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quinta-feira, 12 de setembro de 2024

cotidianas #841 - Natureza

 



Carolina sempre tivera uma ligação muito forte com a avó, muito próxima. Na verdade, todos no bairro adoravam Dona Tereza. Senhora alegre, falante, espontânea. Era a típica vozona, aquela cúmplice e protetora dos netos. Para Carolina, Dona Tereza era como uma mãe. Foi quem mais a incentivou quando decidira ingressar no curso de assistente social, mesmo diante da resistência do pai de Carolina, seu filho, que considerava uma profissão 'pra morrer de fome'.
Carolina cursou, se formou e, apoiada pela avó, foi para o Rio tentar a vida na cidade. Batalhou, fez concursos, entrevistas, até que conseguiu trabalho. Um bom trabalho! Conseguiu se estabelecer, montar apartamento e garantir uma vida estável e sabia que devia muito daquilo ao incentivo da avó.
Mantinha contato, voltava à cidade natal sempre que possível, mas a correria da vida, o dia a dia atropelado e cheio de obrigações, fizeram com que esse contato fosse rareando.
Ligava para o pai, recebia notícias da avó mas o fato é que o tempo passava e, inevitavelmente, Dona Tereza fica mais velha. A saúde já não era a mesma, as deficiências da idade já se manifestavam de maneira implacável, até que um dia recebera a notícia que nunca gostaria de ouvir: a avó havia falecido.
Pediu licença do trabalho, tirou uns dias e voltou à sua cidadezinha, no interior da Bahia para o adeus à tão amada vozinha.
Enterro, despedida, abraços, lágrimas, enfim... Fazer o quê? Todo mundo vai um dia. É da natureza.
Na casa do pai, já mais consolada e conformada, chegando da cerimônia fúnebre, Carolina, cansada do dia longo e desgastante, deixou-se desabar no sofá. Fechou os olhos, repassou, num flash, momentos com a avó. Sorriu. Ah, Dona Tereza! À sua frente, na mesa de centro, estava a pasta de elástico com a certidão de óbito. Como que numa certificação, agora sim, oficial do que acabara de ver no cemitério, resolvera ler o documento: Naturalina Maria Conceição dos Santos.
Como assim?
Erraram o nome da sua avó?
E nem tinha Tereza no nome.
Erguera-se num salto e saiu atrás do pai pela casa.
Mostrou-lhe o erro.
Erro nenhum.
Sua mãe, avó de Carolina, chamava-se, sim, Naturalina. Os vizinhos é que achavam muito complicado, difícil de lembrar, aí associavam com natureza: Naturalina, natureza, Naturaleza, natural, Tereza... Misturaram as coisas e simplificaram. Tereza pegou, e dona Naturalina ficou mesmo conhecida como Tereza.
Carolina agora ria. Nunca soubera o verdadeiro nome da avó. Era uma espécie de batismo após a morte. Mas seria muito estranho, agora, passar a se referir àquela mulher que estivera perto dela a vida toda como Naturalina. Seria quase como se tivesse sido outra pessoa. Dissesse a certidão de nascimento ou a de óbito o nome que fosse, para Carolina, aquela mulher de quem acabara de se despedir sempre seria a vó Tereza. Assim era natural para ela.

Cly Reis

para Ana Carolina
(inspirado em
fatos verídicos)

quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Música da Cabeça - Programa #377

 

Olhar para o céu tem trazido surpresas ultimamente. Mas não estou falando do sol vermelho de poluição, que esse é motivo de se preocupar. Falo, sim, do MDC, que raiou no céu para iluminar mentes e corações. Tem PJ Harvey, Milton Nascimento, Kula Shaker, Tim Maia e Pat Metheny pra cumprir esse papel. Ainda, um Sete-List, enumerando momentos da carreira de Sérgio Mendes. Radiante, o programa vai ao ar (puro, neste caso) às 21h, na solar Rádio Elétrica. Produção, apresentação e olhos ardendo: Daniel Rodrigues.


www.radioeletrica.com


terça-feira, 10 de setembro de 2024

Kula Shaker - "K" (1996)

 




"Govinda Jaya Jaya
 Gopala Jaya Jaya"
saudações à deusa Krishna
na canção "Govinda"



Cara, Kula Shaker é muito Beatles!

Mas calma, não precisam se exaltar os beatlemaníacos mais apressados. Não estou dizendo que é igual, não estou dizendo que é melhor. Não são os novos Beatles. Mas a vibe de "K", o disco de estreia desses ingleses é muito a cara do quarteto de Liverpool. A psicodelia, a "pureza", aquela energia com ares de rock sessentista, os vocais em dueto, os coros de fundo nos refrões, o experimentalismo, a produção com aquela sujeira quase artesanal das guitarras... Tudo está lá.

"Into the Deep", "Magic Theatre", "Hollow Man", dividida em duas partes igualmente viajandonas, e até "Grateful When You're Dead", que faz referência direta a outra banda (Grateful Dead), são provas incontestes dessa influência.

Isso sem falar no toque oriental, indiano, característico daquelas coisas que George Harrison, especialmente, gostava de fazer, e que dão a tônica praticamente de todo o álbum. A própria capa não deixa dúvidas, não. "Sleeping Jiva", instrumental executada toda com instrumentos típicos hindus; a lisérgica "Tattva" um transe rock'n roll; a celebração reverencial de "Temple of Everlasting Light"; e, especialmente, "Govinda", uma peça apoteótica, e a que melhor conjuga o psicodelismo rock'n roll com a sonoridade exótica e suas representatividades espirituais, são os melhores exemplos dessa revisita aquela rica fusão que Harrison já levara seus companheiros de banda a experimentar lá nos idos dos 60's.

Destaque também para o rock estridente da vibrante "303", para a balada folk "Start All Over, com cara de "Rubber Soul", e para o funk-rap-krishna psicodélico "Hey Dude", cuja semelhança, "por mínima que seja", com algum título de música dos Beatles que você conheça, provavelmente, não terá sido mera coincidência.

Imitação? Não. Eu diria inspiração. E os rapazes do Kula Shaker tiraram bom proveito da fonte nesse seu magnífico "K".


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FAIXAS:

  1. Hey Dude
  2. Knight on the Town
  3. Temple of Everlasting Light
  4. Govinda
  5. Smart Dogs
  6. Magic Theatre
  7. Into the Deep
  8. Sleeping Jiva
  9. Tattva
  10. Grateful when You're Dead / Jerry Was There
  11. 303
  12. Start All over
  13. Hollow Man

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Ouça:
Kula Shaker - K


Cly Reis 

sexta-feira, 6 de setembro de 2024

Tortoise


 





"Tortoise"
RODRIGUES, Daniel
Vídeo - agosto/2024

Código Penal - Abertura Show Ratos de Porão - Bar Opinião - Porto Alegre/RS (31/08/2024)


31 de agosto de 2024 seria um dia qualquer na vida de seis indivíduos. A não ser que, como num passado não tão distante, tenham recebido um convite que faria essa data ter outro significado.

 Não sei dizer se se trata de sonhos, objetivos ou simplesmente resultados, porque, afinal, existe uma trabalho realizado que, durante todos esses anos, possa estar sendo notado agora.

 Falo do convite feito lá em março pela Ablaze Produtora, que chamou nós da Código Penal para fazer a abertura do show dos Ratos de Porão!!

 RATOS DE PORÃO, cara!!!

 Naquele momento, tive um breve momento de tipo: “porra, está acontecendo...”, e de lá até o fatídico dia 31 foram meses de preparo, ensaios, planos. Por que, afinal, era a Ratos de Porão mano, e a Código Penal, carai!!

Lucio e o mitológico Jão, da formação
original da Ratos de Porão
com João Gordo
Nunca deixamos de acreditar no trabalho da banda, mas também nunca tivemos a pretensão de querer ser mais que ninguém. Só que chegou o dia! Frio na barriga, ansiedade, passagem de som, equipamento, equipe técnica, logística, tudo funcionando em sincronia para a noite…. 

Porém, durante a semana tivemos um probleminha: nosso baixista foi operado. E agora? Na sexta-feira que antecedia o show, dois dias antes, ele se negou a não fazer o show e, no dia, foi mesmo morrendo de dor. Numa adrenalina insana, subiu ao palco do Bar Opinião e deu o seu melhor.

 Começamos com “Terra de Ninguém’, que fez com que o público que estava chegando fosse encostando na grade, pois, afinal, quem é Código Penal?! A sequência foi de mais petardos e, junto disso, a interação com a galera e aquela sensação de ansiedade do início foi também se dissipando, transformando-se no maior espetáculo realizado por nós naqueles 40 minutos em que, acredito, 80% do público que assistiria a Ratos de Porão logo depois sem dúvida prestou atenção no que nós tínhamos pra mostrar e dizer.

 Enfim, Código Penal vive firme e forte! E que venham novos desafios, pois estamos prontos!!

Confira um pouco de como foi o show!

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Show da Código Penal no Bar Opinião na íntegra



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texto: Lucio Agace
fotos e vídeo: Jéssica Khune e arquivo pessoal