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quarta-feira, 17 de agosto de 2022

Lou Reed - Transformer

 



Lou Reed - Transformer - REIS, Cly
ilustração digital (GIMP)




Lou Reed - Teansformer
Cly Reis 
(ilustração digital inspirada no álbum
"Transformer", de Lou Reed, remetendo ao filme "Transformers")

quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

Lou Reed & John Cale - "Songs for Drella" (1990)


“Lou e eu tivemos uma conversa, e se tornou muito mais importante expor o que nós dois tínhamos [de relação com Andy Warhol], criando um show com apenas duas pessoas no palco, para que todos vissem nossa história. Achei que era mais importante – quase mais importante do que a música”.
John Cale

“O que você experimenta por meio desse registro é o relacionamento entre nós e Andy. Não se trata apenas de Andy; não é apenas, ‘oh! ele fez isso, ele fez aquilo’. Quando você experimenta ‘Drella’, é sobre John e eu, é sobre mim e Andy, e é sobre John e Andy. Queremos que você conheça melhor Andy Warhol, que você o sinta como John e eu o sentimos, para que você possa vivenciar a presença dessa pessoa única e incrível e se aproximar dela.” 
Lou Reed

Há quem contradiga o ditado de que “dois raios não caem no mesmo lugar”. Se for considerar a parceria entre Lou Reed e John Cale, essa máxima realmente não se aplica. Tanto pela raridade do fenômeno quanto por sua fugacidade, em todas as ocasiões em que os dois estiveram juntos ao longo de quase quatro décadas, o céu proporcionou um espetáculo irrefreável de belezas, mas também não demorou a se precipitar com violência. E isso, não apenas uma, mas duas, três vezes pelo menos. Tal como forças da natureza semelhantes e intensamente fortes, não suportam uma a outra pela tamanha atração que exercem entre si, repelindo-se mutuamente tão logo realizem seu feito. 

Foi assim com Reed e Cale desde sempre. Dois dos maiores talentos de sua geração de prodigiosos jovens artistas nascidos no pós-Guerra, são figuras essenciais para a cena da contracultura nova-iorquina, que mudou os rumos da vida social na segunda metade do século XX. Isso, contudo, não impediu que as desavenças se manifestassem. Pelo contrário, era-lhes como dar mais munição. Já na Velvet Underground, histórica banda que cofundaram com Moe Tucker e Sterling Morrison nos anos 60 e espinha dorsal do rock junto a Beatles, Bob Dylan e Rolling Stones, isso já acontecia. Mesmo com a alta sinergia artística que os unia e os colocava como o principal núcleo criativo do grupo – capaz de inventar algumas das mais elevadas obras da música contemporânea, como “Heroin”, “Venus in Furs” e “Sister Ray” –, as diferenças falavam mais alto do que as semelhanças. A Velvet continuou com Reed até este partir para sua própria carreira no início dos anos 70, mas Cale, incomodado com o parceiro, não suportou mais do que dois discos e saltou fora um ano após a estreia no clássico "Disco da Banana" para voos solo e na produção musical.

Já veteranos, os integrantes da banda promoveram uma nova aproximação somente 25 anos, em 1993, para o memorável show “Live MCMXCIII”. A turnê comemorativa, que vinha emocionando fãs por onde passava, entretanto, mal havia começado e teve de ser subitamente interrompida por causa de brigas entre os dois líderes. De novo os iluminados raios se chocavam e faziam fechar o tempo, transformando a situação festiva em um dilúvio de ferozes descargas elétricas.

A Velvet com Nico: apadrinhados por Andy
Somente um milagre da natureza para fazer com que tanto talento (e ego) pudesse permanecer minimamente em harmonia por algum tempo, mesmo que curto, sem que se provocasse imediatamente mau-tempo. Esse milagre tinha nome e lhes era um velho conhecido desde os tempos das performances multimídia da Exploding Plastic Inevitable, nos primeiros anos da Velvet. Chamava-se Andy Warhol. Fazia já três anos que o pai da pop art e padrinho artístico da turma havia dado adeus, deixando neles uma sensação de dívida para com a figura que, junto com eles – mas também abarcando-os –, havia transformado os cânones da cultura mundial para sempre com sua proposta artística ousada e conectada com a pós-modernidade. No entanto, ainda precisou que um segundo raio teimasse em se lançar no mesmo ponto: praticamente um ano depois, a cantora e modelo alemã Nico, parceira do histórico primeiro disco da Velvet e musa musical de Cale por vários anos, também morria. A despedida de Nico, que dera voz a alguns das principais composições da dupla, como “All Tomorrows Parties” e “Femme Fatalle”, deixou a Cale e Reed mais do que evidente que aquele 1990 lhes trazia um aviso do firmamento. Sim, precisavam unir-se. Foi então que, entre tempestades e quietações, nasceu “Songs for Drella”, o qual completa 30 anos de lançamento.

Precavidos do próprio histórico, a combinação foi a seguinte: por três meses, os dois – e somente os dois –, suportariam o confinamento e baixariam a cabeça para comporem conjuntamente um repertório inteiramente novo em memória a Andy. Três meses apenas. O que talvez seja muito pouco tempo para alguns, foi mais do que suficiente para que os conflituosos, mas não menos experientes e afinados companheiros, compusessem uma obra-prima única em vários aspectos. A começar pela ocasião em si, para a qual Reed e Cale conceberam também algo especial, uma vez que sabiam da responsabilidade que lhes cabia: somente eles podiam cumprir aquela tarefa. Embora a vastidão da influência de Andy para a arte, estabelecendo nesta um "antes" e um "depois" de si, eram Reed e Cale seus verdadeiros herdeiros na música. Por isso, entendiam que a homenagem a Andy pedia pompas. Afinal, somente um indivíduo ímpar na humanidade poderia juntar Drácula com Cinderella (daí, o apelido “Drella”). Com isso, “Songs” saiu não apenas um disco, mas uma ópera-rock, que respeita toda a estrutura clássica tal como o rock havia incorporado ao narrar uma história de apogeu e miséria e final necessariamente trágico. Outra excepcionalidade é ter apenas os dois no recinto tocando, cantando, gravando, mixando e produzindo a si próprios. O resultado é um disco de sonoridade minimalista mas altamente expressiva, em que não há percussão, sopros, orquestra ou outras vozes, apenas as cordas vocais dos dois falando pela de Andy e intercalando-se e a de seus instrumentos: guitarras, baixo, viola e piano/teclados.

Cale, Reed e Andy em 1976: relação antiga e muito cúmplice

Para narrar a trajetória de Andy, Cale e Reed determinam, então, 15 movimentos em que se ouvem a sofisticação do art rock, a fúria do punk, a ousadia da vanguarda, a tradição clássica europeia e o palpável da canção pop. Tudo que Andy lhes legou em ideias e conceitos, desde a Velvet até as suas carreiras solo, era revisado e revisitado de forma altamente madura e concisa, mas também emocional e devota. Num teor erudito, a provocativa “Smalltown” começa como uma espécie de minueto ternário em allegro em que a voz de Reed faz resgatar o desejo do jovem Andy antes de mudar-se para a cosmopolita Nova Yprk nos anos 50. Gay, estranho e totalmente deslocado em sua Pittsburgh natal, ele tinha uma única certeza: a de que queria sair dali. “De onde é que Picasso vem/ Não há Michelangelo vindo de Pittsburgh/ Se a arte é a ponta do iceberg/ Eu sou a parte mais ao fundo“. 

A percepção de que o destino de Andy era mudar os padrões da sociedade começa a ser desenhada a partir do momento em que ele pisa na Big Apple, mais precisamente quando “abre a casa” na 81st Street, em Manhattan, para receber toda a fauna de artistas e doidões de uma Nova York em plena ebulição criativa. Era a Factory, seu lendário estúdio de onde a arte ocidental entrou de um jeito e saiu de outro para nunca mais ser a mesma. A dupla dá a este momento ares litúrgicos e ambientais, mas ao mesmo tempo recorre ao minimalismo nas três notas repetidas que formam o núcleo melódico de "Open House", o mesmo que usaram em "Waiting for the Man", outra sua do repertório da Velvet. 

Enquanto Cale canta a busca de Andy por patrocínio junto aos mecenas endinheirados, a quem apresenta um portfólio com suas embalagens de Brillo e uma tal banda chamada Velvet Underground (“Style It Takes”), Reed, na sequência, sob um ruidoso e minimalista rock, traz o artista em atividade (“Work”) fazendo lembrar o som hipnótico e sequencial de contemporâneos de anos 60, mas estes, da cena avant-garde da Califórnia, Philip Glass e Steve Reich. Logo começam, entretanto, os problemas. “Trouble With Classicists”, numa melodia neo-renascentista quase declamada por Cale, traz as idiossincrasias entre a arte moderna e classicismo, bem como o embate com os críticos.  

A efervescência nova-iorquina agora está nas veias de Andy. A intensa “Starlight”, com as guitarras distorcidas de Reed e o toque atonal do piano de Cale, fala da casa LGBT que abrigou seus pares: Ingrid, Viva, Little Joe, Baby Jane, Eddie S. “Starlight aberto/ Luz das estrelas abre sua porta/ Isso se chama Nova York/ Com filmes na rua/ Filmes com pessoas reais/ Que você recebe é o que você vê”. Desses personagens reais surgem as famosas fotografias e serigrafias como as que imortalizou de Marylin Monroe, Elvis Presley ou Truman Capote. O genial e inquieto rapaz do interior agora se encontra totalmente consigo mesmo. Criador e criaturas se homogeneízam. Para Andy, cantado no elegante timbre de Cale numa das mais brilhantes do disco, “rostos e nomes são tudo a mesma coisa”. Kitsch, celebridades, sexo, drogas, noite, ruas. Em "Faces and Names" a arte sai pelos poros, seja pela pintura, cinema, teatro ou música. São os “15 minutos de fama” e muito mais. Andy, no auge, prossegue formando novas figuras, como Reed canta noutra maravilha de “Songs”, “Images”. A viola ao estilo La Monte Young de Cale e a guitarra com efeitos de pedal de Reed formam um corpo dissonante só para registrar que, além do figurativo, o abstrato também integra o repertório pictórico do artista visual. 

A dupla em 1990 na rara
reunião para homenagear
o pai da pop art
Tanta exposição resulta na primeira grande crise, fato presente nas cinco faixas seguintes, que é a tentativa de assassinato que Andy sofreu da feminista radical Valerie Solanas, a qual se sentira ofendida com ele em razão de um desacerto profissional. A melodiosa “Slip Away (A Warning)” fala justamente do conselho de amigos para que fizesse o movimento inverso do que vinha procedendo: ao invés de “open house”, fechar seu estúdio. Pressentimento do pior. A barra segue pesada com “It Wasn't Me”, em que Andy tenta convencer Solanas a não se suicidar e de que ele não tinha culpa. O tiro, literalmente, saiu pela culatra: em 3 de junho de 1968, ela invade a Factory armada e desfere três tiros contra Andy, o que lhe deixou sequelas físicas e emocionais para o resto da vida. “I Believe”, outra ótima, narra com detalhes e urgência a cena do atentado, da chegada dela ao local à agonia de Andy no hospital. Solanas, que passou três anos na prisão pelo ocorrido, morreria 14 meses depois de Andy (e dois antes de Nico) em abril de 1988.

O belo country “Nobody But You” versa ainda sobre o traumático episódio (“Eu realmente me importo muito/ Embora pareça que não/ Desde que eu fui baleado/ Não há ninguém além de você”), encaminhando o musical para um desfecho, como se sabe, melancólico como em todas as óperas. Na discursiva e etérea “A Dream”, Cale traz sua veia new age e neoclássica captada junto a outros parceiros, como Terry Riley, Brian Eno e Kevin Ayers. A letra é um fluxo de pensamento de Andy, cuja descrição de um sonho traça um panorama de vários momentos de sua biografia: os primeiros anos, a Velvet, pessoas de convivência, a amizade com Reed e Cale, o incidente na Factory e as feridas que a vida lhe trouxe. A indagação: “Puxa, não seria engraçado se eu morresse neste sonho antes que eu pudesse inventar outro?”, quase ao final da faixa, denota o pressentimento de que os últimos traços de um artista sublime estavam sendo dados. 

A arquitetura narrativa de “Songs” - que mantém um exemplar equilíbrio entre densidade e leveza, tonalismo e dissonâncias, agitação e calmaria, classicismo e vanguarda, agressividade e lirismo - surpreende mais uma vez na virada da contemplativa e extensa “A Dream” para o blues ultramoderno “Forever Changed”, talvez a mais impactante de todo o álbum. Ciente da proximidade da morte, Andy compreende igualmente a sina de todo grande artista: a permanência do seu legado. “Eu fui”, mas tudo “mudou para sempre”. A consciência da eternidade. Se Cale emenda as duas anteriores, é Reed quem tem o privilégio de desfechar este réquiem. Isso porque, ao invés de prosseguirem a narrativa na terceira pessoa, como que falando pela voz de Andy, são as próprias palavras de Reed que compõem a letra de“Hello It's Me” numa emocionante carta de despedida. “Andy, sou eu, não te vejo há um tempo/ Eu gostaria de ter falado mais com você quando você estava vivo”, abre dizendo na singela balada, mais uma como “Femme Fatale” e “Sunday Morning” composta pelos dois em meio aos vários proto-punks raivosos e sinfonias ruidosas dos tempos de Velvet. 

Terminada a gravação, também não durou muito a turnê de “Songs”. Após algumas apresentações, Cale e Reed separaram-se novamente, como raios excelsos que entram em choque depois de mal se aproximarem. A última ocasião, o reencontro da Velvet, três anos dali, foi sentenciada com a partida de Sterling Morrison dois mais tarde e a do próprio Reed, em 2013. Antes da tormenta, contudo, o tempo colaborou para que registrassem este impecável e sui generis disco, que evidencia o quanto figuras como Andy Warhol fazem falta sempre. E por quê? Porque, como um Michelangelo, um Mozart, um Picasso, um Shakespeare, ícones revolucionários invariavelmente deixam lacunas impreenchíveis, simplesmente. Ouvir “Songs” hoje, a três décadas de seu lançamento, dá a dimensão do que existências como as de Andy, Reed, Nico e Morrison significam depois que partem e da importância dos que ficam, como Cale e Moe. Raios muito raros que, incrivelmente, caíram no mesmo lugar. Justo por isso que o disco tenha se concluído com estes versos: “Bem, agora Andy, acho que temos que ir/ Espero de alguma forma que você goste deste pequeno show/ Eu sei que é tarde, mas é a única maneira que eu sei/ Olá, sou eu/ Boa noite, Andy”.

Show de "Songs for Drella", de Lou Reed e John Cale (1990)


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FAIXAS:
1. “Smalltown” - 2:03
2. “Open House” - 4:16
3. “Style It Takes” - 2:54
4. “Work” - 2:36
5. “Trouble With Classicists” - 3:40
6. “Starlight” - 3:26
7. “Faces And Names” - 4:11
8. “Images” - 3:28
9. “Slip Away (A Warning)” - 3:04
10. “It Wasn't Me” - 3:29
11. “I Believe” - 3:17
12. “Nobody But You” - 3:44
13. “A Dream” - 6:33
14. “Forever Changed” - 4:49
15. “Hello It's Me” - 3:03
Todas as composições de autoria de Lou Reed e John Cale

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OUÇA O DISCO:





Daniel Rodrigues

sexta-feira, 12 de julho de 2019

cotidianas #640 - Rock & Roll




Jenny disse que quando tinha apenas cinco anos de idade
Não havia nada acontecendo
Todas as vezes que ela ligava o rádio
Não havia nada de especial
Nada mesmo
Então numa bela manhã ela sintonizou numa estação nova-iorquina
Sabe, ela não conseguia acreditar no que ouvia
Ela começou a dançar ao som daquela música interessante
Você sabe que a vida dela foi salva
pelo rock 'n' roll
A despeito de todas as amputações você sabe que poderia sair
E dançar ao som de uma estação
de rock n roll

Isso foi muito bom
Hey, baby, você sabe
Você sabe que isso foi muito bom
Isso foi muito bom

Jenny disse que quando tinha apenas cinco anos de idade
Você sabe que meus pais serão a morte de todos nós
Duas televisões e dois Cadillacs
Bem, você sabe que não vai me ajudar em nada
Jamais irão me ajudar
Então numa bela manhã ela sintonizou numa estação nova-iorquina
Sabe, ela não conseguia acreditar no que ouvia
Ela começou a dançar ao som daquela música interessante
Você sabe que a vida dela foi salva pelo rock 'n' roll
Yeah, rock n' roll
A despeito de todos os cálculos
Você pode simplesmente dançar ao som de uma estação de rock 'n roll

E, baby, isso foi muito bom
E isso foi muito bom
Hey, isso foi muito bom
Isso foi muito bom
Hey, aí vem ela agora!
Pule! Pule!

Jenny disse que quando tinha apenas cinco anos de idade
Ei, você sabe que não há nada acontecendo
Em tudo
Toda vez que eu coloco na rádio
Você sabe que não tem nada a descer
Em todos
Então numa bela manhã ela sintonizou numa estação nova-iorquina
Sabe, ela não conseguia acreditar no que ouvia
Hey, nem em tudo
Ela começou a dançar ao som daquela música interessante
Você sabe que a vida dela foi salva pelo rock 'n' roll
Yeah, rock n' roll
Ooh, a despeito de todos os cálculos
Você pode simplesmente dançar ao som de uma estação que toca rock 'n roll

Tudo bem, tudo bem
E tudo isso foi bom
Oh, me escuta agora
E tudo isso foi bom
Vamos agora
Pouco mais
Mais um pouco
Tudo isso foi bom
E tudo isso foi bom, tudo bem
Tudo bem, tudo bem
Baby, tudo bem, agora
Tudo bem, baby tudo bem, agora
Baby, tudo bem
Baby, tudo bem agora
Oh baby, oh baby
Oh baby, yeah yeah yeah yeah yeah
Tudo bem, agora
Ohh, tudo bem agora
Tudo, bem

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"Rock & Roll"
Velvet Underground
(letra: Lou Reed)

terça-feira, 19 de novembro de 2013

cotidianas #254 - "Avenida Suja"


Pedro vive no Wilshire Hotel
Ele olha pela janela sem vidro
As paredes são feitas de papelão, jornais em seus pés
Seu pai lhe bate, porque ele está cansado demais para pedir esmola


Ele tem 9 irmãos e irmãs
Criados sobre seus joelhos
É difícil correr quando um cabide lhe acerta nas coxas
Pedro sonha em ficar mais velho e matar o velho
Mas há uma estreita chance que ele vá sair para a avenida


Ele vai acabar, na avenida suja
Ele vai sair, para a avenida suja
Ele está indo, para a avenida suja


Seu quarto custa dois mil dólares por mês
Pode acreditar cara, é verdade
Em algum lugar um proprietário está rindo até molhar as calças
Ninguém por aqui sonha em ser doutor ou um advogado ou coisa alguma
Eles sonham em negociar na avenida suja


Me entregue, seus famintos seus cansados seus pobres eu mijarei sobre eles
É o que a Estátua do Racismo diz
Sua massa pobre e aglomerada, vamos surrá-los até a morte
E acabar logo com isso e despejá-los na avenida


Vai ter que acabar, na avenida suja
Vai sair, para a avenida suja
Ele está caindo, na avenida suja
Saindo


Lá fora a noite está clara
Tem uma ópera em Lincoln Center
Estrelas do cinema chegam de limusine
Os holofotes atiram sua luz por cima do céu de Manhattan
Mas as luzes estão apagadas nas ruas maliciosas


Um garoto pequeno, em pé perto do Lincoln Tunnel
Ele vende rosas de plástico por um conto
O tráfego aglomera até a Rua 39
As putas de TV estão chamando os Tiras para uma mamada


E de volta ao Wilshire, Pedro se senta ali sonhando
Ele encontrou um livro de mágica numa lixeira
Ele olha para as figuras e encara o teto rachado
"Ao contar de 3" ele diz, "Eu espero desaparecer daqui"


E voar, voar embora, desta avenida suja
Eu quero voar desta avenida suja
Eu quero voar desta avenida suja
Eu quero voar, voar, voar, voar desta avenida suja


Eu quero voar embora
Eu quero voar
Voar, voar embora
Eu quero voar
Voar, voar embora
Voar, voar, voar
Voar, voar embora
Voar embora

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tradução da letra de "Dirty Boulevard"
de Lou Reed
álbum "New York

Ouça:
Lou Reed - "Dirty Boulevard"

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Lou Reed - "Transformer" (1972)




“Mas se essas calçadas [de Nova Iorque] parecerem um pouco mais familiares agora, é porque Lou mostrou-nos tudo ao redor delas há muito tempo atrás, dando rostos humanos a todos os habitantes das trevas.”
Michael Hill,
jornalista,
no texto do encarte da
reedição de 30 anos do álbum


“Transformer” é de certa forma um álbum escuro, um álbum sombrio, que mostra o lado B do mundo, das pessoas , das ruas. As drogas, a prostituição, as perversões, a solidão, de certo modo permeiam todo o desenvolvimento desta obra do ex-Velvet Underground, Lou Reed. Produzido por David Bowie e por Mick Ronson, “Transfromer”, de 1972, é um dos exemplares mais significativos das constantes contribuições entre Bowie e outros artistas, sobremaneira, das que se seguiriam, na chamada ‘fase berlinense’, com Brian Eno e Iggy Pop.
A clássica “Walk on the WildSide” com seu baixo insinuante, seu clima cool e seu charmoso trumpete, exprime perfeitamente todo esse universo com putas de esquina, cafetões agressivos, garotos vendendo drogas e mentes desajustadas. Outras complementam o conceito underground como a ótima e um tanto sadomasoquista, “Vicious” de fraseado marcante de guitarra; a embalada e gostosa “Hangin’ Round”, uma trilha para vidas confusas; e a transformação de uma garota para a ‘noite de trabalho’ em “Make Up”.
Na teatral “New York Telephone Conversation”, Reed praticamente recita a letra sob um acompanhamento de piano numa exposição sobre a cidade e seus habitantes como um todo; a adorável “Satellite of Love” é um pouco mais iluminada com seu belo coro feminino do final; “Wagon Wheel” é o típico rock loureediano, básico e objetivo ao passo que “I’m So Free” tem a cara do produtor, Bowie; “Goonight Ladies” com sua tuba engraçada é um perfeita despedida para aquelas damas da noite que Reed refere-se o tempo inteiro e um final perfeito para o disco, no fim das contas.
Mas em contraste com toda o clima pesado do temas, do disco, dos tipos, das vidas, das amarguras, minha principal lembrança deste disco sempre remete a um dia de sol em que estava em  Veneza  e entrei em uma loja de vidros de Murano e a atendente, uma bela jovem loura, ouvia música em um pequeno discman. Logo percebi que era Lou Reed mas por um momento não identifiquei a música, até que me veio. Próximo ao balcão como estava, comentei simplesmente, “’Perfect Day’...”, ao que a balconista sorriu e respondeu em inglês “É, você gosta?”. “Adoro”, respondi. É do álbum...” - interrompi tentando sinceramente buscar na memória a informação que naquele momento me falhava - “...’Transformer’”, completei lembrando finalmente, ao que ela confirmou novamente em inglês “yeah!”, seguido por outro gracioso sorriso.
Não continuei nenhuma conversa, acho que não quis sacrificá-la com meu inglês sofrível e sequer me aventurei no italiano. Compramos algumas coisas, saímos do loja e nos metemos afora pelas vielas de Veneza novamente. Era um belo dia de sol, um  belo dia para se andar em  Veneza .
Um dia perfeito.

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FAIXAS:

1- Vicious
2- Andy's Chest
3- Perfect Day
4- Hangin' 'Round
5- Walk on the Wild Side
6- Make Up
7- Satellite of Love
8- Wagon Wheel
9- New York Telephone Conversation
10- I'm So Free
11- Goodnight Ladies

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Ouça:

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Metallica + Lou Reed

O pessoal do Metallica já havia antecipado e deixado no ar que lançaria um material que, segundo eles mesmos, "não seria exatamente o Metallica", mas só agora desvendaram o mistério: o lance todo é que a banda gravou uma série de canções em parceria com o ex- Velvet Underground , Lou Reed e pretende lançá-las em álbum em breve. Não houve maiores informações como nome do álbum, previsão de lançamento ou algo mais consistente, apenas se sabe que serão dez músicas e que James Hatfiled se diz muito orgulhoso de trabalhar com o velho Lou.
Fica a curiosidade do que pode sair desta união e a expectativa. Boa expectativa, aliás.



C.R.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

The Velvet Underground & Nico - "The Velvet Underground & Nico" (1967)

"Andy Warhol me disse que estávamos fazendo na música o mesmo que ele na pintura, no cinema e na literatura."
Lou Reed


"Todos nós sabíamos que algo revolucionário estava acontecendo. A gente sentiu isso. As coisas não pareceriam estranhas e novas se alguma barreira não estivesse sendo quebrada."
Andy Warhol


No embalo da exposicão de Andy Warhol aqui no Rio, aproveito pra destacar aqui nos FUNDAMENTAIS um dos discos mais influentes de todos os tempos, "The Velvet Underground and Nico" de 1967. Como uma espécie de 'tentáculo' musical do projeto multimídia de Warhol, que também incluía artes plásticas, cinema, moda e literatura, o Velvet Underground apadrinhado pelo gênio da pop-art, era composto por músicos extremamente inventivos, ainda que nem todos brilhantes, como eram os casos da limitada percussionista Maureen Tucker e do esforçado Sterling Morrisson, por outro lado destacavam-se especialmente o guitarrista e vocalista Lou Reed com suas influências folk, suas levadas pesadas e letras cáusticas; e o multi-instrumentista criativíssimo John Cale, cara técnico, metódico mas aberto a todas as possibilidades e experimentações musicais. No entanto o projeto musical de Warhol ficaria completo mesmo com o acréscimo da modelo alemã Nico, agregando aos vocais da banda sua voz singela e aveludada, cheia de sotaque e sex-appeal apesar de toda a relutância inicial de Lou Reed. O resultado de tudo isso, Warhol+Velvet+Nico, foi um álbum brilhante, notável, uma referência musical e artística, um dos discos mais influentes da hstória do rock.
O produtor (na verdade, financiador)
Andy Wahol
"The Velvet Underground and Nico" é marcante antes mesmo de ser ouvido, já por sua capa concebida pelo mentor e produtor Andy Warhol, com a clássica e conhecidíssima banana; mas é inegavelmente na parte musical que as coisas foram verdadeiramente impressionantes: "Sunday Morning" que abre a obra lembra uma canção de ninar embalada ao som de uma caixinha de música. Em "I'm Waiting for My Man" a guitarra ganha peso acompanhada por um piano insistente e barulhento com o vocal  de Lou Reed soando escrachado enquanto versa sobre as drogas nas ruas de Nova Iorque.
"Venus in Furs", a melhor do álbum e uma das maiores da história do rock, é um épico arrastado com uma batida marcial, pontuada pela viola elétrica de Cale e com Reed, desta vez, cantando de maneira quase hipnótica.
"Heroin" outra das grandiosas do disco vai serpenteando como uma montanha-russa sonora com variações de aceleração, intensidade, ênfases e ruídos como fundo para que Reed conte detalhadamente o uso e as sensações causadas pela droga, com a bateria de Mo Tucker chegando a parecer desordenada em determinados momentos e com tudo culminando numa loucura instrumental total e o violino alucinado de Cale 'bagunce' tudo de vez num final caótico-apoteótico. Aliás, bagunça mesmo (num bom sentido), é o que não falta em "European Son" que chega a ficar praticamente inaudível tal a aceleração, a mistura de sons, as microfonias, a distorção que alcança; mas afinal o que seria do Sonic Youth, do Jesus and Mary Chain, do My Bloody Valentine sem isso?
Nico, a vocalista que Warhol praticamente impôs
mas que deu grande contribuição
Nico aparece apenas como vocal de apoio em "Sunday Morning" mas faz as vezes de principal na lenta "I'll Be Your Mirror", na intensa "All Tomorrow's Parties" e na luxuriante "Femme Fatale" com um vocal sensualíssimo e uma interpretação de 'melar a cueca'.
De resto tem também a galopante e elétrica "Run Run Run", tem outra interpretação bárbara de Reed em "There She Goes Again" falando sobre prostituição, tem outra vez o violino esquizofrênico de Cale em "The Black Angel's Death Song", cara... todas demais, porra!
O disco na época não foi lá muito apreciado; vendeu mal e não obteve grande sucesso. Sua importância foi sendo notada aos poucos e já na década seguinte se sentiria sua influência com a explosão do punk rock. Mas foi só um pouco depois ainda, com o passar do tempo, que se reconheceu definitivamente seu justo status de obra-prima.
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FAIXAS:
  1. "Sunday Morning" (Reed, Cale) - 2:56
  2. "I'm Waiting for the Man" - 4:39
  3. "Femme Fatale" - 2:38
  4. "Venus in Furs" - 5:12
  5. "Run Run Run" - 4:22
  6. "All Tomorrow's Parties" - 6:00
  7. "Heroin" - 7:12
  8. "There She Goes Again" - 2:41
  9. "I'll Be Your Mirror" - 2:14
  10. "The Black Angel's Death Song" (Reed, Cale) - 3:11
  11. "European Son" (Reed, Cale, Morrison, Tucker) - 7:46
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Ouça:
The Velvet Underground & Nico 1967



Cly Reis

terça-feira, 20 de julho de 2010

cotidianas #35 - Um Passeio Pelo Lado Selvagem


Li na edição 155 da revista BRAVO de julho que Lou Reed, um dos maiores poetas do rock, com seus temas sempre bem urbanos, cotidianos e crus, vem ao Brasil, na Festa Literária de Parati, no  Estado do Rio, para lançar seu novo livro com a compilação de todas suas letras chamado "Atravessar o Fogo". Interessante, hein! Boa pedida.
Eis aí abaixo uma das suas músicas mais conhecidas, "Walk on the Wild Side" que tem bem essa cara "cidade-suja", lado B das ruas. Bem cotidiana.

Passeio pelo lado selvagem

Holly veio de Miami, Flórida
Atravessou os Estados Unidos pegando carona
Fez as sobrancelhas no caminho
Depilou as pernas, e então ele virou ela
Ela diz :"ei baby, dê um passeio pelo lado selvagem"

Candy veio de fora da ilha
No quartinho dos fundos, ela era querida de qualquer um
Mas ela nunca perdeu a cabeça
Mesmo quando estavam lhe chupando
(as garotas pretas cantam :"doo do doo do doo")

Little Joe nunca chegou a revelar
Todo mundo tinha que pagar e pagar
Um michê aqui, um michê ali
New York é o lugar onde eles dizem :"hey baby, dê um passeio pelo lado selvagem

A bicha Sugar Plum veio e caiu na rua
Procurando 'soul flood' e um lugar pra comer
Foi ao Apollo, você deveria ter visto eles dançando go-go

Jackie só está acelerando agora
Pensou em ser James Dean por um dia
Aí acho que ela tinha mesmo que bater, Valium deve ter ajudado nessa doidera

Hey dê um passeio pelo lado selvagem
E as garotas pretas cantam :"doo do doo do doo"
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Walk on the Wild Side
Lou Reed 
do álbum "Transformer" (1972)

Ouça:
Lou Reed Walk On The Wild Side


Cly Reis

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Lou Reed - "Berlin" (1973)



"As pessoas não gostaram de 'Berlin' porque ele é muito real."
Lou Reed


Fui hoje a caminho do trabalho ouvindo o grande "Berlin" do Lou Reed.
"Berlin" é um álbum que, é algo assim como, uma pequena ópera-rock na qual o cantor aborda faixa a faixa assuntos como desespero, tristeza e principalmente o suicídio, mas de uma maneira tão artística e melódica que o clima tão pesado acaba não se impondo, prevalecendo sim a beleza e sensibilidade da obra.
Após uma abertura cheia de ruídos e vozes, que é a faixa título "Berlin", o disco abre efetivamente com "Lady Day" com toda uma magnitude que uma faixa deve ter para abrir um álbum desse porte. O álbum encontra pontos altos nas duas "Caroline Says", em "Oh, Jim" que não por acaso remete muito ao Velvet, até por ser uma regravação de uma canção daquela banda, e na fantástica "The Kids" que conta com uma espécie de "solo" de choro infantil, isso sem falar da redundantemente triste "Sad Song" que fecha a obra.
E eu ainda me atrevo a falar em pontos altos...
Tudo são pontos altos!
É um grande disco da primeira à ultima.
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FAIXAS:
  1. "Berlin" – 3:23
  2. "Lady Day" – 3:40
  3. "Men of Good Fortune" – 4:37
  4. "Caroline Says I" – 3:57
  5. "How Do You Think It Feels" – 3:42
  6. "Oh, Jim" – 5:13
  7. "Caroline Says II" – 4:10
  8. "The Kids" – 7:55
  9. "The Bed" – 5:51
  10. "Sad Song" – 6:55
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Ouça:
Lou Reed Berlin


Cly Reis