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quarta-feira, 14 de março de 2018

Música da Cabeça - Programa #50



E chegamos ao Música da Cabeça de nº 50! Para celebrar, a gente traz uma série de coisas legais no programa que vai ao ar hoje. A começar pela entrevista exclusiva com o músico, jornalista, escritor e ilustrador Cadão Volpato. Sim, ele mesmo, da banda Fellini, do antigo programa Metrópolis, da TV Cultura, da Funziona Senza Vapore, dos livros, das ilustrações. Um cara multifacetado que falou com a gente para o quadro “Uma Palavra”. Igualmente especial estará o set-list, que contará com Lincoln Olivetti & Robson Jorge, Caetano Veloso, The Beatles, Sly & The Family Stone e mais. Se não ouvir, não será por falta de aviso, hein? É hoje, às 21h, na Rádio Elétrica. Produção e apresentação: Daniel Rodrigues.



Rádio Elétrica:
http://radioeletrica.com.br/

segunda-feira, 9 de setembro de 2019

4ª Feira de Vinil Gira Música - Casa da Polônia - Rio de Janeiro/RJ (1º/09/2019)



O dias em que passamos Leocádia e eu no Rio de Janeiro foram invariavelmente lotados. Só coisa boa, mas lotados. Mas sempre se tem espaço para encaixar mais uma programação, ainda mais quando esta trata de música. Ou melhor: quando esta trata de música E discos, o que para um colecionador é um prato cheio. Minha mãe, sabendo de nosso gosto, havia avisado dias antes que ocorreria, no domingo, a Feira de Vinil Gira Música, na Casa da Polônia, no próprio bairro e avenida onde estávamos instalados, Laranjeiras. Pois que, voltando de um passeio no bairro Jardim Botânico neste dia, eis que cruzamos em frente à feira. Obviamente que descemos e fomos dar uma conferida, o que não só valeu a pena a título de passeio como, claro, de compras.

A feira trazia food trucks, bancas com artesanato e bijuterias e uma exposição sobre o célebre músico, arranjador e produtor Lincoln Olivetti, morto há  4 anos, infelizmente muito primária e amadora e que não dimensionava nem de perto a relevância do homenageado. Mas isso não era o mais importante e, sim, aquilo que nos levou até lá: os discos. Com expositores cariocas mas também vindos de Minas Gerais e São Paulo, a feira estava muito boa em termos de quantidade e variedade. Todos os gêneros musicais contemplados, mas principalmente rock, MPB e jazz. O nível dos expositores chamou atenção, uma vez que todos sabem muito bem o acervo que oferecem. Ou seja: os discos raros tinham preços que justificavam suas particularidades. Títulos como "A Bad Donato", de João Donato, "Stand", da Sly & Family Stone, o primeiro disco de Arthur Verocai, "Spirit of the Times", de Dom Um Romão, "Blue Train", de John Coltrane, ou o disco do próprio Lincoln em parceria com Robson Jorge, clássico da AOR brasileira, não saíam por menos que 500, 400, 350, 200, 180 Reais ou valores parecidos.

Galera percorrendo as prateleiras em busca "daquele" vinil
Clima descontraído e musical da Feira de Vinil na Laranjeiras
Não só vinil tinha na feira
Eu vasculhando as preciosidades da banda do Sonzera, um dos expositores
Pedaço da miniexposição sobre Lincoln Olivetti: deixou a desejar

Em compensação, vários balaios. E bons! Com muita variedade e, às vezes, até discos raros, era possível encontrar unidades a 10, 20 ou 30 Reais. E foi aí que me esbaldei, passando algumas horas na feira percorrendo as caixas com promoções enquanto Leocádia aproveitava outras atividades ou simplesmente me aguardava. Uma das atrações da feira seria a presença do cantor e compositor Hyldon, lenda da soul brasileira, que estaria à tarde autografando seu disco relançado, mas não ficamos para isso. Afinal, já estávamos muito bem alimentados com o que encontramos de variedade e qualidade de bolachões, inclusive esses, os que levamos para casa:



“Limite das Águas” – Edu Lobo (1976)
Edu tem vários discos solo cultuados, como “Missa Breve”, “Camaleão” e “Jogos de Dança”, mas não raro este aparece como o preferido do autor de “Ponteio”. Afinal, não tem como não adorar as parcerias como Capinan, Cacaso e Guarnieri, além do primor dos arranjos do próprio Edu e as participações de músicos do calibre de Oberdan Magalhães, Cristóvão Bastos, Joyce, Toninho Horta, Danilo Caymmi e o grupo vocal Os 3 Morais. Coisa fina da MPB.


“Libertango” – Astor Piazzola (1974)
Um dos gênios da música do século XX em seu disco mais icônico. Gravado em Milão, é a representação máxima do tango argentino moderno, tanto que as próprias faixas, assim como a que o intitula, trazem o termo “tango” no nome: Meditango, Violentango, Undertango, entre outras. De ouvir ajoelhado - ou tangueando.



“Brazilian Romance – Sarah Vaughn with Milton Nascimento” ou “Love and Passion”  Sarah Vaughn (1987)
A grande cantora norte-americana Sarah Vaughn, amante da MPB, recorrentemente voltava ao gênero. Depois de gravar discos como “Exclusivamente Brasil” e “O Som Brasileiro de Sarah Vaughn”, nos ano 70, em 1987 ela torna à sonoridade do Brasil por meio de um de seus mais admirados compositores: Milton Nascimento. E o faz isso com alto grau de requinte, haja vista a produção de Sérgio Mendes, os arranjos de Dori Caymmi e participações de gente como George Duke e Hubert Laws. Ela quase levou um Grammy de melhor performance feminina por este álbum.

“Merry Christmas, Mr. Lawrence (Music From The Original Motion Picture Soundtrack)”  Ryuichi Sakamoto (1983)
Tenho adoração por este filme intitulado no Brasil como “Furyo - em Nome da Honra”, e tanto quanto pela trilha sonora, escrita pelo genial Ryuichi Sakamoto. Que, aliás, atua neste filme de Segunda Guerra do mestre Nagisa Oshima, o qual conta no elenco (e só no elenco, o que acho legal também em nível de desprendimento) e como ator principal David Bowie em espetacular atuação. A faixa-título é não só linda como um marco das trilhas sonoras feitas para cinema.


“Stories to Tell” – Flora Purim (1974)
Terceiro disco solo de Flora e segundo dela em terras norte-americanas. Ou seja, vindo um ano após o seu debut “Butterfly Dreams”, no mesmo ano de“Hot Sand”, do então marido Airto Moreira, e dois da estreia com Chick Corea na Return to Forever, “Stories...” a consolida como a musa do jazz brasileiro. Ainda por cima tem Carlos Santana, George Duke, Ron Carter e o próprio Airto compondo a “bandinha”. E que voz é essa a dela?! 




“Amor de Índio” – Beto Guedes (1978)
Dos discos mais célebres da chamada “segunda fase” do Clube da Esquina. A galera tá toda lá: Milton, Brant, Toninho, Tiso, Venturini, Tavinho, Caetano e, claro, Ronaldo Bastos, produtor, compositor com Beto da faixa-título e autor da icônica foto dele enrolado no cobertor usada por Cafi na arte da capa.



texto: Daniel Rodrigues
fotos: Leocádia Costa e fanpage Gira Brazil - Gira Música

quinta-feira, 23 de março de 2023

Sandra Sá - "Vale Tudo" (1983)


"Alô, Sandra Sá! Aqui é o Tim Maia. Eu fiz essa música pra você. Já tenho a ideia do arranjo, que eu vou falar com o Lincoln (Olivetti). E tem mais: eu vou gravar ela contigo no teu LP!" 
Tim Maia, em ligação telefônica para Sandra Sá, sobre a música “Vale Tudo”

O chamado Black Rio foi o grande movimento cultural próprio do Rio de Janeiro depois da bossa nova. Se não teve a mesma influência ou projeção internacional que as notas dissonantes ou que a Garota de Ipanema, a cena, movida à música soul importada dos states mas com tempero bem tupiniquim, cumpria uma função social corajosa ao exaltar algo inédito naquele Brasil ditatorial dos anos 60 e 70: a cultura negra. Influenciado pelo Black is Beautiful dos Estados Unidos, o movimento Black Rio conseguia levar a pistas brasileiras aquilo que o perseguido samba, o mais brasileiro dos ritmos, nunca havia alcançado, que era a valorização uma raça preponderante em população, mas marginalizada, violentada e desumanizada pelo histórico e estrutural racismo.

As danças, as roupas, os pisantes, os cabelos, a pele, os gestos. Tudo compunha o cenário de deslumbramento e descoberta dos bailes black, que tomavam a Zona Norte carioca. Equipes de som como Furacão 2000, Soul Grand Prix, Modelo, Sua Mente numa Boa, Rick e Revolução na Mente garantiam a festa, frequentada por milhares de pretos e pretas. E claro: a música exercia um papel fundamental nesta inédita onda de autovalorização e resistência. E se a Banda Black Rio tinha a autoridade sonora e onomática de grande grupo da cena, Gerson King Combo o de astro central e Carlos Café o de principal cantor, havia a necessidade de responder também ao público feminino. Sandra Sá, então, naturalmente veio tomar este espaço.

Nascida em Pilares, na Zona Norte carioca, a neta de africanos Sandra Cristina Frederico de Sá levou sua voz rouca e cheia de groove das festas black direto para as rádios, um salto inédito na indústria musical brasileira até então para uma artista negra de música pop. Depois de um celebrado álbum de estreia, em 1980, com direito a música inédita de Gilberto Gil ("É"), Sandra é adotada de vez pela turma da soul brasileira. O sucesso comercial de "Lábios Coloridos", do segundo disco, de 1982, já contava com Lincoln Olivetti nos teclados e arranjos, Robson Jorge nas guitarras, o Azimuth Ivan Conti "Mamão" na bateria e a cozinha da própria Banda Black Rio, a se ver pelas participações ativas de Oberdan Magalhães, Jamil Joanes e Cláudio Stevenson. Em "Vale Tudo", terceiro e último trabalho pela gravadora RGE, Sandra repetia as parcerias e já estava pronta para sua grande obra, a qual completa 40 anos de lançamento em 2023.

O precioso repertório de "Vale Tudo" une músicas de autores consagrados e da nova geração, que passava a se firmar. A começar pela faixa-título: o sucesso instantâneo de Tim Maia dado de presente por ele a Sandra. Não é difícil entender o porquê: em duo com o próprio Síndico, Sandra solta a voz numa animada disco engendrada pelo próprio autor em parceria com Lincoln e executada pela banda Vitória Régia. Ouvir os dois maiores cantores da soul brasileira juntos foi tão estrondoso, que a faixa ganhou videoclipe do Fantástico e virou hit em todo o Brasil, figurando na 28ª de posição entre as 100 músicas mais tocadas do ano de 1983.

videoclipe de "Vale Tudo", com Sandra Sá e Tim Maia

Mas se tinha Tim, tinha Cassiano também. É dele a autoria do funk suingado "Candura", em preciosa parceria com Denny King, das melhores do disco. E se havia Tim e Cassiano, também aparecia Guilherme Arantes, na romântica "Só as Estrelas", que encerra o álbum. Com o samba-funk brasilianista "Terra Azul", a dupla veterana Júnior Mendes e Gastão Lamounier eram outros que não resistiram ao talento da cantora, sendo fisgados por seu carisma e seu timbre, que não deixava nada a desejar a grandes cantoras internacionais da época. Se os norte-americanos tinham Donna Summer, Roberta Flack e Chaka Khan, o Brasil tinha Sandra Sá.

De fato, ninguém queria ficar de fora do bonde de Sandra. Tanto é que músicos de primeira linha como Serginho Trombone e Reinaldo Árias também tocam e assinam arranjos. Igualmente presente, seja na caprichada produção quanto em arranjos, é o tarimbado violonista Durval Ferreira, cujo currículo inclui trabalhos com Leny Andrade, Sérgio Mendes e o lendário saxofonista de jazz norte-americano Cannonball Adderley. Ferreira também assina duas composições: o tema de abertura, a excelente "Trem da Central", ao lado de Sandra e Macau (este, o autor de “Lábios Coloridos”), e o funk dançante “Pela Cidade”. Ambas as músicas trazem um olhar diferente da Rio de Janeiro idílica da Zona Sul, evidenciando uma cidade preta e periférica que começava a pedir passagem.

Fotos das gravações no encarte
original de "Vale Tudo"
Outras duas delícias emitidas pelo aveludado vocal de Sandra: “Gamação”, soul de muito suingue e romantismo, e a brilhante "Guarde Minha Voz", do craque Ton Saga, tranquilamente uma das mais belas canções pop-soul já gravadas no Brasil. Uma joia equiparável a outros “clássicos B” do AOR brasileiro, como “Débora”, de Altay Veloso, “Joia Rara”, da Banda Brylho, ou “Lábios de Mel”, de Tim. Como diz a letra: para se guardar no coração.

Embora a maioria das músicas seja de compositores masculinos, o disco de Sandra traz uma outra pequena revolução, que é o papel de mulheres como autoras. Além dela própria, que assina a balada “Musa” e coassina “Trem...”, a carioca abre espaço para compositoras no seu repertório já tão disputado. Rose Marinho divide a autoria da já citada “Pela Cidade” com Durval e outro veterano, Paulo César Pinheiro, enquanto Irineia Maria revela outro destaque do disco: a apaixonada “Onda Negra”. Balada soul deliciosa, com a arranjo de Oberdan, contém em sua letra vários elementos representativos da figura de Sandra para o movimento Black Rio, que é um filtro de olhar feminino para aquela “onda negra de amor” que se presenciava: “Nessa forma de beleza/ Vou seguindo a te levitar/ E o som me envolve me fascina/ Não consigo mais parar/ Mas é sempre uma dose certa/ De alegria, paz de luz e cor/ E a certeza de poder criar/ Uma onda negra de amor”. Mais visto na MPB de então por conta da geração de compositoras como Joice Moreno, Leila Pinheiro e Sueli Costa, no meio pop Sandra prenunciava aquilo que se tornaria comum anos depois para Cássia Eller, Adriana Calcanhoto, Vange Leonel e outras, bem como, especialmente, para as cantoras pretas brasileiras da atualidade, tal Xênia França, Larissa Luz, Luedji Luna, Iza e outras.

Depois de “Vale Tudo”, Sandra - que adicionaria definitivamente dali a alguns anos a preposição “de” original de batismo ao nome artístico - ainda alcançou sucessos esporadicamente, principalmente com “Bye Bye, Tristeza”, de 1988. Numa viragem mais pop e comercial para a carreira, hits como este, embora a tenham ajudado a se consolidar no cenário musical brasileiro, denotavam, por outro lado, que a fase áurea havia terminado. Porém, ninguém tira de Sandra o nome gravado na história da música brasileira, haja vista que sua credibilidade como artista e seu legado permanecem inalterados. Mais do que isso: renovados. Um disco como este, mesmo ouvido quatro décadas depois de seu lançamento, soa como um agradável compêndio do que de melhor havia na soul music brasileira àquela época e, porque não dizer, na história da música preta no Brasil. Está tudo lá: intacto. Assim como a voz de Sandra, que o público a atendeu e guardou no coração.

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FAIXAS:
1. “Trem Da Central” (Durval Ferreira, Macau, Sandra Sá) - 4:03
2. “Candura” (Cassiano, Denny King) - 3:03
3. “Pela Cidade” (Durval Ferreira, Paulo César Pinheiro, Rose Marinho) - 3:21
4. “Onda Negra” (Irinéia Maria) - 3:40
5. “Gamação” (Pi, Ronaldo) - 3:14
6. “Vale Tudo” (Tim Maia) - 4:07
7. “Guarde Minha Voz” (Ton Saga) - 3:11
8. “Terra Azul” (Gastão Lamounier, Junior Mendes) - 3:33
9. “Musa” (Sandra Sá) - 2:46
10. “Só As Estrelas” (Guilherme Arantes) - 3:26

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Daniel Rodrigues