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terça-feira, 25 de dezembro de 2018

The Sonics, The Wailers & The Galaxies - "Merry Christmas" (1965)


“Gozação com alegria e contemplação particular. A The Sonics capturou o espírito dessas duas atmosferas na contribuição para o álbum”.

“Em ‘Christmas Album’, eles [The Wailers] capturaram o clima que desejavam: a sensação de Natal em um novo estilo”.

“A The Galaxies expressa sons frescos e velozes como a neve do Natal” 
Textos da contracapa do disco

Convenhamos: não é todo mundo que gosta de Natal. Talvez até mais pessoas que se suspeite, porque tem um monte das que verbalizam não gostarem e aquelas que se entristecem nessa época, resgatando tudo de ruim que aconteceu na vida inteira assim que dezembro entra. Quem não tem um parente ou amigo assim, que jogue a primeira pedra. Pois foi celebrando essa desconformidade, esse descompasso com as festas natalinas que o selo alternativo norte-americano Etiquette Records lançou, em 1965, “Merry Christimas”, o qual reúne faixas de três grupos de seu cast: The Sonics, The Wailers e The Galaxies.

No álbum “descomemorativo” está a raiz daquilo que se fortaleceria a partir de então nos EUA e na Inglaterra: as garage bands. Psicodélicas e arraigadas no rock e no blues, elas passariam a ser chamadas de proto-punk anos mais tarde por terem aberto caminho – mesmo sem saberem que estavam fazendo isso – para que Sex Pistols, Ramones, The Clash, Dead Boys, Buzzcocks e outras reivindicassem de vez a anarquia punk. Pois as três bandas de “Merry...”, juntamente com contemporâneas como The Chocolate Watchband, The Seeds, Deviants, The Troggs, Monks e outras, já criavam, quase uma década antes da onda punk explodir em Nova York e Londres, um som inconformado, agressivo e fora dos padrões da grande indústria. O pop-rock eles deixavam para os astros Beatles, Rolling Stones, Byrds e cia. Eles queriam mesmo era dar sua mensagem de contrariedade e fazer barulho. Muito barulho. Filhos dos mesmos traumas e transformações sociais do pós-Guerra, cabia a eles escancarar o grito contra o establishment. Nada mais apropriado para se criticar, então, do que um dos símbolos do capitalismo: o Natal.

Nessa, sobrou, claro, para o Papai Noel. A desavença com o Bom Velhinho fica clara na primeira faixa: “Santa Claus”, dos Sonics. Na letra, o jovem roqueiro cheio de ilusões pergunta: “Papai Noel, onde você tem andado?/ Eu estive esperando aqui apenas para deixá-lo entrar/ Sim, Papai Noel, o que você tem nas suas costas?/ Existe algo para mim que dentro de saco?/ Eu quero um carro novo, uma guitarra twangy/ uma pequena bonita e muito dinheiro/ Papai Noel, você não vai me dizer, por favor?/ O que você vai colocar debaixo da minha árvore de Natal?”. A resposta não poderia ser mais insensível e decepcionante. “E ele simplesmente disse:/ "Nada, nada, nada, nada.”  Suficiente para suscitar a fúria juvenil. A guitarra fuzz rosnando, o riff básico quase "pogueante" e o jeito indolente de cantar do vocalista Gerry Rosie mostram o quanto a batata (ou o peru) do Papai Noel assou.

Num tom de rock embalado e romântico, a The Wailers vem com sua primeira do disco: “She's Comin' Home", em que o rapaz está implorando à garota para que volte para casa no Natal. A The Galaxies, por sua vez, abre a participação numa versão apimentada de "Rudolph the Red Nosed Reindeer", clássico do cancioneiro infanto-natalino, dando-lhe um ritmo entre a surf e o country rock. 

A The Wailers não só retoma o country ao estilo Bob Dylan na batida de violão encorpada e na sonoridade “rancheira”, como também a contrariedade ao “espírito natalino”. É "Christmas Spirit??", assim mesmo, com DUAS interrogações. O órgão mantém-se permanente, enquanto a letra critica, já naquela época, o consumismo da sociedade moderna que engole a todos no Natal: “Entre numa fila/ Compre uma grande bola de barbante/ Qualquer coisa que você possa colocar em suas mãos/ Não importa o que você dá/ Só tenho que pegar um presente/ Não sabe o que você está dando/ A única coisa que conta é a marca e o valor/ Que vem de uma loja cara”. 

Irascíveis, os Sonics voltam à carga contra o Papai Noel. Lembram do desaforo que ele fez deixando o cara na mão na música de abertura? Pois “The Village Idiot” é diretamente em homenagem a ele, o “Idiota da Aldeia”. Irônicos, dizem: “Como é divertido rir e cantar/ A canção hoje à noite num trenó”. A famosa melodia de “Jingle Bells” é totalmente avacalhada pela debochada turma. Gritos e alaridos de chacota acompanham o órgão, que desenha os acordes enquanto a bateria castiga as caixas e o bumbo. Tudo com doces sininhos tinindo ao fundo. Um desavisado poderia dizer tranquilamente que se trata de uma faixa de “The Great Rock ‘n’ Roll Swindle”, dos Sex Pistols, de 1979, haja vista a semelhança, inclusive, da galhofa de “Friggin’ in the Riggin’”. Subversiva ao extremo.

Cabe aos Sonics dar sequência, ou seja, uma nova pedrada: “Don't Believe in Christmas". Precisa dizer mais alguma coisa? Precisa. Olha a letra: “Bem, mamãe e papai disseram que podíamos/ Então eu fiz o que deveria/ Eu pendurei minha meia em uma parede/ Eu não entendi nada/ Porque eu não recebi nada no ano passado/ Bem, ficando acordado até tarde/ Para ver Santa Claus voar/ Bem, com certeza você não sabe/ O gordo não apareceu”. Como se vê, o velho furão frustrou a Noite Feliz da galera mais uma vez. Com refrão pegajoso e ritmo alucinante, daqueles que dá vontade de entrar numa roda punk, lembra a versão de “Too Much Monkey Business”, de Chuck Berry, feita pelos pais das garage bands, a The Kinks.

Depois disso, Wailers e Galaxies intercalam as quatro últimas faixas: as baladas "Please Come Home for Christmas" e “Christmas Eve”, ambas da Galaxies; e "Maybe This Year" e "The Christmas Song", da Wailers, que também apostam em duas canções açucaradas para terminar a coletânea. Afinal, a mensagem já estava dada. Entendem agora quando os Garotos Podres cantam: “Papai Noel, velho batuta/ Aquele porco capitalista”? Pois é, a primeira pedra estava lançada lá, em 1965, por estes heróis da contracultura. Nada mais rock ‘n’ roll do que um Natal de contestação.

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FAIXAS:
1 – "Santa Claus"- The Sonics (Gerald Roslie) - 2:49
2 - "She's Coming Home" – The Wailers (K. Morrill/R. Gardner) - 2:55
3 - "Rudolph The Red Nosed Reindeer" - The Galaxies (Johnny Marks) - 2:31
4 - "Christmas Spirit??" - The Wailers (K. Morrill/R. Gardner) - 3:05
5 - "The Village Idiot" ("Jingle Bells") - The Sonics (J. Pierpont) - 2:35
6 - "Don't Believe In Christmas" - The Sonics (Gerald Roslie) - 1:41
7 - "Please Come Home For Christmas" - The Galaxies (C. Brown/G. Redd) - 3:04
8 - "Maybe This Year" - The Wailers (K. Morrill/N. Anderson/R. Gardner) - 3:15
9 - "Christmas Eve" - The Galaxies (R. Gardner) - 4:05
10 - "The Christmas Song" ("Chestnuts Roasting On An Open Fire") - The Wailers (M. Torme/R. Wells) - 3:09

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OUÇA
The Sonics, The Wailers & The Galaxies - "Merry Christmas"

Daniel Rodrigues
Agradecimento a João Carneiro pela dica

terça-feira, 3 de maio de 2016

The Modern Lovers – “The Modern Lovers” (1976)


A capa original de 1976,
só com o logo da banda e a da
reedição em CD, de 1989.
“The Modern Lovers
é a minha banda de rock favorita
 de todos os tempos”.
David Berson,
executivo da Warner

“Bem, algumas pessoas
tentam pegar as meninas/ 
E são chamados de cuzões/ 
Isso nunca aconteceria
com Pablo Picasso”
Jonathan Richman,
da letra de “Pablo Picasso”



Muito tem se falado sobre disco de estreia dos Ramones, o grande marco inicial daquilo que o mundo pop passou a conhecer como punk-rock e que está completando dignos 40 anos. Mas quem se embrenha um pouco mais na cena underground norte-americana sabe que este movimento e sua sonoridade rebelde e anti-establishment – que remetia à simplicidade do rock ‘n’ roll básico dos anos 50 e a culturas pop apreciadas por uma rapaziada contrária ao modo de vida padrão da sociedade – vinha sendo alimentado desde meados dos anos 60. Detroit, Boston, San Francisco e principalmente Nova York concentravam essa galera criativa e crítica que não admitia que o planeta Terra se configurasse daquele jeito que se anunciava: Guerra do Vietnã matando inocentes por nada, crises econômicas mundo afora, ascensão de ditaduras, repressão militar e os ecos de um inacabado 1968.

Uma das bandas fruto dessa efervescência é a The Modern Lovers. Liderados pelo inventivo Jonathan Richman, o grupo de Boston estava, assim como o Ramones, tão de saco cheio com o sistema político e social que seu discurso era, por pura ironia, totalmente apolítico. Nada de afrontamentos políticos ou denúncia das mazelas sociais. A maneira de protestarem era falar sobre aquilo que a sociedade não falava ou considerava coisa de moleque de classe baixa: comer as menininhas do bairro, a falta de grana, se chapar com a droga mais fuleira que tiver, andar de carro em alta velocidade (sem ter carro para isso) e paixões raramente retribuídas. Temas que não eram novidade no mundo jovem mas estavam esquecidos pelos grandes astros que a mídia havia criado. Com o espírito punk do “faça você mesmo”, o Modern Lovers e os tresloucados da cena punk revitalizaram tais questões com muita ironia, deboche e realismo. Nada de carrões, de levar lindas modelos para a cama e superequipamentos para superespetáculos em superestádios. O negócio era curtir um pouco daquela merda de vida que tinham, sonhar em comer a garota gostosa do bairro num motel barato e tocar em garajões fétidos de Nova York – como um em plena East Village, chamado CBGB. Eram aquilo que viviam e pensavam, e tudo isso está encapsulado no essencial “The Modern Lovers”, o qual, assim como o primeiro dos Ramones, também faz quatro décadas de seu lançamento.

A Modern Lovers mandava ver um som curto e grosso, mas com inventividade. Sem grandes habilidades técnicas, compunham um rock básico, vigoroso e pautado na realidade que vivenciavam nas ruas. Riffs magníficos saíam da cabeça do guitarrista e vocalista Richman e seus parceiros de ensaio e de punheta: Ernie Brooks (baixo), Jerry Harrison (teclados) e David Robinson (bateria). A produção do mestre underground John Cale avalizava aquele primeiro trabalho de estúdio da Modern Lovers, cujo título é tão irônico quanto autocrítico, haja vista que boa parte dos temas que abordavam era, justamente, a fragilidade e inadequação sexual e afetiva daqueles jovens dentro da sociedade moderna. Sem grana no bolso e longe de aparentarem os abastados roqueiros do rock progressivo, astros da época, era difícil ser mais do que um arremedo de “amante moderno”.

A nasalada e tristonha voz de Richman anuncia o que vem numa contagem até 6. É “Roadrunner" abrindo o disco, clássico do rock alternativo que a grande banda do punk britânico, o Sex Pistols, gravaria dois anos depois. Riff marcante e de acorde simples, apenas três notas. “Roadrunner, roadrunner/ Going faster miles an hour/ Gonna drive past the Stop 'n' Shop/ With the radio on”, canta Richaman com seu timbre bonito, algo entre o vocal de Joey Ramone e o de outro contemporâneo deles, Richard Hell. Bateria suja, guitarra e baixo e bem audíveis. A sonoridade proposta por Cale junta a secura das garage bands dos anos 60, a irreverência do New York Dolls e a atmosfera proto-punk do Velvet Underground com uma pitada daquilo que se chamaria anos depois de new wave. Isso muito ajudado pelos teclados moog de Harrison, numa influência direta do glam rock, mistura de punk e pop que este ajudaria a levar para outra banda referencial da cena de Nova York a qual formaria um ano depois: o Talking Heads.

Como Joey e Hell, Richman, guitarrista e líder da banda, era mais que um vocalista: era um dos porta-vozes daquela turma. Seus versos muitas vezes reproduziam as angústias e vontades daqueles jovens deslocados que não queriam ser certinhos nem hippies: queriam ser apenas eles mesmos. Com este substrato, Richman é capaz de criar versos verdadeiramente geniais, formando rimas cantaroláveis e cheias de expressividade. “Astral Plane” é um exemplo. Rockzão embalado, fala de um rapaz sozinho em seu quarto, prestes a enlouquecer, pois sente que nunca mais terá a garota que gosta. Seu desespero é tanto que já está aceitando até encontrá-la num outro plano imaterial e, digamos, “não-carnal” (“O plano astral para o escuro da noite/ O plano astral ou eu vou enlouquecer”).

Outro caso é o da clássica “Pablo Picasso”, em que, com criatividade e atrevimento, engendra uma rima de “asshole” (“cuzão”, em inglês) com "Picasso". Dentro da sua classificação estilística, este tipo de rima pode ser considerado como “rima rica”, quando a combinação é formada por vocábulos de classes gramaticais distintas entre si. Além desta, a rima de Richman também se enquadra no que se pode chamar de “rima preciosa”, ou seja, quando se combina em versos palavras de dois idiomas diferentes. Ele altera a pronúncia da palavra estrangeira para rimar com outra na língua vernácula da obra (inglês). Nos versos em questão, o sobrenome do artista plástico espanhol, o substantivo próprio de origem malaguenha "Picasso", é dito com uma leve distorção no seu último fonema, o que faz com que se equipare fonética e sintaticamente a “asshole”, um adjetivo originário da linguagem chula. Além disso, a letra em si é superespirituosa, pois endeusa a figura do autor da Guernica pelo simples fato de ser um nome público, como se por causa disso jamais ele passasse pelo vexame de não conseguir pegar as meninas como eles. Pura inventividade.

Fora a letra, “Pablo Picasso” é um blues ruidoso no melhor estilo Velvet, roupagem que Cale fez questão de dar ao intensificar a distorção das guitarras sobre uma base quase de improviso, a exemplo de "The Gift" e “European Son”. O produtor, inclusive, foi, um ano antes, o primeiro a gravá-la no clássico álbum “Helen of Troy”, apresentando ao mundo do rock aquele jovem criativo chamado Jonathan Richman. Com menos distorção mas de levada empolgante, “Old World”, “Dignified And Old” e “She Cracked” são daquelas gostosas até de poguear. Todas com um cuidado na linha dos teclados, inteligentemente utilizado com diferentes texturas por Cale, o que cria atmosferas próprias para as canções. “She Cracked”, em especial, que fala sobre o ciúme sentido por um rapaz em relação a uma mulher madura e independente, é outra de refrão pegajoso, das de cantar em coro com uma galera: “She cracked, I'm sad, but I won't/ She cracked, I'm hurt, you're right”. O riff é de um minimalismo quase burro: como uma “Waiting for the Man”, apenas uma nota sustenta toda a base.

Já na meio-balada “Hospital”, de Harrison, a figura feminina inatingível a um adolescente pobre do subúrbio está presente de novo: “Às vezes eu não suporto você/ E isso me faz pensar em mim/ Que eu estou envolvido com você/ Mas eu estou apaixonado por este poder que você mostra através de seus olhos”. Novo petardo: “Someone I Care About”, com sua combinação de 4 notas, lembra direto Ramones, mas com um toque mais apurado por conta da produção de estúdio. Reduzindo o ritmo novamente, a balada ”Girl Friend” volta a falar sobre as meninas desejadas mas… sem sucesso. A letra brinca com a sintaxe da palavra em inglês (olha aí Richman mais uma vez se esmerando na poesia) juntando os dois vocábulos (“girlfriend”, namorada) ou separando-os (“girl friend”, garota amiga, justamente com o que ele não se contenta, mas não tem coragem de confessar). Nesta, o teclado soa como piano, dando-lhe um ar ainda mais melancólico.

Mais uma acelerada, “Modern World”, mesmo não sendo das conhecidas, é um exemplo de rock bem feito: pulsação, melodia de voz eficiente, vocal honesto, guitarras rasgando sem precisar de excesso de distorção. E a letra é hilária: o rapaz, querendo convencer a garota a ir para a cama com ele, larga um papo de que aderiu ao “mundo moderno” e à liberdade sexual. “If you'd share the modern world with me/ With me in love with the U.S.A. now/ With me in love with the modern world now/ Put down the cigarette/ And share the modern world with me” (Se você quiser compartilhar o mundo moderno comigo/ Comigo no amor com os EUA agora/ Comigo no amor com o mundo moderno agora/ Largue o cigarro/ E compartilhe comigo o mundo moderno.”)

O álbum deu luzes à geração punk tanto nos Estados Unidos, como para Talking Heads, Blondie e Television, quanto na Inglaterra, como Sex Pistols, The Clash, Jam, Buzzcocks e The Stranglers, bandas nas quais se vê claramente toques da Modern Lovers. Várias outras, inclusive, da leva pós-punk, como The CureGang of FourPolyrock e P.I.L. beberiam também na fonte de Richman & Cia. Se os Ramones elevaram a ideologia do “faça você mesmo” ao showbizz, revolucionando para sempre a música pop, a The Modern Lovers, na mesma época, já dava a mensagem de que, o importante era fazer por si próprio, sim, mas que havia espaço para refinar um pouco aquela tosqueira toda.

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A versão em CD lançada pelo selo Rhino em 1989 pode ser considerada a definitiva deste álbum tão influente. Primeiro, por trazer o remaster das faixas originais do LP, evidenciando o trabalho inteligente de Cale na mesa de som e o vigor sonoro da banda. Segundo, porque traz faixas extras que, ao que se percebe, só não entraram na edição de 1976 por pura falta de espaço no vinil. Estas, aliás, são fruto da parceria do grupo com outro mestre da subversão, Kim Fowley. Ele produz duas das melhores músicas do disco: “I’m Straight”, rock de veia blues em que, hilariamente, um adolescente, fascinado pelo poder que rapaz tem para com as mulheres, tenta reafirmar sua masculinidade dizendo: “Eu sou hétero” (mais uma vez, uma maravilha de rima rica de Richman: “But I'm straight/ and I want to take his place”). Fowley vale-se do expediente de aumentar o microfone do vocal, fazendo com que se captem os mínimos suspiros. Junto, enche o timbre da caixa da bateria, que estronda alta. Guitarra e baixo, em escala média, soam, entretanto, bem audíveis, formando um som orgânico. Alguma semelhança com o estilo de sonoridade dada por Steve Albini ao Pixies ou Nirvana não é mera coincidência.

A outra assinada por Fowley é a também muito boa: “Government Center”, que desfecha-o CD num rock de ares de twist mas que, pela característica da produção (as palmas acompanhando o ritmo, o moog, a marcação no baixo), remete a The Seeds, The SonicsThe Monks e a outras garage bands norte-americanas.
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FAIXAS:
1. Roadrunner - 4:05
2. Astral Plane - 3:00
3. Old World - 4:03
4. Pablo Picasso - 4:21
5. I'm Straight - 4:18
6. Dignified And Old - 2:29
7. She Cracked - 2:56
8. Hospital (Jerry Harrison) - 5:35
9. Someone I Care About - 3:39
10. Girl Friend - 3:54
11. Modern World - 3:43
12. Government Center - 2:03
todas as composições de autoria de Jonathan Richman, exceto indicada.

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OUÇA O DISCO:




domingo, 2 de agosto de 2015

Feira do Vinil – Groovaholic – Porto Alegre/RS (4/7/2015)

Nós na adorável tarde no Grovaholic
foto: Juliano Oster
Sábado desses, entre várias atividades que começaram pela manhã e só terminariam por volta da meia-noite, Leocádia e eu achamos uma brecha na agenda para conferir a Feira do Vinil da Groovaholic, no bairro Bom Fim, convidados por nosso antenado e querido amigo Christian Ordoque, colaborador do blog, que nos esperava lá. Acompanhados da mana Carolina e da prima Gabriela, para Leo e eu tratava-se de um retorno, haja vista que havíamos estado na loja em fevereiro, quando a mesma recém abria suas portas. Não havia ainda nem o café, no qual paramos dessa vez para um agradável papo e um lanche.
Eu à cata dos LP's
foto: Leocádia Costa
Em seguida, entretanto, fui ao que mais interessava ali além das companhias: os LP’s. Quando estive pela primeira vez enlouqueci pela qualidade e variedade dos títulos oferecidos. Do rock anos 50, 60 e 70, passando pela soul music e o rap anos 80 e 90 mas, principalmente, vários clássicos de jazz. Tudo em edições novas, com arte de capa e encarte caprichados que reproduzem os originais, e gramatura do acetato de 180 gramas. Uma finura. Desta vez, não foi diferente: muitos títulos para escolher. No critério, esses aqui foram os que levamos pra casa:




"Crescent"John Coltrane Quartet (1963) – Dispensa apresentações. Talvez o melhor disco do mestre Trane e seu famoso time de craques (McCoy TynerElvin Jones e Jimmy Garrison), "Crescent" é nada mais nada menos que o último passo antes do “mantra musical” "A Love Supreme". Para alguns, inclusive, passo esse já definitivo e definidor  até melhor do que o grande clássico de 1964. Tudo é perfeito e elevado, mas as baladas! Meu amigo: que deslumbre! “Wise One” e “Lonnie’s Lament”. Isso sem falar da grandiosa faixa-título, da homenagem a Bessie Smith e da intensa “The Drum Thing”. Será ÁLBUNS FUNDAMENTAL certo.



"Loveless"My Bloody Valentine (1992) – Obra-prima do rock alternativo britânico, é maravilhoso tê-lo no formato vinil. Listado entre os 30 melhores discos de rock de todos os tempos pelo crítico musical e historiador italiano Piero Scaruffi (que também o inclui como 1° na de shoegaze rock), “Loveless” é uma verdadeira sinfonia das guitarras, tão distorcidas, sobrepostas e reafinadas que, homogeneizados aos outros sons e timbres, compõem uma peça única em que as faixas se tornam partes de um todo. Não à toa já é ÁLBUNS FUNDAMENTAL do Clyblog há horas.




“Speak no Evil!”, Wayne Shorter (1964) – Outro clássico do jazz, que completou louváveis 50 anos em 2014. Shorter, dos meus jazzistas preferidos, estava absolutamente encantado nessa época (haja vista que cunhou outra obra-prima naquele mesmo ano, "Night Dreamer"). Gosto muito desse disco também, em especial da faixa de abertura, “Witch Hunt”, e a elegantérrima ”Fee-Fi-Fo-Fum” e a lânguida “Infant Eyes”. Mas um dos motivos que me motivaram também a comprá-lo nesse formato é a maravilhosa arte da capa de Reid Miles, para mim uma das mais geniais de todos os tempos. Promete mais um ÁLBUM FUNDAMENTAL de Shorter.





“Black Monk Time”, The Monks (1965) – Assim como The Sonics, The Seeds e The Troggs, os Monks são das minhas amadas garage bands dos anos 60 que anteviram o punk. No caso deles, especificamente, o disco, talvez o primeiro “álbum preto” da história do rock (abrindo caminho para os vários “black” e “whitealbuns que viriam depois, de Beatles a Metallica), mereceu essa reedição é uma verdadeira preciosidade, muito bem acabada. Do sulco, sai pura corrosão! É fantástico imaginar que essa galera (norte-americanos que, servindo na Alemanha, gravaram-no em Berlim), travestindo-se de monges franciscanos (até no corte de cabelo!) faziam um som tão revolucionário e agressivo. Merece muitas audições.






segunda-feira, 12 de março de 2012

Red Hot Chilli Peppers - "Blood Sugar Sex Magik" (1991)


"They're Red Hot"
Robert Johnson


Eles pintaram como uma interessante surpresa ali pela metade do anos 80 com sua mistura rock-funk-rap. Não que aquilo fosse uma absoluta novidade, mas o som daqueles malucos do Red Hot Chilli Peppers trazia um pouco mais de malícia, de tempero, de pimenta. Mas tinha outro diferencial em relação a outras bandas que tentassem fazer aquele tipo de som: um baixista habilidosíssimo de formação no hard-rock e punk, mas de influências jazzísticas notórias.
Os primeiros discos da banda causaram boa impressão, prometiam mas não pareciam tirar o máximo que eles podiam dar, em "Mother's Milk" de 1989 já mostravam um som mais encorpado, mas foi em "Blood Sugar Sex Magik" de 1991, seu 5° trabalho que os Red Hot Chilli Peppers, com a ajuda do mestre de estúdio, Rick Rubin, conseguiram lapidar seu som e produzir uma das obras-primas dos anos 90.
O funk dos caras estava calibrado, as composiçõe mais ousadas e seguras, as tentativas iam na mosca e Flea, o homem do baixo, estava, especialmente, endiabrado.
"The Power of Equality" vem à frente já para comprovar tudo isso: com uma linha de baixo swingada, a guitarra preenchendo os espaços e o vaocal rappeado de Kieds, abre o disco em grande estilo.
"If You Have to Ask" tem um refrão totalmente Funkadelik, num funk à antiga com uma guitarra novamente muito bacana. Aliás, mesmo sem grandes arroubos, com um estilo discreto, jogando mais pro time do que em nome da glória pessoal, o guitarrista John Frusciante mata a pau em várias como na gostosa "Apache Rose Peacock", na embalda "Funky Monks" e na selvagem "Greeting Song".
Com uma evidente ão do produtor, "Breaking the Girl", uma das grandes dos disco, é ousada em sua concepção com suas influências indianas, instrumentação com flautas e com ênfase no trabalho de bateria e percussão.
Não há como não destacar "Give It Away", o grande hit do álbum. Um funkaço alucinado com um a guitarra retinindo, uma incrível linha de baixo sinuosa e escorregadia, e um dos refrões mais bacanas e originais da história do rock.
Na sequência já vem outra das minhas preferidas onde uma batida marcada e pesada seguida de um riff com wah-wah apresentam "Blood Sugar Sex Magik" que tem outra interpretação marcante de Anthony Kieds, quase sussurrando nos versos e expplodindo em vigor nos refrões.
E tem a ótima "Suck My Kiss", forte ,aressiva e pesada; "The Righteous and the Wicked " com outro baixão mataror de Flea; a superlegal "Naked in the Rain"; e a boa "My Lovely Man" que homenageia o ex-guitarrista falecido Hillel Slovak.
A rotação só baixa mesmo no disco com "I Could Have Lied" e "Under the Bridge", uma balada sobre drogas com um coral apoteótico no final. "Sir Psycho Sexy" poderia tranquilamente ter a honra de fechar o disco  pela grandiosidade que vai assumindo ao longo de sua extensão de mais de 8 minutos, mas a tarefa fica bem nas mãos de "They're Red Hot", cover de Robert Johnson aceleradíssima e ensandecida, que faz jus aos adjetivos que carregam no nome: Eles são relamente quentes!
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FAIXAS:
1. "The Power of Equality" 4:03
2. "If You Have to Ask" 3:37
3. "Breaking the Girl" 4:55
4. "Funky Monks" 5:23
5. "Suck My Kiss" 3:37
6. "I Could Have Lied" 4:04
7. "Mellowship Slinky in B Major" 4:00
8. "The Righteous and the Wicked" 4:08
9. "Give It Away" 4:43
10. "Blood Sugar Sex Magik" 4:31
11. "Under the Bridge" 4:24
12. "Naked in the Rain" 4:26
13. "Apache Rose Peacock" 4:43
14. "The Greeting Song" 3:14
15. "My Lovely Man" 4:39
16. "Sir Psycho Sexy" 8:17
17. "They're Red Hot (Robert Johnson)" 1:11

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Ouça:
Red Hot Chilli Peppers Blood Sugar Sex Magik