Luzes da Cidade (O Passageiro) foto: Cly Reis |
- Já vou, já vou.
Beto esperava impaciente, já posicionado ao lado da porta.
- Vamos, Mari! - insistiu, diante da persistência da demora.
- Tô indo! Que pressa! - reclamou ela aparecendo no estreito corredor do apartamento, segurando algumas garrafas cheias de um líquido amarelado e com trapos enfiados nos bocais.
- O que que é isso? - interpelou Beto um tanto incrédulo do que estava vendo.
- Temos que estar prontos, Beto. - disse ainda com um pedaço de trapo na boca - O inimigo é implacável. Temos que estar prontos pra tudo.
- Mari, eu falei que é uma manifestação pacífica. PA-CÍ-FI-CA!
- Diz isso pra eles, diz. Vai lá e argumenta quando eles estiverem te descendo a borracha.
- Não vai ter borracha coisa nenhuma. Não vai ter essas tuas coisas também. A gente só vai lá, estica as faixas, os cartazes, marcha até o local, grita aquelas palavras de ordem que a gente combinou e pronto.
Mari parou olhando fixamente para Beto com os braços caídos ao lado do corpo, em desânimo, com uma garrafa em cada mão.
- Agora larga isso aí e vamos.
Contrariada, deixou as garrafas no canto atrás da porta e saíram para a passeata.
**********
O povo bradava com os punhos cerrados e erguidos.
No meio da multidão, Beto parou com os gritos de guerra e olhou para o lado.
Mari não estava mais ali.
Vasculhou tudo apressadamente em volta, virando o pescoço para um lado e para o outro, quando finalmente a avistou lá na frente. Estava à frente da primeira fileira de manifestantes e a apenas alguns passos da tropa de choque. Levava em uma das mãos um pequno bloco de paralelepípedo de granito.
Antes de avançar contra a barreira de escudos policiais, ela ainda olhou para trás e gritou, "Desculpa, Beto, mas a mudança não vai acontecer com palavras bonitas".
Arremessou a pedra...
- Viva la Revolución!
Cly Reis
O governador se ajeitou no trono e encarou o homem à sua frente com um olhar sentencioso.
- Chegou a meus ouvidos que teria sido ideia tua aplicar a tal poção bizantina em um dos condenados.
O centurião, um tanto embaraçado, hesitou um instante mas confirmou:
- Sim, meu senhor..., a sugestão foi minha.
Novamente acomodando-se no trono, desconfortável, incomodado, o governador da Judéia, claramente impaciente, lançou ao centurião:
- E não te passou pela cabeça, em nenhum momento que DANDO AQUELES PODERES A UM INDIVÍDUO QUE JÁ ERA ADORADO, IDOLATRADO, ELE PODERIA FICAR AINDA MAIOR COM TUDO ISSO? - aumentando gradativamente a voz até terminar a frase praticamente num berro.
- Eu... eu considerei que deveríamos testar antes de dar aos nossos soldados e... pensei que fosse melhor dar a um condenado pacífico do que àqueles outros, bandidos, assassinos... se tivesse algum outro efeito, se ficasse violento, seria mais fácil de controlar e...
- ... E então ele resiste a mais castigo e torturas do que qualquer outro homem resistiria, revive dias depois e ainda assim pareceu uma boa ideia? - completou interpondo-se na frase do subordinado.
O legionário não soube o que responder.
- Bem, - tentando acalmar-se - ao menos agora temos a certeza que a tal poção para o super-soldado romano funciona. Nossos homens ficam mais resistentes, suportam qualquer dor e, principalmente, não podem ser mortos.
- Sim, meu senhor... Embora não tenhamos certeza de quanto tempo podem viver depois de retornarem da morte, creio que a experiência foi positiva. - argumentou o centurião, um pouco aliviado.
- Tragam aqui o alquimista bizantino, ou seja lá como chamam aquilo que ele faz. - ordenou o governador Pilatos a um dos soldados que guardava a porta.
O governador da judéia bebeu um gole de vinho e, enquanto aguardava o retorno do soldado trazendo o místico, voltou a dirigir-se ao centurião:
- Quero, então que dê a solução para todos os soldados. Mandem esse hierofante ou seja o que for preparar a fórmula. Dêem-lhe o que for preciso para produzir para todos nossos homens.
- Sim, meu senhor. - assentiu o militar.
- Quanto ao judeu, - prosseguiu com as ordens - localizem-no, dêem um fim nele e certifiquem-se de que todos que o viram vivo não possam confirmar o fato.
Neste momento, quase correndo entrou pela porta o soldado, com uma aparência pálida e olhos arregalados.
- O que foi? - quis saber o governador - Onde está o homem?
- Sumiu, meu senhor.
- Como assim sumiu? Alguém deixou que ele fugisse? Abriram sua cela, foi isso?
- Não, meu senhor... Sumiu! Evaporou...
- Como 'evaporou'? - duvidou o nobre - Isso é alguma espécie de brincadeira? Vou mandar te crucificar e ao responsável por essa troça!
- Eu juro, meu senhor, eu juro. Se desfez como fumaça, passou entre as grades, voou pela janela, se espalhou pelo ar...
- Centurião Flávio Augusto, leva este homem. Crucifiquem-no e a todos envolvidos nessa galhofa!
- Sim, meu senhor. Ave, Tibérius! - E saiu segurando o soldado pelo braço sem resistência alguma.
Novamente sozinho no salão, em seu trono, Pôncio Pilatos recostou-se reflexivo. O estrago já estava feito: eles endeusariam o tal nazareno, o seguiriam incondicionalmente. Sabia que os tempos, a partir daquele momento seriam diferentes para Roma e seu Imperador. O mundo acabara de recomeçar.
Cly Reis
No instante seguinte, era Alice quem se entocava ali. Decidiu perseguir o Coelho Branco sem refletir sobre como sairia daquele buraco.
A toca tinha um trecho reto semelhante a um túnel. Depois, inclinava-se bruscamente para baixo, tão bruscamente que Alice não foi sequer capaz de pensar em frear. Simplesmente despencou em um poço de grande profundidade.
Alice caía, caía, caía... Será que aquela queda não acabaria nunca? — Então, de repente: plunct! Aterrissou em um amontoado de gravetos e folhas secas. A queda havia chegado ao fim.
Sem nenhum arranhão, ela se levantou em um instante. Olhou para cima, mas sobre sua cabeça tudo estava escuro. Atrás de Alice havia outra passagem longa, onde ainda se podia ver o Coelho Branco descendo bem depressa. Não dava para perder nem um segundo: lá foi a menina, veloz como o vento ainda a tempo de vê-lo fazer a curva. Alice estava perto dele ao fazer, mas o Coelho Branco já não podia mais ser visto. Sumira na escuridão de um salão comprido, baixo e mal iluminado.
De repente, de um ponto qualquer na escuridão do fundo do salão, viu surgir o Coelho que avançou lentamente para uma faixa um pouco mais iluminada onde ela podia distingui-lo melhor. Ele estancou a encará-la e Alice, por sua vez, o olhou com curiosidade.
De trás do Coelho Branco, também daquela treva, surgiram à luz algumas figuras no mínimo excêntricas: um tipo alto com uma cartola extravagante, um homenzinho baixo tão gordo que se assemelhava a um ovo, um par de gêmeos rechonchudos vestidos de forma rigorosamente igual, e um gato que a encarava com um sorriso sinistro na cara.
O Coelho, girando a corrente do relógio de bolso, e agora parecendo ignorar a presença da menina, depois de um angustiante período de silêncio, finalmente abriu a boca e falou: - Eu não disse que ela ia me seguir? Tá aí ela, gente. Podem descer a porrada.
...
A orientação é para que os retire do imóvel e retorne para a Central. Câmbio.
Não conseguem sair? Você também não consegue? Câmbio.
Eles estão lhe impedindo de alguma maneira, 65? Estão armados? Obstruíram os acessos, as aberturas? Câmbio.
...
Qual a sua localização, 65?
...
Rua da Providência..., sim, sei.
Ok. Aguarde reforços. Estamos enviando uma unidade para o local. Câmbio e desligo."
Por falar em ClyArt, ao longo do ano tivemos, como sempre, dividindo espaço com dicas, mostras e exposições, nossa produção artística individual, fosse em tinta, grafite, digital, fotografia ou vídeo. Também tivemos as artes produzidas para publicações da seção Cotidianas, ilustrando contos, crônicas ou poemas e as tradicionais chamadas para as mídias sociais, sempre criativas e muito visuais, divulgando o blog e suas atrações.
Querem relembrar como foi? Dêem uma olhada aí abaixo e confiram o que rolou aqui, visualmente, no ano que passou:
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O ClyArt continua abrigando todo tipo de possibilidades artísticas: aqui, a ilustração a grafite "City Fog", de Cly Reis |
Teve Copa do Mundo feminina em 2023! Nosssas meninas não foram tão bem mas relembramos dois grandes momentos delas no ClyARt em ilustrações digitais. |
A música brasileira homenageada com ilustrações digitais que imaginam como seria se nossos artistas de MPB fossem herois, personagens de cinema, se as músicas fossem HQ's, filmes... |
Astros pop também lembrados no nosso ClyArt. |
A primeira imagem feita a partir de I.A. no ClyBlog, produzida para o conto "Dulce", nas nossas Cotidianas |
Ilustração digital para a música "Bebeto Loteria", no cotidianas do ClyBlog |
Mais uma feita para o Cotidianas: arte produzida para o conto "Aberração" |
Arte inspirada na canção Gothan City, de Jards Macalé, que, na imagem, controla, impávido, a cidade, lá do alto. |
No Dia da Consciência Negra, homenageamos esses sambistas maravilhosos que levam a música negra para todos so brasileiros |
As chamadas para a seção Ábuns Fundamentais, produzidas no ano passado. |
E duas novas chamadas para a seção Lido |
Campanha de aniversário do ClyBlog. Aqui, alguns dos banners |
Em 2022, depois de muito tempo criamos nosso logo para seção de tirinhas. Tirinhas qualquer um tem, mas clytOOn, só o ClyBlog. |
No ano que passou, chegamos à octagésima centésima publicação da seção Cotidianas e para a ocasião especial, "roupa" especial. |
Logo do ClyBlog para a Copa do Mundo feminina, disputada na Autrália e Nova Zelândia, usado nas postagens relacionadas a futebol e ao torneio. |
Dentro do Clyblog, se tem um logo que está sempre mudando é o do ClyArt. Ele se molda conforme a arte, o artista, a exposição, e aí vão algumas mostras dessa constante mutação. |
O próprio logo do blog é inquieto, dinâmico, variável e, volta e meia, apresenta um visual diferente. |
Ano anos dos nossos 15, não poderíamos deixar de ter um logo especial de aniversário que, é claro, também adquiriu variações e se incorporou às marcas das seções do blog. |