Seu Chico, personagem de Milton em "Carandiru", de 2003
Dia desses conversava com um colega sobre a grandeza de
alguns atores brasileiros que, não fosse o entrave cultural à língua portuguesa
no mundo do entretenimento (ou a qualquer outro idioma que não o inglês),
estariam voando alto mundo afora. Vários grandes ficaram apenas para “consumo
interno” do brasileiro na tevê, no cinema ou no teatro. Alguns, tiveram em
produções internacionais, como José Wilker, José Lewgoy e Grande Otelo, mas não
despontaram internacionalmente. A exceção são Carmen Miranda, ícone, e Sônia Braga e Rodrigo Santoro,
que se adaptaram ao idioma de fora. Fernanda Montenegro é também um caso que não foge à regra: vencedora
de Globo de Ouro e concorrente ao Oscar falando português há 25 anos, nunca
mais concorreu a algo deste vulto mesmo com excelentes trabalhos posteriores a “Central do Brasil”. Por quê? Seguiu falando somente (e suficientemente) o português.
Semelhante ocorreu com Milton Gonçalves, que faleceu no último
dia 30, aos 88 anos. Lembro do policial que ele viveu em “O Beijo da Mulher Aranha”, de
Hector Babenco, em 1986, filme que deu o Oscar de Melhor Ator para o norte-americano John Hurt, com quem
Milton contracena, contudo, sem dever em nada. Milton foi, sim, da altura de Hurt, Freeman, Hopkins, Lancaster, Hanks, Lee Jones. A diferença? O português.
Se no cenário internacional Milton foi um dos que quase alçou,
em seu terreiro, contudo, voou alto. Foi uma das vozes negras mais importantes da
dramaturgia brasileira em mais de 60 anos de carreira. Por esse protagonismo preto, para além de outros grandes
atores brasileiros como ele, deixou uma marca insubstituível no teatro, na TV e no cinema. Este mineiro de Monte
Santo teve importante atuação no Teatro de Arena de São Paulo, no Teatro
Experimental do Negro de São Paulo, no Grupo Opinião, no Teatro dos Quatro e em
outras companhias. Como ator de novelas e seriados, nem se fala! Embora pouco lembrado por isso, foi também foi o primeiro negro
a dirigir uma novela na Globo – e não qualquer novela, mas sim o sucesso
internacional da primeira versão de “A Escrava Isaura”, de 1976. Mas não só
isso: esteve decisivamente em todos os momentos demarcatórios do cinema brasileiro:
no neorrealismo dos anos 50 (“O Grande Momento”), no Cinema Novo (“Macunaíma”),
no udigrudi (“O Anjo Nasceu”), na fase Embrafilme (“Eles Não Usam Black-Tie”), na
primeira internacionalização (“O Beijo da Mulher Aranha”), na retomada (“Carandiru”)
e na produção atual (“Pixinguinha: Um Homem Carinhoso”).
Dotado de espontaneidade e carisma, dominava a arte dramática com maestria, indo do pastelão ao melodrama com a naturalidade dos grandes. Interpretou textos dos maiores, de Guarnieri a Dias Gomes, de Steinbeck a Millôr. Sabia como tratar um texto. De todos os personagens que fez, de Zelão das Asas a Bráulio e Seu Chico,
no entanto, um se destaca especialmente para mim: “A Rainha Diaba”, filme de Antonio
Carlos Fontoura, de 1974. Espécie de blackexplotation à brasileira, o longa, centrado
na atuação de Milton, nasceu do desejo do diretor de mostrar o submundo das
drogas e da prostituição no Rio de Janeiro dos anos 70, com influências
decisivas do teatrólogo Plinio Marcos – responsável pelo argumento – e do
artista plástico Helio Oiticica. Como lembra o jornalista Márcio Pinheiro,
trata-se de um filme livremente inspirado na vida de Madame Satã, porém com
mais violência e menos romantismo. “’A Rainha Diaba’ é, em muitos aspectos,
mais autêntico e biográfico do que o próprio filme que leva o nome do
mitológico travesti da Lapa”, diz em uma postagem nas redes sociais. Milton dá
vida a este personagem andrógeno, que põe pela primeira vez um negro LGBTQIA+ como
protagonista de um filme no Brasil. E isso é muito.
Até o primeiro brasileiro num Emmy Internacional (prêmio
ao qual concorreu como Melhor Ator Internacional, em 2006) ele foi quando entregou
a estatueta de Melhor Programa Infantojuvenil ao lado da atriz norte-americana
Susan Sarandon. Predileção pela estreia, como um ator que sobe ao palco renovado
a cada noite de espetáculo.
Também tive, aliás, uma primeira – e única – vez com Milton. Uma ocasião em que o vi
pessoalmente, a poucos metros. Estava no Rio de Janeiro, nos arredores da
emblemática Cinelândia, acompanhado de minha esposa e de meu irmão numa tarde de agosto de 2018. Nós saímos
de uma livraria e ele, provavelmente, de algum dos teatros daquele quadrante em busca de um dos infindáveis taxis do Rio. Durante os segundos
de espera dele na calçada, pintou-me a dúvida: “Falo com ele?” Mas para dizer-lhe o
quê? pensei. “Parabéns”? “Obrigado”? Minha hesitação momentânea impediu que achasse
algo mais válido que isso e o taxi, obviamente, chegou. Ele embarcou e foi-se
embora com toda sua importância e grandeza. Voou. Aliás, como há muito se ensaiava, seja como Zelão, que sobrevoou Sucupira, seja como o velho Chico, aprendiz das pipas no Carandiru. Eu fiquei na calçada, pés plantados, olhando para cima e sabendo que havia
deixado escapar a oportunidade. Não agarrei suas asas. Depois vi que fiz o certo: deixei-o subir. Quantas asas ele já havia me dado sem saber para que eu, negro homem, um dia voasse também.
Certos marcos temporais não se completam à toa. Em cinema, fenômeno com pouco mais de um século de existência e menos ainda de indústria, décadas contam muito em ternos de significado, ainda mais numa nação jovem como a brasileira. Por isso, diz muito o fato de, há 40 anos, o cinema brasileiro ter perdido Glauber Rocha, principal artífice do Cinema Novo e autor de obras essenciais para a formação do cinema nacional, entre os quais “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, de 1964. Primeiro grande marco do Cinema Novo, esta obra divisional é o produto mais pungente de uma rica leva da produção cinematográfica brasileira motivada por um contexto histórico-social e político implosivo nutrido por abissais contradições. Entre a modernidade nacionalista dos tempos pós-Vargas e a embrionária globalização, havia, em mesma proporção, o alarme pelo alto índice de desigualdade social e a forte tensão de forças políticas que resultaria no Golpe Civil-Militar daquele mesmo fatídico ano de lançamento de “Deus e o Diabo...”.
Incandescentes como o sol que assola a terra destas duas forças, a materialização destas motivações em aspectos fílmicos e narrativos dão à obra de Glauber, seguidamente considerada difícil e cerebral, uma representação estética possível de ser revisitada à luz de produções atuais do cinema nacional. A perspectiva pop que traz “Jesus Kid”, de Aly Muritiba, recentemente exibido – e premiado – no Festival de Cinema de Gramado, entreabre, quase 60 anos depois, portas escancaradas com fúria e poesia por Glauber e sua geração. O filme de Muritiba busca explorar artifícios pop já experimentados com êxito anteriormente, numa tentativa digna de estabelecer diálogo com um público aberto a esta abordagem e, principalmente, com condições de transmissão/replicação das propostas discursivas de “vanguarda” na sociedade, a fatia jovem-adulta dos chamados “formadores de opinião”.
Antes mesmo de rodar “Deus e o Diabo...”, Glauber, um iniciante cineasta e ativo crítico de cinema, exaltava em seu “Revisão Crítica do Cinema Brasileiro”, editado em 1963, o potencial “popular” do Cinema Novo. A ideia dos jovens realizadores do movimento era engendrar um cinema de autor que refletisse a alma de um povo, fosse econômica ou esteticamente. Para isso, vestiam suas obras de características ora muito próprias, mas também de natureza “pop” comuns na acepção mais abrangente do termo. A exemplo do que observava com entusiasmo no cinema de colegas como Paulo César Saraceni, Joaquim Pedro de Andrade e Nelson Pereira dos Santos, Glauber trazia para seu olhar elementos “pop” dentro de seu contexto cultural, histórico e social, como o cinemão norte-americano, a fragmentação sequencial dos quadrinhos a e correlação entre erudito e folclórico – visto, por exemplo, na trilha sonora de “Deus e o Diabo...” dotada de Villa-Lobos e dos cantos de violeiro de Sérgio Ricardo. Igualmente, estão-lhe presentes o cinema de Sergei Eisenstein, Humberto Mauro, John Ford, Luis Buñuel e Roberto Rosselini, todos, à exceção do primeiro, vivos e ativos à época. Elementos que faziam sentido num contexto de “popficação” nos anos 60. Glauber e seus correligionários entendiam que cabia aos autores do cinema uma visão formativa desta inserção de propostas cultas no tecido social. Transformar a alta cultura em hits deglutíveis.
filme"Deus e o Diabo na Terra do Sol", de Glauber Rocha
O uso de elementos “pop” no cinema brasileiro maturou-se ao longo das décadas juntamente com a produção audiovisual nacional. Porém, embora tenha ganho em experiência e até em condições econômicas, alguns ensinamentos parecem ter se dispersado. Em “Jesus Kid”, justamente por seus méritos técnicos, essa inconsistência fica bem evidente. De caprichadas fotografia e direção de arte, o filme de Muritiba se esvazia, por outro lado, naquilo que, certamente, mais almejou realizar, que é uma narrativa de apelo pop. Fugindo do padrão comum, mas também sem recair na proposta alternativa, este formato tenta criar um espaço simbólico que comporta ideias modernas capazes de gerar identificação com o público, sendo um destes recursos a alusão a produtos “do mercado”. Estética e formalmente, “Jesus Kid” apropria-se de referências diretas dos filmes “Barton Fink - Delírios de Hollywood”, de Joen e Ethan Coen (1991), “Cidade dos Sonhos”, de David Lynch (2002) e bastante de Quentin Tarantino, desde os westerns “Os Oito Odiados” (2015) e “Django Livre” (2013) ao episódio de “Grande Hotel” (1995).
Acontece que “Jesus Kid”, mesmo que tenha atingido sua assimilação junto a quem intenta dirigir-se, apresenta duas grandes travas que o impedem de alçar: uma estrutural e outra formal. A começar, o roteiro. Baseado num romance do celebrado escritor Lourenço Mutarelli, o que se verteu das páginas para a construção audiovisual parece ter se descompassado, haja vista, principalmente, o ritmo apressado dos acontecimentos e encadeamentos do filme. Saliente-se: ritmo frenético numa narrativa não pressupõe falta de respiros, visto que a psique do espectador comum – inclusive, o de simpatia ao dito “pop” – carece da tradicional alternância de estados psicológicos da dramaturgia clássica. Subverter isso é optar pelo caminho alternativo, o que está longe de ser-lhe a intenção.
Enquadramento e tonalidades semelhantes de "Jesus Kid" com "Barton Fink": referências diretas
Tanto Tarantino quanto os Coen, os cineastas cujas obras são as mais referidas em “Jesus Kid”, sabem bem disso, pois são conhecidos pelo apreço ao exercício de extensão-distensão da narrativa. O primeiro, com seus longos diálogos preparativos para clímaces; já os irmãos Coen, pelo consciente uso dos espaços vazios visual e narrativamente. Por que, então, pegar-lhes emprestado justo o mais superficial, a estética? Impossível não entender isso como um subterfúgio (pouco assertivo) de atração quase publicitária para a obra. A tarantinesca resolução do filme brasileiro, igualmente, não peca pelo tom satírico ou pela bizarrice – aceitáveis dentro da trama – mas pela falta de preparo a um momento tão importante para a história, visto que o espectador é colocado até ali constantemente num indistinto frenesi de imagens e ações.
Miklos: atuação que enfraquece o filme
Este mesmo raciocínio pode ser aplicado ao outro aspecto analisável de “Jesus Kid”, que é ligado à sua forma: a escolha de Paulo Miklos como protagonista para o papel do escritor Eugênio. Não é difícil perceber que, já no primeiro diálogo, fica evidente o despreparo técnico deste para com os recursos cênicos, visto que recai sobre ele a responsabilidade de sustentar um papel cômico, trágico e cheio de nuanças, difícil até para um ator profissional. Resposta a qual Miklos, ator não-profissional, fatalmente não dá. Mesmo espirituoso e carismático, falta-lhe olhar, falta-lhe tempo de articulação, falta-lhe consciência de movimentos. Se a estratégia era se valer, como na publicidade e seus “garotos-propaganda”, da figura pop de um conhecido astro da música, havia de se avaliar que, como ator, este desempenhou bem no cinema apenas 20 anos atrás em “O Invasor”, de Beto Brant (1997), justo quando teve, conceitualmente, liberdade de uma atuação naturalista dentro da “marginalmente” que o papel exigia, o que supunha desvencilhar-se de balizamentos técnicos. Para “Jesus Kid”, no entanto, a opção por Miklos prejudica sobremaneira todo o andamento, visto que a história se centra no escritor ao qual ele interpreta. Não é difícil imaginar algum ator profissional assistindo o filme e lamentando pelo desperdício de um roteiro promissor.
Há de se entender, contudo, que a caminhada para um cinema de apelo “pop-cult” no Brasil, a exemplo do que outros polos mundiais produzem, principalmente os Estados Unidos, está em pleno curso. Desde que “Deus e o Diabo....” iluminou este caminho, títulos importantes para essa viragem como “O Bandido da Luz Vermelha” (Rogério Sganzerla, 1969), “A Rainha Diaba” (Antonio Carlos da Fontoura, 1974) e “Faca de Dois Gumes” (Murilo Salles, 1989) evoluíram em linguagem e aproximaram os conceitos “brutos” da vanguarda para a massa. Mais proximamente, o cinema pós-retomada dos últimos 30 anos captou bem este espírito a exemplo de “Cidade de Deus” (Fernando Meirelles e Katia Lund, 2002), a franquia “Tropa de Elite” (José Padilha, 2007 e 2010), “Fim de Festa” (Hilton Lacerda, 2019) e o talvez mais bem-sucedido de todos nesta linha: “Bacurau”, de Kleber Mendonça Filho (2019). Todos entenderam o que Glauber avaliava como essencial a uma obra de cinema que se pretende popular: cada um à sua medida, dosa discurso e poesia. Equilíbrio difícil, porém, o que talvez explique a inconstância de obras desta potência e natureza no Brasil. Linguagem em cinema também é continuidade da prática.
Se custou a Glauber e ao Cinema Novo o preço muitas vezes da incompreensão, é curioso perceber como o movimento serviu para emancipar o cinema nacional justamente no aspecto que teve menos êxito, que foi o de representar e dialogar com o público – ou o mais amplo possível deste. Como acontece em processo semelhante na música erudita para com a música pop, as bases lançadas pela primeira passam por tamanho burilo que, quando chegam aos ouvidos da massa, pouco se identifica de seus arrojados acordes geradores. A Glauber, especialmente, homem de poucas concessões e cujo cinema intensificou-se em complexidades alegóricas cada vez mais ao longo dos anos, ficou a pecha de alguém genial, mas de ínfima aceitação e entendimento popular. Independentemente disso, faz quatro décadas que Glauber Rocha deixou, dentre outros legados, as bases de um “cinema pop” para o Brasil sob uma perspectiva doméstica. É justo e genuíno, então, buscá-lo e aperfeiçoá-lo. Talvez, contudo, seja preciso ainda que bata muito sol sobre esta terra para que o diabo da inovação e o deus do gosto popular se harmonizem.
Enfim, chegamos à
terceira e última listagem de filmes brasileiros essenciais para se
entender o nosso cinema no final do século XX, terminando com a
safra dos 80. Mais do que para com os anos 60 e 70, a década de 80
foi a que mais tive dificuldade de escolher entre tantos títulos que
considero fundamentais. Talvez pelo fato de, dos anos 60,
embrionários e revolucionários, haver mais clareza quanto ao que
hoje é tido como essencial, bem como pela até injusta comparação
com os sofridos e minguados anos 70. O fato é que a produção dos
80 vem justificar, justamente, o decréscimo quali e quantitativo da
sua década anterior. Tanto é verdade que, com os reflexos visíveis
da Abertura Política e já se enxergando a tão sonhada democracia
não apenas como uma miragem, os cineastas brasileiros – mesmo com
a menos rígida mas ainda existente censura – passam a ter uma até
então inédita estrutura através de verba do próprio Governo via
Embrafilme.
Foi aí, então, que
os cineastas daqui mostraram o quanto são, de fato, brasileiros. Se
já haviam conseguido, nos 60 e 70, realizações memoráveis sem uma
Atlântida ou Vera Cruz por trás, quando tiveram um tantinho mais
fizeram “chover pra cima”. Desfalcados a maior parte da década
da tempestuosidade de ideias de Glauber Rocha, falecido em 81, além
de Leon Hirszman e Joaquim Pedro de Andrade, também vitimados cedo,
outros cabeças do cinema nacional avançaram em temática, nível
técnico, concepção e apelo com o público. Ironicamente,
entretanto, se os 80 justificaram a baixa dos 70, também herdaram o
inevitável: justo na década que talvez melhor se tenha produzido
para as massas até então, recaiu-lhes a pecha de cinema malfeito e
sem qualidade, motivado, principalmente, pela herança das
famigeradas pornochanchadas, naturalmente desvalorizadas com o
declínio do discurso do Governo Militar – estigma do qual o cinema
nacional tenta se livrar até hoje.
Para além das
comparações, a diversidade do cinema nacional dos 80 é grande. As
abordagens vão desde cinebiografias (pouco vistas até então),
felizes adaptações do teatro para as telas (finalmente!), avanço
do documentário, início da descentralização da produção eixo
Rio-São Paulo e, principalmente, uma maior liberdade de expressão.
Sem o fantasma constante das torturas e perseguições, as histórias
tocavam agora direto nas feridas da ditadura. “Nos nervos, nos
fios”. Ainda deu tempo, inclusive, de tanto Glauber quanto Leon
produzirem as talvez obras-primas de ambos. Diretores surgiam; uns,
despontavam; outros, afirmavam-se. Nesse contexto, sobraram títulos
que, por restringirmos a 20, não puderam entrar na lista, mas que
merecem menção: “Barrela”, “Cidade Oculta”, “A Dama do
Cine Shangai”, “Quilombo”, “Um Trem Pras Estrelas”,
“Gabriela”, “Índia, a Filha do Sol”, “O Romance da
Empregada”, “Inocência”, sem falar nas produções televisivas
de Walter Avancini. Mas, com esses 20 não tem erro: só filmaços.
1 - “A Idade da
Terra”, Glauber Rocha (80) – Poesia total. O último e
criticado filme de Glauber, fábula sobre as possíveis vidas e
mortes de Cristo num Brasil moderno, pode ser visto até como uma
metáfora visionária da morte do cineasta, que, entristecido com o
Brasil e com a recepção a seu filme, sucumbiu um ano depois de
lançá-lo. Esqueça os detratores: “A Idade...” é grande,
potente, cáustico, catártico, altamente filosófico. Um dia será
devidamente reconhecido.
2 - “Os 7
Gatinhos”, Neville D’Almeida (80) – Neville é daqueles
cineastas da “elite intelectual carioca” que só fala besteira e
produz coisas intragáveis e ininteligíveis, mas esse é um acerto
inconteste. Baseado em Nelson Rodrigues, tem o dedo do próprio no
roteiro e, além de trilha com músicas de Roberto e Erasmo, é uma
tragicomédia crítica e consistente à hipocrisia e depravação da
sociedade brasileira. Interpretações (Thelma Reston, Melhor
Coadjuvante em Gramado) e cenas inesquecíveis como a dos
“caralhinhos voadores” e “me chama de contínuo” estão neste
longa referencial.
3 -“O
Beijo no Asfalto”, Bruno Barreto (80) – Outra feliz adaptação
de peça, outra feliz adaptação de Nelson Rodrigues. Essa, no
entanto, deixando de lado a linguagem metafórica e fantástica de
“Os 7 Gatinhos”, investe numa história contada com rigor e
direção segura, apoiada pelas ótimas atuações de todos: Ney,
Tarcisão, Daniel, Torloni, Lídia. Daqueles filmes que, se está
passando na TV, não se fixe por 15 segundos, pois senão acabarás
terminando de assisti-lo inevitavelmente.
4
- “Pixote, A Lei do Mais Fraco”,
Hector Babenco (80) – Babenco chega à maturidade de seu cinema e
faz o até hoje melhor trabalho de sua longa e regular filmografia.
Com ar de documentário, toma forma de um drama realista e trágico,
trazendo à tona mais uma mazela da sociedade brasileira: a
desassitência político-social às crianças e a violência urbana.
O pequeno Fernando, que, ao interpretar Pixote, faz bem dizer ele
mesmo, nos emociona e nos entristece. Marília está num dos papeis
mais espetaculares da história. Indicado ao Globo de Ouro e vencedor
do New
York Film Critics Circle Awards (além de Locarno e San Sebastian), é
considerado dos filmes essenciais dos anos 80 no mundo.
5 - “Eles não
Usam Black Tie”, Leon Hirszman (81) – Como um “Batalha de
Argel” e “Alemanha Ano Zero”, é uma ficção que se mistura
com a realidade, e neste caso, por vários fatores. Adaptação para
o cinema da peça dos anos 50 de Gianfrancesco Guarnieri sobre uma
greve e a repressão política decorrente, transpõe para a realidade
da época do filme, de Abertura Política e ânsia pela democracia,
retratando as greves no ABC Paulista. E ainda: tem o próprio
Guarnieri como ator, que, segundo relatos, codirigiu o filme. Filme
lindo, que remete a Eisenstein e Petri. Música original da peça de
58 de autoria de Adoniran Barbosa. Prêmio do Júri em Veneza.
6 - “Sargento
Getúlio”, Hermano Penna (81) – Pouco lembrado, mas talvez o
melhor filme nacional da década. Adaptação do romance de João
Ubaldo, dá ares de tragédia shakesperiana à história em plenos
sertão e Ditadura Militar. Crítico, poético e altamente literário,
sem deixar o aspecto fílmico de lado, haja vista a fotografia,
cenografia e a arte primorosos. E o que dizer de Lima Duarte, Melhor
Ator em Gramado, Havana e APCA? Ponha sua atuação entre as 20
maiores do cinema mundial sem pestanejar. Ainda levou Melhor Filme e
Crítica em Gramado.
7 - “O Homem
que Virou Suco”, João Batista de Andrade (81) – A forte
atuação de José Dumond (Melhor ator em Gramado, Brasília e
Huelva), mais uma vez espetacular como em “A Hora da Estrela” e
“Morte e Vida Severina”, leva o filme conta a história do poeta
popular, o nordestino Deraldo, quer tenta viver em São Paulo de sua
arte mas é irresponsavelmente confundido com um assassino. Suas
raízes e verdades, então, viram “suco” na grande cidade. Melhor
Filme em Moscou e Nevers.
8 - “Bar
Esperança, O Último que Fecha”, Hugo Carvana (82) – Poético
e divertido, “Bar...” é o típico filme do novo Brasil que se
construía com a Abertura, o que significava transformações
irrefreáveis, como o avanço da modernidade e a morte da antiga
boemia poética. Junto com a companhia Asdrúbal Trouxe o Trambone,
lançou toda a geração de atores que viriam a desembocar na TV
Pirata e afins e no cinema que se constituiu no Brasil na
pós-retomada. Cenas memoráveis, atuações impecáveis, diálogos
idem. Música-tema de Caetano com Gal Costa. Vários prêmios em
Gramado. Uma joia.
9 - “Pra
Frente, Brasil”, Roberto Faria (82) – Tijolaço na cara da
ditadura, que, embora mais branda, ainda se mantinha no governo
Figueiredo. Corajoso e sem dó, evidencia a desumanidade do regime
militar ao contar a história de um homem confundido com um
“subversivo” e que é dura e aleatoriamente torturado, fazendo um
paralelo com o clima festivo da Copa de 70. Primeiramente proibido
pela censura, depois de liberado arrebatou Gramado (Filme e Edição)
e levou prêmio em Berlim, entre outras premiações e indicações.
10 -“Nunca
Fomos Tão Felizes”, Murilo Salles (84) – O letreiro inicial
diz tudo, quando o título do filme se constrói de forma a se
entender “Tão Felizes Nunca Fomos”. Estocada forte na Ditadura,
rodado no último ano do Governo Militar, conta a história de um
filho de um misterioso militante político que é retirado de um
colégio interno para viver temporariamente num moderno e entediante
apartamento. Alto nível técnico. Arrebatou Brasília e prêmio da
Crítica em Gramado.
11 - “Verdes
Anos”, Carlos Gerbase e Giba Assis Brasil (84) – O cinema
gaúcho, encabeçado pela galera da Casa de Cinema, começava nos 80
a mostrar suas qualidades: roteiros tratados literariamente, ares de
cult movie europeu, técnicos competentes e sotaque diferente do
“carioquês” ou “paulistês” que todos eram acostumados a
ouvir no cinema nacional. Um sopro de criatividade que revolucionaria
o audiovisual brasileiro a partir dos anos 90. Tema musical clássico
de Nei Lisboa.
12 - ”Cabra
Marcado para Morrer”, Eduardo Coutinho (84) – Mestre do
documentário mundial, Coutinho não se entregava mesmo quando
parecia impossível. “Cabra...”, um dos maiores filmes do gênero,
é um documentário do documentário. Interrompido em 1964 pelo
governo militar, narra a vida do líder camponês João Pedro
Teixeira e teve suas filmagens retomadas 17 anos depois, introduzindo
na narrativa os porquês da lacuna. Premiado na Alemanha, França,
Cuba, Portugal e Brasil, onde conquistou Gramado e FestRio.
13 - “Memórias
do Cárcere”, Nelson Pereira dos Santos (84) – Prova de que
Nelson Pereira não tinha “perdido a mão” depois de erros e
acertos nos anos 70, se debruça novamente sobre Graciliano Ramos,
mas desta vez não como fizera com seu grande romance, “Vidas
Secas”, mas sobre o próprio escritor quando de sua prisão pelo
Governo Vargas. Um épico que ganhou prêmio da crítica em Cannes.
14 - “A Hora da
Estrela”, Suzana Amaral (85) – Exemplo de como se fazer um
filme pequeno, com baixo orçamento, mas de muito, muito esmero de
roteiro (baseado no forte texto de Clarice Lispector) e cenografia.
Cartaxo interpreta a inocente Macabéa, noutra atuação espetacular
dos anos 80 no cinema mundial, que a fez ganhar Urso de Prata em
Berlim, onde a diretora também ganhou prêmio da crítica. O filme
ainda levou tudo no Festival de Brasília.
15 -“O
Beijo da Mulher Aranha”, Hector Babenco (85) – Uma história
improvável em uma produção brasileiro-americana ainda mais
improvável de dar certo. Mas Babenco, talentoso e sensível, amarra
tudo com maestria. De roteiro primoroso, é mais uma pungente crítica
ao Governo Militar e que tem nas atuações dos estrangeiros John
Hurt e Raul Julia e na dos brasileiros, Lewgoy, Sônia Braga e Milton
Gonçalves sua base. Cannes e Oscar de Ator para Hurt, mas concorreu
também a Filme, Direção e Roteiro na Academia e a Palma de Ouro.
16 - “O Homem
da Capa Preta”, Sérgio Rezende (86) – Na sua longa
filmografia, Rezende se especializou em rodar temas ligados à
história do Brasil. Porém o seu maior acerto é justamente o
primeiro com esta temática. Sobre o controverso político de Duque
de Caxias, Tenório Cavalcanti (Wilker, incrível), é um exemplo a
se seguir de cinebiografias, as quais hoje tanto se fazem mas que
resvalam na superficialidade. Grande vencedor de Gramado.
17 - “O Grande
Mentecapto”, Oswaldo Caldeira (86) – Das melhores comédias
do cinema nacional, filme mineiro que, na linha de “Verdes Anos”,
direcionou a produção a outros Estados que não Rio e SP, e que
sedimentou a geração TV Pirata (Diogo Vilella, LF Guimarães,
Regina Casé) numa história de Fernando Sabino ao mesmo tempo
deliciosa, cômica, poética e aventuresca. Um dos finais de filme
mais bonitos do cinema brasileiro. Trilha do Wagner Tiso marcante.
Melhor Filme pelo júri em Gramado e concorreu em Cuba, Canadá e
EUA.
18 - “Ópera do
Malandro”, Ruy Guerra (86) – Ruy é o cara que sempre
produziu com alto padrão de qualidade desde que surgiu, nos anos 60.
Em “Ópera...”, coprodução da Embrafilme com a França, ele
eleva ainda mais o nível. Numa adaptação da peça de Chico Buarque
(por sua vez, baseada em Brecht e Gay), ele se vale do apoio do amigo
e parceiro não só para os maravilhosos temas musicais como até
para os diálogos. Tiro certeiro. Musical que não te cansa, pois
integra tanto a cenografia às canções que todos os atores se saem
bem cantando.
19 - “Ele, O
Boto”, Walter Lima Jr, (87) – Lenda popular e realidade se
misturam nessa fábula contada com muita poesia sobre a beleza do
imaginário e da sexualidade feminino, tema que Lima Jr. recuperaria
10 anos depois em “A Ostra e o Vento”. Dos primeiros filmes
brasileiros que me arrebataram. Nunca me esqueci da lindeza da
fotografia das cenas noturnas, com a claridade (muito bem
fotografada) da lua na praia. Outra ótima trilha de Tiso.
20 - “Faca de
Dois Gumes”, Murilo Salles (89) – Terminando a década,
Murilo acerta a mão em cheio de novo, desta vez adaptando
Best-seller de Sabino. O resultado é um drama policial potente e não
menos crítico no que se refere ao sistema. Atuações memoráveis de
José Lewgoy, Pedro Vasconcelos e Paulo José, principalmente.
Direção, Fotografia e prêmios técnicos em Gramado, além de Filme
em Natal e Rio.
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Embora goste menos
desses títulos ou até não goste de alguns, acho justo, por uma
questão jornalística e histórica, ao menos citá-los, pois cada um
tem seu grau de importância dentro do período dos anos 60, 70 e 80
que abordamos:
60: “Macunaíma”
(Joaquim Pedro, 69); “Cara a Cara” (Bressane, 67); “A Falecida”
(Leon, 65); “Porto das Caixas” (Saraceni, 62); “Bahia de Todos
os Santos” (Triguerinho, 60); “A Grande Feira” (Pires, 61); “A
Grande Cidade” (Cacá, 66)
Cena do inaugural "Os Óculos do Vovô", de 1913, há 110 anos
Quando, em março de 1913, o cineasta e ator luso-brasileiro Francisco Santos levou pela primeira vez ao público de Pelotas, no extremo Sul do Brasil, “Os Óculos do Vovô”, é de se supor que soubesse estar marcando uma era. Aquilo que então chamavam de “atualidades” já trazia a semente de mais do que isso: era o nascer de uma indústria, a indústria do entretenimento. Mas mais do que este aspecto produtivo e mercadológico, aquilo era “arte”. Isso, talvez Santos supusesse com maior assertividade. Uma espécie nova, ainda em construção, experimental, mas instigante e visivelmente muito promissora de arte: o cinema.
O que o pioneiro do cinema brasileiro talvez não suspeitasse era que aquilo que ele empreendera com muito custo através da Guarany Films, sua produtora, fosse se tornar tão longevo e, por que não dizer, exitoso. Pois uma coisa pode-se afirmar do cinema brasileiro: mesmo várias vezes acometido por crises econômicas, políticas, culturais e ideológicas em um país jovem historicamente falando, jamais lhe faltou criatividade e perseverança. As condições nem sempre favoráveis, quando não dribladas, foram inclusive combustível para a geração neo-realista ou a cinema-novistas e udigrudi, para citar três exemplos.
Glauber: genialidade marcante para o cinema brasileiro
E se são raros os casos de abastamento, por outro lado nunca se deveu nada a outros polos, inclusive bem mais endinheirados como a Europa, o Japão e os Estados Unidos. De gênios, podemos entabular Glauber, Peixoto e Mauro. De documentaristas, o talvez maior de todos: Coutinho. De obras revolucionárias, “Limite”. De divisores-de-águas modernos: “Cidade de Deus”. De obras-primas, “O Pagador de Promessas” e “Eles não Usam Black Tie”. Isso sem falar na brasilidade exposta em diversos filmes, às vezes de forma absolutamente orgânica, algo impossível de ser copiado, reproduzido e, em certa medida, até explicado noutras paragens. Como legendar diálogos como os de “A Hora e a Vez de Augusto Matraga” ou “Amarelo Manga” sem perder consistência e poética?
Tem isso e mais um monte de coisas. Afinal, em 110 títulos cabe bastante diversidade. Longas de ficção, documentários de maior ou menor duração, filmes mudos, curtas-metragens ficcionais, fitas P&B e coloridas, audiovisuais feitos para TV, gêneros diversos, produções do início do século 20 e outras recentes. Tem, sim, um pouco de tudo. Como diz Caetano Veloso sobre o cinema brasileiro: “Visões das coisas grandes e pequenas que nos formaram e estão a nos formar”.
Dizem que montar listas é uma forma de, além de divertir-se dando classificações aos próprios gostos, apreender tudo aquilo que se vê. E é tanta coisa que já se viu!... Aqui, a tentativa lúdica é de resgatar preferências de forma a dar uma noção subjetiva do que é cinema brasileiro em minha visão. Porém, também contemplar o crítico, que pode ponderar a consideração a medalhões, mas entende suas relevâncias. Recai aqui aquela “justificativa” dos preteridos. Muita coisa fica de fora, infelizmente, a contragosto do próprio autor da classificação. Impossível não citar pelo menos 10 deles: “Di”, “Pacarrete”, “O Palhaço”, “Linha de Passe”, “Os Primeiros Soldados”, “Porto das Caixas”, “O Homem do Ano”, “Chuvas de Verão”, “Alma Corsária” e “Inocência”. E teriam mais.
Cena de "Os Primeiros...", um dos célebres não-incluídos na lista
Diferirá de outras listas semelhantes? Claro, e isso que é o bom. O exercício aqui é justamente este: louvar a produção nacional em sua diversidade e preservar a memória de um dos cinemas mais inspirados do mundo, mesmo sem nunca ter ganho um Oscar de Filme Internacional. Importante? Sim, mas não é tudo, pois há muito mais abundância do que reconhecimento. E se são 110 anos, então, que sejam 110 títulos, lançados em partes e em ordem inversa. De início, os últimos 20 colocados já mostram essa riqueza. Têm desde clássicos do Neo Realismo e do Cinema Novo, passando por filme da retomada e produções da Embrafilme a dignos representantes do cinema atual feito no País. Então, partiu ordenar filmes representativos desta história mais que centenária como parte das celebrações pelos 15 anos do Clyblog!.
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110.“O Grande Mentecapto”, Oswaldo Caldeira (1986)
Das melhores comédias do cinema nacional, filme mineiro que, na linha de “Verdes Anos”, direcionou a produção a outros Estados que não Rio e SP, e que sedimentou a geração TV Pirata (Diogo Vilella, LF Guimarães, Regina Casé) numa história de Fernando Sabino ao mesmo tempo deliciosa, cômica, poética e aventuresca. Um dos finais de filme mais bonitos do cinema brasileiro. Trilha do Wagner Tiso marcante. Melhor Filme pelo júri em Gramado e concorreu em Cuba, Canadá e EUA.
109.“Meu Nome não é Johnny”, Mauro Lima (2008)
108.“O Grande Momento”, Roberto Santos (1959)
107.“Canastra Suja”, Caio Sóh (2018)
106.“Marighella”, Wagner Moura (2021)
105.“Verdes Anos”, Carlos Gerbase e Giba Assis Brasil (1984)
101.“Dois Córregos - Verdades Submersas no Tempo”, de Carlos Reichembach (1999)
102.“Os Cafajestes”, Ruy Guerra (1962)
103.“O Homem que Copiava”, Jorge Furtado (2003)
104.“A Hora da Estrela”, Suzana Amaral (1985)
100.“O Auto da Compadecida”, de Guel Arraes (2000)
No início doa anos 2000, o cinema brasileiro fechava seu ciclo de maiores dificuldades estruturais com um sucesso de crítica e público (2 mi de expectadores). Guel, que havia construído uma carreira alternativa na dramaturgia através da televisão desde a TV Pirata e aperfeiçoando-a ao longo dos anos, chegou pronto ao seu primeiro longa, baseado na peça de Ariano Suassuna. Difícil ver uma trupe tão grande de ótimos atores/atuações juntos: Selton, Nachtergaele, Nanini, Denise, Diogo, Lima, Virgínia, Goulart... todos, todos impagáveis. João Grilo e Xicó formam uma das melhores duplas de personagens do cinema nacional. Comédia divertida – mas também dramática – com o pique de edição e cenografia de Guel. Um clássico imediato.
99.“Tudo Bem”, Arnaldo Jabor (1978)
98.“O Lobo Atrás da Porta”, Fernando Coimbra (2013)
97.“Iracema, Uma Transa Amazônica”, Jorge Bodanzky e Orlando Senna (1976)
96.“A Rainha Diaba”, Antonio Carlos da Fontoura (1974)
95.“Os Saltimbancos Trapalhões”, J. B. Tanko (1981)
Esse foi o cara que ensinou o rock'n roll a rasgar a voz.
Não que tenha sido sua única contribuição - não mesmo - mas come certeza caras como Kurt Cobain Max Cavalera, John Lydon e tantos outros muitos devem um pouco da fúria no jeito de cantar a Richard Waye Pennyman, mais conhecido Little Richard.
Seu disco de estreia, "Here's Little Richard" de 1957, é uma daquelas cartilhas do rock'n roll: doses perfeitas de fúria, malícia, perversão e ousadia.
E aquela batida insistente?
E aquele piano alucinado?
E aquele ritmo ensandecido?
A clássica "Tutti Frutti" é um exemplo perfeito destas interpretações enlouquecidas de Richard, acompanhada de uma base agressiva e acelerada de piano. A canção foi regravada por Elvis Presley mas a versão de Richard no fim das contas, se formos falar em força, é bem mais potente que a do Rei; "She's Got It" é outra com vocal selvagem e gritado; "Rip It Up" vai na mesma linha com força, poder e embalo; tem a baladinha gospel "Can't Believe You Wanna Leave" e "Oh Why?" mais cadenciada, ambas muito legais, mas o bom mesmo é quando o piano da Rainha Diaba pega fogo e sua garganta se abre em urros agudos e ensurdecedores como em "Long Tall Sally" ou em "Jenny Jenny".
Ah, cara, isso é rock'n roll!!! "A-woop-bop-a-loo-bop-a-loo-bam-boom"
*************************** FAIXAS:
"Tutti Frutti" (Richard Penniman, Dorothy LaBostrie, Joe Lubin) – 2:25
"True Fine Mama" (Penniman) – 2:43
"Can't Believe You Wanna Leave" (Lloyd Price) – 2:28
"Ready Teddy" (Robert Blackwell, John Marascalco) – 2:09
"Baby" (Penniman) – 2:06
"Slippin' and Slidin' (Peepin' and Hidin')" (Penniman, Eddie Bocage, Albert Collins, James Smith) – 2:42