Enquanto alguns brasileiros saíram à rua este ano pedindo incrivelmente
a volta da ditadura, os argentinos continuam lambendo as feridas que os anos de
intervenção militar deixaram naquele país. Esta discussão está presente no
cinema argentino que não foge da raia e vem com mais um grande exemplo de como
o golpe militar interferiu na vida da população. “Kóblic” é o novo filme de Sebastián
Borenztein (“Um Conto Chinês”).
Nele, o onipresente Ricardo Darín interpreta Tomás Kóblic, um capitão
da marinha que se recusa a abrir as portas de um avião para que se pudessem
jogar os opositores do regime no mar, prática que ficou conhecida durante a
intervenção militar naquele país. Para evitar a perseguição de seus colegas de
armada, Kóblic se esconde em um lugarejo do interior chamado Colonia Elena. Mal
sabe ele que será alvo da ira de Velarde (Oscar Martinez), o delegado da cidade
que tem íntimas ligações com o regime militar. Ao mesmo tempo, Kóblic se
envolve com a mulher de um comerciante da cidade (Inma Cuesta), tornando sua
permanência na cidade ainda mais perigosa.
Oscar Martínez é o delegado
com íntimas relações com o regime militar
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O diretor Sebastián e seu co-roteirista Alejando Ocon mantém o clima de
suspense durante todo o filme e ainda dão um pequeno toque de faroeste num
duelo final entre os protagonistas. Algumas críticas dão conta de que “Kóblic”
perde sua intenção no final, quando se transforma de um filme de denúncia
política a um banho de sangue a la Sam Peckinpah. Na verdade, a violência da ditadura argentina esteve sempre pronta
para explodir durante todo o filme.
O clímax é apenas consequência do que os personagens vivem na tela.
Como sempre, Darín está excelente, sabendo dosar sua performance com as devidas
emoções. Já Oscar Martinez consegue compor um vilão de polícia do interior,
sempre perseguindo o forasteiro que veio trazer balbúrdia á sua pacata cidade,
enquanto Inma Cuesta dá credibilidade à sua Nancy mas tem pouco a fazer durante
o filme. Novamente, o cinema argentino dá mostras de seu vigor e de que não há
tema tabu em suas telas.
trailer "Kóblic"
por Paulo Moreira