"Poucos artistas mostram sua alma e seu coração
com tanta beleza quanto Nelson Cavaquinho
mostra a sua nos seus sambas"
Sérgio Cabral, pai
jornalista e pesquisador musical
(trecho do texto da contracapa original de 1972)
Ele foi o sambista
dark, o compositor das trevas, o seresteiro soturno. Seria ele uma espécie de
Robert Smith do samba, um Allan Poe do morro, um Augusto dos Anjos da música? Exageros à parte, mesmo em um universo tão comumente marcado por dores, desgostos, abandonos, tristezas como é o da música brasileira, o carioca Nelson Cavaquinho conseguiu se sobressair no que diz respeito ao pessimismo. Não só pela temática, constantemente abordando assuntos como morte, fim, sombras, medo, mas muito também ajudado pela sua voz cadavérica, macabra, parecendo moribunda, arrancada do último suspiro do peito.
Embora já conhecido nos meios de samba desde os anos 30, tendo sido gravado por diversos artistas da música popular brasileira, Nelson Cavaquinho foi um daqueles casos de artistas que, como intérprete, foi aparecer bastante tarde, lá pelos final dos anos 60, tendo gravado, então, somente em 1970 seu primeiro álbum.
Destaco aqui, no entanto, seu segundo trabalho, que provavelmente reúne suas maiores preciosidades, a compilação
"Nelson Cavaquinho - Série Documento", que na verdade é uma variação de disco de estreia, só que lançado por outra gravadora. O álbum traz a mórbida "Quando Eu Me Chamar Saudade"; "Palhaço", com sua quase angustiante dicotomia alegria-tristeza sendo, logicamente vencida pelo último sentimento; o clássico "A Flor e o Espinho" com seu misto de beleza e melancolia ; e a minha favorita, "Tatuagem", ressentida, magoada, machucada ao extremo. Tudo triste, arrasado sombrio. Nem a exaltação, "Sempre Mangueira", mais animada, bem raiz, bem fundo-de-quintal, consegue deixar de mencionar a tão aguardada morte. Se tem um clássico que falta nessa verdadeira galeria de pérolas é a excelente "Juízo Final", que já havia sido escrita mas que só apareceria no seu disco seguinte, "Nelson Cavaquinho" (1973), mas a ausência não desvaloriza em nada este álbum que é verdadeiramente um documento da discografia nacional.
Um dos artistas fundamentais da música brasileira, ímpar no jeito de tocar o violão (curiosamente, não o cavaquinho), singular por sua voz peculiar e ainda hoje insuperável na capacidade de expressar a dor de uma maneira tão intensa.
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FAIXAS:
01 – Quando Eu Me Chamar Saudade (Nelson Cavaquinho / Guilherme de Brito)
02 – Tatuagem (Nelson Cavaquinho / Guilherme de Brito)
03 – Eu e as Flores (Nelson Cavaquinho / Jair do Cavaquinho)
04 – Palhaço (Nelson Cavaquinho / Osvaldo Martins / Washington)
05 – Sempre Mangueira (Nelson Cavaquinho / Geraldo Queiroz)
06 – Deus Não Me Esqueceu (Nelson Cavaquinho / Ananias Silva / Armando Bispo)
07 – A Flor e o Espinho (Nelson Cavaquinho / Alcides Caminha / Guilherme de Brito)
08 – Degraus da Vida (Nelson Cavaquinho / César Brasil / Antônio Braga)
09 – Noticia (Nelson Cavaquinho / Nourival Bahia / Alcides Caminha)
10 – Lágrima Sem Juri (Nelson Cavaquinho / Fernando Mauro)
11 – Luto (Nelson Cavaquinho / Sebastião Nunes / Guilherme de Brito)
12 – Luz Negra (Nelson Cavaquinho / Amâncio Cardoso)
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Ouça:
Nelson Cavaquinho Série Documento
por Cly Reis