quinta-feira, 13 de julho de 2017
Meus melhores filmes de Rock
segunda-feira, 10 de abril de 2017
Pink Floyd – “The Piper at the Gates of Down” (1967)
de Kenneth Grahame, de onde Syd Barrett tirou a frase
“The Piper at the Gates of Down” (“O Flautista nas Portas do Alvorecer”)
“Diamante Desvairado”, como os companheiros de banda o apelidaram, é a melhor classificação que podia ser dada a Syd Barrett. A perturbação mental e emocional sempre lhe foram uma faca de dois gumes. Suspeita-se que sofria de Síndrome de Asperger, condição neurológica do espectro autista caracterizada por dificuldades na interação social e comunicação não-verbal, além de padrões de comportamento repetitivos e interesses restritos. Em contrapartida, tal condição lhe evidenciava uma criatividade acima da média – ou, quem sabe, não era suficiente para suplantar-lhe o ato de criar. “Não acho que seja fácil falar de mim, tenho uma mente muito irregular”, dizia, referindo-se a si próprio. De fato, como os misteriosos caminhos percorridos pela lontra Portly ao perder-se na floresta em “O Vento nos Salgueiros”, não é simples entender por quais meandros psiconeurológicos percorriam a mente de Barrett, artista capaz de conciliar rock com música barroca, conto de fadas, expressionismo abstrato, duendes, jazz avant-garde, teosofia e B movie numa única sinapse cerebral. Naturalmente uma mente de vanguarda. “The Piper at the Gates of Down”, um dos ícones do rock psicodélico, é a melhor representação dessa equação ímpar engendrada por Barrett. Junto com “Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band”, dos Beatles, o primeiro do The Doors, “Velvet Underground & Nico” e alguns outros clássicos do rock que completam 50 anos em 2017, a estreia do Pink Floyd continua inovadora a cada audição, inundando de referências gerações e gerações.
“The Piper...” é surpreendente do início ao fim. A começar pela capa, que não poderia ser mais tradutora da psicodelia da época, em que os integrantes do grupo se misturam como num caleidoscópio lisérgico. A produção de Norman Smith se vale do luxuoso aparato técnico do estúdio Abbey Road, em Londres, para criar a devida atmosfera espacial e jogar luz sobre todos os detalhes (não raro exóticos) ressaltados por Barrett e a jovem banda, que trazia Roger Waters, baixo e voz; Richard Wright, teclados, sintetizador; e Nick Mason, bateria e percussão – ou seja, os integrantes clássicos do Pink Floyd somados a David Gilmour, substituto de Barrett a partir de 1968. Comandando a guitarra e os vocais, Barrett dá o direcionamento conceitual do álbum, que começa com a tensa "Astronomy Dominé". Sinais intermitentes de um contador Geiger iniciam a música prenunciando a instabilidade do tema. Em uníssono, o vocal canta sobre um compasso monofônico: “Verde-limão límpido, uma segunda cena/ Uma luta entre o azul que você uma vez conheceu/ Flutuando para baixo o som ressoa/ Pelas águas geladas e subterrâneas/ Júpiter e Saturno, Oberon, Miranda e Titânia/ Netuno, Titã, estrelas podem assustar”. Uma espécie de refrão sem letra se dá numa frase de guitarra e um vocalize que, unidos, assemelham-se a um uivo selvagem. Isso até chegar a 1 min 35 da faixa, ponto onde ela muda totalmente. Parece que a canção irá se manter nesse rumo sob sons de órgão, efeitos, interferências de rádio e improvisações. Entretanto, a melodia de repente volta ao tema inicial e o término é igualmente intenso, quase catártico. Isso tudo é o disco recém começando...
A magnífica “Lucifer Sam” – cuja produção e a engenharia de som de Peter Bown são irretocáveis – é, basicamente, um blues ritmado com certa pegada surf music. Não fosse sua atmosfera sombria e mística (“Lucifer Sam, um gato siamês/ Sempre sentado ao seu lado/ Sempre ao seu lado/ Esse gato tem algo que não posso explicar/ Jennifer Gentle você é uma bruxa/ Você está do lado esquerdo/ Ele está do lado direito/ Esse gato tem algo que não posso explicar...”), que a leva mais para uma obscura trilha de série de TV. Efeitos como chocalhos, o órgão de Wright, a guitarra-base, o baixo de Waters e a bateria de Mason são perfeitamente ouvidos, mas o que se destaca mesmo é a segunda guitarra de Barrett, que executa um riff em tom grave, a qual contém uma das características compositivas dele: os leves atrasos nos tempos. Como se sempre algo estivesse fora do presente, pondo-se entre a realidade e o sonho. E se o virtuosismo não é a característica de Barrett – como será a de Gilmour, que assumirá as guitarras logo em seguida na banda –, o solo da faixa (toque percutido, exploração dos efeitos de pedal, variação de escala) é de pura criatividade.
Novamente revelador, o disco traz a estranha mas brilhante “Matilda Mother”, que muda totalmente pelo menos umas três vezes em pouco mais de 3 minutos de canção. O arranjo vocal, incrivelmente variante, é um primor, lembrando bastante no refrão o estilo que o Pink Floyd adotaria muitas vezes a partir de então, como em “Breath” (1973) e “The Thin Ice” (1979). O teclado e o baixo pronunciam o acorde inicial, pausado e contemplativo. O universo lúdico da infância, ao mesmo tempo fantástico e tempestuoso, é expresso na letra, em que Barrett clama pela mãe e pela criança que não mais é: “Havia um rei que governou a terra/ Sua Majestade estava no comando/ Com olhos prateados a águia escarlate/ Banhou de prata as pessoas/ Oh, Mãe, me conte mais”. Depois de algumas sinuosidades melódicas, lá por 1 min 25 entra um solo de órgão de ares barrocos. Porém, o que mais se destaca é a psicodélica percussão gutural de Barrett. De repente, as vozes se intensificam, a guitarra dita o riff e... volta tudo à melodia inicial, num proposital corte abrupto – como uma contação de estória sendo interrompida, ou melhor, deslocando-se no tempo psicológico em que o autor se dá conta de que a infância se foi. Em 2 min 25, um novo fim falso, que leva a música até o desfecho num clima ainda mais onírico.
“Flaming” não só se mantém no universo anedótico como o expande, levando o ouvinte a um céu estrelado e azul com unicórnios e animais da floresta de toda ordem. A melodia é ondulante, obscura, exótica. Não é para menos, pois se trata de um dos mais fiéis relatos de uma viagem lisérgica de LSD: “Observando botões-de-ouro moldarem a luz/ Dormindo em um dente-de-leão/ É demais, eu não vou te tocar/ Mas até poderia”. Exemplo de melodia composta no violão e devidamente arranjada pela banda em que todos se destacam, principalmente Barrett ao violão e Wright, que segura o clima no órgão e no solo de cravo ao final.
Nova surpresa, nova montanha-russa, nova obra-prima. Os sons articulados na goela e na faringe não apenas reaparecem como sustentam a abertura da sui generis “Pow R. Toc. H.”. O que se ouve são cacos vocais e sons quase demenciados sobre curtos e esquisitos rufares percussivos igualmente gerados por aparelho vocal humano. Essa configuração estranha se transforma em seguida num som de culto indígena, haja vista os gritos tribais e o ritmo ritualístico ditado pelo tambor – agora da própria bateria. Essa nova formatação sonora, entretanto, se altera rapidamente de novo numa perfeita transição executada na mesa de estúdio, fazendo a melodia se transformar agora num... elegante jazz! É Wright quem brilha nessa parte, solando no piano por quase 1 minuto sobre a ainda tribal percussão. Isso é interrompido mais uma vez, claro. Sons de órgão e de guitarra improvisam e se entrelaçam por quase 2 min, direcionando o tom jazzístico para uma polifonia. Tudo isso, para retomar a linha melódica inicial, agora com a guitarra, os efeitos de mesa e de pedal e os ensandecidos alaridos finalizando o número. Junto com “Peaches en Regalia”, de Zappa, é um dos temas instrumentais mais criativos do rock anos 60. Além disso, é, ao lado de “Interstellar Overdrive”, a única composição coletiva do disco, que já denota claramente que o Pink Floyd não era (e não seria, fatalmente) apenas Syd Barrett.
Composição de Waters, “Take Up Thy Stethoscope And Walk” é mais um belo exemplar do rock psicodélico que 1967 emoldurava. Isso se deve em parte, principalmente na primeira parte – ou melhor, até onde vai a seção cantada, a pouco mais dos 30 segundos iniciais, tendo em vista que o restante, exceto o rápido desfecho, é tomado de delírios instrumentais da banda inteira – a Barrett, que se vale, novamente dos cacos e sons guturais em conjunção com os efeitos e as texturas sonoras para compor o arranjo.
Centro do disco, a já mencionada “Interstellar Overdrive” é um hino lisérgico, que se assemelha em formato e proposta a outro clássico do rock composto naquele mesmo ano: “Heroin”, do Velvet Underground. Quase uma pequena sinfonia, começa como um hard rock cuja semelhança à sonoridade de Black Sabbath e Led Zeppelin não é mera coincidência. A 2 min e 20, a guitarra parece trancar como se tivesse arranhado o sulco naquele ponto (novamente, sente-se o estranhamento com o tempo). Essa ideia – lapidada pela maestrina do pós-jazz Carla Bley em “Musique Mecanique III”, de 1979 – reproduz no instrumento outra das peculiaridades da música de Barrett: os fonemas cacofônicos, ditos com certo engasgo. É como se fosse o sintoma da formação de uma linguagem atípica e excêntrica do Asperger, aliado ao dos padrões repetidos da doença, traduzido para música, para arte.
Seguem-se cerca de 7 minutos de improviso de toda a banda, que forma uma sonoridade espacial, quando não de uma viagem alucinógena ou uma trilha de filme de ficção científica. Até que, quase no fim do tema, um ruidoso e longo rolo de Mason traz de volta o riff inicial. Mas... algo estranho está embaralhando os ouvidos e os sentidos... É Norman Smith mais uma vez valendo-se do aparato do Abbey Road e de sua técnica como produtor operando uma radical alteração do balance, o qual joga rapidamente todo o som de um lado para o outro nas caixas de som: enquanto uma fica em silêncio, a outra recebe toda a massa sonora. Isso gera um efeito de desequilíbrio, espiral, revolto, que age diretamente sobre os sentidos humanos. Parece que se está escutando a arte da capa do disco. Impossível ficar impassível, pois o efeito atingido aqui pelo Pink Floyd chega a ser físico. Por todas essas particularidades, “Interstellar...” pode-se dizer a precursora do rock progressivo, que faria tantas bandas surgirem ou aderirem (como o próprio Pink Floyd em certa medida) nos anos 70.
Aí, como se nada tivesse acontecido, colada à intensa “Interstellar...”, entra a faixa seguinte, “The Gnome”: uma singela ciranda infantil sobre seres elementais. Só que não! Igualmente brilhante e consideravelmente sinistra, “The Gnome” (“Quero te contar uma história/ Sobre um homenzinho/ Se eu puder/ Um gnomo chamado Grimble Crumble/ E pequenos gnomos que ficam em suas casas/ Comendo, dormindo, bebendo vinho...”) realça o belo timbre de voz de Barrett e sua pronúncia elegante – o que confere ainda mais obscuridade ao tema. Os cacos fonéticos e a preferência por vocábulos “engasgados” (“GRimble”, “CRumble”, “tunIC”, “ADventure”) aparecem em abundância, intensificados pela dicção do cantor.
Rivalizando com outras duas canções daquele ano, “Within You Without You”, dos Beatles, e “The End”, dos Doors, “Chapter 24” ergue uma mística capela sonora. Wright é exímio ao imitar nos teclados o som de um fole nórdico. A percussão, inteligente, é apenas nos pratos e sinos, emprestando muita naturalidade. Apenas o baixo é mais “moderno” na sonoridade de “Chpater 24”, haja vista que o canto de Barrett soa quase litúrgico. Talvez a mais linear faixa do disco – se é que dá pra classificar qualquer uma das peças assim, tão simploriamente –, abre caminho para a totalmente medieval “Scarecrow” com suas flautas celtas e percussão barroca. Genialmente, Barrett dissolve qualquer noção de tempo – o mesmo “tempo” que ele, mentalmente perturbado, não consegue apreender. A bela letra é talvez a mais autobiográfica e – haja vista a metáfora essencial, a comparação de si com um “espantalho” – tristemente reveladora. Merece ser reproduzida por completo:
“O espantalho preto e verde
Como todo mundo sabe
Ficava com um pássaro no seu chapéu
E palha por todo lado
Ele não se importava
Ele ficava num campo onde o milho cresce
Sua cabeça não pensava, seus braços não se moviam
Exceto quando o vento soprava
E ratos corriam pelo chão
Ele ficava num campo onde o milho cresce
O espantalho preto e verde é mais triste do que eu
Mas agora ele está resignado com seu destino
Pois a vida não é má
Ele não se importa
Ele fica num campo onde o milho cresce.”
O que resta a um disco impecável como este? “Scarecrow”, por seu final quase épico, dá indícios de fim. Mas clássico que é clássico tem mais uma joia reservada. É o caso da originalíssima e sarcasticamente circense “Bike”, forjada sobre um único compasso. A voz de Barrett, tão cristalina quanto alucinada, joga versos em demasia sobre os intervalos – mas eles fazem caber no tempo musical, hábeis em harmonia como são. A festa no picadeiro lúgubre parece terminar a 1 min 45', mas sons de bugigangas (entre estas, relógios, como os que aparecerão 6 anos mais tarde em “Time”, do “The Dark Side of the Moon”), comandados pelos teclados fasmáticos de Wright, entram para preencher o restante da faixa a la John Cage. Esta, no entanto, termina da talvez mais apavorante forma que qualquer disco da música pop – e olha que bate muita dark music. O volume vai baixando aos poucos, anunciando o final, quando surge um som que parece ser de uma boneca enguiçada. Misto de gargalhada macabra com urro de dor e de prazer carnal, vai subindo até um clímax, que chega a chocar os ouvidos. Porém, logo em seguida, vai caindo até terminar o disco finalmente. Dá para imaginar uma cena de filme de terror em que o palhaço assassino aproxima-se, chegando a centímetros do escondido e amedrontado perseguido, mas que, não o encontrando, afasta-se e vai embora. No quarto de brinquedos, quebrados e tristes, está terminada a obra sinistra de Barrett e Cia.
A aparente infinita inventividade de Barrett, por infelicidade, teve sim um fim. Acometido pela deterioração mental, agravada pelo exagerado uso de drogas, Barrett afastou-se da banda antes de lançar um segundo trabalho com eles, restando apenas mais uma (e igualmente brilhante) composição sua em “A Saucerful of Secrets”, de 1968: “Corporal Clegg”. Vieram ainda duas obras-primas solo em 1970: “The Madcap Laughts” e “Barrett”, nos quais já se nota o progressivo agravamento do quadro físico e psíquico. Logo em seguida, entra numa reclusão autoimposta de 30 anos até a morte, em 2006. Porém, os parcos 6 anos em que produziu seguem influenciando profundamente a cultura pop meio século depois de seu surgimento em “The Piper...”. Para o próprio Pink Floyd foi assim: com talento, souberam apreender e reelaborar o legado de seu ex-líder, avançando em suas ideias mas mantendo-lhe uma ligação permanente. Mesmo com as capacidades criativas de e liderança tanto de Waters quanto de Gilmour, o Pink Floyd foi e sempre será como um tal personagem de conto de fadas chamado Syd Barrett.
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“The Piper…” teve, em 1967, uma edição norte-americana que, além de alterar a ordem das faixas e suprimir duas delas (“Bike” e “Astronomy Dominé”), conta com uma nova, “See Emily Play”. Em 1974, os dois primeiros álbuns do Pink Floyd são reunidos num único volume, “A Nice Pair”. Ainda, “The Piper...” consta na íntegra com outros discos nas caixas “First XI” (1979), “Shine On” (1992), “1997 Vinyl Collection” e “Oh By the Way” (2010).
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sexta-feira, 15 de janeiro de 2016
“BOULEZBOWIE”: Esse (esquizo)frênico mundo que une (ou separa) a vanguarda do pop
segunda-feira, 2 de maio de 2022
As 30 melhores aberturas de filmes
Não sei quanto a quem não é cinéfilo de carteirinha, mas mais de uma vez me surpreendi tanto com a abertura de um filme, que a sensação imediata era a de quem nem precisava mais continuar assistindo. Foi assim quando, em 1995, na companhia de vários amigos – em sua maioria absoluta amantes de cinema mas não necessariamente cinéfilos – reunimo-nos para ver o VHS locado de “Pulp Fiction: Tempo de Violência”, do Quentin Tarantino. Eu não havia visto “Cães de Aluguel” ainda, seu primeiro e anterior longa, embora já ouvisse todo o debate em torno do nome do cineasta que dizia-se estar revolucionando o cinema. Mas o que me despertava maior interesse era, principalmente, porque o filme em questão havia ganhado a Palma de Ouro em Cannes. Isso, mais do que toda a celeuma sobre Tarantino significar ou não um novo capítulo na história da 7ª Arte (o que poderia ser, escaldado que sou, um exagero proposital, comum na mídia), de fato me surpreendia. Cannes desde cedo em minha vida cinéfila fez muito sentido, pois cresci assistindo seus premiados e indicados, que não raro eram (ainda são) alguns dos melhores filmes que já assisti, como “A Balada de Narayama”, “Coração Selvagem” e “Mephisto”. No caso de “Pulp Fiction”, ainda mais por saber tratar-se de um filme “comercial” norte-americano e não algum cult europeu ou asiático, isso, sim, chamava-me mais a atenção e despertava a curiosidade de vê-lo.
Pusemos a fita no videocassete. A grande maioria sabe o que acontece nos primeiros minutos de “Pulp Fiction”, né? A sequência do diálogo entre Pumpkin (Tim Roth) e Honey Bunny (Amanda Plummer) antes de assaltarem o restaurante e a entrada triunfal dos letreiros iniciais com “Miserlou” de Dick Dale arrasando com um surf-rock na trilha e, ainda pelo meio dos créditos, a mudança de música, como se alguém tivesse mudado uma estação de rádio para o funkão “Julgle Boogie”, da Kool & The Gang. Tudo aquilo, o estilo; a atmosfera pop; a inteligência da montagem; o bom gosto musical; o tom de tele-seriado B; a referência a Godard no nome da produtora A Band Apart: toda essa sequência minimamente bem pensada de como iniciar um filme me fez ficar absolutamente estarrecido. Somava-se a isso a engenhosidade da montagem no momento em que Pumpkin e Honey Bunny levantam-se sobre o banco do restaurante (e Roth diz: “I love, Honey Bunny”, e eles se beijam em close antes de apontarem as armas) e anunciam o roubo, a imagem congela e mantém-se o áudio das falas – estas, aliás, extremamente musicais, tanto que se tornam inseparáveis da música de Dale que vem na sequência no próprio disco da trilha sonora. Apaixonei-me pelo filme que mal havia começado.
"Pulp Fiction", Quentin Tarantino (1994)
Excitado, eu olhava para meus amigos na sala enquanto aquela série de genialidades iam surgindo da tela para observar suas reações, mas todos, embora estivessem, sim, gostando, nem de perto se exaltavam como eu. Aquele sentimento de arrebatamento era única e exclusivamente meu. Cheguei a perguntar, incrédulo: “Gente, vocês estão vendo a MESMA coisa que eu?!”. A resposta? Com desdém adolescente: “Sim, Dani, o que é que tem? O filme tá recém começando”. Sim, o filme estava recém começando, mas não de um jeito normal. Para mim (e para muito cinéfilo e estudiosos do cinema) confirmava-se ali a tal revolução cinematográfica atribuída a Tarantino. Não precisava nem ver o filme por completo: era certo que o cinema, então a 4 anos de completar seu primeiro século de existência, mudava a partir dali, e isso era o máximo de eu estar presenciando. Aprendi, naquela situação, que não era uma pena meus amigos não estarem vendo o mesmo que eu: era, sim, o que me diferenciava do senso comum na forma de ver e sentir cinema.
Não foi a primeira abertura de filme que me surpreendeu a de “Pulp Fiction”, claro, mas é certo que esta sensação de entusiasmo se me repetiu várias vezes. Seja em casa ou numa sala de cinema, de vez em quando sou pego de surpresa com algum começo de filme que, como um bom disco de música, sabe dar o start certo e cativar de cara quem o está apreciando, mesmo que a obra em si não corresponda tanto a seu bom início – embora seja geralmente um bom indicativo. Pois essa lista se propõe a elencar justamente isso: não os filmes inteiros, mas seus primeiros minutos. A rigor, por “openning scene” entendemos não somente o design de créditos, mas o suficiente para apresentar o filme, embora não seja necessariamente uma regra.
A junção de fatores, a inventividade na disposição dos letterings, a edição, o prólogo, o design, o impacto da cena, o significado simbólico para com a história que será contada: tudo conta para impressionar e construir uma introdução digna de memória. As maneiras de fazer, assim como de se contar uma história em imagens, são infinitas, e não há um jeito melhor que outro. O critério para a escolha destes 30 exemplos sem ordem de preferência – e que pode tranquilamente ser ampliada por novos filmes ou por títulos aos quais não me ocorreram – é apenas o da sentir-se conquistado já na largada por uma obra cinematográfica. Aqueles filmes que, contrariando a lógica, recomendo que não sejam necessariamente vistos até o final. Os primeiros minutos já bastam.
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“Era uma Vez no Oeste”, Sergio Leone (1968)
São pouco mais de 7 min de puro deleite daquela que é
provavelmente a melhor abertura de um filme de todos os tempos. O filme de
Leone, aliás, por si merece essa alcunha, mas se se destacar apenas o seu começo
já está mais do que bem representado. O design, o cenário, os enquadramentos, a
disposição criativa dos letterings, o tempo da montagem, a arte e o figurino, a
fotografia. Tudo em perfeita sintonia e, mais que isso, conceitual, visto que
apresenta, sem precisar valer-se da poderosa música de Ennio Morricone e quase
sem nenhuma palavra dita, tal westerns do cinema mudo, as ideias centrais do filme:
o embate ideológico entre passado e futuro, entre vida e morte, entre instinto e consciência..
“Cassino”, Martin Scorsese (1996)
Lembro também de, no cinema, sentir a reação da sala ao
surpreender-se com a explosão do carro do personagem Sam Rothstein, vivido por
Robert DeNiro, em “Cassino”, nos idos de 1996. Uma reação espontânea do
público, que, assim como eu, era abduzido para dentro da história em poucos
minutos de fita transcorridos. Scorsese, justificadamente fã de Saul Bass,
conseguira em vida trabalhar com o mestre do design de créditos
cinematográficos ainda em dois filmes: “Cabo do Medo”, de 1991, e neste, do ano
em que ele morreu.
“Fahrenheit 451”, François Truffaut (1966)
Esta cena já esteve destacada aqui no Clyblog por outro
motivo: o plano-sequência. Pois Altman consegue com este engenhoso desenho de
cena não apenas criar uma das melhoras sequências sem corte da história do
cinema (afinal, o próprio filme trata sobre os bastidores da sua indústria) como, por conta
exatamente disso, causar um incrível impacto já no início do filme, visto que o
plano-sequência é justamente o que o abre. Altman, dos melhores do cinema autoral dos Estados Unidos, sabia como ninguém abrir suas obras, haja vista "Nashville", "M*A*S*H*" ou "Três Irmãs", mas nada bate a de "O Jogador".
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“Magnólia”, Paul Thomas Anderson (1999)
Outro dos que fui assistir no cinema é fui totalmente
arrebatado. Também pudera: que forma criativa de se começar um filme! P.T.Anderson põe pra baixo o queixo do espectador num prólogo ao mesmo tempo
divertido e instigante, que relaciona fortuitos momentos da história, para, ao final, triunfantemente, soltar a imagem da flor "Magnólia" abrindo-se em velocidade acelerada sobre a projeção de diversos vídeos. Além disso, tem a
apaixonante música de Aimee Mann, a quem nem conhecia e passei a adorar por
causa da trilha do filme. Inteligentemente, a aparente dissociação dos
acontecimentos do prólogo antecipa a trama coral proposta pelo roteiro e a nada
casual relação entre aquelas histórias paralelas. “Isto não foi uma
coincidência”.
Bass de novo, aqui na sua forma mais naturalmente criativa e
genial: grafismos e desenhos com seu traço característico sobre um fundo preto
e legendas sendo dispostas em conjunto com a música de Elmer Bernstein. A
primeira parceria do designer com Otto Preminger, com quem trabalharia em vários
outros projetos, também explora os meandros obscuros da mente humana, no caso,
de um baterista de jazz viciado em heroína vivido incrivelmente pelo jovem (mas
já ídolo) Frank Sinatra. Só o desenho do braço distorcido já é uma das mais
felizes contribuições de Bass para a história do cinema e do design.
“A Marca da Maldade”, Orson Welles (1958)
Outro que, assim como "O Jogador", também tem um dos grandes
plano-sequências da história cinematográfica para começar o filme. Porém,
havemos de dar ainda mais mérito para o sempre inquieto e criativo Orson Welles
em ousar abrir um filme deste jeito nos anos 50, quando o cinema e os
espectadores tinham como padrão o formato convencional de créditos iniciais. Nunca se
havia visto uma cena de abertura tão complexa, com vários atores e figurantes em cena,
câmara em travelling, mudança de enquadramento de primeiríssimo plano para
planos médios e grande, num espaço físico extenso e com direito até à explosão.
E tudo isso SEM corte. Caramba! Como se não bastasse, o longa confirma todas as
expectativas de seus de minutos iniciais naquele que é, talvez, o grande de
Welles.
Godard, assim como Truffaut e seus companheiros de nouvelle
vague, nunca deixaram de inovar a maneira de começar a contar suas histórias. O
suíço, aliás, comumente radical, já fez muito filme que, a rigor, não começa
nunca – e nem “termina”, consequentemente, como “Je Vous Salue, Marie” ou “FilmSocialisme”. Mas uma das marcas que Godard nunca abandonou é o trato formal da
tipografia dos letterings, os quais se utiliza geralmente com fontes
não serifadas tipo Futura ou Arial (e nas cores da bandeira da França) sobre
fundo escuro, encurtando os limites entre poesia concreta, cinema, vídeoarte e
literatura. Caso de “Uma Mulher é Uma Mulher”, que ele faz a proeza de apresentar genialmente
em menos de 2 min.
****
“Fellini 8 1/2”, Federico Fellini (1963)
Fellini não cria suspense nenhum em relação ao nome do filme, o
qual aparece já no segundo frame sobre fundo escuro na forma da conhecida logo.
Mas a partir dali o que se vê até os 3 min que se transcorrem é a mais absoluta
genialidade felliniana. A história do cineasta pressionado pela crise de
criatividade é expressa numa espécie de prólogo onírico minuciosamente bem
construído. O claustrofóbico engarrafamento, cuja mudez é ensurdecedora, e os
olhares condenatórios à sua volta, sufocam aquele homem sem rosto dentro de seu
carro a ponto de fazê-lo... sair voando! A lindeza do sonho se encerra numa
praia, sobrevoando o mar e sendo puxado por uma corda da areia por ele próprio,
que tem a companhia de um homem de capa sobre um cavalo negro. E o melhor: o oitavo filme (mais um média) de Fellini mantém esse nível até o fim.
“2001: Uma Odisseia no Espaço”, Stanley Kubrick (1969)
A ficção científica
que estabeleceu o padrão do gênero para sempre é uma aula de narrativa para
realizadores até hoje, o que inclui sua marcante abertura. Copiado e
referenciado centenas de vezes, o início de "2001", de apenas 1 min30’, é,
contudo, dos mais originais da história da 7ª Arte. Traduzindo em imagens
siderais grandiosas a impactante abertura da sinfonia "Also Sprach Zarathustra",
de Richard Strauss, Kubrick mostra o raro alinhamento do planeta com Sol com a
Lua valendo-se, para isso, de poucos mas precisos elementos: tela escura que
vai aos poucos revelando a imagem e apenas três letreiros em tipografia Futura: “Metro-Goldwyn-Mayer Presents”, “A Stanley Kubrick Production” e o nome do
filme em tamanho maior (com o detalhe do Copyright abaixo bem pequeno). Separadamente
do filme, só esse trecho já pode ser considerado uma obra-prima.
“O Poderoso Chefão”, Francis Ford Coppola (1972)
Este é um caso de uma forma própria de apresentar a
história. O nome, através da bela logo com a mão divina comandando a marionete com
o letreiro “Mario Puzo’s The Godfather” e os acordes da clássica música tema de Nino Rota, já
está garantido no segundo frame. Porém, os 6 minutos seguintes apenas de
diálogos traduzem diversos níveis narrativos e simbólicos que serão trazidos
nas quase 3 horas de fita subsequentes. As relações de poder, a inteligência
manipuladora do Padrinho, os valores familiares, os papeis sociais, os meandros
dos poderosos... muita coisa é dita ou subentendida até o momento em que Vito
Corleone (Marlon Brando, espetacular) cheira a rosa de sua lapela e dá-se continuidade
à “festa”.
“A Terceira Geração”, Reiner Werner Fassbinder (1979)
Um dos maiores estetas do cinema, o alemão Fassbinder deve muito de suas criativas aberturas de filmes a um contemporâneo e conterrâneo seu ligado à arte moderna a quem muito se inspirava para isso: Joseph Beuys. Não raro, as introduções de seus filmes referenciam o estilo de Beuys, com tipografias monocromáticas dispostas sobre imagens em movimento ou estáticas, criando peças dignas de galerias expositivas. O começo de “A Terceira Geração” é um deles, com os créditos pulsando no ritmo de uma batida cardíaca enquanto vão sendo apresentados sobre um zoom out que vai descortinando um apartamento com telas, móveis e pessoas.
“Assassinos por Natureza”, Oliver Stone (1994)
Cineasta pautado pelo experimentalismo, Oliver Stone desde
seu primeiro longa, “Platoon”, de 1986, sempre soube começar bem um filme.
Porém, 8 anos depois, ao invés de tornar-se mais conservador, Stone mostra-se
saudável e surpreendentemente ainda mais ousado com o altamente pop e
sarcástico “Assassinos por Natureza”. O começo do filme é visivelmente influenciado pela
linguagem dos videoclipes da MTV, emissora à época em alta, seja pelos enquadramentos
distorcidos, pelo movimento de câmera frenético, pela alteração brusca de ISO
ou pela montagem de ritmo musical. Tão musical, que, na cena, o violento casal
espanca e mata pessoas em um restaurante com absoluto prazer ao som do
punk-rock da L7.
“Persona”, Ingmar Bergman (1960)
Um dos maiores cineastas de todos os tempos, Bergman tinha
total domínio da narrativa. Porém, a introdução de seus filmes invariavelmente
traziam a fonte Times sem serifa sobre fundo escuro. Mas Bergman sabia
quando contrariar o próprio estilo, e o profundo “Persona” incitou-lhe a isso.
Num conceito de vídeoarte – já existente nas galerias contemporâneas
mas pouco exploradas no cinema de arte –, o cineasta funde imagens em alta
profusão, usa fotos reais e ousa em enquadramentos e fotografia p&b. Tudo
de forma a criar uma atmosfera de sonho e fluidez do tempo/espaço o qual
Bergman tão bem constrói naquele que é considerado“o filme mais difícil de
todos os tempos”.
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“Cidadão Kane”, Orson Welles (1940)
Em seu primeiro longa, o então jovem Welles, com apenas 25
anos, inovava consideravelmente o modo de abrir uma história filmada. Aliás,
não somente essa parte, mas em diversos aspectos da linguagem cinematográfica
daquele que é ainda hoje para muitos o melhor filme de todos os tempos. Quanto
à introdução, mesmo com o título revelado imediatamente ao começo (seria muita
transgressão não informar pelo menos isso ao público da época), nunca havia se
visto um prólogo in média rés (com o qual se começa uma narrativa no auge da
ação antes de começar de novo para explicar como se chegou lá), tão comum hoje.
Enigmática (o que será aquele "Rosebud" dito antes do cara morrer?!), a primeira imagem que aparece traz uma placa com a mensagem “No
Trapessing” (“Não Ultrapasse”). Era Welles, o mesmo que anos antes havia
apavorado multidões com a transmissão em rádio d'"A Guerra dos Mundos", manipulando
o subconsciente do espectador.
“Manhattan”, Woody Allen (1979)
Assim como Bergman, Allen tem um estilo geralmente muito próprio de iniciar seus filmes, quase que invariavelmente com legendas em fonte tipo Windsor Light Condensed e uma música inteligentemente bem selecionada para sonorizar. Porém, como o mestre sueco em "Persona", Allen também sabe transgredir a si próprio. Em "Manhattan", ao invés do fundo preto com letterings, ele monta uma pequena sinfonia urbana com uma sequência de imagens documentais e poéticas de sua Nova York num cristalino p&b. A sutileza da forma como anuncia o título (e nada mais que isso), num letreiro luminoso de uma rua qualquer do bairro, prevê a abordagem que será dada aos personagens do filme: todos meras continuações do próprio corpo da cidade. Poesia.Com total domínio do fluxo narrativo, Kubrick é um craque
das aberturas. "O Grande Golpe", "O Iluminado" e o já citado "2001: Uma Odisseia no
Espaço" são exemplos, mas outro diferenciado neste sentido é "Laranja Mecânica".
Uma música feita em sintetizador começa sobre uma tela vermelha até quase 30
segundos, quando finalmente surgem os primeiros letterings numa tipografia Arial
negritada. Percebe-se, então, que a tal música é uma versão eletrônica da peça “Music
for the Funeral of Queen Mary”, de Henry Purcell, do século XVII. O fundo
vermelho se transforma em azul e, de novo, em vermelho para anunciar o nome do
filme. Até que, num corte brusco, muda para o close da figura andrógena de Alex
(Malcom McDowell), personagem principal da história de Anthony Burgess. Dessa
imagem, Kubrick não corta novamente e, sim, a faz prosseguir num travelling frontal-out
sob o off do brilhante texto que reproduz o fluxo de pensamento de Alex, o qual
situa o espectador do universo de distopia que se verá a partir dali.
“Arizona Nunca Mais”, Joel e Ethan Coen (1987)
A abertura do segundo e cativante filme dos irmãos Coen,
quando eles ainda eram uma revelação, no final dos anos 80, é tão criativa, engraçada,
pop e publicitária (no bom sentido), que serve como trailer. A história do assaltante
pé-rapado H.I. McDonnough (Nicholas Cage) contada em off por ele mesmo enquanto
as imagens vão sendo exibidas com a trilha magistral de Carter Burwell – suas idas
e vindas pra cadeia, os personagens bizarros que conhece no caminho – denotam, pelo
brilhante texto, principalmente, seu coração bom. O mesmo que o faz conhecer o
amor de sua vida, a policial Ed (Holly Hunter). Depois, eles resolvem
sequestrar um dos sete bebês da ricaça família Arizona, mas aí é que a história
mesmo começa...
****
“Alien: O 8º Passageiro”, Ridley Scott (1979)
Lembrando a abertura de "2001", filme ao qual Scott bastante
homenageia neste revolucionário terror espacial, tem, assim como na obra de
Kubrick, um desenho de cena simples mas muito eficiente. Uma câmera se desloca
no espaço da esquerda para a direita em uma panorâmica enquanto veem-se
manchas brancas surgirem, as quais vão formando numa uniformidade não-sequencial o nome
“Alien” em uma fonte pesada e sem serifa. Não há nos créditos, mas diz que
também é obra de Saul Bass.
“Apocalypse Now”, Francis Ford Coppola (1979)
Não há nenhuma palavra escrita dizendo que filme é. Mas nem precisa. O grande plano de uma floresta é aos poucos invadido por helicópteros que cruzam a tela e uma fumaça começa a levantar. Percebe-se, porém, que a fumaça não é de areia, mas, sim, o venenoso napalm. Até que várias bombas caem sobre a mata, provocando gigantescas explosões. A música que toca não podia ser outra: “The End”, da The Doors. É um presságio. É a guerra. É o Vietnã. É “o horror”. Diversas imagens apocalípticas se fundem ao rosto de um homem em close, o personagem principal do filme, o perturbado Capitão Benjamin Willard (Martin Sheen). A sensação de quebra no tempo perfaz todo o longo filme, que perscruta os mais terríveis meandros psicológicos da guerra.
“Cléo das 5 às 7”, Agnés Varda (1962)
Outra grande esteta do cinema moderno, Varda pautou toda sua filmografia pela inventividade narrativa e estética, a qual passava por um filtro muito pessoal. Em "Cléo das 5 às 7", seu primeiro longa, fica clara esta criatividade seja na forma como no conteúdo. A mesa de uma cartomante é filmada em plongê mostrando somente o baralho e as mãos dela e da cliente. Os subtítulos em branco são gerados conforme a disposição das cartas sob um silêncio que provoca tensão. Que mensagem as cartas vão dizer? E dizem: a jovem Cléo tem apenas 2 horas de vida, o tempo que o filme transcorrerá: das 5 da tarde às 7 da noite. Varda dá um show em montagem e no jogo simbólico entre cor, que aparece somente quando as cartas são lidas (supostamente, enquanto ainda há vida), e p&b, que domina o filme, marcado pela agourenta previsão que atormentará a personagem.
“A Pantera Cor-de-Rosa”, Blake Edwards (1963)