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quinta-feira, 24 de março de 2022

"Duna", de David Lynch (1984) vs. "Duna", de Denis Villeneuve (2021)


Uma substância valiosa e a disputa pela administração e a exploração desse produto no planeta onde ele é extraído está  no centro das ações de ambas as versões de "Duna". O duque Atreides é incumbido pelo Imperador para a tarefa de chefiar o planeta Arrakis, mas o que parecia ser uma honra e benefício mostra-se, na verdade, uma armadilha tramada pelo Império com os perigosos Hakkonen para eliminar o duque e seu filho, o jovem Paul Atreides que, gerado da relação com uma bruxa, tem atributos um tanto especiais que se acentuam ainda mais quando o jovem chega a Arrakis. Seus talentos, sua sensitividade, seus poderes que ele própro não domina completamente, mostram-se fundamentais, especialmente depois que seu pai é traído e morto pelos Hakkonen, e o rapaz, fugitivo, é obrigado a se isolar no deserto com sua mãe, se aproximando a cada momento, a cada passo, de uma profecia que anuncia um "escolhido" que liderará o povo de Arrakis e acabará com a tirania do Império.
Não estou entre os tantos que deploram a adaptação de David Lynch, de 1984, para o romance de Frank Herbert. O filme tem bom elenco, com Jürgen Prochnow, de "O Barco", Sean Young, de "Blade Runner", Max Von Sydow, de "O Sétimo Selo", Patrick Stewart, que viria  estrelar a saga "Star Trek", o astro pop Sting, e Kyle McLachlan que estrelava seu primeiro longa mas que seria, a partir dali, um dos atores preferidos de David Lynch. Os figurinos são incríveis, a direção de arte é bem impressionante, os cenários muito interessantes, a fotografia, na maioria das vezes, é bem competente, e além de tudo isso, a trilha sonora ficava por conta de Toto e Brian Eno.
O grande problema do filme de Lynch foi a parte técnica. Os efeitos especiais, para um filme de ficção científica e com o bom orçamento que teve, são, no mínimo decepcionantes. Mesmo se levando em consideração a época, as limitações técnicas, a primariedade de alguns recursos, eles são, em determinados momentos, quase risíveis. A armadura, por exemplo, que envolve o corpo dos guerreiros de Atreides, uma espécie de campo de força, é simplesmente ridícula. Uma animação geométrica constrangedora. E não me venham dizer que era o que dava pra fazer em 1984 porque, àquelas alturas, já tinham sido feitos três "Star Wars" (1977, 1980, 1983), "Blade Runner" (1982), dois "Superman" (1978, 1980), só pra ficar em alguns, com efeitos visuais muito mais impressionantes e convincentes.
Mas se ficasse limitado a isso, dava pra dar um desconto. A narrativa é apressada, tem muito texto narrado, o que, ao invés de ajudar, atrapalha mais a compreensão, e a última meia hora é atropelada e confusa. Aí, o resto de boa vontade que podia-se ter com o filme de 1984, foi pro espaço.
O que podia ser um gol contra a nova versão de "Duna", que é o fato de não acabar a história (não estou dando spoiler pois todo mundo sabe que vão rodar uma sequência), acaba sendo positivo pelo fato de não correr com a trama pra resolver logo, como fez seu antecessor. O novo "Duna" usa mais tempo mas desenvolve bem a história, sem presa, com paciência, sem precisar recorrer a uma narração explicativa durante todo o filme, e ainda dá mais profundidade e destaque a alguns personagens subutilizados no primeiro, aproximando-os do espectador. Colabora para isso, também, o elenco, igualmente muito qualificado, como no original: Oscar Issac, de "Ex-Machina" e da nova saga "Star Wars", Rebecca Ferguson, de Doutor Sono" e da franquia "Missão Impossível", Jason Momoa ("Aquaman"l), a veterana Charlotte Rampling ("Coração Satânico", "Melancolia"), a carismática Zendaya, dos novos "Homem-Aranha", e, capitaneado o time, o grande queridinho do momento, Timothée Chalamet, de "Me Chame Pelo Seu Nome" e "Não Olhe Para Cima", ente outros, no papel do "messias" Paul Atreides.
A parte técnica, então, que era o ponto fraco do outro, é exatamente uma das maiores virtudes do novo, com efeitos visuais e som espetaculares, não à toa indicados ao Oscar, além da fotografia, com seu visual sombrio e suas locações no deserto simplesmente impressionantes.

"Duna" (1984) - trailer


"Duna" (2021) - trailer


Elenco por elenco, vamos deixar no empate; protagonista por protagonista, também não vejo grande vantagem para ninguém; no entanto, na caracterização e desenvolvimento dos personagens, o remake salta na frente no placar. E, a propósito de desenvolvimento, o andamento do filme e sua estrutura garantem mais um para a nova versão. Os cenários e a direção de arte, os figurinos do primeiro garantem um tento para o time de 1984, contudo, a fotografia, magistral, do novo filme acabam com a alegria do antigo "Duna" que tem que buscar mais uma no fundo das redes. De um modo geral, os efeitos especiais do filme de Villeneuve são muito melhores, mais espetaculares e, sem dúvida representam um golaço para o time de 2022, embora tenhamos que fazer justiça para com os vermes do primeiro filme que também era muito impressionantes, mesmo para as limitações da época. Em compensação, o que os habitantes subterrâneos do deserto de Arrakis acrescentam de positivo, a tal armadura que envolve o corpo dos guerreiros, tira. Quase um gol contra.
Quanto aos caras da casamata, ou seja, os diretores, são dois maestros competentíssimos e, apesar de ser fã de David Lynch, tenho que reconhecer que, mesmo com um bom material humano, com um bom investimento, ele comete alguns erros que comprometem o desempenho final de seu time, ao passo que Denis Villeneuve conduz seu time com precisão, usa um esquema mais adequado para a situação de jogo e, assim, extrai o melhor de cada um de seus atletas.
Duna '84 foi indicado ao Oscar de melhor som mas sua refilmagem atual, além de ser indicada na mesma categoria, ainda recebeu nomeações para outras nove, incluindo melhor filme. Por aí já dá pra ter um pouco da ideia da diferença entre os dois filmes. Duna '21 está muitos anos-luz à frente.

Alguns pontos de comparação entre os dois filmes:
No alto, a Reverenda Madre da ordem das Bene Gasserit nas duas versões.
 original, à esquerda, mais requintada e exótica, e à direita, a nova, mais sobria.
Na segunda linha, o barão Hakkonen, o original típico das bizarrices de David Lynch,
o outro, mais sério, sinistro é mais fiel ao livro.
Em seguida, os vermes do deserto, a esquerda o antigo e à direita, o novo.
Apesar das deficiências dos efeitos visuais do primeiro filme, os vermes de David Lynch se salvam 
e até se destacam como uma das coisas boas do filme.
Em compensação o escudo virtual do primeiro filme, à esquerda, na quarta faixa, é lamentável,
enquanto o outro, da nova versão. é meramente discreto, mas funciona melhor visualmente.
E para finalizar, os dois Paul Atreides.
Kyle McLaclan, do primeiro filme, não decepciona e vai bem no papel e a derrota não passa por ele,
 bem como o queridinho do momento, Timothée Chalamet, que se não é brilhante , não compromete também. 






Cly Reis 

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

Oscar 2022 - Os Indicados


"Ataque dos Cães" e "Duna" vislumbrando o Oscar no horizonte.

Depois de muita especulação acerca de quem já ganhara Globo de Ouro, BAFTA e outros prêmios indicativos, saiu a tão esperada lista do Oscar que, a bem da verdade, confirmou a maioria das expectativas. "Ataque dos Cães", de Jane Campion, como era esperado, por suas inúmeras qualidades, leva um monte de indicações, "Duna" se impõe nos prêmios técnicos, embora também figure em outras categorias, a encantadora animação da Disney, "Encanto" disputa o prêmio em sua categoria, tem tema de James Bond disputando para trilha original, e "Belfast" e "Amor Sublime Amor" pintam como aqueles que podem roubar a cena. 

No mais, uma certa surpresa pela não indicação de Lady Gaga a melhor atriz, da mesma forma que surpreende um pouco a indicação de Kirsten Stewart, ignorada em outras premiações. Havia uma expectativa sobre como a Academia lidaria com o badalado e discutido "Não Olhe Para Cima" e, felizmente ele não foi ignorado, sendo nomeado para quatro prêmios, inclusive o de melhor filme e também para aquele que é seu maior mérito, o roteiro. Destaque também para a animação dinamarquesa "Flee" que disputa em três categorias, sendo elas, curiosamente, animação, filme estrangeiro e documentário, coisas aparentemente um tanto distantes uma da outra.

Como hoje em dia, com o streaming e as coisas chegando muito mais rápido às nossas casa, está mais fácil de ver os concorrentes, o negócio agora é preparar a pipoca, zapear os canais de filmes e aplicativos e começar a maratona de filmes. 

O Oscar é logo ali. A cerimônia está marcada para o dia 27 de março.


Confira, abaixo, todos os indicados em todas as categorias:


  • Melhor filme

"Belfast"

"Não olhe para cima"

"Duna"

"Licorice pizza"

"Ataque dos cães"

"No ritmo do coração"

"Drive my car"

"King Richard: criando campeãs"

"O beco do pesadelo"

"Amor, sublime amor"


  • Melhor direção

Kenneth Branagh - "Belfast"

Ryusuke Hamaguchi - "Drive my car"

Jane Campion - "Ataque dos cães"

Steven Spielberg - "Amor, sublime amor"

Paul Thomas Anderson - "Licorice Pizza"


  • Melhor atriz

Jessica Chastain - "Os olhos de Tammy Faye"

Olivia Colman - "A filha perdida"

Penélope Cruz - "Mães paralelas"

Nicole Kidman - "Apresentando os Ricardos"

Kirsten Stewart - "Spencer"


  • Melhor ator

Javier Bardem - "Apresentando os Ricardos"

Benedict Cumberbatch - "Ataque dos cães"

Andrew Garfield - "Tick, tick... Boom!"

Will Smith - "King Richard: criando campeãs"

Denzel Washington - "A tragédia de Macbeth"


  • Melhor atriz coadjuvante

Jessie Buckley - "A filha perdida"

Ariana DeBose - "Amor, sublime amor"

Judi Dench - "Belfast"

Kirsten Dunst - "Ataque dos cães"

Aunjanue Ellis - "King Richard: criando campeãs"


  • Melhor ator coadjuvante

Ciarán Hinds - "Belfast"

Troy Kotsur - "No ritmo do coração"

Jesse Plemons - "Ataque dos cães"

J.K. Simmons - "Apresentando os Ricardos"

Kodi Smit-McPhee - "Ataque dos cães"


  • Melhor filme internacional

"Drive my car" - Japão

"Flee" - Dinamarca

"A Mão de Deus" - Itália

"A Felicidade das Pequenas Coisas" - Butão

"A Pior Pessoa do Mundo" - Noruega


  • Melhor roteiro adaptado

"No ritmo do coração"

"Drive my car"

"Duna"

"A filha perdida"

"Ataque dos cães"


  • Melhor roteiro original

"Belfast"

"Não olhe para cima"

"King Richard: criando campeãs"

"Licorice pizza"

"A pior pessoa do mundo"


  • Melhor figurino

"Cruella"

"Cyrano"

"Duna"

"O beco do pesadelo"

"Amor, sublime amor"


  • Melhor trilha sonora

"Não olhe para cima"

"Duna"

"Encanto"

"Mães paralelas"

"Ataque dos cães"


  • Melhor animação

"Encanto"

"Flee"

"Luca"

""A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas"

"Raya e o último dragão"


  • Melhor curta de animação

"Affairs of the art"

"Bestia"

"Boxballet"

"A Sabiá Sabiazinha"

"The windshield wiper"


  • Melhor curta-metragem em live action

"Ala kachuu - Take and run"

"The long goodbye"

"The dress"

"On my mind"

"Please hold"


  • Melhor documentário

"Acension"

"Attica"

"Flee"

""Summer of Soul (...ou Quando A Revolução Não Pôde Ser Televisionada)"

"Writing with fire"


  • Melhor documentário de curta-metragem

"Audible"

"The queen of basketball"

"Lead me home"

"Três canções para Benazir"

"When we were bullies"


  • Melhor som

"Belfast"

"Duna"

"Sem tempo para morrer"

"Ataque dos cães"

"Amor, sublime amor"


  • Melhor Canção original

"Be Alive" - "King Richard: criando campeãs"

"Dos Oruguitas" - "Encanto"

"Down To Joy" - "Belfast"

"No time to die" - "Sem tempo para morrer"

"Somehow you do" -"Four good days"


  • Melhor Maquiagem e cabelo

"Um Príncipe em Nova York 2"

"Cruella"

"Duna"

"Os olhos de Tammy Faye"

"Casa Gucci"


  • Melhores Efeitos visuais

"Duna"

"Free guy"

"Sem tempo para morrer"

"Shang-Chi e a lenda dos dez anéis"

"Homem-Aranha: Sem volta para casa"


  • Melhor fotografia

"Duna"

"Ataque dos cães"

"Beco do pesadelo"

"A tragédia de Macbeth"

"Amor, sublime amor"


  • Melhor edição

"Não olhe para cima"

"Duna

"King Richard: criando campeãs"

"Ataque dos cães"

"Tick, tick... boom!"


  • Melhor design de produção

"Duna"

"Ataque dos cães"

"O beco do pesadelo"

"A tragédia de Macbeth"

"Amor, sublime amor"


C.R.


sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

“A Chegada”, de Denis Villeneuve (2016)



Reflexão. Isso me veio à mente assim que terminei de assistir a “A Chegada”. O longa não esconde nada. Mostra tudo, faz tudo na sua frente. Mas mesmo assim te surpreende e te coloca para pensar horas depois que ele acaba. O diretor, Denis Villeneuve, é um mágico, daqueles que faz o truque com cartas na sua frente. Você não percebe nada e fica chocado assim que termina a mágica. Que homem!
Quando seres interplanetários deixam marcas na Terra, a Dra. Louise Banks (Amy Adams), uma linguista especialista no assunto, é procurada por militares para traduzir os sinais e desvendar se os alienígenas representam uma ameaça ou não. No entanto, a resposta para todas as perguntas e mistérios pode ameaçar a vida de Louise e a existência de toda a humanidade.
Uma ficção-cientifica sobre alienígenas,
mas a mais humana dos últimos tempos
Apesar de ser um grande filme, seu segundo ato é meio cansativo. Quase escorrega quando começa a ir mais para o lado militar de que “só os Estados Unidos podem nos salvar”. Tá certo, estamos em Hollywood e é praticamente impossível fugir disso. Pelo menos o filme não cai na ação desenfreada e explosões.
Que roteiro, que direção, que filme completo! Enquanto você vai se preocupando com a possível invasão alienígena, outras coisas são jogadas na sua cara. Ao mesmo tempo, o longa é tão misterioso. Para se ter uma ideia, no início do segundo ato, já é revelada a forma dos aliens. Quanto às atuações, o destaque vai mesmo para Amy Adams. Ela brilha. O filme é dela. E não é uma personagem fácil. Todos os mistérios e peso da personagem, o drama que ela carrega, tudo é entregue com um grau de atuação espetacular.
Enquadramentos fabulosos
Mas o grande espetáculo fica por conta da parte técnica do filme. Denis Villeneuve mostra que está maduro e ser um dos diretores mais competentes da atualidade. As cores do filme dão um ar triste; a trilha sonora, sempre entrando nos momentos certos; e os enquadramentos dentro da nave, assim como os planos abertos mostrando as naves, são todos fenomenais. De roteiro impecável, assim como a montagem, a história tem seu próprio tempo. Viaja-se pelo passado, futuro e presente. Pode parecer confuso, mas no final, nos últimos 5 minutos você... BAAAM!... "Era isso?!", pensa-se. Que genial.
“A Chegada” é uma história de invasão alienígena de proporções globais, uma ficção-científica. Mas o que mais é importa são as coisas mundanas, do dia a dia, a construção e desconstrução de vínculos, a nossa dimensão frente ao imenso tempo e espaço. O filme te coloca para pensar, mas sem ser chato e expositivo. É claro e sincero com você, te apresenta algo de fora do planeta com um conhecimento macro, mas, ao mesmo tempo, falando de você, o micro.

por Vágner Rodrigues