Como venho ressaltado aqui no blog, a temporada de show está ótima. Mais
um destes belos espetáculos, que vi ao lado de Leocádia Costa e de minha
querida Martha Becker, ocorreu no Teatro Bourbon Country, quando o cantor,
compositor e violonista Toquinho e a
cantora Maria Creuza se reuniram
para homenagear Vinícius de Moraes. A ocasião – comemorativa aos 15 anos do
escritório jurídico TozziniFreire de Porto Alegre, que patrocinou o show – foi
especial. Isso porque a dupla havia se apresentado junto apenas em um
espetáculo, justo no histórico show de 1970 que os reuniu com Vinicius e que
deu origem a um dos mais celebrados discos ao vivo da MPB, “Vinicius de Moraes
en La Fusa”, gravado em Buenos Aires. Depois, nunca mais pisaram num palco
juntos.
Porém, felizmente, ambos estão ativos para poderem repetir o feito. O
show, na verdade, não se restringia apenas ao repertório de Vinicius de Moraes,
pois é mesmo comandado por Toquinho, este virtuose do seu instrumento que, como João Bosco e seu mestre Baden Powell, aprendeu não apenas a tocar mas também a
cantar e, principalmente, compor (alinhando-se a uma seleta estirpe de
compositores que vai de Liszt e Rachmaninoff a Jimi Hendrix e Louis Armstrong).
Assim, “Toco” – como é carinhosamente chamado por Maria Creuza –, teve a
“sorte”, segundo o próprio, de cocriar com outros grandes mestres da música
brasileira, como Chico Buarque, Paulo César Pinheiro, Jorge Ben e o próprio Baden, autores que também aparecem no set-list.
Maria Creuza, ainda com seu belo timbre mas de voz já um pouco cansada,
faz boas participações no meio e no final. Foi ela quem comandou clássicos como
“Você abusou”, “Se Todos no Mundo Fossem Iguais a Você” e “Eu Sei que Vou te
Amar”, este, seu melhor momento. Juntos, cantaram outras pérolas: “A
Felicidade”, “Tomara” e “Samba em Prelúdio”, de Baden (que promove na segunda
parte um lindo contracanto com as vozes de ambos), autor este do qual Toquinho
ainda tocou uma impressionante versão de “Berimbau”, do memorável "Os Afro-Sambas" (1966), em que o violão, de tão bem tocado, parecia realmente soar como o típico
instrumento afro.
Toquinho, um mestre com seu violão
foto: Dulce Helfer
De resto, o show é todo de Toquinho. Simpático e conversador, ele
contou histórias e comentou praticamente todos os números, fosse antes ou
depois. Afinal, histórias dele, dos tempos de bossa nova e, principalmente, do “vivido”
amigo Vinicius, não faltam. Uma destas foi a que deu origem a um de seus
maiores sucessos, “Tarde em Itapuã”. Ele, na época adolescente, vira o poeta escrevê-la
em sua casa em Salvador e se encantara com os versos. Só que a mesma estava
prometida para outro gênio da música brasileira musicar: Dorival Caymmi. No
entanto, Toquinho, ousado, roubou o papel e aproveito que voltava uns dias para
São Paulo para criar a melodia. Na volta a Bahia, encontrou Vinicius
desesperado atrás do seu escrito e, para aplacar sua fúria quando soube que tal
havia sido surrupiado, Toquinho tocou-a ao violão para o mestre. Meia hora
depois, mais calmo, Vinicius aceitou não repassá-la a Caymmi e assim nasceu um
dos maiores clássicos da MPB.
O show teve ainda momentos de bastante emoção, como nas interpretações
de “A Casa” e “O Pum”, do infantil "A Arca de Noé", último projeto de Vinicius com
Toquinho antes de morrer, em 1980, obra que permeia a infância de muita gente
que estava ali – a começar pela minha e de Leocádia, que, inclusive, já
escreveu sobre sua ligação com “A Arca...” aqui no blog. Na mesma linha, as
tocantes “O Caderno” (preferida do próprio Toquinho, dele com Mutinho) e
“Aquarela”, com sua letra lúdica e realista (“Nessa estrada não nos cabe conhecer ou ver o que virá/ O fim dela
ninguém sabe bem ao certo onde vai dar/ Vamos todos numa linda passarela/ De
uma aquarela que um dia enfim/ Descolorirá.”), foram de levar às lágrimas. Como
ele mesmo disse, o desafio de fazer música para os pequenos é se despir das
complexidades harmônicas do adulto e se comunicar com as crianças sem
subestimá-las.
No seu tributo ao “poetínha” couberam ainda “Samba pra Vinicius” (“Poeta, poetinha vagabundo/ Quem dera todo
mundo fosse assim feito você/ Que a vida não gosta de esperar/ A vida é pra
valer/ A vida é pra levar/ Vinícius, velho, sarava”), dele e de Chico,
“Chega de Saudade”, marco inicial da bossa nova em que deram vivas a João Gilberto, e, claro, as tão famosas parcerias com Vinicius: “Cotidianas n° 2”, "Como
Dizia o Poeta” e a atualíssima “A Tonga da Mironga do Kabuletê”: “Você que lê e não sabe/ Você que reza e não
crê/ Você que entra e não cabe/ Você vai ter que viver...”. Nem parece ter
sido escrita nos anos 70... Pra terminar, “Regra três”, bis que fechou a noite.
É muito bonito ver na ativa um verdadeiro representante de um período
tão fértil da música brasileira, um cara que faz com propriedade a ligação
entre os compositores dos anos 50 (Tom Jobim, Antonio Maria, Dolores Duran,
Carlos Lyra, entre outros) com o período pós-bossa nova dos anos 60 e 70 (Chico,
Baden, Elis Regina, festivais, tropicalistas) e, ainda assim, resgata a
tradição dos violeiros e do choro, um dos estilos seminais do samba moderno. E
mais digno ainda assistir eles homenageando Vinicius de Moraes, que revelou Maria
Creuza e que, com Toquinho, principalmente, escreveu nada menos do que cerca de
130 canções, hoje eternizadas geração após geração. Toquinho teve sorte? Sim, mas,
muita competência. Parafraseando o poeta: que nos desculpem os inaptos, mas
talento é fundamental. E Toquinho tem de sobra.
Acima, capa original, com arte de Carlos Leão As outras duas, capas das versões para os mercados latino e francês, respectivamente, de 1973
"São demais os perigos desta vida
Pra quem tem paixão principalmente
Quando uma lua chega de repente
E deixa no seu, como esquecida
E se o lugar que atua desvairado
vem se unir uma música qualquer
Vem se unir uma música qualquer..."
O disco “São Demais os Perigos Desta Vida...”, deToquinho e Vinícius de Moraes. é, parafraseando os próprios, para viver um
grande amor. Desde a primeira vez que o escutei, tornou-se um vinil inseparável
para mim e que está sempre à mão. Escuto todo ele, mas a faixa que lhe dá
título, “São Demais...” é a que se repete... se repete... se repete. Tanto na
tristeza de uma perda como na espera de um outro grande amor como nas alegrias
próprias de um novo começo.
"Aí estão é preciso ter cuidado
Porque deve andar perto uma mulher
Deve andar perto uma mulher que é feita
De música, luar e sentimento
E que a vida não quer de tão perfeita..."
A capa do disco, com desenho de Carlos Leão, é linda. A do meu LP está bem judiada. Não
têm muitas informações sobre o disco propriamente, e o encarte com os créditos
já nem me lembro mais. É o segundo disco da parceria gravado em 1972. E foi nesse
ano que descobri este disco, que mexe com a minha alma.
"E que a vida não quer de tão perfeita
Uma mulher que écomo
a própria lua:
Tão linda que só espalha sofrimento." da letra de "São Demais os Perigos Desta Vida...”
porW L A D Y M I R U N G A R E T T I
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FAIXAS:
01. "Cotidiano Nº 2" (Como Dizia O Chico...) 02." Tatamirô" (em louvor de Mãe Menininha do Gantois) "Ponto de Caboclo" da Bahia, em arranjo de Edinho do Gantois 03. "São Demais Os Perigos Desta Vida..." 04. "Chorando Prá Pixinguinha" 05. "Valsa Para Uma Menininha" 06. "Para Viver Um Grande Amor" 07. "Menina Das Duas Tranças" 08. "Regra Três" 09. "No Colo Da Serra" 10. "Canto De Oxalufa" Todas as faixas de autoria de Toquinho e Vinícius
Wladymir Ungarettifoi durante os últimos 25 professor de Jornalismo da Fabico/UFRGS. Exerceu a profissão por 40 anos em diversas redações. Comanda e edita o blog Pontodevista: www.pontodevista.jor.br e assina suas fotos com a marca Wu. Outros links: wladyunga.tumblr.com/ e br.pinterest.com/ungareti3499/
Numa das conversas que tivemos sobre as nossas infâncias, confessei ao Clayton e ao Daniel, com muita emoção que “A Arca de Noé” é a trilha sonora que eu mais gostava e lembrava a minha primeira infância. Nada em termos fonográficos, nenhum outro disco podia se comparar a “Arca de Noé” e olha que o páreo tinha as obras “Os Saltimbancos”, “Sítio do Pica-pau Amarelo”, "Plunct-Plact-Zum!", “Pirlimpimpim” e o “Grande Circo Místico” só para começar a listinha básica de musicais das crianças que cresceram entre 1973 a 1983.
Na época da Arca, eu, uma guria entre 7 e 8 anos de idade, me divertia com a minha irmã repetindo muitas vezes as canções que minha mãe ajudava a gente a lembrar, porque não tínhamos os LPs. “A Arca de Noé” ficou na minha memória musical depois que assisti ao programa de televisão de mesmo nome exibido no início da década de 80, na Rede Globo. Os registros sonoros se fixaram tão fortemente nas minhas retinas, ouvidos e coração, que por muitos anos, lembrava dos detalhes visuais de cada apresentação. Lembrava dos gestos e dos figurinos/cenografias dos convidados que fazem parte do elenco musical dos volumes 1 e 2.
Eu e minha irmã na época em
que conhecemos "A Arca de Noé"
Muitos anos se passaram e já adulta me deparei com os dois volumes da Arca em CD e relembrei, faixa a faixa, cada poema. As músicas estavam tão vivas em mim que cheguei a apresentar “Corujinha”, da “Arca de Noé 1”, numa audição em 2008 promovida por todos os estudantes da Profª de música Maria Beatriz Noll. Aliás, foi ela também quem me mostrou a versão italiana de “A Casa”, no LP “L´Arca – Canzoni per bambini” a partir da produção de Sergio Endrigo que reuniu vários intérpretes italianos em versões das canções do volume 1 feitas por Vinícius de Moraes.
Cada vez que escuto a “Arca de Nóe” de Vinicius de Moraes, acompanho em poesia as vozes e a respiração de Milton Nascimento, Moraes Moreira, Alceu Valença, MPB 4, Elis Regina, Frenéticas, Fabio Jr., Boca Livre, Ney Matogrosso,Marinae Walter Franco só para citar os intérpretes do volume 1. O mais interessante é que parte deles já fazia parte do repertório diário que eu colocava na vitrola, após chegar da escola diariamente para fazer meus shows dublados com o som no volume máximo.
A “Arca de Noé” é o último trabalho poético-musical de Vinicius de Moraes lançado nos anos de 1980 e 1981 – este último, póstumo. Em entrevista ao jornalista Tárik de Souza, o produtor Fernando Faro reafirma que Vinicius trabalhou até pouco antes de morrer. “Na madrugada em que se foi, vertia do italiano para o português os poemas da Arca. E cobrava de mim: ‘Faro, me dá logo esse treco!’. Ele respirava esse disco, atento a todos os detalhes”, conta o produtor dos shows e dos álbuns da dupla Toquinho-Vinicius.
No volume 2, alguns intérpretes se repetem, mas as participações de Fagner, Jane Duboc, Elba Ramalho, Grande Otelo, Clara Nunes, Céu da Boca e Paulinho da Viola são muito especiais, diversificando os temas e os gêneros musicais.
A poesia de Vinicius é tão imensamente bela e se ampliou tanto na voz desses intérpretes que está na memória de crianças, jovens e adultos por sua qualidade, irreverência e pureza. A poesia d’“A Arca de Noé” é capaz de coisas que você nem imagina, como, por exemplo, reencontrar a sua criança toda a vez que a escuta. Experimente.
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FAIXAS - "Arca de Nóe 1": 1 - A Arca de Noé-Abertura - Chico Buarque e Milton Nascimento 2 - O Pato - MBP 4 3 - A Corujinha - Elis Regina 4 - A Foca - Alceu Valença 5 - As Abelhas - Moraes Moreira 6 - A Pulga - Bebel 7 - Aula de Piano - Frenéticas 8 - A Porta - Fábio Jr. 9 - A Casa - Boca Livre 10 - São Francisco - Ney Matogrosso 11 - O Gato - Marina 12 - O Relógio - Walter Franco 13 - Menininha - Toquinho 14 - Final - Instrumental
FAIXAS - “Arca de Noé 2”: 1 - Abertura - A Arca de Noé - Dionísio Azevedo 2 - O Leão - Fagner 3 - O Pinguim - Toquinho 4 - O Pintinho - Frenéticas 5 - A Cachorrinha - Tom Jobim 6 - O Girassol - Jane Duboc 7 - O Ar (O vento) - Boca Livre e Vinicius de Moraes 8 - O Peru - Elba Ramalho 9 - O Porquinho - Grande Otelo 10 - A Galinha d'angola - Ney Matogrosso 11 - A Formiga - Clara Nunes 12 - Os Bichinhos e o Homem - Céu da Boca 13 - O Filho Que Eu Quero Ter - Paulinho da Viola
“Quando eu era criança, as pessoas me perguntavam: ‘como é teu nome?’ Eu respondia: Adriana Partimpim. Meu pai até hoje só me chama de ‘Partimpim’.”
Adriana Calcanhoto
"Os artistas japoneses do grande período mudavam de nome várias vezes na vida. Amo isso!!!" Adriana Partimpim
“ADRIANA CALCANHOTO: Era possível, através da música, passar para o outro lado e adentrar o mundo fascinante dos adultos...?
ADRIANA PARTIMPIM: O disco foi feito para eu ser a criança que sou hoje e não a que já fui.
ADRIANA CALCANHOTO: Então o ‘disco infantil’...
ADRIANA PARTIMPIM: Ao invés de música para crianças, tarja que não considero exata, preferi chamar de disco de CLASSIFICAÇÃO LIVRE. Que, no fundo, é tudo o que ele mais gostaria de ser.” Trecho da entrevista que Adriana Partimpim concedeu à Adriana Calcanhoto na época do lançamento do disco
Vinicius de Moraes, depois dos vários projetos literários e musicais que encabeçou durante mais de 40 anos de vida artística, voltou seu olhar, no último deles, às crianças. Nada das mulheres, das paixões ardentes, da boemia, da praia ou dos orixás. O histórico “Arca de Noé”, em parceria com Toquinho e que envolveu vários outros artistas convidados, fez escola no Brasil no que se refere à produção cultural para os pequenos. Elevou-a – junto com outros igualmente célebres, como “Sítio do Picapau Amarelo”, “Pirilimpimpim” e “Plunct Plact Zum” – a um nível de igual qualidade ao que Vinicius fizera na bossa-nova e na literatura.
Com a morte do “Poetinha”, logo após o lançamento do primeiro volume de “Arca...”, em 1980, coincidindo com a acirrada competição televisiva dos programas infantis que tomariam os anos 80, essa proposta de oferecer alta qualidade de cultura para os baixinhos foi se esvaziando. Toquinho e Paulo Leminski bem que tentaram, mas sucumbiram a “Ilariês” e assemelhados. Parecia que não haveria jamais alguém que seguisse aquele caminho aberto por Vinicius em final de vida. Porém, passadas quase duas décadas e meia, o destino levou a gaúcho-carioca Adriana Calcanhoto a assumir esse espaço com o rico – e salvador – projeto “Adriana Partimpim”, de 2004.
A ideia de Adriana, a Calcanhoto, era antiga, de 10 anos antes. À época, ela já havia recolhido temas aos quais gostaria de propor uma nova roupagem sonora, mais solta, divertida e que agradasse tanto crianças quanto adultos. O parceiro Dé Palmeiro foi quem mais incentivou. Porém, imagina-se que deva ter contribuído em certa medida a forte ligação amorosa que Adriana passou a ter com a atriz e cineasta Suzana de Moraes, filha de Vinícius, com quem se casara quatro anos antes de “Partimpim” ser lançado. Pronto: havia juntado todo o necessário: a vontade de compor o repertório, sua experiência e qualidade artística, o apoio externo e o acolhimento emocional. Muito provavelmente, o universo viniciano dentro de casa (e do coração) contagiou Adriana ainda mais, quase que como uma bênção espiritual. O resultado é um disco com alma, diferenciado: ao mesmo tempo altamente musical, tanto no que se refere à escolha do repertório quanto em arranjos e sonoridade, mas também delicioso de se ouvir, pop no melhor sentido.
Não precisa mais de meia hora para isso. De grande experiência e rara sensibilidade, Adriana seleciona dez faixas tão certeiras que parecem, mesmo com idades de composição tão diferentes entre si, terem sido escritas para integrar somente esse disco. A beleza começa com um som de scratch de rap, seguido de uma batida de samba muito gingada e um violão digno dos melhores mestres do instrumento. É "Lição de Baião", canção do repertório de Baden Powell, gravada originalmente em 1961, e que tem a participação de ninguém menos que Louis Marcel Powell, filho e sucessor da maestria do pai nas cordas de nylon. Um barato a letra que brinca – como as crianças fazem! – com as palavras em francês e em português, construindo versos misturando os dois idiomas.
Quadrinhos que ilustram a canção "Oito Anos" (adrianapartimpim.com.br/um/)
"Oito Anos", que Paula Toller compôs para responder às inúmeras (e, não raro, capciosas) perguntas do filho Gabriel, virou um grande sucesso na voz de Partimpim. É divertidíssima em sua enumeração de indagações típicas de criança que está conhecendo o mundo. “Por que as cobras matam/ Por que o vidro embaça/ Por que você se pinta/ Por que o tempo passa”, são alguns dos versos que dão ideia da encrenca que é para uma mãe responder A própria autora comenta a respeito: "Quando cantei para o Gabriel fui mais mãe-artista que artista-mãe. Agora ouço Adriana interpretando ‘Oito anos’ como um menino esperto e adorável. Na leveza da voz dela, há espontaneidade e uma sutil implicância muito bem sacada, afinal, perguntar tanto é menos para saber a resposta do que para treinar a ferramenta perguntadora e a paciência do respondedor.”
A marchinha carnavalesca "Lig-Lig-Lig-Lé", dos anos 30, ganha um arranjo colorido em que se vale bem do clima com que Adriana orientou seus músicos: “tocaram com leveza, com delicadeza e espontaneidade, com muito humor e quase nenhuma coerência”. Querida desde a época de seu lançamento, no carnaval de 1937 (o noticiário da época a classificava como “sucesso fulminante” e “destinada a um recorde de bilheteria”), é das mais divertidas faixas do disco.
Mais do que “Oito Anos”, “Fico Assim sem Você”, na sequência, foi um verdadeiro hit de “Partimpim”, colocando o disco entre os mais vendidos da época. Versando um funk melódico de Claudinho & Buchecha – e cuja original já havia feito estrondoso sucesso nos anos 90 –, não só conquistou o grande público com sua bela melodia romântica e arranjo moderno – com a programação de ritmo funkeada, o violão bossa-nova de Adriana, bem como sua delicada voz, muito afeita à melodia da canção –, como, igualmente, prestou uma bonita homenagem à dupla carioca, desfeita tragicamente em 2002 por conta da morte de Claudinho. A letra, de certa forma, prenuncia a falta que um amigo faz ao outro caso se separassem (o que, fatalmente, ocorreu): "Avião sem asa/ Fogueira sem brasa/ Sou eu assim, sem você/ Futebol sem bola/ Piu-Piu sem Frajola/ Sou eu assim, sem você...". E o refrão não pode ser mais doce: "Eu não existo longe de você/ E a solidão é o meu pior castigo/ Eu conto as horas pra poder te ver/ Mas o relógio tá de mal comigo."
Outra delícia é "Canção da Falsa Tartaruga", em que o poeta concretista Augusto de Campos, fértil parceiro de Adriana (a Calcanhoto), e seu filho, o músico e também poeta Cid Campos, versam com muita habilidade e sensibilidade um trecho de “Alice no País das Maravilhas”, clássico do escritor britânico Lewis Carroll, de 1865. O resultado é uma canção delicada, com um refrão de notas abertas tão bonito que é impossível não cantar junto sempre que se ouve: “Quem não diz: - Ave!/ Quem não diz: - Eia!/ Quem não diz: - Opa!/ Que bela Sopa!” E por que uma sopa de uma falsa tartaruga? Ora, alguém já viu uma tartaruga de verdade fazer sopa?...
Rebuscando mais um pouco o variado conhecimento musical, Adriana traz a bossa nova meiga e melancólica “Formiga Bossa Nova”, adaptação do poema do português Alexandre O’Nell que ficara conhecida, em 1969, na voz da cantora lusa Amália Rodrigues. Outra mostra do quanto a proposta de “Partimpim” não é trazer somente temas de fácil assimilação, uma vez que abarca (também) o público infantil. Caso também de “Ser de Sagitário”, composta por Péricles Cavalcanti para sua filha, que ainda não havia nascido e que ele e sua esposa não sabiam nem que sexo teria, apenas que nasceria no começo de dezembro, ou seja, na vigência do signo de sagitário. “Você metade gente/ e metade cavalo/ Durante o fim do ano/ cruza o planetário”, diz a poética e tocante letra, fazendo uma metáfora com o centauro, símbolo do signo no zodíaco.
O poetinha Vinícius de Moraes: inspiração e bênção
Na mesma linha, outra brilhante canção de “Partimpim”: “Ciranda da Bailarina”. Se “Formiga Bossa Nova” e “Ser de Sagitário” não poupam as crianças de refletirem e aguçarem seus sentimentos, esta, clássico de Edu Lobo e Chico Buarque da trilha do balé “O Grande Circo Místico”, de 1983, vale-se da fantasia e da figura de linguagem da comparação para concluir aquilo que é óbvio, mas que nem todo mundo admite: que ninguém é perfeito. Ao dizer que só a bailarina, tão artificial quanto mítica, não tem pereba, marca de bexiga ou vacina e nem dente com comida ou casca de ferida, está se deixando claro que todo mundo é ser humano. E aí é que está a beleza! Afinal,“sala sem mobília/ Goteira na vasilha/ Problema na família/ Quem não tem?” Bela versão de Adriana em que seus violão e vocal apurados funcionam muito bem novamente. Fora que ainda lhe foi permitido finalmente dizer a ridiculamente proibida palavra “pentelho” sem o grosseiro corte da censura como ocorreu na versão original, ainda dos tempos de Ditadura.
Os craques da nova MPB Moreno Veloso, Kassin e Domênico, este último, autor de "Borboleta", canção encomendada especialmente a ele por Adriana para o disco, antecede outra das especiais de “Partimpim”: “Saiba”, que o encerra. Lindamente classificada como“uma canção para ninar adultos”, “Saiba”, de Arnaldo Antunes, fecha o disco com a mais doce e profunda poesia, pondo os baixinhos para refletirem sobre coisa séria, mas necessária - e, por que não dizer, comum. A música leva o ouvinte a pensar sobre a condição humana a partir de uma proposição óbvia, porém pouco elucubrada: a de que “todo mundo foi criança” e que o ciclo da vida, inevitavelmente, se encerra um dia. Como não ficar tocado por versos como estes? “Saiba/ Todo mundo teve infância/ Maomé já foi criança/ Arquimedes, Buda, Galileu/ e também você e eu”. A letra ainda tem a função educativa de apresentar versos e termos rebuscados, como os nomes estrangeiros Nietzsche e Sadam Hussein, ou rimas diferentes do comum: “Simone de Beauvoir” com “Fernandinho Beira-Mar” ou “Pinochet” com “você”, ambas rimas de classificação “preciosa”, um tipo raro que combina palavras de idiomas distintos. Um final emocionante e que lembra, em certa medida, as melancólicas “Menininha” e “O filho que eu quero ter”, que finalizam os dois volumes de “Arca de Noé”, respectivamente.
A brincadeira de assumir outra personalidade foi levada a sério (sic) por Adriana, a Calcanhoto, que deu vida à outra Adriana, a Partimpim. Com nome artístico independente de sua criadora, a criatura Adriana Partimpim deu tão certo, que, além deste primeiro álbum, outros dois ótimos vieram a seguir (2009 e 2012), além de dois DVD’s ao vivo igualmente imperdíveis. Mais do que isso: o projeto Partimpim pareceu simbolizar um salto qualitativo na obra e na carreira de Calcanhoto, um momento em que ela conseguiu reunir sua competência artística, estética e performática a seus mais íntimos sentimentos. E o resultado foi algo genuíno. Infantil? Adulto? Tanto faz. Como conseguira Vinícius de Moraes em “Arca...”, o trabalho das Adrianas, a Calcanhoto e a Partimpim, rompeu as fronteiras da idade dos ouvintes e da idade do tempo. Afinal, contempla, igualmente, as crianças grandes e os pequenos adultos.
Clipe de"Fico Assim sem Você"
********************************** FAIXAS: 1. "Lição de Baião" (Daniel Marechal/Jadir de Castro) - 03:16 2. "Oito Anos" (Dunga/Paula Toller) - 03:08 3. "Lig-Lig-Lig-Lé" (Oswaldo Santiago/Paulo Barbosa) - 02:38 4. "Fico Assim Sem Você" (Abdullah/Cacá Moraes) - 03:08 5. "Canção da Falsa Tartaruga" (Augusto de Campos/Cid Campos sobre texto de Lewis Carroll) - 04:07 6. "Formiga Bossa Nova" (Alain Oulman/Alexandre O'Neill) - 02:28 7. "Ciranda da Bailarina" (Chico Buarque/Edu Lobo) - 02:49 8. "Ser de Sagitário" (Péricles Cavalcanti) - 03:03 9. "Borboleta" (Domênico Lancellotti) - 02:30 10. "Saiba" (Arnaldo Antunes) - 03:01
"Futebol é uma arte completa em si. É todo um universo. Eu amo futebol porque é preciso ser um artista para praticá-lo. Quando nós jogamos futebol, também fazemos música. Eu preciso disso. Liberdade! Futebol é liberdade." Bob Marley
Aproveitando o ensejo da Copa do Mundo, dessa coisa toda de futebol, aproveitamos para incluir entre os ÁLBUNS FUNDAMENTAIS um artista que, com certeza, por sua representatividade, por sua obra, por sua ascendência já merecia há algum tempo aparecer por aqui, mas que, na verdade, nunca fora destacado anteriormente na nossa seção de grandes discos pelo fato de seu estilo musical, embora gozando de todo nosso respeito e reconhecimento, não figure entre os favoritos do blog. Mesmo assim talvez algum convidado, como costumeiramente temos, resolvesse vir a escrever sobre ele mas como nunca aconteceu, resolvemos fazer justiça.
Bob Marley, cantor e compositor jamaicano, é, sem dúvida alguma, um dos maiores nomes da música mundial e um dos artistas mais influentes de todos os tempos, sendo sua obra engajada, e contestadora, símbolo de lutas por toda forma de liberdade.
Bob Marley correndo atrás da redondinha e, ao lado,
com ilustres parceiros de pelada,
Chico Buarque, Toquinho e o craque Caju.
O caso é que Bob também era chegado numa redondinha e sempre que possível curtia uma pelada com os parças, muitas vezes com amigos famosos como, por exemplo, Jimi Hendrix, Mick Jagger, e os brasileiros Chico Buarque, Toquinho, incluindo o tricampeão mundial pela Seleção Brasileira, Paulo César Caju. Olha, e consta que Bob levava jeito e poderia tranquilamente ter optado pela carreira futebolística. Bom para o mundo da música que não. Bob deixou além de obras importantes e extremamente significativas, um legado de expansão da linguagem do reggae e uma forte mensagem de luta e indignação.
Destacamos aqui o disco "Burnin' " de 1973, que, depois da ótima recepção do disco anterior, "Catch a Fire", projetou definitivamente Marley e sua banda ao reconhecimento internacional, marcando contudo, o fim da participação de Peter Tosh, junto aos Wailers. Além de divergências e desentendimentos pessoais, Tosh, outro ícone do reggae, sentira-se incomodado com a separação do nome da banda do nome de seu frontman, o que acontecera exclusivamente por vontade da gravadora, que pretendia (e conseguira com êxito) torná-lo um grande nome individual.
"Burnin' ", salvo todas as questões periféricas, é um disco de incitação, de convocação, de chamamento às armas contendo algumas das letras mais incisivas de Marley e Tosh nesse sentido. Destaque especial para os sucessos, mundialmente conhecidos, "Get Up, Stand Up" e "I Shot The Sheriff", gravada posteriormente por Eric Clapton, mas também para "Pass It On", "One Foundation" e "Rastaman Chant".
A trajetória de Marley infelizmente foi curta, abreviada, ironicamente, por sua outra paixão, o futebol. Um pisão no pé, numa pelada, teria gerado uma lesão que, não tratada devidamente, se transformara num melanoma que se espalhara pelo corpo, levando o cantor à morte poucos meses depois.
Pena que exatamente o esporte que Marley tanto amava e relacionava de forma tão afetuosa e direta à sua música tenha sido a origem de toda sua tragédia. Mas tenho certeza que de onde estiver, Marley não culpa o futebol pelo fato de não estar mais entre nós. Quem ama o futebol como Bob Marley amava, sabe que o esporte mais praticado no mundo, assim como a música dele, se bem utilizado, pode ser um grande instrumento de transformação, congraçamento e paz.
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"Ao entregar a letra, num golpe de ironia e audácia, o advogado da gravadora pediu que a proibissem; os censores então, como que para contrariá-lo, liberaram "Construção" sem cortes."
relatado pelo escritor Humberto Werneck, no livro "Tantas Palavras - Letra e Música",
songbook de Chico Buarque
Tijolo por tijolo num desenho mágico. Assim foi construído "Construção"(1971), disco espetacular de Chico Buarque de Holanda; o primeiro gravado após sua volta do exílio, provavelmente o melhor do artista e um dos maiores da música brasileira. Ao contrário da boa parte dos discos de Chico que eram verdadeiras colchas de retalho com músicas feitas em épocas diferentes, com parceiros variados, para fins diferentes (filmes, peças, homenagens), "Construção" fora planejado para ser efetivamente um álbum e provavelmente por isso mostre uma coesão, uma unidade, uma encaixe tão perfeito entre as músicas que o tornam diferenciado na obra do cantor.
Constitui praticamente uma grande sinfonia cotidiana, uma grande ópera do homem comum, com tragédias, amores, sangue e emoção. Reforçam esta sensação de obra erudita os arranjos ousados e intensos do maestro Rogério Duprat, com suas cordas e metais poderosos. Já em "Deus lhe Pague" que abre o disco esta intensidade fica demonstrada: ela é forte, ela é densa, com sua condução grave, sua percussão pesada e com as vozes do MPB4 intensificando o sarcasmo da gratidão.
"Cotidiano" que a segue alivia o clima num samba descontraído faz um infinito ciclo do dia-a-dia. "Desalento", um samba triste com uma cuíca chorosa, parceria com Vinícius de Moraes, é um dos poucos casos de música que não deveria estar ali uma vez que faria parte originalmente do compacto de "Apesar de Você" que acabou não saindo, vetado pela censura.
A faixa título, "Construção" é a verdadeira ópera trágica cotidiana: dramática desde sua sonoridade até seus versos pessimistas. Um dia na vida de um operário de obra; aquele dia que ele, cansado da vida, da injustiça, da mesmice, decidira ser o último de sua vida. E Chico descreve isso de maneira mágica, brincando com as palavras, jogando com os versos, num exercício formal absolutamente bem engendrado, amarrando a letra toda por uma anáfora que serve de fio condutor e mantendo uma admirável regularidade silábica de dodecassílabos. A dramaticidade da letra, da situação do operário, do incidente fatal ganham proporções ainda maiores novamente com a orquestração de Duprat e com o coro do MPB4 até chegar a um final onde repete-se um trecho de "Deus lhe Pague" (dentro de "Construção") reafirmando toda e desesperança.
Segue com o gostoso samba "Cordão"; com a lamentosa "Olha, Maria" parceria com Vinícius e Tom Jobim, bem com a cara do maestro soberano; com o desafiador "Samba de Orly" que não se privou, mesmo em época de censura forte e violenta, de falar de quem estava fora do país morrendo de saudades mas que não podia voltar por 'forças maiores'. "Minha História", uma adaptação de uma canção italiana de Lucio Dalla chamada "Gesù Bambino", também teve seus problemas com a censura e com a igreja pela menção a um Menino-Jesus de procedência indigna e vida marginal e boêmia, à qual Chico então teve que se contentar em deixar o nome que pretendia traduzir simplesmente, apenas entre parênteses e no original em italiano.
O disco baixa a rotação totalmente na última faixa, numa espécie de canção de ninar, como que num convite a um relaxamento depois de tantos dramas, compromissos e agruras, em que Chico se despede com "Acalanto". A última peça. O último tijolo.
A obra estava completa.
Álbum mais que fundamental! E não sou apenas eu que digo: "Construção" é um dos poucos discos brasileiros na publicação "1001 Discos Pra Ouvir Antes de Morrer", livro que conta com avaliações de críticos especializados do jornalismo internacional; além disso, foi eleito o terceiro melhor disco brasileiro de todos os tempos na edição brasileira da Rolling Stone, e também pela mesma revista, a canção "Construção" foi considerada a melhor música brasileira da história.
É pouco?
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FAIXAS:
"Deus lhe Pague" – 3:19
"Cotidiano" – 2:49
"Desalento" (C. Buarque, Vinícius de Moraes) – 2:48
"Construção" – 6:24
"Cordão" – 2:31
"Olha Maria" (C. Buarque, V. de Moraes, Tom Jobim) – 3:56
"Samba de Orly" (C. Buarque, Toquinho, V. de Moraes) – 2:40
"Valsinha" (C. Buarque, V. de Moraes) – 2:00
"Minha História (Gesù Bambino)" (Lucio Dalla; versão de C. Buarque) – 3:01
"Acalanto" – 1:38
*todas as músicas, Chico Buarque, exceto as indicadas *******************
Ouça: Chico Buarque Construção
As semifinais não poderiam ter sido mais emocionantes. Dois clássicos locais definiram os classificados para a grande final. Foram decisões difíceis para cada um dos membros da nossa bancada legionística mas, a muito custo, cada um chegou às suas finalistas. Confira aí os comentários, o desenvolvimento, as impressões dos jogos e as classificadas de cada um:
Aquele jogo que eu já começo torcendo pra dar empate. A melodia de Há Tempos sai na frente, consolidando o resultado com sua letra poética e forte. Mas, a inteligência de Meninas e Meninas empata o jogo. A sutileza das ironias de Meninas e Meninas ultrapassa e fica a frente. Os fãs Legionários mais fanáticos reclamam: Há Tempos é favorita! Há Tempos tem história, tem fãs dentro dos fãs. Mas camisa não ganha jogo. Meninas e Meninas ainda faz mais um gol e se classifica para espanto de uns e para alegria de outros.
MENINOS E MENINAS CLASSIFICA
ÍNDIOS x TEMPO PERDIDO
Índios ou Tempo Perdido? Indecisão. Times e forças equivalentes, apesar de jogarem diferentes. O primeiro é racional, forte, social. O outro é um clássico emocional, um show de interpretação. Os detalhes contam. Mas, o detalhe mais importante conta mais: qual mexe mais. Qual marca mais. Qual mobiliza mais. Qual é mais carnal, mais épico? Me fiz essas perguntas por alguns minutos e só aí vi qual time deveria passar. Tempo Perdido merece uma vaga. Vitória apertada, mas ainda vitória. O grito da torcida fanática ajudou.
Há momentos na vida em que se deve ser atrevido. Isso vale para o futebol. E música. “Há tempos” é daqueles baita times, sabidamente grande, mas que, por ser ter de sustentar uma imagem tão séria, se esquece às vezes de que as coisas podem ser diferentes. Isso não quer dizer que não tenha qualidade, pelo contrário, tanto que foi “Há tempos” que abriu o placar no primeiro tempo, terminando os primeiros 45 min em vantagem. Mas o deboche de “Meninos e Meninas”, com seu jogo mais atrevido, mais pra frente, surpreendeu na segunda etapa. Empatou aos 10 min, e aí o negócio engrossou. Depois de tomar um sufoco de “Meninos...”, que se animou e foi pro ataque, “Há tempos” se reorganizou e também ofereceu perigo, com uma bola na trave. Mas a animação de “Meninos...” foi recompensada: aos 32 min, numa jogada de velocidade dentro da área que ia resultar em gol certo, o zagueiro não teve outra alternativa senão fazer a falta: pênalti. Empurra-empurra, tapa na cara, voadeira, “seu juiz viado” pra cá, técnico entrando no campo pra lá, uma balbúrdia. O zagueiro, último homem, já tinha um amarelo e foi expulso. O pênalti só foi ser cobrado 5 minutos depois de os brigadianos tirarem todo mundo de campo. E convertido. Com acréscimos até os 49 min (que o juizinho também não é bobo de dar mais que isso), “Meninos...”, com um homem a mais, segura o resultado e vence o clássico local.
MENINOS E MENINAS NA FINAL!
ÍNDIOS x TEMPO PERDIDO
Times se respeitando. Bem armados, com a categoria de hits campeões e que sustentam, com justiça, até hoje a mística. Resultado: 0 x 0 no primeiro tempo, com os dois times chegando bem na frente, mas perigo mesmo, apenas um lance pra cada lado. O negócio pegou fogo mesmo na segunda etapa, tendo em vista que ambas ganham força da metade pro final. Teve bombardeio de “Índios” na área de “Tempo perdido”, com direito a bola na trave e zagueiro salvando na linha um gol que já era certo. Dois minutos depois, do outro lado, “Tempo...” também botou pavor na área adversária em quatro escanteios seguidos, que o goleiro teve que se desdobrar pra defender as cabeçadas do atacante goleador e do lateral bom de cabeceio. Mas aos 37, num passe errado de “Índios” no campo de defesa, contra-ataque de “Tempo...” bem articulado. Não dá pra ratear com um time desse calibre numa semifinal, né? Golzinho chorado num cruzamento da linha de fundo que o meia raspou nela prensado com o zagueiro. O goleiro ainda abafou, e a bola foi morrer fraca, mas dentro da goleira. Aí, foi só segurar. O técnico de “Tempo...” sacou do banco um zagueiro e um volante e só manteve o atacante lá na frente sozinho. Vai que rolasse outro contra-ataque, né? Mas ficou assim. 1 x 0 e...
TEMPO PERDIDO NA FINALEIRA!
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Jowilton Amaral da Costa
HÁ TEMPOS x MENINOS E MENINAS
Em primeiro lugar devo dizer que fiquei bastante espantado com a canção Meninos e Meninas ter chegado ate as semifinais. Para mim é surpresa. Mas é assim mesmo, eu desclassifiquei Ainda é Cedo no primeiro confronto, e, provavelmente, deixando muitos de queixo caído. Bem, vamos para o jogo, contudo, antecipo que Meninos e Meninas duelando com Há Tempos não tem chance. É um bom jogo, sem dúvida, mas, não é tão disputado quanto o outro confronto da semifinal. Há Tempos domina a partida do início ao fim. Fechando-se como uma fortaleza lá atrás, tocando a bola com disciplina e liberdade no meio de campo, e atacando com coragem, só não goleando por pura compaixão e bondade. Meninos e Meninas 0 x 2 Há Tempos
HÁ TEMPOS CLASSIFICA
ÍNDIOS x TEMPO PERDIDO
Aqui estão duas das minhas músicas preferias da banda. E, em minha opinião, duas das melhores canções da Legião. Jogo duro. As duas fizeram intensamente parte da minha adolescência. Tempo Perdido tem um time veloz, jovem e muito habilidoso. A formação de “Índios” é mais madura, mesclando jovens com jogadores mais experientes. Tempo Perdido prioriza o ataque, sem se preocupar muito em defender. “Se eles fazem um aqui, nós vamos lá e metemos três”, é essa a filosofia do time. Já “Índios”, joga mais cadenciado e é organizado nos três setores do campo, principalmente no meio. “Índios” possui uma “meiuca” cerebral, formada por jogadores clássicos. Com dois cabeças de área marcadores, mas, que têm um ótimo passe e que sabem jogar com a bola no pé., e um camisa dez a lá Zico. Contudo, Tempo Perdido tem os artilheiros do campeonato.A bola rola. Logo aos cinco “Índios” abre o placar numa bela triangulação do seu dez com o centroavante. Tempo Perdido 0 x 1 “Índios”. Tempo Perdido sai com tudo ao ataque, mas de forma desorganizada. Num contra-ataque fulminante “Índios” amplia. 2 a 0 “Índios”. Quando pensávamos que ficaria por isso mesmo na primeira etapa, “Índios” marca o terceiro, num lançamento primoroso do zagueiro que encontrou o atacante sozinho na ponta esquerda que domina e acerta um cruzamento fenomenal na cabeça do camisa nove, que só cumprimenta para o fundo das rede. “Índios” 3 a 0. O segundo tempo foi morno até os trinta minutos e em ebulição dali em diante. Tempo Perdido não conseguia articular o seu jogo e incrivelmente não ameaçava a meta adversária. Aos trinta, num chutão para frente dado pelo goleiro de Tempo Perdido, o zagueirão de “Índios” domina a bola e tenta dá uma de craque e sair driblando na frente da área, mas, acaba entregando o ouro numa lambança magistral, o camisa sete não perde a oportunidade e cara a cara com o goleirão toca em sua saída. Tempo Perdido 1 x 3 “Índios”. O escrete de Tempo Perdido se empolga e vai para o abafa. Dá certo. Aos Trinta e oito, numa bela e veloz jogada pela ponta, o lateral de Tempo Perdido invade a área e é derrubado pelo mesmo zagueiro que entregara o ouro momentos antes. Defensor expulso e pênalti convertido. Tempo Perdido 2 x “Índios” 3 e com menos um em campo. O jogo fica nervoso. “Haja coração amigo, o jogo é teste pra cardíaco, amigo”. Aos quarenta e seis, o juizão olhando para o relógio, já doido pra apitar o fim da partida, o meia-esquerda de Tempo Perdido arranca do meio de campo, passa por dois antes de invadir a área, o goleirão sai nele e ele dá um traço rápido, dando um toquinho para a linha de fundo, o guarda-meta passa batido, contudo, o toque saiu com uma força a mais do que a necessária, e quando ele chega para concluir o ângulo não é mais favorável, mesmo assim ele chuta. A bola caprichosamente bate na trave e corre para o meio da zona do agrião. O centroavante de Tempo Perdido chega babando, com tudo, e salta esticando a perna, junto dele o zagueiro de “Índios”. Até hoje não se sabe direito se quem tocou na bola foi o atacante, ou o zagueiro, ou os dois ao mesmo tempo. O que importa foi que a bola não entrou, passou tirando tinta da trave. O juiz não pensou duas vezes e encerrou o jogo. “Tempo Perdido 2 x 3 “Índios”. Que jooooogo amigo!
Daí é brabo. Necessitamos critério. Meninos e Meninas começa com aquela levada de violão que tu escutas e pensas "Lá vem um hit" e vêm mesmo, com versos, refrões e tempo determinado para tocar em rádio. Há Tempos é a primeira música deste disco, o que faz dela um excelente cartão de visitas. Belíssima letra atemporal. Meninos e Meninas é hit. Há Tempos é hit com um pequeno detalhe. Não tem refrão, embora pareça ter. Por isso passa, pela ousadia de ser colocada como primeira do disco e segurar o tirão.
HÁ TEMPOS PASSA
ÍNDIOS x TEMPO PERDIDO
Passa Índios. Assim, de cara, sem "duvidamente". Tempo Perdido cumpriu seu papel de Smithear a Legião o que para mim é um problema pq se tem uma banda supervalorizada é os The Smiths. Banda de single que construiu discos ao redor deles. A mesma coisa tentaram fazer com a LU nesse disco. Vamos colocar 2 confirmadas Eduardo e Mônica e Tempo Perdido e coloca qualquer coisa aí para encher linguiça que tá bom. Reza a lenda que Índios foi feita aos 44 do segundo tempo em estúdio de forma apressada. Imagina se tivesse tido tempo. Talvez não tivesse ficado tão boa. Quem escreve sabe que em algumas vezes o texto já sai redondo, com poucos ajustes e é esse o caso de Índios. Colocada estrategicamente no final do disco, ao vivo tinha um ganho imenso que auxiliada pelo coral da audiência destrói o poder do hit de Tempo Perdido.
Meninos e Meninas é um barato, uma
música muito legal, uma manifesto pessoal de afirmação e
lebertação, um grande sucesso e tal, mas não tem condições de
bater com Há Tempos. Não dá. Há Tempos é muito mais completa
enquanto música, conceito, ideia, letra e o que mais que seja.
Vitória tranquila por 2x0. Um gol em cada tempo sem tomar pressão.
Para mim, HÁ TEMPOS CLASSIFICA PARA A
FINAL
ÍNDIOS x TEMPO PERDIDO
Jogo equilibradíssimo! Dois times
muito qualificados com características parecidas mas com estruturas
táticas diferentes. Contudo, logo de início, por conta daquele riff
inicial marcante, Tempo Perdido faz 1x0. Depois da surpresa do
início, as letras vão se desenvolvendo e por mais que TP tenha suas
qualidades, a estrutura de Índios com suas anáforas se mostra um
diferencial e garante o empate: 1x1. O jogo vai se desenvolvendo
equilibrado com chances para os dois lados. Segue assim quase até o
final do jogo, mas ali pelos 35 do segundo tempo, aquela parte do
“então me abraça forte...” é o 2x1 de Tempo Perdido, que logo
na sequência, aos 38 faz o terceiro por conta daquele emblemático
“somos tão jovens” que é matador. O jogo estava liquidado! Não,
não. Ainda havia tempo e aos 42 por causa daquele trecho “quem me
dera ao menos uma vez fazer com que o mundo saiba que seu nome está
em tudo...”, Índios faz seu 2º. Teremos emoção até o apito
final. E no apagar das luzes, aquele desfecho fantástico “tentei
chorar e não consegui”, garante o empate já nos acréscimos. Um
3x3 emocionaNte. O jogo vai pra prorrogação e tanto aquele
finalzinho no violão de índios quanto aquela extensaõzinha
acústica de Tempo perdido parecem cansadas demais para mudar o
resultado. A prorrogação acaba sem que ninguém mexa no placar e
vamos para os tiros livres da marca do pênalti. Como pênalti é
loteria, a única maneira de decidir esse confronto é na sorte.
Portanto, agora, amigos, neste momento estou jogando uma moeda para
cima (cara é Índios, coroa é Tempo Perdido) e deu...
Coroa: TEMPO PERDIDO GANHA O JOGO E,
PARA MIM, VAI PARA A FINAL.
pela maioria
"HÁ TEMPOS" e "TEMPO PERDIDO"
classificadas para a grande final
Agora é aguardar a decisão do colegiado legionista e dos fãs no Facebook para conhecermos o campeão. O campeão sai nos próximos dias.
No
início deste ano, numa das vezes que fui à Bahia a trabalho, peguei
um táxi do aeroporto de Salvador com destino a Feira de Santana com
um taxista incomum. Um senhor de uns 50 anos, Sr. Gelson, que adorava
e conhecia muito bem música africana (e de vários países: Angola,
Congo, Mali, Nigéria, entre outros). Papo vai, papo vem e, além de
aprender com ele, fiquei sabendo que em Salvador havia lojas de
música que o supriam de parte deste exótico material fonográfico.
Guardei a informação para quando retornasse à capital baiana.
Pois,
desta vez viajando a passeio por Salvador, descobri uma cidade que
respira música – o que, vocês devem imaginar, gerou uma forte
identificação a alguém que, como eu, anda ininterruptamente com
várias músicas na cabeça durante o dia. E não demorou muito para
que o cheiro de loja de discos me atraísse. Em plana Praça da Sé,
centrão da cidade, está lá a Planet Music, comandada pelo
diletante Ademar, sujeito boa-praça que não poupava em deslacrar
qualquer CD e colocá-lo para o cliente escutar, mesmo que fosse pra
passar rapidamente cada faixa (atitude quase inimaginável no
comércio de Porto Alegre). Pois, seguindo o bom gosto do dono, a
Planet Music é rica em títulos e muito bem selecionada, além de os
preços serem bem aceitáveis.
Entrei,
percorri algumas fileiras enquanto tocava (alto) um axé-music
qualquer, corriqueiro por lá. Leocádia entrou em seguida. Até que
Ademar, de dedo nervoso, para a música pela metade e troca por nada menos que “Saci Pererê”, da Black Rio. Conquistou-me de vez.
Levei junto com esses outros CD’s que aqui comento:
“Saci
Pererê” – Banda Black Rio (1980): Clássico segundo álbum
deste que é dos meus grupos brasileiros preferidos. Além da gostosa
faixa-título, presente de Gilberto Gil, tem Aldir e João Bosco (“Profissionalismo
É Isso Aí”), Zé Rodrix (“Amor Natural”) e composições dos
integrantes da banda. Nem a ausência de Cristovão Bastos nos
teclados fez Oberdan e Cia. baixarem a qualidade, que, depois do
célebre instrumental "Maria Fumaça", se aventuram nos vocais e
mandam muito bem.
“Marinheiro
Só” – Clementina de Jesus (1973): Produzido por Caetano Veloso e Milton Miranda, é talvez o mais bem acabado trabalho desta
negra que alçou ao mundo da música já idosa por providencia de
Hermínio Bello de Carvalho, que a descobriu cantando num bar. Toda a
ancestralidade antropológica africana pode ser sentida em sambas
(“Essa nêga pede mais”, “Madrugada”), maxixes (“Marinheiro
Só”) e cantos religiosos (“Taratá”, “5 Cantos Religiosos”).
“Nada
Como um Dia Após o Outro Dia” – Racionais MC’s (2002): O
sucessor de “Sobrevivendo no Inferno” é um disco longo demais
(pecado dos duplos), por isso é irregular. Mas inquestionavelmente a
banda avançou em estilo e discurso, o que faz com que seus dois
volumes, “Chora Agora” e “Ri Depois”, tragam verdadeiras
joias do rap e da música nacional no início dos 2000. Espetaculares
“Vida Loka” 1 e 2, “Jesus Chorou” e “Vivão e vivendo”.
Figura entre os 100 maiores discos da música brasileira da história
segundo a Rolling Stone.
“Negro
é Lindo” – Jorge Ben (1971): Embora o Babulina tenha outros
VÁRIOS discos preferidos da discoteca, pois produziu absurdamente
bem principalmente do final dos anos 60 até meados de 70, este não
fica pra trás, até porque a “cozinha” é do espetacular Trio
Mocotó. Traz a poética e sensível "Porque é proibido pisar na grama", a bela canção-homenagem “Cassius Marcellus Clay”,
parceria com Toquinho, e aqueles sambas-rock sempre inspirados
(“Cigana”, “Comanche” e “Zula”) como só Ben sabe fazer.
“Força
Bruta” – Jorge Ben (1970): Também com o Trio Mocotó, é o
mais experimental trabalho de Ben. Ele, Parahyba, Nereu e Fritz estão
soltos e se divertindo ao executar os temas ao vivo no estúdio. Não
é dos meus preferidos, até porque Ben tem muito mais discos
maravilhosos, mas só por “O telefone tocou novamente” (meu toque
de celular!), “Charles Jr.” e “Mulher brasileira” já valia.
Ainda por cima, inicia arrasando com “Oba, lá Vem Ela",
daqueles começos de disco empolgantes.
“O q Faço é Música” – Jards Macalé (1998): Se Cristovão
Bastos não estava mais com a Black Rio, aqui seu papel é
fundamental. Talvez o grande disco de Macalé – ao menos, o seu
mais maduro –, "O Q Faço é Música" já mereceu ÁLBUNS FUNDAMENTAIS aqui do Clyblog, feita por Cly Reis. Eu, que gosto um monte também,
não me contive e comentei no próprio blog, que está logo abaixo da
resenha.