Curta no Facebook

Mostrando postagens classificadas por data para a consulta oscar. Ordenar por relevância Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens classificadas por data para a consulta oscar. Ordenar por relevância Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

"Ataque dos Cães" , de Jane Campion (2021)

 

Deu pra ti, John Wayne
por Daniel Rodrigues

Jane Campion é uma cineasta que, mais do que somente pela qualidade de seus filmes, é por si só uma figura marcante para a história do cinema. Além de ser a segunda entre cinco mulheres nomeadas para o Oscar de Melhor Direção, foi a primeira cineasta feminina da história a receber a Palma de Ouro do Festival de Cinema de Cannes por seu marcante “O Piano”, em 1993. Mas é fato também que, guardada sua importância representativa, a talentosa diretora neozelandesa acumula bons feitos e outros nem tanto. Porém, invariavelmente voltados à visão da mulher no cinema. Desde seu primeiro e referencial “Um Anjo em Minha Mesa” (1990), que retrata a sofrida vida real da escritora Janet Frame, passando pelo inconsistente “Em Carne Viva” (2003) ou em seu celebrado “O Piano”, um dos melhores filmes dos anos 90, a figura feminina é sempre desafiada a situações as quais só mesmo uma mulher para expressar. Em “Ataque dos Cães”, seu novo filme, curiosamente, no entanto, este “lugar de fala” se desloca, visto que não é a personagem feminina quem o protagoniza. Aliás, não há um único protagonista, e isso talvez seja justamente o grande trunfo da produção, que põe Campion novamente na mira do Oscar com o filme com mais indicações em 2022, doze. Mas o longa a leva a se destacar mais uma vez, porém agora por um outro mérito, que é o de inscrever a obra numa importante ressignificação do tão simbólico - e questionável - gênero faroeste.

“Ataque...” se passa numa rústica Montana dos anos 20 em que os irmãos Phil (Benedict Cumberbatch) e George (Jesse Plemons) possuem uma das maiores fazendas da região. Quando George se casa em segredo com a viúva Rose (Kirsten Dunst), dona de uma pequena pensão em que vive com o sensível filho Peter (Kodi Smit-McPhee), a cumplicidade familiar entra em jogo. Phil, de postura rígida e sedutora, faz o possível para atrapalhar a vida de Rose e de Peter, a quem ele cria certa obsessão. Apoiado pelos vaqueiros em suas zombarias, ele não pretende parar até criar conflitos maiores. No entanto, a investida do caubói leva a rumos inesperados – principalmente, para ele próprio.

A trama, construída em capítulos – o que dá ao filme um caráter autoral a exemplo do que fizeram com propriedade Kubrick, Godard e Tarantino – vale-se dos conceitos não só da feminilidade, mas também de masculinidade e da homossexualidade para dissolver mitologias e criticar estereótipos. Em uma sociedade bruta como a do Velho Oeste dos Estados Unidos, em que os instintos se sobrepõem, principalmente a tudo que for de natureza sensível e “feminina”, Campion põe em xeque a macheza do famoso homem “durão”, bem como subjetiva a fraqueza do homossexual e, realista, não inventa nenhuma falsa imagem de uma mulher forte e corajosa diante de uma condição social irrespirável. Tempos antigos, inspirações atuais.

trailer de "Ataque dos Cães"

O longa, embora não seja genial, é muito bem engendrado, uma vez que sabe dispor os elementos narrativos econômica e gradativamente, o que mantém a atenção do espectador que venceu os primeiros 20 minutos de história e diálogos naturalmente (e propositalmente) ainda vagos. Alguns méritos são evidentes. Faroeste sem um disparo de pistola sequer, o filme consegue manter a sensação de tensão quase permanentemente – seja pelo temperamento explosivo de Phil, pela iminência da doença dos animais ou pelo mistério que as montanhas do extremo Norte dos Estados Unidos guardam. O elemento sonoro-musical é outro ponto bem tratado, quase uma chave que liga dois mundos, o selvagem e o desenvolvido, isso tanto na trilha sonora invariavelmente dissonante, assinada pelo Radiohead Jonny Greenwood, quanto nas músicas incidentais. 

Fica claro que não é por acaso que Jane escolheu o faroeste como metáfora para refletir ideologicamente a sociedade atual. Embora não seja novidade a tentativa de Hollywood de mostrar que os brutos também amam, é inegável que o gênero mais yankee do cinema representa em boa medida a ideologia que os Estados Unidos vendem ao mundo, arraigado em boa parte em concepções machistas e patriarcais. Isso explica porque o western, enquanto símbolo cultural e hipérbole dessa ideologia, tenha perdido o passo ao galopar paralela e anacronicamente com o desenvolvimento sociocultural de sua nação. Neste processo, sofreu um considerável desgaste ao longo das décadas até quase sumir das telas nos anos 80-90, salvo por um clássico temporão, "Os Imperdoáveis", de Clint Eastwood (1992) . Hoje, sua revitalização só poderia vir em forma de crítica. O protagonismo de um caubói negro na refilmagem de "Sete Homens e Um Destino" (Fuqua, 2016), a descrença na natureza humana de “A Balada de Buster Scruggs” (irmãos Coen, 2018) e a feminização do herói valentão de “Cry Macho” (Eastwood, 2021) juntam-se a “Ataque...” nessa tendência de um olhar racional e reflexivo sobre a sociedade e seus padrões. O rei está nu e não se fazem mais John Wayne como antigamente. Ainda bem.

************

Cão que ladra forte
por Cly Reis

Tenho que admitir que tinha um certo preconceito quanto a filmes dirigidos por mulheres. Jane Campion era uma exceção. Desde o primeiro momento, com seu brilhante "O Piano", vencedor da Palma de Ouro em Cannes, em 1995, a diretora neozelandesa conquistou meu respeito e admiração. Agora, quando soube que seu novo filme, "Ataque dos Cães" era um faroeste fiquei bastante intrigado sobre como funcionaria um gênero tão rústico e pesado nas tão delicadas e talentosas mãos desta diretora. Certamente não poderia se tratar de um western convencional. E, efetivamente, não o é. Além de não ser exatamente um faroeste dentro dos moldes tradicionais, nem a época é exatamente a dos conflitos mais brutais e ignóbeis do oeste americano como duelos, assaltos a diligências ou corrida por ouro. "Ataque dos Cães" se passa no final dessa era sem lei, é o início da "civilização", onde há vaqueiros, há revolveres, há cavalos, mas também há  homens de terno que administram as fazendas, a caneta muitas vezes resolve mais do que a bala e o automóvel começa a dividir espaço  com as montarias, sinalizando um novo tempo.

Essa situação histórica não é em vão, não é por acaso. O faroeste de Jane Campion, adaptado do romance do escritor Tomas Savage, é estrategicamente situado nesse recorte histórico de modo a sinalizar para um novo momento no qual não há mais espaço para homens que resolvem tudo na bala. Um novo homem aparece. Na verdade sempre esteve lá, mas agora quer sair. Esse é o conflito que se estabelece em um dos protagonistas, Phil Burbank (Benedict Cumberbatch), um típico vaqueiro, rústico de maus modos e pose de machão, que, além de desaprovar a civilidade do irmão, George, homem do campo como ele, porém mais adaptado aos novos tempos e administrador dos negócio da família, briga contra si mesmo por sentimentos íntimos que, contra sua vontade, o tornam frágil, vulnerável e fazem aflorar coisas que reluta em assumir. O conflito interior se acentua quando Phil tem contato com Peter
Cumberbatch e Smth-McPhee: faroeste com requintes
de um drama sensível e perspicaz
(Kodi Smth-McPhee), filho de uma estalajadeira, Rose (Kirsten Dunst), que, para seu desgosto, cai nas graças do irmão que a pede em casamento. O jovem é sensível, talentoso, emotivo e a percepção dessas qualidades por parte do cowboy fazem com que, incapaz de lidar com sua sexualidade, nutra pelo rapaz uma séria antipatia. Por extensão à repulsa pelo garoto, e também por "roubar" seu irmão e pelo fato de, na sua visão, enfraquecer os valores de homem do campo, Phil rejeita a nova cunhada destratando-a, a fazendo sentir-se uma estranha mesmo dentro da própria casa. O filho, o jovem Peter, que não havia ido morar com o casal, num primeiro momento, aproveita o recesso das aulas para passar uma temporada em companhia da mãe em seu novo lar, dando a ela um pouco de conforto naquele território hostil. No entanto, o que era para ser algo positivo acaba sendo mais uma dor de cabeça  para Rose quando o cunhado, seu desafeto, por incrível  que pareça, acaba se aproximando de seu filho, em parte por implicância, por provocação, mas em parte, também, por ver no rapaz algo parecido consigo e, nessa proximidade, a possibilidade de se libertar e de, minimamente, ser quem desejaria ser. E é nesse quadrilátero que a diretora desenvolve seu filme com engenhosidade e sabedoria para captar e transmitir o perfil psicológico e emocional de cada um de seus personagens principais, com rara sutileza e sensibilidade.

O título em português, embora justificável, de certa maneira, é um tanto infeliz e acaba insinuando uma violência que o filme não possui, o que acaba mais repelindo do que conquistando potenciais espectadores. Sei de gente que não quis ver ainda por conta da sugestão de atrocidade que o nome carrega. Mas não precisa ter medo dos cães. O filme passa longe de ser um bang-bang, um faroeste spaghetti e muito menos um desfile de atrocidades. "Ataque dos Cães" é, na verdade, um drama familiar de quatro pontas, um exame sobre a masculinidade que, no fim das contas, acaba por nos revelar que nem sempre o cão que late mais alto é o mais perigoso. 


**************

Ataque psicológico
por Vagner Rodrigues


Uma certa lentidão, uma narrativa arrastada, tudo isso é muito bem compensado com um terceiro ato magnífico. Que filme, senhoras e senhores!
"Ataque dos Cães" acompanha os irmãos Phil (Benedict Cumberbatch) e George (Jesse Plemons), que são ricos proprietários da maior fazenda de Montana. Enquanto o primeiro é brilhante, mas cruel, o segundo é a gentileza em pessoa. Quando George secretamente se casa com a viúva local Rose (Kirsten Dunst), o invejoso Phil faz tudo para atrapalhá-los.
O fato do andamento ser mais arrastado e parado foi proposital, mas entendo aqueles que aproveitaram o filme em streaming para dar uma pausa, ir ao banheiro, fazer um lanche, pois realmente fica um pouco cansativo. Um dos aspectos que me tirava um pouco do filme era o modo como o personagem de Jesse Plemons foi utilizado, entrando e sando da história a todo instante. Seus momentos de interação são ótimos, mas ele acaba aparecendo bem pouco, e fiquei com a impressão de que poderia ter sido melhor aproveitado.
Já que estamos falando dos personagens, é simplesmente impossível falar do filme e não citar as grandes atuações. O elenco como um todo está inspirado. Começando pelo próprio, já citado Jesse Plemons (George) que, se por um lado é o que tem menos tempo de tela, por outro, quando aparece é cirúrgico. Poucas falas, mas muito é dito com seu olhar. Kirsten Dunst (Rose) fazia tempo que não via atuar tão bem. A dor, a confusão mental que essa mulher passa, você sente tudo. Kodi Smit-McPhee (Peter), é o segundo personagem mais importante da trama e a forma como ele muda o filme e também como cria os elos das pessoas é o que nos leva às surpresas finais. E ele, Benedict Cumberbatch, tem uma das melhores atuações de sua vida, (se bem que, para mim, ele esta sempre bem). A forma intensa que ele atua, como ela passa aquele ar do cowboy bruto, sujo, quieto, tudo muito natural em um personagem com uma presença enorme, interpretado em uma atuação magnifica.
A construção narrativa feita pelo longa é espetacular, desde como os personagens são apresentados passando por como eles vão interagindo entre eles, sendo essas interações repletas de detalhes muito bem colocados.
A fotografia exuberante de "Ataque dos Cães"

E a fotografia, se não for a melhor do ano, certamente é uma das melhores! O jeito como o cenário é construído, os enquadramentos em planos abertos, os detalhes nas composições de cena... Um esplendor.
Temos um bom trabalho na construção e desconstrução do cowboy, a forma como longa brinca com nossas expectativas nos induzindo a pensamentos, conduzindo nossa mente para um lado para o outro. Na sequência em que Phill e Peter terminam juntos de construir uma corda de laçar, por exemplo, Jane Campion cria toda uma situação cheia simbolismos e possíveis interpretações (eu tive a minha, depois me conta a sua) que nos prendem  a ela de uma maneira incrível, tal qual a tensão criada por um filme de terror psicológico.
“Ataque dos Cães” não brinca somente com o psicológico dos personagens porque, sim temos ataques psicológicos fortes no longa que são muito mais agressivos que os físicos. Não vá pensando em ver um “bang-bang”. "Ataque dos Cães" é um filme que não mexe apenas com o psicológico dos personagens, mas com o seu também.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

Oscar 2022 - Os Indicados


"Ataque dos Cães" e "Duna" vislumbrando o Oscar no horizonte.

Depois de muita especulação acerca de quem já ganhara Globo de Ouro, BAFTA e outros prêmios indicativos, saiu a tão esperada lista do Oscar que, a bem da verdade, confirmou a maioria das expectativas. "Ataque dos Cães", de Jane Campion, como era esperado, por suas inúmeras qualidades, leva um monte de indicações, "Duna" se impõe nos prêmios técnicos, embora também figure em outras categorias, a encantadora animação da Disney, "Encanto" disputa o prêmio em sua categoria, tem tema de James Bond disputando para trilha original, e "Belfast" e "Amor Sublime Amor" pintam como aqueles que podem roubar a cena. 

No mais, uma certa surpresa pela não indicação de Lady Gaga a melhor atriz, da mesma forma que surpreende um pouco a indicação de Kirsten Stewart, ignorada em outras premiações. Havia uma expectativa sobre como a Academia lidaria com o badalado e discutido "Não Olhe Para Cima" e, felizmente ele não foi ignorado, sendo nomeado para quatro prêmios, inclusive o de melhor filme e também para aquele que é seu maior mérito, o roteiro. Destaque também para a animação dinamarquesa "Flee" que disputa em três categorias, sendo elas, curiosamente, animação, filme estrangeiro e documentário, coisas aparentemente um tanto distantes uma da outra.

Como hoje em dia, com o streaming e as coisas chegando muito mais rápido às nossas casa, está mais fácil de ver os concorrentes, o negócio agora é preparar a pipoca, zapear os canais de filmes e aplicativos e começar a maratona de filmes. 

O Oscar é logo ali. A cerimônia está marcada para o dia 27 de março.


Confira, abaixo, todos os indicados em todas as categorias:


  • Melhor filme

"Belfast"

"Não olhe para cima"

"Duna"

"Licorice pizza"

"Ataque dos cães"

"No ritmo do coração"

"Drive my car"

"King Richard: criando campeãs"

"O beco do pesadelo"

"Amor, sublime amor"


  • Melhor direção

Kenneth Branagh - "Belfast"

Ryusuke Hamaguchi - "Drive my car"

Jane Campion - "Ataque dos cães"

Steven Spielberg - "Amor, sublime amor"

Paul Thomas Anderson - "Licorice Pizza"


  • Melhor atriz

Jessica Chastain - "Os olhos de Tammy Faye"

Olivia Colman - "A filha perdida"

Penélope Cruz - "Mães paralelas"

Nicole Kidman - "Apresentando os Ricardos"

Kirsten Stewart - "Spencer"


  • Melhor ator

Javier Bardem - "Apresentando os Ricardos"

Benedict Cumberbatch - "Ataque dos cães"

Andrew Garfield - "Tick, tick... Boom!"

Will Smith - "King Richard: criando campeãs"

Denzel Washington - "A tragédia de Macbeth"


  • Melhor atriz coadjuvante

Jessie Buckley - "A filha perdida"

Ariana DeBose - "Amor, sublime amor"

Judi Dench - "Belfast"

Kirsten Dunst - "Ataque dos cães"

Aunjanue Ellis - "King Richard: criando campeãs"


  • Melhor ator coadjuvante

Ciarán Hinds - "Belfast"

Troy Kotsur - "No ritmo do coração"

Jesse Plemons - "Ataque dos cães"

J.K. Simmons - "Apresentando os Ricardos"

Kodi Smit-McPhee - "Ataque dos cães"


  • Melhor filme internacional

"Drive my car" - Japão

"Flee" - Dinamarca

"A Mão de Deus" - Itália

"A Felicidade das Pequenas Coisas" - Butão

"A Pior Pessoa do Mundo" - Noruega


  • Melhor roteiro adaptado

"No ritmo do coração"

"Drive my car"

"Duna"

"A filha perdida"

"Ataque dos cães"


  • Melhor roteiro original

"Belfast"

"Não olhe para cima"

"King Richard: criando campeãs"

"Licorice pizza"

"A pior pessoa do mundo"


  • Melhor figurino

"Cruella"

"Cyrano"

"Duna"

"O beco do pesadelo"

"Amor, sublime amor"


  • Melhor trilha sonora

"Não olhe para cima"

"Duna"

"Encanto"

"Mães paralelas"

"Ataque dos cães"


  • Melhor animação

"Encanto"

"Flee"

"Luca"

""A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas"

"Raya e o último dragão"


  • Melhor curta de animação

"Affairs of the art"

"Bestia"

"Boxballet"

"A Sabiá Sabiazinha"

"The windshield wiper"


  • Melhor curta-metragem em live action

"Ala kachuu - Take and run"

"The long goodbye"

"The dress"

"On my mind"

"Please hold"


  • Melhor documentário

"Acension"

"Attica"

"Flee"

""Summer of Soul (...ou Quando A Revolução Não Pôde Ser Televisionada)"

"Writing with fire"


  • Melhor documentário de curta-metragem

"Audible"

"The queen of basketball"

"Lead me home"

"Três canções para Benazir"

"When we were bullies"


  • Melhor som

"Belfast"

"Duna"

"Sem tempo para morrer"

"Ataque dos cães"

"Amor, sublime amor"


  • Melhor Canção original

"Be Alive" - "King Richard: criando campeãs"

"Dos Oruguitas" - "Encanto"

"Down To Joy" - "Belfast"

"No time to die" - "Sem tempo para morrer"

"Somehow you do" -"Four good days"


  • Melhor Maquiagem e cabelo

"Um Príncipe em Nova York 2"

"Cruella"

"Duna"

"Os olhos de Tammy Faye"

"Casa Gucci"


  • Melhores Efeitos visuais

"Duna"

"Free guy"

"Sem tempo para morrer"

"Shang-Chi e a lenda dos dez anéis"

"Homem-Aranha: Sem volta para casa"


  • Melhor fotografia

"Duna"

"Ataque dos cães"

"Beco do pesadelo"

"A tragédia de Macbeth"

"Amor, sublime amor"


  • Melhor edição

"Não olhe para cima"

"Duna

"King Richard: criando campeãs"

"Ataque dos cães"

"Tick, tick... boom!"


  • Melhor design de produção

"Duna"

"Ataque dos cães"

"O beco do pesadelo"

"A tragédia de Macbeth"

"Amor, sublime amor"


C.R.


segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

Globo de Ouro 2022 - Os Vencedores


Saíram os vencedores do Globo de Ouro, um dos principais prêmios de cinema e televisão dos Estados Unidos, que sempre é um bom termômetro em relação aos possíveis indicados e favoritos para o Oscar, a principal premiação do cinema norte-americano e, possivelmente, a mais conhecida e conceituada no mundo, que acontecerá em março.

No Globo de Ouro que esse ano foi meio secreto, sem transmissão por TV, o grande destaque ficou por conta do bom "Ataque dos Cães", da diretora Jane Campion, que vem impressionando por onde passa, e que levou prêmios de direção, filme de drama, roteiro e ator coadjuvante, para o jovem Kodi Smit-McPhee. Já o badalado "Não Olhe Para Cima", que concorria em quatro categorias, não levou nenhum, perdendo, inclusive na de melhor filme de comédia, para o musical "Amor, Sublime Amor", de Steven Spielberg. Mas não é de se surpreender. Vamos ver se o filme, de necessária reflexão, terá melhor sorte no Oscar que, por seu turno, vem desenvolvendo conceitos um pouco mais abrangentes nos últimos anos.

Confira a baixo a lista dos vencedores:


Benedict Cumberbatch em "Ataque dos Cães".


CINEMA:

  • Melhor filme – drama

‘Belfast’

‘No Ritmo do Coração’

‘Duna’

‘King Richard: Criando Campeãs’

Ataque dos Cães’


  • Melhor diretor – Filme

Kenneth Branagh (‘Belfast’)

Jane Campion (‘Ataque dos Cães’)

Maggie Gyllenhaal (‘A Filha Perdida’)

Steven Spielberg (‘Amor, Sublime Amor’) 

Denis Villeneuve (‘Duna’) 


  • Melhor atriz em filme – drama

Jessica Chastain (‘The Eyes of Tammy Faye’)

Olivia Colman (‘A Filha Perdida’)

Nicole Kidman (‘Apresentando os Ricardos’)

Lady Gaga (‘Casa Gucci’)

Kristen Stewart (‘Spencer’)


  • Melhor ator em filme – drama

Mahershala Ali (‘Swan Song’)

Javier Bardem (‘Apresentando os Ricardos’)

Benedict Cumberbatch (‘Ataque dos Cães’)

Will Smith (‘King Richard: Criando Campeãs’)

Denzel Washington (‘The Tragedy of Macbeth’) 


  • Melhor filme – musical ou comédia

‘Cyrano’

‘Não Olhe Para Cima’

‘Licorice Pizza’

‘Tick, Tick … Boom!’

‘Amor, Sublime Amor’


  • Melhor atriz em filme – musical ou comédia

Marion Cotillard (‘Annette’)

Alana Haim (‘Licorice Pizza’)

Jennifer Lawrence (‘Não Olhe Para Cima’)

Emma Stone (‘Cruella’)

Rachel Zegler (‘Amor, Sublime Amor’) 


  • Melhor ator em filme – musical ou comédia

Leonardo DiCaprio (‘Não Olhe Para Cima’)

Peter Dinklage (‘Cyrano’)

Andrew Garfield (‘Tick, Tick … Boom!’)

Cooper Hoffman (‘Licorice Pizza’)

Anthony Ramos (‘Em um Bairro de Nova York’)


  • Melhor ator coadjuvante em qualquer gênero

Ben Affleck (‘Lar Doce Lar’)

Jamie Dornan (‘Belfast’)

Ciarán Hinds (‘Belfast’) 

Troy Kotsur (‘No Ritmo do Coração’)

Kodi Smit-McPhee (‘Ataque dos Cães’) 


  • Melhor atriz coadjuvante em qualquer gênero

Caitríona Balfe (‘Belfast’)

Ariana DeBose (‘Amor, Sublime Amor’)

Kirsten Dunst (‘Ataque dos Cães’)

Aunjanue Ellis (‘King Richard: Criando Campeãs’)

Ruth Negga (‘Identidade’)


  • Melhor roteiro – filme

‘Licorice Pizza’

‘Belfast’

‘Ataque dos Cães’

‘Não Olhe Para Cima’

‘Apresentando os Ricardos’


  • Melhor filme – animação

‘Encanto’

‘Flee’

‘Luca’

‘My Sunny Maad’

‘Raya e o Último Dragão’


  • Melhor trilha sonora original

‘A Crônica Francesa’

‘Encanto’

‘Ataque dos Cães’

‘Madres Paralelas’

‘Duna’


  • Melhor filme em língua estrangeira

‘Compartment No. 6’

‘Drive My Car’

‘A Mão de Deus’

‘A Hero’

‘Madres Paralelas’


  • Melhor canção original – Filme

‘Be Alive’ (‘King Richard: Criando Campeãs’)

‘Dos Orugitas’ (‘Encanto’)

‘Down to Joy’ (‘Belfast’)

‘Here I Am (Singing My Way Home)’ (‘Respect’)

‘No Time to Die’ (‘007: Sem Tempo para Morrer’)


TELEVISÃO:

  • Melhor série de comédia ou musical

‘The Great’

‘Hacks’

‘Only Murders in the Building’

‘Reservation Dogs’

‘Ted Lasso’


  • Melhor atriz em série de comédia ou musical

Hannah Einbinder (‘Hacks’)

Elle Fanning (‘The Great’)

Issa Rae (‘Insecure’)

Tracee Ellis Ross (‘Black-ish’)

Jean Smart (‘Hacks’)


  • Melhor ator em série de comédia ou musical

Anthony Anderson (‘Black-ish’)

Nicholas Hoult (‘The Great’)

Steve Martin (‘Only Murders in the Building’)

Martin Short (‘Only Murders in the Building’)

Jason Sudeikis (‘Ted Lasso’)


  • Melhor minissérie ou filme para TV

‘Dopesick’

‘Impeachment: American Crime Story’

‘Maid’

‘Mare of Easttown’

‘The Underground Railroad’


  • Melhor atriz em minissérie ou filme para TV

Jessica Chastain (‘Scenes From a Marriage’)

Cynthia Erivo (‘Genius: Aretha’)

Elizabeth Olsen (‘WandaVision’)

Margaret Qualley (‘Maid’)

Kate Winslet (‘Mare of Easttown’)


  • Melhor ator em minissérie ou filme para TV

Paul Bettany (‘WandaVision’)

Oscar Isaac (‘Scenes From a Marriage’)

Michael Keaton (‘Dopesick’)

Ewan McGregor (‘Halston’)

Tahar Rahim (‘The Serpent’)


  • Melhor atriz coadjuvante em série, minissérie ou filme

Jennifer Coolidge (‘White Lotus’)

Kaitlyn Dever (‘Dopesick’)

Andie MacDowell (‘Maid’)

Sarah Snook (‘Succession’)

Hannah Waddingham (‘Ted Lasso’)


  • Melhor ator coadjuvante em série, minissérie ou filme

Billy Crudup (‘The Morning Show’)

Kieran Culkin (‘Succession’)

Mark Duplass (‘The Morning Show’)

Brett Goldstein (‘Ted Lasso’)

Oh Yeong-su (‘Round 6’)


  • Melhor ator em série de drama

Brian Cox (‘Succession’)

Lee Jung-jae (‘Round 6’)

Billy Porter (‘Pose’)

Jeremy Strong (‘Succession’)

Omar Sy (‘Lupin’)


  • Melhor atriz em série de drama

Uzo Aduba (‘In Treatment’)

Jennifer Aniston (‘The Morning Show’)

Christine Baranski (‘The Good Fight’)

Elisabeth Moss (‘The Handmaid’s Tale’)

Mj Rodriguez (‘Pose’)


  • Melhor série de drama

‘Lupin’

‘The Morning Show’

‘Pose’

‘Round 6’

‘Succession’



C.R.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

"Não Olhe para Cima", de Adam McKay (2021)


 

Tem filmes que se transformam “da moda” e geram tanta discussão – nem sempre merecidamente – que é quase “chover no molhado” falar-lhes a respeito. É o caso de “Não Olhe para Cima”, que estreou no Netflix e em alguns cinemas pelo mundo – claro, com intenções de Oscar, visto que somente o streaming lhe impede de concorrer ao prêmio. Porém, a comédia sarcástica com lances de suspense de Adam McKay (“A Grande Aposta”, “Vice”) tem, sim, merecimento em ser tão comentado, ainda mais porque a celeuma a qual gerou é mundial e não restrita apenas ao país no qual foi produzido. A enxurrada de comentários nas redes sociais que correlacionam aspectos do filme à realidade brasileira, no entanto, não é à toa, visto que os terríveis tempos de bolsonarismo parecem-lhe estar retratados fielmente. Só por isso, mesmo que esteja sendo repetitivo, já merece se tecerem algumas observações.

Seja norte-americana, brasileira ou de qualquer lugar que o valha, “Não Olhe...” é um retrato tristemente muito bem traçado dos tempos de pós-verdade no qual vivemos. O longa conta a história de dois cientistas (os astrônomos Randall Mindy, vivido por Leonardo DiCaprio, e Kate Dibiasky, Jennifer Lawrence) que descobrem um corpo espacial sólido gigante que está vindo em direção à Terra e tentam alertar autoridades e imprensa para que providências sejam tomadas antes que as consequências sejam fatais. Porém, são envolvidos em um jogo político de interesses em que a ciência não é lavada a sério (alguma semelhança com políticos e pessoas que negam a vacina ou à própria existência do Coronavírus?). Pior: suas figuras e discurso são distorcidos e transformadas em produto ao bel prazer da mídia. A dupla de pesquisadores tenta encampar uma peregrinação na imprensa e acaba na Casa Branca, mas nada parece ser suficiente para que as pessoas “olhem para cima” de forma racional e despida de interesses próprios.

“Não Olhe...” expõe a máxima contradição dos tempos atuais: a de que não é a vida que imita a arte, e, sim, o contrário. O negacionismo, o ódio ao conhecimento, a polarização de ideias, a exaltação da ignorância, o interesse político-econômico e a intransigência ideológica estão todos evidentes. A semelhança – e a bizarrice –é tanta, que os mesmos famigerados memes que o filme mostra se produzirem sem controle se aplicam perfeitamente à realidade fora da ficção, como no paralelo de personagens do filme e figuras públicas brasileiras que corre pelas redes sociais: a presidente Orlean (Meryl Streep) comparada a Jair Bolsonaro; o filho da presidente Jason (Jonah Hill) com o deputado federal Carlos Bolsonaro; Randall com o microbiologista Átila Iamarino; e Kate com a bióloga Natália Pasternak– que, aliás, ela mesma identificou-se com a personagem.

Afora a edição ágil de Hank Corwin e a direção bem conduzida por McKay, que faz o longo filme não ter “barriga”, tamanho é o proveito do roteiro, as atuações são um destaque à parte. Maryl, deusa, está tragicamente magnífica no papel da patética presidente; DiCaprio, o maior de sua geração, mais uma vez dando o tamanho certo para o personagem; Jennifer, igualmente bem; e especialmente Mark Rylance, que vive o egoico magnata Peter Isherwell, cuja figura amorfa e andrógena denotam o quão perigosos são estes novos donos do mundo como Musk e Bezos.

No entanto, o que se destaca antes de tudo em “Não Olhe...” é seu roteiro, digno de Oscar. Escrito pelo próprio McKay (que levou a estatueta de Roteiro Adaptado em 2016 por "A Grande Aposta"), traz um retrato sem perdão da sociedade contemporânea em seus tempos líquidos de conexões digitais e desconexões humanas. A história é um compêndio de percepções muito acertadas de um mundo de radicalismos político, ideológico e, num entendimento mais profundo, religioso. É o império do absurdo, que só pode nos levar a um desastre irreparável. O longa guarda também uma metáfora de alerta para a questão climática no planeta: nesse ritmo de descontrole do ecossistema, o resultado será a destruição da vida como a conhecemos.

Atuações de gala abrilhantam o perspicaz "Não Olhe..."

Neste turbilhão de opiniões que o filme suscita, é interessante, contudo, perceber o mesmo comportamento autodestrutivo que este critica em relação à sociedade atual. Ou seja, a mentalidade está tão incrustrada que aqueles que deveriam ter mais condições de avaliar a obra como uma oportunidade de reflexão (independentemente se a consideram boa ou não, isso é irrelevante), são, justamente, os que tentam “lacrar”, mostrando-se os verdadeiros cegos. Uma crítica especializada, por exemplo, apontou que “Não Olhe...” é fadado a ser esquecido pela história por ser “um filme confuso, sem foco, pouco engraçado e, pior de tudo, que já nasce velho”. Ora, primeiramente, que não é incomum nos depararmos com filmes que, mesmo discutíveis em qualidade, marcam, sim, uma época, haja vista “A Primeira Noite de um Homem”, não necessariamente brilhante mas marcante para a geração baby boomer, ou o celebrado “Forrest Gump”, que justifica a barbárie social norte-americana de uma forma um tanto leviana. Entretanto, a questão vai além disso, pois não cabe a um ou outro dizer se a obra vai ou não perdurar: é um conjunto de fatores históricos, sociais e culturais que determinam, independente dos gostos pessoais. Avaliações como estas só reforçam, mascarada ou ignorantemente, o monstrengo autoritário e superpoderoso da sociedade digital-capitalista.

Dada a pertinência de “Não Olhe...” na leitura de nossos tempos – importante lembrar os detratores, aliás, que o filme foi escrito antes da pandemia, aumentando seu mérito – é muito difícil imaginar que seja esquecido no futuro. O que me deixa, inclusive, minimamente reconfortado considerando que a história não se baseia no exemplo brasileiro. Ou seja: esta onda de ultradireita e neofascismo não pertence somente a nós, brasileiros, o que significa que mais nações podem estar passando por isso e percebendo seus malefícios. Mas espero, sim, que o filme seja lembrado daqui a algum tempo como a antítese de um mundo para o qual caminhávamos em épocas passadas, mas que, a certa altura, percebendo o erro que cometíamos, tenhamos conseguido retomar a rota do bom senso e do humanismo. Quem sabe, assim, findar essa era atual para iniciar uma outra.

*************

trailer de "Não Olhe para Cima"


Daniel Rodrigues

segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

"Meu Pai", de Florian Zeller (2020)

 

MELHOR ATOR
MELHOR ROTEIRO ADAPTADO


Fui assistir a "Meu Pai", filme do escritor e diretor francês Florian Zeller, com a expectativa de ver nada muito além de um drama familiar com boas atuações. Recebi muito mais do que isso! "Meu Pai" é envolvente, tem um roteiro brilhante, instigante, fascinante. Zeller coloca o espectador dentro da cabeça, do universo confuso, embaçado, embaralhado de Anthony, um idoso que sofre de um processo gradativo de deterioração de memória, possivelmente um Alzheimer, embora não mencionado diretamente no filme, e ocasiona uma série de dificuldades à filha, que mesmo extremamente carinhosa, atenciosa, pacienciosa, começa a ver-se impotente diante das limitações do pai. O filme, com um roteiro inteligente e uma montagem brilhante, cria uma espécie de labirinto que embaralha situações, impressões, objetos, numa proposital desordem de espaço e tempo, que faz com que o espectador tenha um pouco da sensação do que acontece dentro da mente de uma pessoa naquelas condições. Informações são dadas e são negadas, objetos parecem estar em determinado lugar mas logo não estão mais, pessoas aparecem mas não temos certezas que existem, lembranças são recuperadas mas não sabemos se os fatos aconteceram... Como era de se esperar, dadas as indicações ao Oscar da dupla de protagonistas, as atuações são memoráveis! Olivia Colman, já oscarizada por "A Favorita", tem uma atuação perfeita mesmo sem arroubos ou exageros. Ela ganha o filme num olhar, emociona numa expressão facial, na maneira como coloca uma frase. Anthony Hopkins, por sua vez, vivendo o personagem de seu mesmo nome, Anthony, está absolutamente brilhante (mais uma vez na carreira). Suas mudanças de expressão, muitas vezes na mesma cena, oscilando entre o afeto, a fragilidade, a irritação e a confusão, são simplesmente incríveis! A cena final em que ele parece, por um momento, finalmente, dentro de toda sua demência, perceber sua vulnerabilidade e de certa forma, volta a ser um menininho chamando pela mãe, é de encher os olhos de lágrimas e aplaudir de pé. "Meu Pai" é muito mais que um filme de atuações mas só as atuações já o justificariam. Mas ainda bem que, além delas, temos mais do que isso. 

Dupla espetacular em cena.



Cly Reis

quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

"Hulk", de Ang Lee (2003) vs. "O Incrível Hulk", de Louis Leterrier (2008)




Não é exatamente de um remake, é mais um arrependimento. Depois de ver o resultado final de "Hulk", de 2003, sua baixa aceitação e fraca bilheteria, a Marvel, até para incluir no arco de seu Universo Cinematográfico que começara a se desenvolver a partir de "Homem de Ferro", resolveu fazer tudo de novo.. só que diferente. 
Mesmo contando com um belo orçamento, com um elenco interessante de nomes como Eric Bana, Jennifer Connely, Nick Nolte, e com um diretor de primeira, o oscarizado Ang Lee, o primeiro filme do monstrão verde não agradou a quase ninguém. A história até que era boa, explorando desde a origem, desde as experiências do pai de Bruce, resultando na mutação que o tornava resistente aos raios gama, só que desenvolvida de maneira um tanto atropelada, cheia de pontas soltas e bastante insatisfatória, como o próprio diretor, inclusive, admite. A linguagem visual também era bem interessante, remetendo diretamente às HQ's, com tela dividida, um colorido bem característico vivo e vibrante, fontes de texto típicas de HQ e onomatopeias na tela. O grande problema mesmo foram os efeitos especiais e, principalmente, o visual da criatura. 
Meu Deus!...
O Hulk, exatamente o elemento que deveria receber o maior cuidado, o melhor tratamento, parecia de borracha, totalmente artificial. Parecia um daqueles bonecos que se vende nos camelôs em época de Dia das Crianças ou Natal. Deprimente! Aí não teve jeito: o filme perdeu todo o crédito e toda a boa vontade por parte de crítica e público.
Já que ia começar, mesmo, um novo projeto, um universo contínuo, interligado e coerente entre os personagens, a Marvel, diante do insucesso do filme de origem do homem verde, resolveu refilmar o negócio todo, reformulando o elenco e trocando o diretor. É que nem aquele clube que investiu no time numa temporada, fez boas contratações, chamou um técnico de renome mas não ganhou nada e ainda foi malhado pela crônica esportiva. O que que o presidente do clube fez, então? Pra começar, contratou um gerente de futebol, que seria, no caso, o Kevin Feige, pra capitanear o projeto MCU. Com o novo manager à frente, contrataram um novo camisa 9, Edward Norton, pra ser o homem decisivo; alguém competente ali pro meio-campo, a simpática Liv Tyler, que não é nenhuma craque mas dá conta do recado; um cara ágil pra acelerar o jogo, o bom Tim Roth; e um medalhão, o veterano William Hurt, já com um prêmio de melhor do mundo FIFA nas costas (ou seja, um Oscar), pra ser aquele cara pra garantir a experiência do grupo. Pra conduzir o time, ao invés de apostar em nome de impacto, faixa no peito, taã no armário e coisa e tal, o novo diretor de futebol acabou optando por um técnico mais afeito com o tipo de jogo pretendido: correria, bola na área, marcação alta... Tiro, porrada e bomba, pra resumir. Louis Leterrier, não era nada de mais, nada brilhante, mas era acostumado com filmes de ação e, até por isso, o resultado final ficou bem mais aceitável. "O Incrível Hulk", de 2008, também não é nenhuma obra-prima mas atendia melhor as expectativas do estúdio e do público, que, até pela relação estabelecida com "Homem de Ferro" e a promessa implícita de um longa dos Vingadores, recebia bem melhor o novo projeto.
O reboot abria mão de toda a parte de origem do personagem, o que no original era crucial e ocupava boa parte do filme, para limitar-se a resumir todo o surgimento do Hulk ao longo os créditos iniciais, e daí já desembocar no momento em que, meses depois do incidente, nosso herói, alvo dos militares que desejavam o poder obtido na experiência, se escondia numa comunidade do Rio de Janeiro, tentando viver sua vidinha o mais normalmente possível, enquanto tenta descobrir uma forma de dominar permanentemente aquela coisa que quando surge de dentro dele, é incontrolável.
A sequência da perseguição na favela da Rocinha é eletrizante, a cena no campus da universidade é muito legal e a briga final entre o Hulk e o Abominável, o monstro em que o militar Blonsky, vivido por Tim Roth, se transforma, é, esta sim, digna de um filme de super-herói. Sem falar nos easter-eggs recheados de nostalgia: os olhão verdão arregalado de Banner, na primeira transformação, na fábrica, imitando a expressão de Bill Bixby, o Banner do seriado dos anos 70; a própria "aparição" de Bixby, já falecido, na tela de uma TV, na casa de Bruce; a participação de Lou Ferrigno, o fortão que fazia, sem efeitos especiais, o homem-verde na série, como segurança na faculdade; e uma breve mas significativa execução de "The Lonely Man Theme", aquela música triste que tocava no final da série quando, depois de transformado, reestabelecido como humano, o Dr. Banner seguia, sem destino por alguma estrada em busca de si mesmo e convivendo com aquele monstro que não sabia como controlar.

"Hulk" (2003) - trailer




"O Incrível Hulk" (2008) - trailer


Ampla vantagem para o filme novo: Edward Norton é muito mais jogador que Eric Bana, William Hurt, como General Ross, é muito melhor que Sam Elliot, no mesmo papel; o Abominável é um vilão muito mais fodão que o Homem-Absorvente (agora, veja só o nome...); o Hulk em si, sua figura, sua textura, sua interação com o ambiente, toda a CGI dão um banho de bola no antigo; e as referências ao seriado antigo...ah! aí desequilibra o jogo.
A namoradinha, Beth Ross é um caso à parte porque, se, por um lado, Jennifer Connely do filme de 2003 é mais atriz, por outro, a personagem da segunda versão é mais fiel, mais parceira, menos filhinha-do-papai.
A favor do primeiro filme temos o fato de esmiuçar as origens, a experiência, que levou à metamorfose; e, especialmente, a estética de histórias em quadrinhos que ficou muito show. Mas não é o suficiente. O "Incrível Hulk" de Louis Leterrier esmaga o "Hulk" de Ang Lee e vence facilmente.


Aqui, os principais destaques
das duas versões, lado a lado.


O Hulk de 2008 dá uma surra no Hulk de 2003 igual àquela que 
ele mesmo viria a dar no Loki em "Os Vingadores". 
Tratando como se fosse um boneco (e parecia ser mesmo, não?)
Vitória fácil do Verdão.
(Ah, os dois jogam de verde...)
Então, vitória do Incrível Verdão!





por Cly Reis

segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Minhas 5 atuações preferidas do cinema

Brando: imbatível
Recebi do meu amigo e colega de ACCIRS Matheus Pannebecker o convite para participar de uma seção do seu adorável e respeitado blog Cinema e Argumento. A missão: escolher três atuações que me marcaram no cinema. Ora: pedir isso para um cinéfilo que adora elaborar listas é covardia! Claro, que topei. Não só aceitei como, agora, posteriormente à publicação do blog de Matheus, amplio um pouquinho a mesma listagem para compor esta nova postagem. Não três atuações inesquecíveis, mas cinco. 

Obviamente que ficou de fora MUITA coisa digna desta mesma seleção: Michel Simon em “Boudu Salvo das Águas” (Jean Renoir, 1932), Lima Duarte em “Sargento Getúlio” (Hermano Penna, 1983); Steve McQueen em “Papillon” (Franklin J. Schaffner, 1973); Marília Pêra em “Pixote: A Lei do Mais Fraco” (Hector Babenco, 1981); Toshiro Mifune em “Trono Manchado de Sangue” (Akira Kurosawa, 1957); Klaus Kinski em “Aguirre: A Cólera dos Deuses” (Werner Herzog, 1972); Fernanda Montenegro em “Central do Brasil” (Walter Salles Jr,, 1998); Dustin Hoffman em “Lenny” (Bob Fosse, 1974); Sharon Stone em “Instinto Selvagem” (Paul Verhoven, 1992); Al Pacino em “O Poderoso Chefão 2” (Francis Ford Coppola, 1974)... Ih, seriam muitos os merecedores. Mas fiquemos nestes cinco, escolhidos muito mais com o coração do que com a razão.

******

Marlon Brando
“O Poderoso Chefão" (Francis Ford Coppola, 1972)
Há momentos na história da humanidade que a arte sublima. É como um milagre, uma mágica. Isso, não raro, provêm dos grandes gênios que o planeta um dia recebeu. Sabe Jimi Hendrix tocando os primeiros acordes de “Little Wing”? Pelé engendrando o passe para o gol de Torres em 70? A fúria do inconcebível de Picasso para pintar a Guernica? A elevação máxima da arte musical da quarta parte da Nona de Beethoven? Na arte do cinema este posto está reservado a Marlon Brando quando atua em “O Poderoso Chefão”. Assim como se diz que nunca mais haverá um Pelé ou um Hendrix ou um Picasso, esse aforismo cabe a Brando que, afora outras diversas atuações dignas de memória, como Vito Corleone atingiu o máximo que uma pessoa da arte de interpretar pode chegar. Actors Studio na veia, mas também coração, intuição, sentimento. Tão assombrosa é a caracterização de um senhor velho e manipulador no filme de Coppola que é quase possível se esquecer que, naquele mesmo ano de 1972, Brando filmava para Bertolucci (em outra atuação brilhante) o sofrido e patológico Paul, homem bem mais jovem e ferinamente sensual. Pois é: tratava-se, sim, da mesma pessoa. Aliás, pensando bem, não eram a mesma pessoa. Um era Marlon Brando e o outro era Marlon Brando.

cena inicial de "O Poderoso Chefão"



Giulieta Masina
“A Estrada da Vida” (Federico Fellino, 1954)
“A Estrada da Vida” é sem dúvida um dos grandes filmes de Federico Fellini. Sensível, tocante e levemente fantástico. Nem a narrativa linear e de forte influência neo-realista – as quais o diretor foi se afastando cada vez mais no decorrer de sua carreira em direção a uma linguagem mais poético e surrealista – destaca-se mais do que considero o ponto alto do filme: as interpretações. À época, Fellini se aventurava mais nos palcos de teatro e nas telas, basta lembrar do lidíssimo papel de “deus” no episódio dirigido pelo colega Roberto Rosselini no filme “O Amor” (1948). Talvez por essa simbiose, e por ter contado com o talento de dois dos maiores atores da história, Anthony Quinn (maravilhoso como Zampano) e, principalmente, da esposa e parceira Giulieta Masina na linha de frente, “A Estrada da Vida” seja daquelas obras de cinema que podem ser considerados “filme de ator”. Considero Gelsomina a melhor personagem do cinema italiano, o que significa muita coisa em se tratando de uma escola cinematográfica tão vasta e rica. Não se trata de uma simplória visão beata, mas o filme nos põe a refletir que encontramos pessoas assim ao longo de nossas vidas e, às vezes, nem paramos para enxergar o quanto há de divino numa criatura como a personagem vivida por Giulieta. Reflito sobre a passagem de Jesus pela Terra, e o impacto que sua presença causava nas pessoas e o que significava a elas. Se ele não era “deus”, era, sim uma pessoa valorosa entre a massa de medíocres e medianos. Gelsomina, com sua pureza e beleza interior quase absurdas, parece carregar um sentimento infinito que poucas pessoas que baixam por estas bandas podem ter – ou permitem-se. E é justamente essa incongruência que, assim como com Jesus, torna impossível a manutenção de suas vidas de forma harmoniosa neste mundo tão errado. Tenho certeza que foi por esta ideia que moveu Caetano Veloso a escrever em sua bela canção-homenagem à atriz italiana, “aquela cara é o coração de Jesus”.

cena de "A Estrada da Vida"



Leonardo Villar
“O Pagador de Promessas” (Anselmo Duarte, 1960)
Sempre quando falo de grandes atuações do cinema, lembro-me de Leonardo Villar. Assim como Giulieta, Brando, Marília, Toshiro, De Niro, Pacino, Emil ou Lorre, o ator brasileiro é dos que foram além do convencional. Aqueles atores cujas atuações são dignas de entrar para o registro dos exemplos mais altos da arte de atuar. Sabe quando se quer referenciar a alguma atuação histórica? Pois Leonardo Villar fez isso não uma, mas duas vezes – e numa diferença de 5 anos entre uma realização e outra. Primeiro, em 1960, ao encarnar Zé do Burro, o tocante personagem de Dias Gomes de “O Pagador de Promessas”, o filme premiado em Cannes de Anselmo Duarte (na opinião deste que vos escreve, o melhor filme brasileiro de todos os tempos). Na mesma década, em 1965, quando vestiu a pele de Augusto Matraga, do igualmente célebre “A Hora e a Vez de Augusto Matraga”, de certamente o melhor filme do craque Roberto Santos rodado sobre a obra de Guimarães Rosa. Dois filmes que, soberbamente bem realizados não o seriam tanto não fosse a presença de Villar na concepção e realização dos personagens centrais das duas histórias. Ainda, personagens literários que, embora a riqueza atribuída por seus brilhantes autores, são - até por conta desta riqueza, o que lhes resulta em complexos de construir em audiovisual - desafios para o ator. Desafios enfrentados com louvor por Villar.

cena de "O Pagador de Promessas"



Emil Jannings
"A Última Gargalhada" (F. W. Murnau, de 1924)
Falar de Emil Jannings é provocar um misto de revolta e admiração. Revolta, porque, como poucos artistas consagrados de sua época, ele foi abertamente favorável ao nazismo, tendo sido apelidado pelo próprio Joseph Goebbels como o "O Artista do Estado". Com o fim da Guerra, nem o Oscar que ganhou em Hollywood em 1928 por “Tentação da Carne”, o primeiro da Melhor Ator da história, lhe assegurou salvo-conduto no circuito cinematográfico, do qual foi justificadamente banido.  Porém, é impossível não se embasbacar com tamanho talento para atuar. O que o ator suíço faz em “A Última Gargalhada”, clássico expressionista de F. W. Murnau, de 1924 é digno das maiores de todo o cinema. Que personagem forte e cheio de nuanças! A expressividade teatral, comum às interpretações do cinema mudo, são condensadas pelo ator numa atuação que se vale deste exagero dramatúrgico a favor da construção convincente de um personagem inocente e puro de coração. Com apenas 40 anos Jannings, que alimentava pensamentos fascistas, transfigura-se num idoso bonachão e humano. E tudo isso sem “pronunciar” nenhuma palavra sequer! Joseph Von Steiberg ainda o faria protagonizar um outro grande longa alemão, o revolucionário “O Anjo Azul”, em que contracena com a então jovem diva Marlene Dietrich, mas a mácula nazi não o deixaria alçar mais do que isso. Para Jennings, a última gargalhada foi dada cedo demais.

cena de "A Última Gargalhada"



Robert De Niro
"Touro Indomável" (Martin Scorsese, 1980)
Têm atuações em cinema que excedem o simples exercício da arte dramática, visto que representam igualmente uma prova de vida. Foi o que Robert De Niro proporcionou ao interpretar, em 1980, o pugilista ítalo-americano Jake LaMotta (1922-2017) em “Touro Indomável”, de Martin Scorsese. Desiludido com os fracassos que vinha acumulando desde o sucesso de crítica “Taxi Driver”, de 4 anos antes, o cineasta só vinha piorando a depressão com o uso desenfreado de cocaína. Somente uma coisa podia lhe salvar. A arte? Não, os amigos. De Niro, a quem Scorsese havia confessado que não iria mais rodar jamais na vida, convenceu-o a aceitar pegar um “último” projeto, que contaria a biografia do “vida loka” LaMotta. Claro, o ator, parceiro de outros três projetos anteriores de Scorsese, se responsabilizaria pelo personagem principal. Por sorte, o destino provou a Scorsese que ele estava errado em sua avaliação negativa e o recuperou para nunca mais parar de filmar. “Touro...”, uma das principais obras-primas da história cinema, é não só o melhor filme do diretor quanto a mais acachapante das atuações de De Niro. As “tabelinhas” dele com Joe Pesci, a qual o trio repetiria a dose nos ótimos “Os Bons Companheiros” e “Cassino”, começaram ali. Prova da capacidade de mergulho de um ator no corpo de um personagem, De Niro vai do físico de atleta, parecendo muito maior do que ele é de verdade, à obesidade de um homem decadente e alcoólatra. Fora isso, ainda tem a tal cena de quando LaMotta é preso em que, numa crise de fúria, ele esmurra a parede da cela, cena na qual De Niro, tão dentro do personagem, de fato quebra a mão.“Eu não sou um animal!”, bradava. Eu diria que é, sim: um “cavalo”, daqueles de santo que recebem dentro de si entidades.

cena de "Touro Indomável"


Daniel Rodrigues