O fato de apresentar o programa Música da Cabeça, na Rádio Elétrica, é
meio que mera desculpa minha para ir à cata de listas. Sempre gostei de criá-las a
partir das coisas que curto, das criteriosas às mais estapafúrdias. Uma dessas
que me veio à mente para usar no programa se refere a músicas que têm a mesma
melodia, mas letras diferentes. A parte musical e o arranjo podem ser
idênticos, mas o que é cantado, não. Às vezes, até melodias de voz e cantores
diferentes. Dois lados da mesma moeda ou - por que não? - do mesmo disco.
Numa rápida pesquisa de memória, o interessante foi perceber que essa
prática é comum nos mais diferentes gêneros, culturas e locais. Seja no Brasil,
nos Estados Unidos, na Alemanha, na Inglaterra ou até na Jamaica, não há quem
resista em usar aquela base que ficou superlegal de um outro jeito, numa
outra roupagem.
Pra compor esta lista de 15 + 1 exemplos, ainda contei com a ajuda de meu irmão e
parceiro de blog Cly Reis, que contribuiu com algumas das duplas de músicas as
quais não tinham me ocorrido.
Tom Zé e Tim: ambos com duas duplas de músicas na lista |
Igualmente, não se incluem canções “reprise” ou de letra mesmo que diferentes entre si, mas que se tratam de duas partes da mesma, nem mesmo versões para idioma diferente do original feita por outro artista. Músicas “irmãs”, tipo “Blue Monday” e “586”, da New Order, ou “Crush with Eyeliner” e “I Took Your Name”, da REM, não cabem, nem muito menos aquelas que samplearam a “alma” do tema que a inspirou, como o rap norte-americano costuma fazer. Essas todas ficam de fora – quem sabe, guardam-se para uma futura outra lista...
Do blues ao samba, do industrial a soul, do shoegaze ao psicodelismo.
Têm dobradinhas bem interessantes e variadas.
1. "João Coragem"/ "Padre Cícero" - Tim Maia
Em 1970, Tim estava gravando seu disco de estreia quando Nelson Motta aparece no estúdio e fica maravilhado com "Padre Cícero". Tanto que pediu para Tim e Cassiano alterarem a letra para a música entrar na trilha da primeira novela da Rede Globo, "João Coragem".
2. "Sister Midnight"/ "Red Money" - David Bowie
A fase berlinense rendeu coisas maravilhosas e simbióticas para Bowie. "Sister Midnight", composta por ele e Iggy Pop para abrir "The Idiot", de Iggy, de 1977, serviu para o próprio Bowie finalizar sua própria trilogia na capital alemã dois anos depois com outro título e letra.
3. "O Samba da Minha Terra"/ "365 Igrejas" - Dorival Caymmi
O mestre da "preguiça" baiana sabia muito bem fazer sambas geniais com pouquíssimos versos, quando não quase repetidos. Aqui, o que Caymmi repete é a parte instrumental idêntica a ambas, mas com melodias de voz e letras totalmente diferentes entre si.
"Strange Brew", que abre o cláscico disco "Disreali Gears", de 1967, é tão boa que dá vontade de reescutá-la. Não precisa, pois Clapton/Bruce/Baker a põem no fim do disco, só que com outro nome e letra.
5. "Mã"/ "Nave Maria" – Tom Zé
Uma mais percussiva, a outra mais world music, mas ambas de abertura de seus discos "Estudando o Samba", 1976, e "Nave Maria", 1984) e sobre o genial riff do baiano de Irará.
6. "Teenage Lust"/ "Heat" -
Jesus & Mary Chain
"Teenage Lust" é um clássico da banda que coroa uma fase inspirada, marcada pelo disco "Honey's Dead", de 1992. "Heat", por sua vez, está na coletânea de B-sides "Stoned and Detoned", de um ano depois.
7. "Alma Matters"/ "Nobody Loves Us" – Morrissey
Vindo de Moz, artista que produz muito, não seria estranho haver esse tipo de repetição. No caso, "Alma Matters", hit do disco "Maladjusted", de 1997, tem como sombra "Nobody..,", da coletânea "My Early Burglary Years", de 1998.
9. "Pocket Calculator"/ "Dentaku" – Kraftwerk
Totalmente iguais, não fosse uma ser cantada em inglês e a outra em japonês. Aí os alemães conseguiram fazer, pro disco "Computer World", de 1981, duas obras totalmente diferentes sendo a mesma coisa.
10. "Hang On To Your Ego"/ "I Know There's An Answer" - The Beach Boys
Quase iguais, não fosse o título e algumas partes da letra. Mesmo estando no mesmo disco, o clássico "Pet Sounds", de 1966, é tão bonita que não há nenhum problema em "reouvi-la" com pouca diferença entre uma e outra.
11. "Os Escravos de Jó"/ "Caxangá" – Milton Nascimento
A censura, que comeu praticamente todas as letras de "Milagre dos Peixes", de 1973, inclusive "Os Escravos de Jó", parceria de Milton com Fernando Brant, já havia abrandado um pouco anos depois quando Elis Regina gravou "Caxangá" e depois o próprio Milton.
12. "Graveyard"/ "Another" – P.I.L.
A instrumental "Graveyard", de "Metal Box" (1979), é, literalmente, a "Outra" em "Commercial Zone", disco de sobras de estúdio da mesma época. Coisas da cabeça conceitual de John Lydon e sua Public Image Ltd..
A instrumental "Graveyard", de "Metal Box" (1979), é, literalmente, a "Outra" em "Commercial Zone", disco de sobras de estúdio da mesma época. Coisas da cabeça conceitual de John Lydon e sua Public Image Ltd..
13. "Jimi Renda-se"/ "Dor e Dor" – Tom
Zé
A mente inquieta de Tom Zé faz com que, mais de uma vez, ele revisite a própria obra. Assim como "Mã"/"Nave Maria", a metaliguagem pega nestas duas também, de 1970 e 1972 respectivamente.
14. "Slave to the Rythmn"/ "The Fashion Show" – Grace Jones
O disco de Grace "Slave to the Rhythm", de 1985, em si, é todo cunhado sobre a mesma base, mas estas duas não não são iguais pela letra.
15. "With no One elseAround"/ "Pra Você Voltar" – Tim Maia
Tim não tinha vergonha de reaproveitar melodias suas mais de uma vez, mas aqui ele fez melhor: uma em inglês, para o arrasador álbum de 1978, e outra na língua de Camões, um ano depois ("Reencontro"), em que até o sentido das letras são totalmente diferentes.
Tim não tinha vergonha de reaproveitar melodias suas mais de uma vez, mas aqui ele fez melhor: uma em inglês, para o arrasador álbum de 1978, e outra na língua de Camões, um ano depois ("Reencontro"), em que até o sentido das letras são totalmente diferentes.
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+1. "À Flor da Pele"/ "À Flor da Terra" – Chico Buarque
O título é igual, "O que Será?", eu sei, mas o fato de o subtítulo ser diferente faz, com perdão da redundância, toda a diferença. Escritas por Chico para a trilha sonora de "Dona Flor e seus Dois Maridos", de 1976, uma inicia o filme e outra o encerra - e as letras são totalmente distintas.
cena final do filme "Dona Flor e Seus Dois Maridos" - tema: "À Flor da Pele"
Daniel Rodrigues
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