumes densos de “Cinemagma” (estopa, madeira e vidro, 2000), que invadem o
salão central do espaço, criam uma sensação de estranheza e certo pavor, haja
vista que, pelo menos a mim, remetem àqueles organismos gosmentos e radioativos
dos filmes de terror B cujo crescimento e perigo são incontroláveis. “Monitor”,
quadro feito apenas em lã, e “Parábola”, um interessante “desenho” composto em
mármore que parece, ao mesmo tempo, o mapa de uma cidade medieval, uma trilha
de peças de dominó e um entremeado de tecidos, impressionam antes de qualquer
coisa pelo seu desenho, os quais dão origem aos outros formatos que dele
decorrem.
Como a curadora descreve, José Damasceno nos leva a “uma
topologia inesperada, em um movimento das dimensões ‘normais’ do tempo, do
espaço e da representação”. De fato, pois, instigantes e significadas para além
de seu próprio “corpo”, tudo na obra de Damasceno depende do “plano de
observação” que o olhar de cada um dará.
Detalhe de Observaton Plan, remete às pinturas das cavernas |
A impressionante e fantasmagórica Cinemagma |
Metalinguagem no quadro feito com gizes de cêra colados |
A instigante Mass Media Para Modelar |
Quadro Monitor, feito em lã |
Leocádia observando por outro ângulo a obra montada com lápis |
texto e fotos: Daniel Rodrigues
“Planos de
Observação” de José Damasceno
onde: Santander
Cultural (Rua Sete de Setembro, 1028 – Centro Histórico – Porto Alegre/RS)
quando: até 26 de
julho, terça a sábado, das 10h às 19h, e domingos e feriados, das 13h às 19h
entrada: gratuita
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