Curta no Facebook

quinta-feira, 16 de outubro de 2025

Banda Black Rio - Blues Bossa Jam Session POA - Teatro do Bourbon Country - Porto Alegre/RS (1º/10/2025)

 

Sonho realizado. Ao longo dos anos, ver a Banda Black Rio, desde que a banda voltou, no final dos anos 90, e passou a se apresentar mais, tornou-se mais do que um desejo, mas um desafio. Isso porque, das várias vezes que viajamos ao Rio de Janeiro, nunca coincidia de pegarmos um show deles. Ou tinham se apresentado antes ou se apresentariam depois de retornarmos a Porto Alegre, onde, aliás, nunca tinham vindo. Essa realidade mudou com a primeira descida da Black Rio à capital gaúcha, dentro do projeto Blues Bossa Jam Session POA, quando pudemos Leocádia e eu conferi-los numa concorrida e feliz noite no Teatro do Bourbon Country. E foi uma festa.

Com uma considerável presença de um público preto – coisa meio rara em Porto Alegre, ainda mais de pessoas pretas de bom nível social – e bastante aguardados pelos gaúchos - que, como nós, queriam muito vê-los há muito tempo - a Black Rio subiu ao palco comandada por seu cabeça, o tecladista William Magalhães, responsável pela retomada do mítico grupo fundado por seu pai, o precocemente falecido Oberdan Magalhães, este, um dos maiores músicos que o Brasil já teve. 

Cumprindo muito bem a missão de prosseguir com a arte maior da Black Rio, com o groove inconfundível da grande banda da história da soul brasileira, William e seus competentes companheiros músicos começaram com alguns números do seu clássico álbum, “Maria Fumaça”, de 1977. Este marco na história da música brasileira conquistou, mesmo sem vocal ou letra, crítica e público, chegando a ser trilha de abertura de novela da Globo (“Locomotivas”, aliás, a primeira a conseguir esse feito). Foi a música que dá título ao cultuado primeiro disco da Black Rio, inclusive, que iniciou a apresentação. Um desbunde total de musicalidade, mas um pouco atrapalhado pelas as falhas técnicas no som tanto do teclado, que mal se ouvia no início, mas principalmente da guitarra. Não dava para ouvir direito justamente o marcante riff com som ecoado da guitarra. Uma pena.

Depois desse número inicial, o som melhorou, mas ainda apresentava algumas falhas, com William tendo que chamar o roadie algumas vezes para resolver problemas. Imagino que seja um pouco difícil equalizar satisfatoriamente todos os instrumentos para uma banda como a Black Rio, em que cada mínimo som é importante para o contexto sonoro. Porém, é inexplicável que não se tenha testado e ajustado isso tudo antes. Mas, tudo bem. A festa prosseguiu com outras três de “Maria Fumaça”: a estonteante “Mr. Funky Samba”, bem como as não menos impressionantes “Leblon Via Vaz Lobo” e “Casa Forte”.

Após estas, entrou no palco o ótimo cantor Marquinho Osócio, integrante oficial desde o começo dessa segunda fase, marcada pelo lançamento do álbum “Movimento”, de 2001. Embora muito competente, o show seguiu praticamente só com as músicas “novas”, o que poderia ter sido um pouco diferente em se tratando de uma estreia em solo gaúcho. O público, maior parte formada por fãs dos tempos antigos da Black Rio, esperavam, se não mais músicas de “Maria Fumaça”, como “Na Baixa do Sapateiro” e “Baião”, pelo menos coisas dos outros dois discos da fase clássica, “Gafieira Universal”, de 1978 (“Chega Mais”, “Samboreando”, “Expresso Madureira”, quem sabe) e “Saci Pererê”, de 1980, em que podiam ter resgatado o lindo reggae que lhe dá título feito por Gilberto Gil especialmente para o conjunto, ou “De Onde Vem” e “Amor Natural”, todas em que o vocal de Osócio se encaixaria bem ao formato atual.

O sentimento de que podiam ter maior trato no set list, no entanto, não tirou o brilho do show. Do repertório recente, eles tocaram números como “Nova Guanabara”, “Carrossel”, “Sexta Feira Carioca” e “América do Sul”, sempre contagiando a plateia. Ainda teve maravilhosas interpretações de "Boa Noite", de Djavan, e de “Tomorrow”, de Cassiano, música responsável pela volta da banda em 1999, quando o célebre compositor de “A Lua e Eu” chamou a então inoperante Black Rio para tocar com ele na TV. 

Banda Black Rio tocando o mestre Djavan


Sonoramente falando, não se escuta mais tanto o baixo imponente como era o de Jamil Joanes antigamente. E há de se entender, haja visto que nada se compara ao som tirado por aquele baixista, cheio e ondulante. No arranjo atual, então, William e sua turma decidem equilibrar mais os teclados, a percussão e os metais, além de dar maior peso à melodia de voz. E tudo bem, uma vez que a formação atual é esta – e também porque, convenhamos, é impossível reproduzir o estelar time Oberdan, Jamil, Cristóvão Bastos, Cláudio Stevenson, Luiz Carlos e Barrosinho tocando juntos novamente. Nessa configuração do grupo, além de William, um fera, destaque para o trio dos sopros – Feldeman (trombone), LG (trompete) e Marlon Cordeiro (sax) – e para o excelente percussionista Marcos César. 

Mais para o fim, rolou uma lindíssima versão de “Mistério da Raça”, de Luiz Melodia, tocada por uma Black Rio com a autoridade de quem formava originalmente a banda de Melodia no álbum “Nós”, de 1980. No encerramento, outra obra a qual somente eles mesmos poderiam tocar com a dignidade de quem também escreveu aquela história: o hit “Sossego”, de Tim Maia, gravada pelo “Síndico” com eles no delirante “Tim Maia Disco Club”, de 1978.

Sim: sonho realizado de ver a Black Rio! Esses verdadeiros criadores do brazillian jazz, os caras que representam no nome mais do que uma banda, mas um movimento! Uma instituição da música brasileira. A Black Rio não é sé esse patrimônio cultural, mas uma prova viva da resistência negra e de sua cultura. Em uma entrevista tempo atrás, William disse ter orgulho de seguir a profissão e a própria banda fundada pelo pai. “Me sinto um herói da música preta”, disse ele. Concordamos plenamente. 

🎶🎶🎶🎶🎶🎶🎶🎶🎶


A brilhante e resistente Black Rio entre no palco


Tocando clássicos instrumentais do disco "Maria Fumaça"


Um trechinho de "“Leblon Via Vaz Lobo”, 
do repertório antigo


William Magalhães comanda seu timaço de músicos


Marquinho Osócio entra para animar ainda mais a festa


Muito groove samba-soul no Bourbon Country


A contagiante "Sossego", hit de Tim Maia, 
que encerrou o espetáculo


Momento de agradecer a acolhida
- e nós, o belo show da lendária Black Rio



texto: Daniel Rodrigues
fotos e vídeos: Daniel Rodrigues e Leocádia Costa

Nenhum comentário:

Postar um comentário