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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

cotidianas #704 - Pílula Surrealista #44

 

Não fazia muito que havia chegado ao trabalho. Mal engatara o ritmo dos afazeres e recebeu uma ligação. Do vizinho:

- Seu Nestor, sua casa foi embora.

- Como assim, “foi embora”?!

- Sim, seu Nestor, foi embora. Saiu voando.

- Mas como isso?

- Sim, saiu voando. Como diz naquela música, "Bateu asas e voou" - tentou soltar uma brincadeira, mas logo recompôs-se, pois percebeu nenhuma receptividade do outro lado. Então, continuou com o relato:

- Tem acontecido bastante. O senhor não tem visto no noticiário? Já teve uma porção de casa que aconteceu isso aqui na cidade, aí pelo interior, por tudo. Não vou lhe mentir, mas a casa da minha cunhada em...

- É, ouvi falar que tem acontecido, sim... Poxa, mas a minha casa? O que eu fiz pra merecer?

O silêncio do outro lado da linha por parte do Sr. Ivo, aposentado boa-praça, mas sempre pronto para fuxicar a vida dos vizinhos, dava a entender que a ligação se prestava somente para aquele aviso específico. O que Nestor deveria fazer ou o que não fez com sua própria casa era, definitivamente, problema deste. Entendendo, Nestor agradeceu e desligou o telefone.

Ficou pensativo em sua cadeira enquanto os colegas seguiam em seus ritmos de afazeres o qual ele havia se obrigado a parar por alguns instantes. Sinal dos tempos, talvez uma evolução em mil devoluções isso das casas voarem. Não mais a cansativa lógica de pessoas que cansam de um lugar e o abandonam. Agora, são os lugares que deixam para trás quem os dominava em busca de outros donos.


Daniel Rodrigues

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