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sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Aniversário do Show da HímenElástico

Há exatos 17 anos, numa sexta-feira 13, a HímenElástico fazia seu primeiro show na cidade de Alvorada, vizinha a Porto Alegre, num lugar chamado Woodstock Bar.
A HímenElástico fora o projeto musical-criativo de 4 primos malucos que costumavam passar madrugadas (sóbrios) falando e inventando doideiras de todo tipo; gráficas, verbais, musicais, ou de qualquer outra forma. Essa hemorragia criativa nos estimulou; a mim, meu irmão Daniel, e meus primos Lúcio e Lê; a tentarmos, mesmo sem tocar nada, a ter uma banda. Não era este afinal o espírito punk? Era! E era isso também que nos servia de base. O Lúcio estivera pouco tempo antes de cabeça no punk da periferia paulista Cólera, Garotos Podres, tinha também descoberto os Kennedy's, Exploited e havia levado a mim e meu irmão que fazíamos uma linha um pouco mais Rock-BR da época (Legião, Titãs, RPM). O Lúcio também tava numas de rap na época e a novidade pra mim era interessante. O tal do Public Enemy era bom pra caralho. Tínhamos também todos acabado de ouvir o "Cabeça Dinossauro" dos Titãs e talvez aquilo tenha sido a mola propulsora definitiva. Poucas notas, agrassividade, letras minimalistas. Dava pra fazer rock! Vamos ter uma banda? Mas e essa diferença toda? Eu gostava de Smiths, meu irmão de Caetano, o Lúcio de Ratos de Porão e o Lê de Thayde. Deu no que deu: uma mistura das mais interessantes, criativas e originais.
O nome era uma brincadeira entre o "Homem-Elástico" e algo bem malicioso, tanto que escreve-se originalmente o nome da banda com o Φ grego, deixando a palavra  hΦmem com uma possível dupla leitura.
Nosso som ficou muito próximo ao do nosso disco modelo, o "Cabeça Dinossauro". Lembrava um bocado Titãs, especialmente na minimalista "Nem uma, coisa nem outra" que parecia não fazer muito sentido mas (sinceramente) era extremamente questionadora, versando sobre o TER, o querer sempre mais, o não se dar por satisfeito. Era tão simplesmente-complexa que, em verdade, entre um ajuste e outro, um complemento, uma palavra aqui  outra ali, a letra demorou três anos pra ficar pronta; e depois musicalmente, acrescido som à letra, fôra uma de nossas melhores.
Não tínhamos muito compormisso exceto com nós mesmos e com a nossa diversão. Tanto que não temos grandes registros gravados. A maioria são em cassete e sem muita qualidade. Ensaiamos pra valer mesmo no dia do tal do show em Alvorada. Apresentação que o Lúcio conseguiu com alguns contatos e nos botou na jogada. Só que aí teríamos que estar mais preparados e então marcamos duas horas de estúdio no fim da tarde pra ficarmos afiados pro show à noite. Deu certo. Estávamos na ponta dos cascos. O problema foi que uma hora antes do show, com a voz desgastada, com o frio terrível que fazia e acho que um pouco pela ansiedade, a voz se foi. Só sei que estava apavorado numa mesa pouco antes de entrar no palco e veio um cara de uma outra banda e recomendou, "sabe o que que é bom pra isso? cachaça. toma uma cachaça pura que isso passa rapidinho". Segui a orientação e não deu outra.
Obra do destino ou sei lá o que, mas entramos no palco exatamente à meia-noite do dia 13 de agosto (o que na verdade já era dia 14, mas pra efeito poético-sinistro ainda seria sexta-feira 13 até raiar o sol). Em um ambiente especialmente decorado para a data tão especial, à penumbra e cheio de caveiras com velas, abrimos o show com a "Marcha-Fúnebre" emendando com nossa vinheta de abertura tradicional inspirada naqueles gritos de pelotões do exército que correm na rua: "Dá um beijo no cangote, Carolina/ Uh, Uh, Uh, Carolina...", e que já emendava com a matadora "Ex", uma das nossas preferidas, também muito minimalista que contava com uma incrível agrssividade intrínsca. A coisa seguiu na boa, acho que a galera gostou, tocamos tudo que tínhamos ensaiado até o grand-finale com "Nem Tudo Está Perdido" que com sua letra apocalíptica e executada de maneira tão catártica acabou configurar um final apoteótico da nossa apresentação.
No final fui cumprimentado sincera e entusiasticamente por um cara da Space Rave, banda de Porto Alegre que continua no circuito com algum êxito e ainda esnobei a loirinha que eu tinha dado em cima antes do show, mas que só depois da apresentação veio se querendo. Agora é tarde, baby.
Como disse, não tínhamos grande compromisso com a coisa, apesar de gostarmos muito. Eu tinha faculdade, éramos duros pra bancar estúdios, meus primos moravam longe e no fim das contas não levamos a coisa muito adiante. Mas até hoje, bem imodestamente, logo eu que sou extremamente chato para o que faço e para o que ouço, considero a HímenElástico uma das melhores coisas nacionais que já ouvi nos últimos tempos. Eu teria um CD daquela banda. Ouço bandas hoje e penso: "Cara, a Hímen já fazia isso naquele tempo e sem o menos recurso". Era criatividade pura.
Parabéns hermenêuticos pelo aniversário do showzinho de Alvorada.

ESCLARECIAMENTO AOS NÃO-HERMENÊUTICOS: Hermenêutico nesse caso não tem a menor relação com seu significado original que é de interpretação de livros sagrados ou de leis, blá, blá, blá. Adotamos a palavra para designar tudo aquilo que fosse relativo à HímenElástico.

Assim sendo, faz 17 anos do primeiro show Hermenêutico!

domingo, 29 de julho de 2012

Anarquia em Porto Alegre - Noite de autógrafos de Daniel Rodrigues - Pinacoteca Café (19/07/2012)




Tinha ficado devendo imagens e algumas considerações sobre o lançamento do livro "Anarquia na Passarela" (ed. Dublinense, 2012) do meu irmão, jornalista, parceiro-colaborador deste blog e dono blog do O Estado das Coisas Cine, Daniel Rodrigues.
Bom, pra começar, voltar a Porto Alegre para mim é sempre um prazer e ainda mais em circunstâncias festivas e alegres como esta, neste caso especialmente numa realização pessoal do Daniel e que por extensão enche de orgulho a todos nós da família.
O evento em si estava um grande barato. Tudo muito bacana, muito alegre, muito amistoso e ambiente aconchegante do bar Pinacoteca Café. Amigos, familiares, desconhecidos, curiosos, todos ali dando uma conferida, cumprimentando o escritor e demonstrando grande interesse pelo tema que num primeiro momento parece estranho mas que olhando em volta se vê o quanto é comum.
Tive a oportunidade de encontrar parentes queridos como minha adorada tia-prima Isaura, amigos de tempo como o Christian Ordoque e a Iris Borges, amigos até então virtuais como a Valéria Luna e o Eduardo Wolff, rever meu outro 'irmão' velho, meu primo e ex-parceiro de banda, o Lúcio Agacê detonando um punk rock nas 'picapes', e até topar com uma das lendas do punk-hardcore gaúcho, o ex-vocalista da Atraque, Leandro Padraxx, que dava uma banda por lá.
Grande noite. Grande honra e prazer ter estado lá com todas essas pessoas. E, mais uma vez parabéns, Daniel! Sucesso e que venham outros e outros livros por aí.


Abaixo algumas das cenas da noite captadas pela lente de Leocádia Costa, que igualmente tive o prazer de conhecer nesta visita:

"Anarquia na Passarela", já à venda
Família presente prestigiando o evento.
Lucio Agacê comandando o som:
Replicantes, Kennedy's, Pistols, Joy, e  por aí vai.
O autor, Daniel, na mesa de autógrafos,
atencioso com os visitantes
...tudo isso 'embalado' pela saborosa
cachaça Da Chica
Daniel com o grande Eduardo Wolff, resenhista
de vários ÁLBUNS FUNDAMENTAIS
aqui no blog,...
... com sua adorável namorada, Leocádia. 
... e revivendo a extinta HímenElástico,
com este blogueiro que vos escreve (dir.) e com Lúcio Agacê.
Irmãos
Autógrafos
Daniel Rodrigues e seu livro


fotos: Leocádia Costa
Luís Ventura


terça-feira, 26 de dezembro de 2023

Código Penal - Preto no Metal Festival - Bar Opinião - Porto Alegre/RS (17/12/2023)

 

Fazia tempo que queria ver a Código Penal, uma das bandas do meu primo-irmão-parceiro Lucio Agace. Digo uma das bandas, porque Lucio enfileira, desde os anos 80, algumas das bandas mais legais da cena alternativa gaúcha. A começar pela HímenElástico, projeto que tínhamos em conjunto com meu outro irmão e coeditor deste blog, Cly Reis, e meu outro primo e irmão do Lúcio, , com o adicional de nosso baterista oficial César “Pereba”. Mas a Hímen, há de se dizer, por mais legal que fosse nosso som (considero-a a grande banda gaúcha dos anos 90 que não aconteceu), foi talvez o projeto mais incipiente de Lucio. Vômitos & Náuseas, Causa Mortis e Câmbio Negro, pelo contrário, são alguns desses seus projetos mais consistentes. Mas também há de se dizer: a Código Penal é especial. O som, misto de hardcore, hip hop, funk e uma veia social e urbana muito evidente (em vários aspectos, parecida com a da Hímen) fazem da Código uma banda muito foda de se ouvir. Faltava vê-los no palco.

Pois o Festival Preto no Metal, ocorrido no célebre bar Opinião, trouxe esta oportunidade. A Código se apresentou na sequência de outras bandas muito legais com essa mesma vertente e ativismo, mas confesso que fomos mesmo lá para vê-los. E a expectativa foi totalmente atendida, numa apresentação enérgica, potente, dançante e... foda. A “arquitetura” da banda é apreciável, desde a visual até a sonora, com Lucio e Black to Face dividindo-se nos vocais como verdadeiros vocalistas MCs, dois guitarristas, Marcio Zuza e Eduardo Jack, um fazendo base e outro complementando o arranjo com efeitos e solos, o baixo poderoso de Luciano Tatu, a bateria pegada de Pereba e uma mesa eletrônica comandada pelo próprio Lucio. 

O tempo de show de festival, como de costume, curto. Então, o negócio é subir no palco e mostrar serviço, como a Código fez. Aí, foi só paulada, uma atrás da outra. “Terra de Ninguém” pra começar. “Os Dois Lados do Imoral”, na sequência, fez o ambiente pra ótima parceria da banda com Tonho Crocco em “Apologia”, que levantou a galera. “Marginalizado”,  “Justiça Injusta” e “Chove Bala”, idem. Pra finalizar, “Sexo nas Ruas” e a ótima “Gangs”, que já rodei no meu programa, o Música da Cabeça, mas que ao vivo ganha uma potência maior, tanto pela reação da galera quanto pela sonoridade própria, com seus samples da trilha de “Sexta-Feira 13”. Aliás, por falar no filme, mais uma das coisas legais da performance da banda e de Lucio, em especial, que é quando ele se ausenta um tempo do palco para voltar travestido de Jason Voorhees, com a máscara característica do personagem, um casaco com capuz preto e um temível taco de beisebol. Fez lembrar outro punk performático chamado John Cale.

Enfim, showzasso da Código, que Leocádia e eu vencemos os 48 graus de sensação de Porto Alegre àquele dia para estar no Opinião, mas que valeu totalmente a pena. Confere aí um pouco de como foi:

**********

A Código sobe ao palco do Opinião 

Lucio, performático, com a máscara do Jason junto com Black to Face

Black to Face mandando ver nas rimas

Um pedacinho de como foi o show 
da Código Penal no Opinião

Visão da mesa de som

Código in da house, motherfucker!

Mais rimas

Lucio ao centro do palco com a baita banda na "cozinha"

Preto no Metal olhando o Preto no Metal

A galera comemorando o baita show ao final:
Jamal, Val, Lucio, Leo e eu
 


Site da Código Penal: www.bandacodigopenal.com.br  


texto: Daniel Rodrigues
fotos e vídeos: Leocádia Costa e Daniel Rodrigues

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Um Dia Depois do Fim


A volta da Causa Mortis


Meu primo/parceiro/irmão/colaborador (não necessariamente nessa ordem), Lucio Agacê, grande influência musical na minha vida, DJ, blogueiro, multiinstrumentista, agitador inquieto, constantemente envolvido em algum projeto musical, retoma um dos mais legais capítulos de sua trajetória no meio alternativo da Grande Porto Alegre, com o qual eu tive o privilégio de conviver ainda que brevemente: a banda Causa Mortis. Petardo hardcore, agressivo, violento, na veia e dando impiedosamente nos dedos, a CM foi contemporânea, nos anos 90, do nosso projeto musical, muito interessante mas pouco profissional e pouco ambicioso, a HímenElástico, inclusive com membros em comum, como Pereba e Maurício, e por certo, muito nos influenciou na atitute e sonoridade.
O lance todo é que depois de um hiato, aí, de 18 anos, a banda volta disposta a pôr tudo abaixo e  a grande volta acontecerá no dia 03 de maio, no Holiday Studio Pub em Sapucai do Sul. Quem estiver por lá ou pelas redondezas, não perca. Eu, mesmo estando aqui no rio, vou tentar estar presente.
Abraços a todos os integrantes e boa sorte nessa volta.
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Causa Mortis é:
LucioAgace(voz)
Sandro Takeda(bass)
Mauricio Sor(guitar)
César Pereba(drums)


Holiday Studio Pub fica na
Rua Leônidas de Souza, 891, 93210-140 Sapucaia do Sul - RS


veja o vídeo de duvulgação da volta e do evento:



C.R.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Miles Davis - "Kind of Blue" (1959)

"Quem é tocado por essa música [de Kind of Blue] muda para sempre. E se torna melhor do que é."
 Herbie Hancock



Fui convidado pelo autor deste blog a escrever a resenha sobre “Kind of Blue”, de Miles Davis, de 1959, simplesmente o disco de jazz de maior sucesso e vendagem de todos os tempos, tendo ultrapassado tranquilamente, mais de meio século depois de seu lançamento, a marca de 6 milhões de cópias vendidas em todo o mundo. Volume este que continuará crescendo certamente, tendo em vista que diariamente exemplares de “Kind of Blue” são adquiridos por novos e antigos fãs. Eu mesmo sou mais um dentre esta multidão de admiradores.
 Então, diante de tal missão, perguntei-me: o que dizer deste fenômeno, uma obra que perdura a tanto tempo e da qual, principalmente, gosto tanto? Como dimensionar sua evidente inspiração a toda uma geração de artistas? Ou, ainda, explicar de que forma a gama de aspectos musicais e não musicais que “Kind of Blue” abarca, trazendo de vez para a música moderna as influências de culturas folclóricas, como os sons orientais, africanas ou hispânicos, e misturando tudo isso ao groove latino, à música erudita e a tradição negra americana? Como jornalista, uma das regras básicas da minha profissão é a de manter imparcialidade sobre o que se está analisando. O que fazer, então, quando se está na posição de crítico e amante ao mesmo tempo?
 A solução que achei foi a de me entregar à genialidade deste disco, perceptível a cada faixa, a cada solo, a cada fraseado de trompete, a cada base de piano, a cada vibração de corda do baixo, a cada ataque do saxofone. “Kind of Blue” já impressiona de cara pela “cozinha”. O quinteto formado por Miles tinha nada mais nada menos que o baixo seguro de Paul Chambers, a bateria swingada e elegante de Jimmy Cobb, o sax alto cheio de sentimento e alma gospel de Cannonball Adderley, o piano “branco” e mezzo-erudito de Bill Evans, o trompete genial e inteligentemente comedido do próprio Miles e o sax tenor do talentosíssimo John Coltrane, que, talvez, comporte todos esses elementos e mais um pouco. Trata-se da melhor banda de Miles, comparada somente a seu supertime de 1969, que contava com feras como Chick Corea, Herbie Hancock, Wayne Shorter e Ron Carter. O fato é que os quatro músicos que acompanharam Miles em “Kind of Blue” tornaram-se ou se solidificaram depois do álbum como alguns dos grandes nomes da história do jazz (incluindo aí Red Garland, que tocou piano em uma das faixas), mas principalmente Coltrane, que revolucionou o estilo, disco a disco, até a sua morte, em 1967.
 Mas e o disco? Bem, “Kind of Blue” começa com a célebre “So What”, um blues cadenciado e cheio de swing onde aparece pela primeira vez na história da música um negócio que Miles Davis vinha desenvolvendo (parte conscientemente e outra não) há mais ou menos uma década: o jazz modal. Embora se trate de uma invenção técnica, facilmente distinguida por músicos, para leigos como eu também não é difícil de reconhecer. Ou, pelo menos, “sentir” a diferença. O jazz modal – diferentemente da loucura criativa do be-bop, que aproveitava todas as escalas musicais ao extremo, ou do free-jazz, livre em concepção, como o título sugere – propunha uma, digamos, “simplificação programada” do jazz. Assim, as melodias eram compostas em escalas (por módulos = modal), o que gera uma base em que há poucas mudanças de notas mas, ao mesmo tempo, dá uma vasta liberdade aos solistas, que não precisam improvisar somente dentro do tradicional tempo 1-2-3-4. Um pequeno detalhe, mas uma verdadeira revolução que influenciou todo o jazz, soul, pop e rock que viria a seguir – isso, para ficar só nas contribuições à música, sem falar do cinema, artes plásticas, cênicas, etc.
 “So What”, com sua memorável abertura do diálogo entre baixo e piano, é, assim, um marco do jazz modal, formato que Miles e seu quinteto empregaram em todas as cinco faixas do álbum. E “So What” guarda ainda uma outra curiosidade. Nela, a visão pop do caleidoscópico Miles se evidencia: ouvindo com atenção, dá para perceber que sua base de sopros no chorus é idêntica a de “Cold Sweat” (veja o vídeo), de James Brown (a quem o jazzista admirava), considerado o primeiro funk da história. Porém, exceto por um detalhe: as notas estão na ordem inversa.
 O disco segue com outro jazz “blueseado”: “Freddie Freeloader”, tema que contém o talvez mais impressionante solo já tocado por Coltrane. Depois do número elegante de Miles, Trane entra literalmente rachando com toda emoção e potência, vazando o som do seu sax para todos os microfones do estúdio e obrigando o operador da mesa a reduzir o volume manualmente na hora. O que seria uma falha na gravação para um artista comum, fazendo com que se repetisse a sessão, por causa da sensibilidade de Miles ficou assim mesmo e assim se eternizou.
 A lindíssima balada “Blue in Green” vem na sequência, uma provável parceria de Miles com o Evans onde o pianista conduz a melodia. Bem, “melodia” não é bem o termo certo. Criada sob a linha modal de notas cool que variam em poucas escalas, e com claras influências eruditas emanadas do piano quase clássico de Evans, “Blue in Green” não tem uma melodia propriamente dita. Não fica evidente um acorde básico ou um riff. Mesmo assim, sua aura é tão palpável que quem a escuta jamais se esquece de como ela é.
 Outra pérola inesquecível de “Kind of Blue” é a hipnótica e sensual “All Blues”, na qual se veem nuanças hispânicas, afro e da vanguarda erudita. Nela, o piano mantém constantemente um trinado que parece com marimbas espanholas tremulando, enquanto os sopros executam o chorus lentamente, em longos e lânguidos riffs fraseados que definem a base do tema. Para matar a pau, o Miles inicia uma segunda frase melódica com um longa nota, que se estende, parecendo dar asas à canção. Ajudado pelo som de escovinhas raspando no tarol, o famoso som repetido do piano gera uma sensação mágica de circularidade, muito bem traduzida para o audiovisual pelas lentes de Spike Lee, no filme "Mais e Melhores Blues" de 1990.
 A obra-prima finaliza com outra de ares ibéricos: “Flamenco Sketches”, tão rica e densa musical e conceitualmente que serviu de inspiração não para mais uma música, mas para um disco inteiro de Miles Davis chamado “Sketches of Spain”, de 1960. É mole ou quer mais?

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 Antes e depois de “Kind of Blue”, Miles Davis revolucionou a música moderna uma porção de vezes. Por isso, vale destacar pelo menos duas obras que se incluem nesta lista e que foram importantes na formação do jazz modal que desembocaria em “Kind of Blue”: “Walkin’” e “The Birth of the Cool”, ambos de 1954.

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 Como todo grande disco, um “The Dark Side of the Moon”, do Pink Floyd, ou “Exile on Main Street”, dos Rolling Stones, “Kind of Blue” carrega lendas. Uma delas – e que se constatou ser verdade quase 40 anos depois – é a de que a gravação impressa em milhões de exemplares e que se popularizou no mundo todo por décadas estava milésimos de segundo mais lenta que o normal, pois se tratava da cópia extraída de uma master com um leve defeito. Hoje, é possível adquirir a versão corrigida, mas muitos veem nesta falha um toque divino, mantendo-se fiéis ao registro “original”.

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O livro sobre a história da obra-máxima
de Davis
O autógrafo do mestre Hermeto
no livro do 'parceiro' Miles
 Para finalizar, dia desses encontrei no Aeroporto de Porto Alegre o compositor e multi-instrumentista brasileiro Hermeto Pascoal. Pedi-lhe um autógrafo no primeiro papel que vi, meu livro, o que ele prontamente atendeu. Para não lhe dar a impressão de que gastaria tinta em qualquer papel, eu, na minha ignorância, comentei que estava lhe dando para assinar uma obra que abordava o tema música: era “Kind of Blue: A História da Obra-prima de Miles Davis”, do jornalista americano Ashley Kahn. Afinal, jazz e Hermeto Pascoal é quase a mesma coisa, né? O “albino Hermeto” (que de fato não enxerga muito bem, como disse Caetano Veloso), comentou-me, então, com toda simplicidade que conhecera Miles Davis no final dos anos 60, e que tocara junto com ele. (!) Não só: que justo o para mim tão mitológico Miles havia gravado duas canções dele, Hermeto, em um disco que ele não lembrava ao certo o título e de quando datava (vejam só!). Enfim, estupefato pelo desapego do genial Hermeto busquei no Google e encontrei o tal disco: chama-se “Live Evil”, de 1967, considerado por alguns como um álbum “demoníaco”. Quem quiser conhecer, benza-se antes de ouvir. Cruz-credo!

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Ouça:
Miles Davis Kind Of Blue



por Daniel Rodrigues





Daniel Rodrigues é jornalista formado pela PUC/RS, curioso e pesquisador de música, é aberto a todos os estilos demonstrando, contudo, especial interesse e conhecimento pelo jazz. Também, por incrível que possa parecer, direciona grande parte de suas atenções ao punk-rock, suas origens e vertentes, estilo sobre o qual inclusive baseou o tema de sua tese de diplomação relacionando-o com a evolução da moda.
Daniel além de tudo isso é meu irmão e foi integrante comigo da banda 'punk-putaria-core', HímenElástico.

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Vômitos & Náuseas – Gravação do Primeiro CD


Deparei-me pelo Facebook com uma notícia com a qual fiquei muito feliz: uma das bandas do meu primo-brother e colaborador do Clyblog, Lucio Agacê, a Vômitos & Náuseas, vai lançar CD este ano. É para setembro que está previsto o primeiro disco full-lenght destes veteranos do hardcore gaúcho, formada atualmente, além do Lucio nos vocais, pelo Gabriel Tolla, no baixo, Fabiano Dian e Guga Prado, nas guitarras, e Cristiano Hulk, bateria.
Minha felicidade se justifica. Além de acompanhar sempre que possível, de perto ou de longe, as movimentações musicais que o agitador Lucio sempre promoveu desde os anos 80 (época em que mudou minha vida, quando, ainda guri, fui apresentado por ele ao punk-rock), igualmente, vi, em 1989, o nascimento e formação da Vômitos, a qual assisti algumas vezes em ensaio e show ao vivo. Presenciei também à época a participação na coletânea “Paranoia Suicida”, de 1990, primeiro registro oficial deles, pouco antes do Lucio entrar para o grupo.
Vômitos & Náuseas, 
retorno com tudo.
E lá se vão 20 anos de “coma”, como os próprios definem o período em que estiveram afastados. Em 2014, depois de tocarem outros projetos, entre períodos de viagens e trabalhos em outras bandas (só o Lucio teve envolvido com a Causa Mortis, Facção Zumbi, trabalhos solo, discotecagem e a própria HímenElástico, a qual também pertencia), os caras retornaram pra detonar tudo de vez com seu som que mescla o bom e velho punk com hip-hop e heavy metal. Estão atualmente aprontando material inédito no estúdio Hurricane, em Porto Alegre, incluindo canções compostas nos anos 90 e coisas novas, com produção do Sebastian Carsin, Gabriel Siqueira e Juan Acosta.

Seja bem vinda de volta, Vômitos & Náuseas! Paulada na cabeça desse rock gaúcho insosso e ridiculamente “érrebe-éssezado”. Nauseiem à vontade os estomagosinhos dessa gente apática e idiota e vomitem-lhes agressividade em forma de boa música. É de vômito que estamos precisando. O CD sai em breve, mas por enquanto, fiquem com uma das inéditas, composta em 1991: “Corpos Mutilados”.


Vomitos & Náuseas - "Corpos Mutilados"



terça-feira, 23 de agosto de 2016

Agosto, Mês do Aniversário do ClyBlog







As pessoas, de um modo geral, costumam demonizar o mês de agosto, em muitos casos gratuitamente, sem que ele tenha lhes feito mal algum, sem que nele tenha ocorrido qualquer fato relevantemente negativo que não tivesse acontecido em qualquer outro dos onze meses do ano. Atribui-se ao oitavo mês do ano uma série de títulos pouco elogiosos, responsabilidades injustas e predicados nada agradáveis repetindo chavões batidos como "mês do desgosto", "mês do cachorro louco" como se seus trinta e um dias guardassem por alguma maldição todas as desgraças do mundo. Não raro ouve-se até que agosto seria um mês ruim por ser o que gente importante morreu, sendo Getúlio Vargas o mais comum de associar-se a este período que, aí, para justificar a má fama do mês até por uma aura quase beatificada parece ficar coberto. Mas não é só ele, vão na carona Elvis, Raul Seixas, John Lennon e outros só pra reforçar a tal reputação maldita do agosto.
De minha parte, pra começar, nunca tive nada contra agosto na minha vida desde sempre, mas com o passar dos tempos o mês oito acabou me reservando algumas grandes alegrias que, contrariando a maioria, acabaram fazendo com que se tornasse um mês especial. Lá pelos idos dos anos 90, minha banda amadora, a HímenElástico fazia seu primeiro e marcante show no município de Alvorada, vizinho a Porto Alegre, numa sexta-feira 13 de agosto, abrindo a apresentação com uma marcha fúnebre, celebrando a data também tida como sinistra, e aos poucos vencendo a desconfiança do público fazendo um show matador até conquistar definitivamente a audiência no final. Um dos grandes momentos da minha vida e tenho certeza que do meu irmão Daniel Rodrigues e do meu primo Lucio Agacê, ex-integrantes da banda, hoje parceiros de ClyBlog. Mais adiante, superando um período acadêmico um tanto conturbado, depois de ter concluído meu trabalho de diplomação entre as madrugadas frias de julho assistindo aos jogos da Copa do Mundo de 2002 da Coreia/Japão, foi marcada para agosto minha cerimônia de formatura, momento marcante não só pelo passo pessoal e profissional em minha vida naquele momento mas também pelo momento emocionante da homenagem à minha mãe guerreira que fez de tudo para que eu conseguisse chegar àquele momento vitorioso.
 Outros agostos vieram com novas vitórias, derrotas, fatos bons, ruins, alegrias, tristezas e a vida, que tem dessas coisas quis que no início de 2006 eu acabasse no Rio de Janeiro. Naquele ano, meu time do coração o Sport Club Internacional, no dia 16 de agosto conquistaria pela primeira vez o tão sonhado título sul-americano em seu estádio em Porto Alegre. Ironia do destino: exatamente no ano em que saía da minha cidade o clube era campeão lá, no estádio onde nunca deixara de ir e assistira a inúmeras decisões, muitas delas, nas décadas que precederam aquele momento, marcadas pelo fracasso. Naquela ocasião acompanhei à distância. Estava em um emprego novo, não podia faltar ao trabalho para viajar e de qualquer forma ainda estava tentando me estabilizar na nova cidade, mas em 18 de agosto de 2010, já um pouco mais estruturado no Rio e diante de uma nova decisão de Libertadores, numa jornada apaixonada e quase inconsequente me toquei para Porto Alegre para ver no estádio, no Beira-Rio, com meus próprios olhos e exorcizar meus fantasmas de derrotas do passado, o Bi da América. Era agosto me trazendo mais uma alegria.
Mas a maior delas ainda estaria por vir. Em 11 de agosto do ano seguinte viria ao mundo meu maior tesouro, minha filha, uma leonina, saudável, linda e inteligente que tornou-se a razão superior da minha vida. Tem como eu não gostar de agosto?
E por essas cargas d'água, sem ter premeditado nada, uma das coisas mais legais que fiz e que tenho feito na vida, um dos projetos criativos mais amplos e abrangentes que tive a oportunidade de criar teve seu início num agosto. Em 26 de agosto de 2008 estava em ação na internet o ClyBlog, no início sem saber muito bem o que pretendia, sem um formato, sem uma ideia definida mas com a intenção de ser o meio onde eu pudesse expôr meu material criativo em todos os segmentos nos quais eu tivesse qualquer coisa para apresentar. Para quem? Para quem quisesse ver, para quem por acaso topasse com aquilo na internet, para minha família, para amigos... O ClyBlog tornou-se um projeto apaixonante. Não é um blog gigante com milhares de visualizações por dia, mas pelo que acompanho, nos gerenciamentos de página, atinge o público certo: quem QUER ler uma crônica, quem QUER ler um conto, um poema, quem tem interesse por música, por arte, por cinema. A sensação que eu tenho é que quem entra na página do blog, LÊ o blog, VÊ o conteúdo e não apenas passa por acaso e segue em frente. Por isso, mais do que em qualquer outra situação, é mais importante é a qualidade do leitor do que a quantidade.
Pois esta ideia individual ganhou corpo, ganhou um parceiro valiosíssimo, ganhou colaboradores, foi se desenvolvendo, ganhou seções, participações especiais importantes, teve seus textos valorizados ganhando espaço em publicações e coletâneas e chega agora, neste agosto de 2016, aos 8 anos. A partir de hoje, desta semana até o final de agosto, o ClyBlog estará comemorando seu aniversário e por esses dias teremos além das publicações habituais, algumas publicações especiais e algumas surpresas.
Temos prazer em fazer o blog e esperamos que quem o visite, leia, veja também o tenha pois a nossa intenção é fazer um blog com coisas que gostaríamos de encontrar quando 'navegamos' por aí ou buscamos alguma informação e por isso procuramos fazer um espaço virtual ágil e diversificado, conseguindo com isso colocar, expôr e expressar todas as nossas paixões, preferências e manifestações sem direcioná-lo especificamente em um só assunto ou modelo.
São oito anos de prazer em criar e sempre estar apresentando algo novo. Sempre manter nossas páginas com alguma coisa no mínimo interessante, instigante, inventiva. Quem vai ler? Quem vai ver? Os amigos, os parentes, quem topar com a gente na internet... Ou seja, continuamos do mesmo jeito que há oito anos atrás. Este momento é apenas mais um novo começo.



Cly Reis
editor-chefe

domingo, 24 de outubro de 2010

Public Enemy - "Apocalypse 91... The Enemy Strikes Back" (1991)


O INIMIGO PÚBLICO NÚMERO 1


"Combata o poder."
Public Enemy



Desde moleque eu tinha uma mente meio rebelde; nada muito pesado, mas eu já pensava em fazer coisas diferentes. Jamais pensei que um dia conheceria o PE.
Foi em meados de 1991/1992 eu acho, enquanto o mundo ainda vagava pela Acid-house, ou pelo Grunge , eu misturava o Rap com Hardcore, influenciado por uma música que tinha escutado. Eu pensava em mudar o mundo junto com mais alguns malucos e, ao mesmo tempo que isso acontecia na minha mente, estava acontecendo no mundo uma outra revolução: o Hip-hop. E junto a uma avalanche de artistas um grupo em especial me chamou a atenção: o PUBLIC ENEMY.
O grupo nasceu quando o estudante de design gráfico e fã de hip hop, Chuck D  resolveu criar um projeto musical com cujos objetivos eram basicamente modernizar as bases e batidas do rap e levar para o gênero as discussões políticas e sociais dos EUA. Para isso contou com Terminator X., Professor Griff e Flavor Flav. Em 1987 lançavam seu primeiro álbum, "Yo! Bum Rush the Show" e já o ano seguinte, apareceram com "It Takes A Nation of Millions to Hold Us Back". Com os sucessos "Don't Believe the Hype" e "Rebel without a Pause", alcançaram sucesso de crítica e extrapolaram as fronteiras do hip hop. Com "Fight de Power", presente na trilha de "Faça a Coisa Certa" (89), de Spike Lee, o Public Enemy atacava ídolos brancos, como John Wayne e Elvis Presley (o grupo depois iria amenizar essas críticas). No mesmo ano, Professor Griff era expulso da banda após supostas declarações anti-semitas dadas ao jornal "The Washington Post" mas a banda continuaria a conservar sucesso de crítica e público com "Fear of a Black Planet" (90) e "Apocalypse 91...The Enemy Strikes Black" (91). Em 1992, causaramm polêmica com o clipe "By the Time I Get to Arizona", que protestava contra o Arizona, um dos dois estados dos EUA que não consideravam feriado a data de aniversário do líder negro Martin Luther King (1929-68). A partir daí, a banda entrou em recesso criativo, lançando álbuns irregulares, o melhor deles sendo "He Got Game" de 1998.
Eu os conheci com o álbum "Fear of a Black Planet", e esse álbum me fez rever conceitos, e tenho certeza que de muitas pessoas também. A meu ver, foi o responsável pelo sucesso dos caras para o mundo, com músicas como "Fight the Power" e "911 is a Joke".
Depois comprei o "Apocalypse 91... The Enemy Strikes Back", e é desse álbum que vou falar:
Esse disco foi o que eu precisava ouvir para me sentir uma pessoa melhor, e acreditar finalmente que era possível ser um negro sem precisar empunhar uma arma, ou ter que sofrer com o preconceito.O movimento brasileiro de Hip-Hop, que vem aumentando até hoje e melhorando musicalmente, foi o que resgatou essa auto-estima de vários jovens pelo Brasil
Foi com o "duplão" dos PE que embalei boas sessions de skate pelos parques da capital gaúcha e mais tarde rolei em alguns campeonatos. Cara esse disco faz parte da minha vida até hoje carrego na case por onde vou.
Destaque para "Rebirth", "Shut Em Down" e "Bring The Noise", esta última gravada junto com a banda de metal Anthrax, o que daria início a mais uma revolução... mas isso é assunto pra outro texto.

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FAIXAS:
1. Lost At Birth
2. Rebirth
3. Night train
4. Can’t Truss It
5. I Don’t Wanna Be Called Yo Niga
6. How To Kill A Radio Consultant
7. By the Time I Get To Arizona
8. Move!
9. 1 Million Bottle bags
10. More News At 11
11. Shut Em Down
12. A Letter to the New York Post
13. Get the F— Outta Dodge
14. Bring the Noise

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Ouça:
Public Enemy Apocalipse 91... The Enemy Strikes Black



por Lúcio Agacê




Luciano Reis Freitas (Lúcio Agacê) é músico, DJ, produtor e radialista. Inquieto, está constantemente atuando em diversos projetos simultâneos especialmente na região metropolitana de PortoAlegre. Tem raízes musicais sobremaneira no punk, no rap, hip-hop, no funk e suas origens mas mantém sempre as antenas ligadas em todo o som que acontece à sua volta. Foi integrante, entre tantas outras, das bandas HímenElástico, Código Penal, Caixa Preta e atualmente está ligado às bandas Digue, Porlacalle, Grosseria e mais outros tantos projetos paralelos.
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